quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Provincianas - Cesário Verde

Provincianas

I

Olá! Bons dias! Em março
Que mocetona e que jovem
A terra! Que amor esparso
Corre os trigos, que se movem
Às vagas dum verde garço!
Como amanhece! Que meigas
As horas antes de almoço!
Fartam-se as vacas nas veigas
E um pasto orvalhado e moço
Produz as novas manteigas.
Toda a paisagem se doura;
Tímida ainda, que fresca!
Bela mulher, sim senhora,
Nesta manhã pitoresca,
Primaveral, criadora!
Bom sol! As sebes de encosto
Dão madressilvas cheirosas
Que entontecem como um mosto.
Floridas, às espinhosas
Subiu-lhes o sangue ao rosto.
Cresce o relevo dos montes,
Como seios ofegantes;
Murmuram como umas fontes
Os rios que dias antes
Bramiam galgando pontes.
E os campos, milhas e milhas,
Com povos de espaço a espaço.
Fazem-se às mil maravilhas;
Dir-se-ia o mar de sargaço
Glauco, ondulante, com ilhas!
Pois bem. O inverno deixou-nos.
É certo. E os grãos e as sementes
Que ficam doutros outonos

Acordam hoje frementes
Depois duns poucos de sonos.
Mas nem tudo são descantes
Por esses longos caminhos;
Entre favais palpitantes
Há solos bravos, maninhos,
Que expulsam seus habitantes!
É nesta quadra de amores
Que emigram os jornaleiros
Ganhões e trabalhadores!
Passam clãs de forasteiros
Nas terras de lavradores.
Tal como existem mercados
Ou feiras, semanalmente,
Para comprarmos os gados,
Assim há praças de gente
Pelos domingos calados!
Enquanto a ovelha arredonda,
Vão tribos de sete filhos,
Por várzeas que fazem onda,
Para as derregas dos milhos
E molhadelas da monda.
De roda pulam borregos;
Enchem então as cardosas
As moças desses labregos
Com altas botas barrosas
De se atirarem aos regos!
Ei-las que vêm às manadas
Com caras de sofrimento,
Nas grandes marchas forçadas!
Vêm ao trabalho, ao sustento,
Com foices, sachos, enxadas!
Ai o palheiro das ervas
Se o feitor lhe tira as chaves!
Elas chegam às catervas,
Quando acasalam as aves
E se fecundam as ervas!...

II

Ao meio-dia na cama,
Branca fidalga o que julga
Das pequenas da su’ama?!
Vivem minadas da pulga,
Negras do tempo e da lama.
Não é caso que a comova
Ver suas irmãs de leite,
Quer faça frio, quer chova,
Sem um mamã que as deite
Na tepidez duma alcova?!
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