sábado, 26 de janeiro de 2008

Hitler não chegou ao poder com voto popular


* Max Altman

No afã de atribuir dramaticidade histórica à raivosa campanha que vastos setores políticos e da mídia nacional e internacional, afetos à ideologia neoliberal e conservadora, arremetem contra o presidente Hugo Chávez e contra o processo revolucionário bolivariano, é comum ler-se e ouvir-se que Adolf Hitler também chegou ao poder na Alemanha através do voto. Argumento insidioso e historicamente falso.



Quantas pessoas que esgrimem esta falácia sabem como Hitler realmente se tornou um ditador? Muito poucas, creio. E dado o fato de que após a Primeira Guerra Mundial a Alemanha se tenha tornado uma república democrática, a República de Weimar, muitos ousariam manifestar sua surpresa de como Hitler pôde ter tido êxito em sua empreitada.

Nas eleições presidenciais de 13 de março de 1932 havia quatro candidatos: o próprio presidente, o idoso marechal liberal-conservador Paul Von Hindenburg, então com 85 anos, o nacional-socialista Adolf Hitler, o comunista Ernst Thaelmann e o nacionalista Theodore Duesterberg. Os resultados foram: Hindenburg -49,6%; Hitler-30,1%;Thaelmann-13,2%, Duesterberg-6,8%. Setenta por cento do povo germânico votou conscientemente contra Hitler, conhecedor de sua ideologia e ação, manifestadas no livro Mein Kampf (Minha luta) escrito em 1923/24, após o fracasso de seu putsch da Cervejaria em Munique. Essa derrota eleitoral levou o correligionário Joseph Goebbels, que viria a se tornar o ministro da Propaganda da Alemanha nazista, a declarar em seu jornal ‘Fomos batidos, terrível resultado. Os círculos partidários estão fortemente deprimidos e desanimados.’

Uma vez que Hindenburg não tinha recebido a maioria absoluta dos votos, um segundo turno teria de ser realizado entre os três primeiros colocados. A segunda votação, levada a efeito em 19 de abril de 1932, teve como resultado: Hindenburg-53,0%; Hitler-36,8%; Thaelmann-10,2%. Parte dos votos de Thaelmann se dirigiu a Hindenburg para derrotar Hitler. Por recomendação pública de Duesterberg, a totalidade de seus partidários votou no líder nazista. Entretanto, embora a votação de Hitler tivesse crescido, ele continuava sendo decididamente rejeitado pelo povo alemão.

Em 1º de junho de 1932, Hindenburg indicou Franz Von Papen como chanceler (que corresponde a primeiro-ministro), a quem o renomado William Shirer, considerado como o mais importante autor desse período histórico, em seu prestigioso livro Ascensão e queda do Terceiro Reich descreveu como “uma figura ridícula e imprevisível”. Papen, tão logo assumiu, resolveu dissolver o Reichstag (congresso nacional alemão), convocando novas eleições, a terceira eleição legislativa em cinco meses.

Hitler e seus comparsas o Partido Nacional-Socialista (Nazional-Sozialist Partei) – nazista, que estavam determinados a derrubar a república e estabelecer um regime ditatorial na Alemanha, cumprindo o programa adiantado por Hitler em seu livro, fizeram todo o possível para estabelecer o caos nas ruas, impondo práticas indiscriminadas de violência e assassinatos com seus esquadrões armados, as SA. A situação tornou-se tão insustentável que se teve de impor uma lei marcial na região de Berlim.

As eleições legislativas de 31 de julho de 1932 deram uma grande vitória ao Partido Nazista, que conquistou 230 cadeiras no Reichstag, tornando-se o maior partido político, embora ainda minoritário num parlamento de 608 assentos.

Com fundamento nesse êxito eleitoral, Hitler exigiu que Hindenburg o nomeasse chanceler e lhe desse o controle total do governo. Otto Von Meissner que trabalhou como assessor de Hindenburg testemunharia mais tarde nos Processos de Nuremberg que “Hindenburg rejeitou a exigência posto que de boa-fé não poderia transferir o poder a um partido novo como o Nacional-Socialista, que não contava com a maioria do povo e que de resto era intolerante, indisciplinado e turbulento.”

A saída para o impasse político reinante no Reichstag foram novas eleições legislativas. No pleito levado a efeito em 6 de novembro de 1932 os nazistas perderam 2 milhões de votos e 34 cadeiras. Embora o Partido Nazista ainda se mantivesse como majoritário, era nítida a perda de terreno entre os votantes.

Tentando aplacar o caos e o impasse que se estabeleceu, o presidente Hindenburg demitiu Von Papen e indicou o general de exército Kurt Von Schleicher como o novo chanceler. Incapaz de formar uma coalizão majoritária, Schleicher pede demissão 57 dias após a sua posse.

Em 30 de janeiro de 1933, o debilitado presidente Hindenburg não mais conseguiu resistir às pressões dos setores conservadores e reacionários, acabando por indicar Adolf Hitler como chanceler. Apesar de os nazistas nunca terem obtido mais de 37% dos votos e mesmo com a minoria dos postos do gabinete ministerial e bem menos do que a metade dos assentos no Reichstag, Hitler e seus acólitos tudo, absolutamente tudo fizeram, inclusive atos de selvageria política com vistas a aterrorizar a população e os adversários, com o fim de consolidar o seu poder. Com Hitler como chanceler a tarefa não se mostrou difícil. O objetivo das classes dominantes da sociedade alemã, (como foi esplendidamente mostrado no festejado filme Cabaret, (1972, de Bob Fosse, com Liza Minelli, Joel Grey entre outros) era ‘deixe que os nazistas acabem com os comunistas que depois daremos cabo deles’.

Em 27 de fevereiro de 1933, exatos 28 dias após sua posse, Hitler estava jantando na casa de Goebbels quando toca o telefone com uma mensagem urgente: ”O Reichstag está pegando fogo!” Hitler e Goebbels foram até o local onde já se encontrava Hermann Goering, mais tarde seu ministro da Aeronáutica. Goering gritava, apoplético, a plenos pulmões: “Este é o começo da revolução comunista! Não podemos perder um minuto sequer. Não teremos compaixão. Todo membro do Partido Comunista deve ser fuzilado, onde for encontrado. Cada deputado comunista deve ser enforcado, hoje mesmo”.

Prenderam um jovem comunista holandês, Marinus van der Lubbe, meio cego, que serviu de bode expiatório. Detiveram também três membros da Internacional Comunista (Comintern), entre os quais o búlgaro Giorgi Dimitrov. Mais tarde, em sua própria defesa, no famoso Processo de Leipzig, Dimitrov conseguiu demonstrar que o incêndio fora provocado pelos próprios nazistas.

Valendo-se do incêndio do Reichstag como pretexto, Hitler consolidou seu poder. Editou em seguida medidas políticas e legais que levariam seus oponentes aos campos de concentração e o mundo ao holocausto e à hecatombe da Segunda Guerra Mundial.

Max Altman é jornalista

in Vermelho 23 DE NOVEMBRO DE 2007 - 16h15

1 comentário:

Unknown disse...

O que sobressai é o raciocínio, para mim inqualificável, de "quem não está por mim, está contra mim"... Quem vota na maçã está contra a laranja. Na estrutura mental do autor; se não, será simplesmente manipulador.
Curioso que releve percentagens, como o faz. De facto, que vale uma "maioria" de 37% ?? E, contudo, numa época (a actual) em que cerca de 60% dos eleitores portugueses votam na Abstenção, qual é a legitimidade de qualquer executivo que surja. De facto, poucos ou nenhuns partidos têm colhido a maioria dos votos. No entanto, eles cá vão sendo governos. Como na Alemanha Nazi ???????????