quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Poeta Ferreira Gullar recebeu Prêmio Camões 2010


Cultura

Vermelho - 16 de Setembro de 2010 - 14h20
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Poeta Ferreira Gullar recebe hoje Prêmio Camões 2010

O poeta Ferreira Gullar recebe, nesta quinta (16), do Ministério da Cultura, em solenidade às 17h, no auditório da Biblioteca Nacional, no centro do Rio, o Prêmio Camões 2010. Gullar, que completou 80 anos na sexta-feira (10), vai receber 100 mil euros como premiação pelo conjunto de sua obra. O presidente da Fundação Biblioteca Nacional, Muniz Sodré, vai representar o ministro da Cultura, Juca Ferreira, na cerimônia.

Instituído em 1988 pelos governos do Brasil e de Portugal, o Prêmio Camões é concedido anualmente a autores que tenham contribuído para o enriquecimento do patrimônio literário e cultural da língua portuguesa.

A escolha de Ferreira Gullar ocorreu em maio, por um júri que se reuniu no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa. Considerado um dos mais importantes poetas brasileiros, o maranhense Ferreira Gullar (pseudônimo de José Ribamar Ferreira) é também crítico de arte e ensaísta e foi um dos fundadores do movimento neoconcretista. Tem mais de 15 livros de poesia publicados, entre eles A Luta Corporal, Poema Sujo e Em Alguma Parte Alguma, lançado este ano.

O primeiro escritor brasileiro a receber o prêmio foi o também poeta João Cabral de Melo Neto, em 1990. Desde então, mais sete autores nacionais foram agraciados com o Camões, que também premiou escritores de Portugal, Angola, Moçambique e Cabo Verde.

Fonte: Agência Brasil
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  • grande poeta

    16/09/2010 16h38



    Ferreira Gullar povoou minha adolescência de belos poemas de revolta e luta. Dentro da Noite Veloz é um dos melhores livros de poesia revolucionária já escrito. A morte do Che, a luta do povo do Vietnam, a resistência brasileira à ditadura, o amor. O Poema Sujo, de um só fôlego, para mim está entre os mais belos poemas já escritos. Pena que este gajo deu de cair para a direita com uma fúria incomum. Tomara que não chegue o dia que nos pedirá para esquecer o que escreveu. Ney
    Ney Gyrão
    Porto Alegre - RS
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    http://2.bp.blogspot.com/_vHfhEO08cCE/TAQRNE4PnEI/AAAAAAAATkw/3RMYdP21UYY/s1600/FERREIRA+GULLAR+-+2.jpg
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    TRADUZIR-SE

    Uma parte de mim
    é todo mundo:
    outra parte é ninguém:
    fundo sem fundo.

    uma parte de mim
    é multidão:
    outra parte estranheza
    e solidão.

    Uma parte de mim
    pesa, pondera:
    outra parte
    delira.

    Uma parte de mim
    é permanente:
    outra parte
    se sabe de repente.

    Uma parte de mim
    é só vertigem:
    outra parte,
    linguagem.

    Traduzir-se uma parte
    na outra parte
    - que é uma questão
    de vida ou morte -
    será arte?
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    Ferreira Gullar
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    "Dois e Dois são Quatro"

    Como dois e dois são quatro
    Sei que a vida vale a pena
    Embora o pão seja caro
    E a liberdade pequena
    Como teus olhos são claros
    E a tua pele, morena
    como é azul o oceano
    E a lagoa, serena

    Como um tempo de alegria
    Por trás do terror me acena
    E a noite carrega o dia
    No seu colo de açucena

    - sei que dois e dois são quatro
    sei que a vida vale a pena
    mesmo que o pão seja caro
    e a liberdade pequena.
    .
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    Ferreira Gullar



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    Cantiga para não morrer


    Quando você for se embora,
    moça branca como a neve,
    me leve.

    Se acaso você não possa
    me carregar pela mão,
    menina branca de neve,
    me leve no coração.

    Se no coração não possa
    por acaso me levar,
    moça de sonho e de neve,
    me leve no seu lembrar.

    E se aí também não possa
    por tanta coisa que leve
    já viva em seu pensamento,
    menina branca de neve,
    me leve no esquecimento.
    .
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    Ferreira Gullar



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    Metade

    Que a força do medo que eu tenho,
    não me impeça de ver o que anseio.

    Que a morte de tudo o que acredito
    não me tape os ouvidos e a boca.

    Porque metade de mim é o que eu grito,
    mas a outra metade é silêncio...

    Que a música que eu ouço ao longe,
    seja linda, ainda que triste...

    Que a mulher que eu amo
    seja para sempre amada
    mesmo que distante.

    Porque metade de mim é partida,
    mas a outra metade é saudade.

    Que as palavras que eu falo
    não sejam ouvidas como prece
    e nem repetidas com fervor,
    apenas respeitadas,
    como a única coisa que resta
    a um homem inundado de sentimentos.

    Porque metade de mim é o que ouço,
    mas a outra metade é o que calo.

    Que essa minha vontade de ir embora
    se transforme na calma e na paz
    que eu mereço.

    E que essa tensão
    que me corrói por dentro
    seja um dia recompensada.

    Porque metade de mim é o que eu penso,
    mas a outra metade é um vulcão.

    Que o medo da solidão se afaste
    e que o convívio comigo mesmo
    se torne ao menos suportável.

    Que o espelho reflita em meu rosto,
    um doce sorriso,
    que me lembro ter dado na infância.

    Porque metade de mim
    é a lembrança do que fui,
    a outra metade eu não sei.

    Que não seja preciso
    mais do que uma simples alegria
    para me fazer aquietar o espírito.

    E que o teu silêncio
    me fale cada vez mais.

    Porque metade de mim
    é abrigo, mas a outra metade é cansaço.

    Que a arte nos aponte uma resposta,
    mesmo que ela não saiba.

    E que ninguém a tente complicar
    porque é preciso simplicidade
    para fazê-la florescer.

    Porque metade de mim é platéia
    e a outra metade é canção.

    E que a minha loucura seja perdoada.

    Porque metade de mim é amor,
    e a outra metade...
    também
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    Ferreira Gullar



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    A poesia
    Quando chega
    Não respeita nada.

    Nem pai nem mãe.
    Quando ela chega
    De qualquer de seus abismos

    Desconhece o Estado e a Sociedade Civil
    Infringe o Código de Águas
    Relincha

    Como puta
    Nova
    Em frente ao Palácio da Alvorada.

    E só depois
    Reconsidera: beija
    Nos olhos os que ganham mal
    Embala no colo
    Os que têm sede de felicidade
    E de justiça.

    E promete incendiar o país.

    Ferreira Gullar
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    Nova Canção do Exílio


    Minha amada tem palmeiras
    Onde cantam passarinhos
    e as aves que ali gorjeiam
    em seus seios fazem ninhos
    Ao brincarmos sós à noite
    nem me dou conta de mim:
    seu corpo branco na noite
    luze mais do que o jasmim
    Minha amada tem palmeiras
    tem regatos tem cascata
    e as aves que ali gorjeiam
    são como flautas de prata
    Não permita Deus que eu viva
    perdido noutros caminhos
    sem gozar das alegrias
    que se escondem em seus carinhos
    sem me perder nas palmeiras
    onde cantam os passarinhos
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    Ferreira Gullar



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    "A história humana não se desenrola apenas nos campos de batalhas e nos gabinetes presidenciais. Ela se desenrola também nos quintais, entre plantas e galinhas, nas ruas de subúrbios, nas casas de jogos, nos prostíbulos, nos colégios, nas usinas, nos namoros de esquinas. Disso eu quis fazer a minha poesia. Dessa matéria humilde e humilhada, dessa vida obscura e injustiçada, porque o canto não pode ser uma traição à vida, e só é justo cantar se o nosso canto arrasta consigo as pessoas e as coisas que não tem voz".
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    ferreira gullar




    Ferreira Gullar

    Ferreira Gullar, pseudônimo de José Ribamar Ferreira (nasceu dia 10 de setembro de 1930, em São Luis, Maranhão, Brasil); poeta brasileiro.
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