domingo, 31 de outubro de 2010

Versículos do 13º capítulo do livro de Marcos da Bíblia.

Sinais do fim dos tempos

1 E, saindo ele do templo, disse-lhe um dos seus discípulos: Mestre, olha que pedras e que edifícios!
2 E, respondendo Jesus, disse-lhe: Vês estes grandes edifícios? Não ficará pedra sobre pedra que não seja derribada.
3 E, assentando-se ele no monte das Oliveiras, defronte do templo, Pedro, e Tiago, e João, e André lhe perguntaram em particular:
4 Dize-nos quando serão essas coisas e que sinal haverá quando todas elas estiverem para se cumprir.
5 E Jesus, respondendo-lhes, começou a dizer: Olhai que ninguém vos engane,
6 porque muitos virão em meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo; e enganarão a muitos.
7 E, quando ouvirdes de guerras e de rumores de guerras, não vos perturbeis, porque assim deve acontecer; mas ainda não será o fim.
8 Porque se levantará nação contra nação, e reino, contra reino, e haverá terremotos em diversos lugares, e haverá fomes. Isso será o princípio de dores.
9 Mas olhai por vós mesmos, porque vos entregarão aos concílios e às sinagogas; sereis açoitados e sereis apresentados ante governadores e reis, por amor de mim, para lhes servir de testemunho.
10 Mas importa que o evangelho seja primeiramente pregado entre todas as nações:
11 Quando, pois, vos conduzirem para vos entregarem, não estejais solícitos de antemão pelo que haveis de dizer; mas o que vos for dado naquela hora, isso falai; porque não sois vós os que falais, mas o Espírito Santo.
12 E o irmão entregará à morte o irmão, e o pai, o filho; e levantar-se-ão os filhos contra os pais e os farão morrer.
13 E sereis aborrecidos por todos por amor do meu nome; mas quem perseverar até ao fim, esse será salvo.
14 Ora, quando vós virdes a abominação do assolamento, que foi predito, estar onde não deve estar (quem lê, que entenda), então, os que estiverem na Judéia, que fujam para os montes;
15 e o que estiver sobre o telhado, que não desça para casa, nem entre a tomar coisa alguma de sua casa;
16 e o que estiver no campo, que não volte atrás, para tomar a sua veste.
17 Mas ai das grávidas e das que criarem naqueles dias!
18 Orai, pois, para que a vossa fuga não suceda no inverno,
19 porque, naqueles dias, haverá uma aflição tal, qual nunca houve desde o princípio da criação, que Deus criou, até agora, nem jamais haverá.
20 E, se o Senhor não abreviasse aqueles dias, nenhuma carne se salvaria; mas, por causa dos escolhidos que escolheu, abreviou aqueles dias.
21 E, então, se alguém vos disser: Eis aqui o Cristo, ou: Ei-lo ali, não acrediteis.
22 Porque se levantarão falsos cristos e falsos profetas e farão sinais e prodígios, para enganarem, se for possível, até os escolhidos.
23 Mas vós vede; eis que de antemão vos tenho dito tudo.
24 Ora, naqueles dias, depois daquela aflição, o sol se escurecerá, e a lua não dará a sua luz.
25 E as estrelas cairão do céu, e as forças que estão nos céus serão abaladas.
26 E, então, verão vir o Filho do Homem nas nuvens, com grande poder e glória.
27 E ele enviará os seus anjos e ajuntará os seus escolhidos, desde os quatro ventos, da extremidade da terra até a extremidade do céu.
28 Aprendei, pois, a parábola da figueira: quando já o seu ramo se torna tenro, e brotam folhas, bem sabeis que já está próximo o verão.
29 Assim também vós, quando virdes sucederem essas coisas, sabei que já está perto, às portas.
30 Na verdade vos digo que não passará esta geração sem que todas essas coisas aconteçam.
31 Passará o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão.

Ninguém sabe o dia nem a hora

32 Mas, daquele Dia e hora, ninguém sabe, nem os anjos que estão no céu, nem o Filho, senão o Pai.
33 Olhai, vigiai e orai, porque não sabeis quando chegará o tempo.
34 É como se um homem, partindo para fora da terra, deixasse a sua casa, e desse autoridade aos seus servos, e a cada um, a sua obra, e mandasse ao porteiro que vigiasse.
35 Vigiai, pois, porque não sabeis quando virá o senhor da casa; se à tarde, se à meia-noite, se ao cantar do galo, se pela manhã,
36 para que, vindo de improviso, não vos ache dormindo.
37 E as coisas que vos digo digo-as a todos: Vigiai. 
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http://www.bibliaon.com/marcos_13/
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Os poetas segundo José Luís Peixoto

Lia Branco

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Encantar-te-ás com os poetas até conheceres um.
Com calças de poeta, camisa de poeta e casaco
de poeta, os poetas dirigem-se ao supermercado.

As pessoas que estão sozinhas telefonam muitas vezes,
...por isso, os poetas telefonam muitas vezes. Querem
falar de artigos de jornal, de fotografias ou de postais.

Nunca dês demasiado a um poeta, arrepender-te-ás.
São sempre os últimos a encontrar estacionamento
para o carro, mas quando chove não se molham,

passam entre as gotas de chuva. Não por serem
mágicos, ou serem magros, mas por serem parvos.
A falta de sentido prático dos poetas não tem graça.

José Luis Peixoto
há 5 horas · 

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Yolanda Botelho e Francisco Santos gostam disto.
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o
Victor Nogueira Não estou de acordo que isto seja o retrato dos poetas;trata-se apenas ou de ideia feita, pré-conceituoso, ou dum humor que não atinjo. Fico-me pela poesia sem parvoíce e pelos poetas com os pés na terra e que não  se tornaram pateta "alegre",  com voz de trovão e penas de pavão !!!
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Mário Henrique Leiria - extractos e Contos do Gin Tónico e Sofia

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Lurdes Martins
Estendeu os braços carinhosamente e avançou, de mãos abertas e cheias de ternura.
- És tu Ernesto, meu amor?
Não era. Era o Bernardo.
Isso não os impediu de terem muitos meninos e não serem felizes.
É o que faz a miopia.
...
Mário-Henrique Leiria
há 2 horas · GostoNão gosto · 2 pessoas2 pessoas gostam disto.
#
Victor Nogueira LOL. A Primavera é que é perita no florescer de amores que muitas vezes desembocam no Verão que já lá foi :-)
há 2 segundos
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MÁRIO-HENRIQUE LEIRIA, alguns Contos do Gin-Tónico
 
 
CEGARREGA PARA CRIANÇAS
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A Velha dormindo
o rato roendo
a Velha zumbindo
o rato correndo
a Velha rosnando
o rato rapando
a Velha acordando
o rato calando
a Velha em sentido
o rato escondido
a Velha marchando
o rato mirando
a Velha dizendo
o rato escutando
a Velha ordenando
o rato fazendo
a Velha correndo
o rato fugindo
a Velha caindo
o rato parando
a Velha olhando
o rato esperando
a Velha tremendo
o rato avançando
a Velha gritando
o rato comendo

TELEFONEMA
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    Telefonaram-lhe para casa e perguntaram-lhe se estava em casa.
    Foi então que deu pelo facto. Realmente tinha morrido havia já dezassete dias.
    Por vezes as perguntas estúpidas são de extrema utilidade.
 
ÚLTIMA TENTAÇÃO
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    E então ela quis tentá-lo definitivamente. Olhou bem em volta, com extrema atenção. Mas só conseguiu encontrar uma pêra pequenina e pálida.
    Ficaram os dois numa desesperante frustação.
    Não há dúvida que o Paraíso está a tornar-se cada vez mais chato!

RIFÃO QUOTIDIANO
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Uma nêspera
estava na cama
deitada
muito calada
a ver
o que acontecia
chegou a Velha
e disse
olha uma nêspera
e zás comeu-a
é o que acontece
às nêsperas
que ficam deitadas
caladas
a esperar
o que acontece

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http://www2.dem.ist.utl.pt/~jsantos/Literature/Mario_p.html
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página em branco

Uma página para encher de palavras bonitas e de cores do arco-iris

Sexta-feira, Novembro 30, 2007


Porque está de volta...

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Mario Henrique Leiria
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Tempo de solidão e de incerteza
Tempo de medo e tempo de traição
Tempo de injustiça e de vileza
Tempo de negação
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Tempo de covardia e tempo de ira
Tempo de mascarada e de mentira
Tempo de escravidão
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Tempo dos coniventes sem cadastro
Tempo de silêncio e de mordaça
Tempo onde o sangue não tem rasto
Tempo da ameaça
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Sophia de Mello Breyner
publicada por Maria Lisboa @ 00:00
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sábado, 30 de outubro de 2010

Cancões heróicas musicadas por Fernando Lopes Graça

Fernando Lopes Graça em Évora

Sábado, Abril 28, 2007


FERNANDO LOPES-GRAÇA

músico/compositor, 1906-1994
, Colocado por Victor Nogueira @ Sábado, Abril 28, 2007
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Fotografia de Victor Nogueira

shortcut: [Album549931]
Canções Heróicas / Canções Regionais Portuguesas  - album cover

Fernando Lopes Graça
 (1906-1994)
Canções Heróicas
 
Acordai
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Acordai,
Homens que dormis
A embalar a dor
dos silêncios vis!
Vinde, no clamor
Das almas viris,
Arrancar a flor
Que dorme na raiz!

Acordai,
Raios e tufões
Que dormis no ar
E nas multidões!
Vinde incendiar
De astros e canções
As pedras e o mar,
O mundo e os corações!

Acordai!
Acendei,
De almas e de sóis
Este mar sem cais,
Nem luz de faróis!

E acordai, depois
Das lutas finais,
Os nossos heróis
Que dormem nos covais
Acordai!
 

Jornada
.
Não fiques para trás, ó companheiro,
É de aço esta fúria que nos leva.
Pra não te perderes no nevoeiro,
Segue os nossos corações na treva.

Vozes ao alto!
Vozes ao alto!
Unidos como os dedos da mão
Havemos de chegar ao fim da estrada,
Ao som desta canção.

Aqueles que se percam no caminho,
Que importa! Chegarão no nosso brado.
Porque nenhum de nós anda sozinho,
E até mortos vão ao nosso lado.

Vozes ao alto!
Vozes al alto!
etc.
 

Mãe Pobre
.
Terra Pátria serás nossa,
Mais este sol que te cobre,
Serás nossa,
Mãe pobre de gente pobre.

O vento da nossa fúria
Queime as searas roubadas;
E na noite dos ladrões
Haja frio, morte e espadas.

Terra Pátria serás nossa
Mais os vinhedos e os milhos,
Serás nossa,
Mãe que não esquece os filhos.

Com morte, espadas e frio,
Se a vida te não remir,
Faremos da nossa carne
As seraras do porvir.

Terra Pátria serás nossa,
Livre e descoberta enfim,
Serás nossa,
Ou este sangue o teu fim.

E se a loucura da sorte
assim nos quizer perder,
Abre os teus braços de morte
E deixa-nos aquecer.
 

Convite
.
Vinde ver a Primavera,
Vós que sois da minha terra.
Na raiz de cada chão
Nasce um canto contra a guerra.

Vinde ver o sol fecundo
E abraçar a ventania.
Nas vozes de cada fome
Há gritos de rebeldia
Vinde, vinde!
 

Firmeza
.
Sem frases de desânimo,
Nem complicações de alma,
Que o teu corpo agora fale,
Presente e seguro do que vale.

Pedra em que a vida se alicerça,
Argamassa e nervo,
Pega-lhe como um senhor
E nunca como um servo.

Não seja o travor das lágrimas
Capaz de embargar-te a voz;
Que a boca a sorrir não mate
Nos lábios o brado de combate.

Olha que a vida nos acena
Para além da luta.
Canta os sonhos com que esperas,
Que o espelho da vida nos escuta.
 

Cantemos o Novo Dia
.
Olhai que vamos passar,
Nosso canto é de verdade;
Vinde connosco lutar,
Nós somos a liberdade.

A terra está toda em flor
O céu é todo alegria.
A nossa voz é de amor,
- Cantemos o Novo Dia!

Ó jovem que és cavador,
Semeia, hás-de colher.
A papoila é nossa flor,
O trigo é nosso querer.

Toda a palavra é de amor,
A hora é nossa, confia,
Nosso olhar tem mais fulgor
- Cantemos o Novo Dia!

Há seiva forte a brotar,
Novas folhas a nascer,
A Primavera a chegar,
Os homens querem viver.

A juventude é mais moça
Quando o amor principia
Pois se a vida é toda nossa
- Cantemos o Novo Dia!
 

Combate
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Nada poderá deter-nos
Nada poderá vencer-nos.
Vimos do cabo do mundo
Com este passo seguro
De quem sabe aonde vai.

Nada poderá deter-nos,
Nada poderá vencer-nos!

Guerras perdidas e ganhas
Marcaram o nosso corpo,
Mas nunca em nós foi vencida
Esta certeza sabida
De saber aonde vamos.

Nada poderá deter-nos,
Etc.

Os mortos não os deixamos
Para trás, abandonados,
Fizemos deles bandeiras,
Guias e mestres, soldados
Do combate que travamos.

Nada poderá deter-nos,
Etc.

Nada poderá deter-nos,
Pró assalto das muralhas
Nossos corpos são escadas,
Para as batalhas da rua
Nossos peitos barricadas.

Nada poderá deter-nos,
Etc.

Nada poderá vencer-nos,
Vimos do cabo do mundo
Vimos do fundo da vida:
Que somos o próprio mundo
E somos a própria vida.

Nada poderá deter-nos,
Etc.
 

Ronda
.
Amor, já se aproxima a hora
De darmos as mãos e dançar.
A ronda que começa agora,
Eia agora!
É para nela se bailar.

Mas precisamos ir primeiro
por uma madrugada fria,
Fazer dos anseios bandeira,
Na dor temperar a alegria.

Amor, já se aproxima a hora
De darmos as mãos e dançar.
Na ronda que começa agora,
Eia agora!
Havemos todos de entrar.

Se a vida vã que nos uniu
À morte assim nos entregasse,
Seria uma noite mais noite
Que a esta noite nos poupasse.

Amor, já se aproxima a hora
De darmos as mãos e dançar.
A ronda que começa agora,
Eia agora!
Não mais voltará a parar.

E o novo dia se levanta
Vadiando da rua ao telhado.
- Amor, estende a tua manta,
Vamos dormir sobre o passado.
 

Livre
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Não há machado que corte
A raiz ao pensamento:

Não há morte para o vento,
Não há morte.

Se ao morrer o coração
Morresse a luz que lhe é querida,

Sem razão seria a vida,
Sem razão.

Nada apaga a luz que vive
Num amor, num pensamento,

Porque é livre como o vento
Porque é livre.
 

Canto de Esperança
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Dentro de mim e de ti
Algo de novo estremece,
A vida abre-se e ri
Na hora que se entretece.
Vultos parados e sós,
Mudez da alma sozinha,
Tomai o corpo e a voz
Da vida que se adivinha.

Canta mais alto, avança e canta,
Lança-te à marcha, não te afastes.
Mistura a tua voz à voz que se levanta
Das chaminés e dos guindastes.

Rasgam-se os céus e a terra,
A esperança cai e refaz-se.
É o grito duma outra guerra:
Canto do homem que nasce.

Tomam forma consistente
As ilusões encobertas.
Caminha, caminha em frente
Para as novas descobertas.

Canta mais alto, avança e canta,
Etc.

Molda em teus dedos leais
Um destino à tua imagem.
Ao ódio dos vendavais
Ergue uma viva barragem.

Da alma do tempo imundo
Arranca a felicidade.
Homens humanos do mundo!
Homens de boa vontade!

Canta mais alto, avança e canta,
Etc.
 

Canto de Paz
.
Homens deixai abrir a alma ao que vier,
Deixai entrar a paz do tempo que ela quer.

De par em par aberta com sol até ao fundo,
Gastai a alma toda na harmonia do mundo.

Homens deixai abrir a alma ao que vier,
Etc.

Homens que vagueais pela berma da vida,
Tereis enfim sinais da glória prometida.

Homens deixai abrir a alma ao que vier,
Etc.

Na voz do Dia Novo a dar bom dia aos astros,
Quando a tristeza for só pó dos vossos rastros,

Homens deixai abrir a alma ao que vier,
Etc.
 

Canto Livre
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Gema embora a terra inteira
Acurvada a iníquas leis;
Esta fonte sobranceira
Jamais de rojo a vereis.

Hó! Ninguém, ninguém a esmaga
Que eu sou livre como a vaga,
Que sacode sobre a plaga
O jugo de altos baixéis.

Liberdade é o mote escrito
No céu, na terra e no mar!
Di-lo a fera no seu grito
Di-lo a fera no seu grito
E as aves cruzando o ar,
Di-lo o vento da procela,
A vaga que se encapela
E nos espaços a estrela
E nos espaços a estrela
Em seu contínuo girar.

Eu sou livre; eis minha crença,
Nem força contra ela vale.
Que um tirano enfim me vença;
Triunfarei por seu mal.

Triunfarei, que algemado
E diante dele arrastado,
Sou livre! Será meu brado
Até ao momento final
Liberdade é o mote escrito
Etc.
 

Clamor
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Ao sol os olhos vendados,
Braços na luta cingidos;
E ainda que algemados
- Algemados
Mas nunca vencidos!

Sabemos do sofrimento
O que no sofrimento há;
Se a dor é desalento
- Desalento
Outra fé nos dá!

Uma esperança em cada vida,
Que ao calor do ódio arde;
Luta até mesmo abatida
- Abatida
Mas nunca cobarde!

Carne que se não corrige,
Chicote com sangue a lava;
Se só na morte transige
- Transige
Mas nunca é escrava!
 

Ó Pastor que choras.
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Ó pastor que choras;
O teu rebanho onde está?
Ó pastor que choras;
O teu rebanho onde está?
Deita as mágoas fora!
Carneiros é o que mais há!
Deita as mágoas fora!
Carneiros é o que mais há!

Uns de finos modos
Outros vis por desprazer:
Uns de finos modos
Outros vis por desprazer:
Mas carneiros todos
Com carne de obedecer!
Mas carneiros todos
Com carne de obedecer!

Quem te pôs na orelha
Essas cerejas pastor?
Quem te pôs na orelha
Essas cerejas pastor?
São de cor vermelha!
Vai pintá-las de outra cor...
São de cor vermelha!
Vai pintá-las de outra cor...

Vai pintar os frutos,
As amoras, os rosais:
Vai pintar os frutos,
As amoras, os rosais:
Vai pintar de luto
As papoilas dos trigais!
Vai pintar de luto
As papoilas dos trigais!
 

Canções de Catarina
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Na fome verde das searas roxas
Passeava sorrindo Catarina
Passeava sorrindo Catarina

Ah!

Na fome verde das searas roxas
Ai a papoila,
Ai a papoila cresce na campina!
Ai a papoila cresce na campina!

Ah!

Na fome roxa das searas negras
Que levas, Catarina, em tua fonte?
Que levas, Catarina, em tua fonte?

Na fome roxa das searas negras
Ai devoraram,
Ai devoraram corvos o horizonte!
Ai devoraram corvos o horizonte!

Ah!

Na fome negra das searas rubras
Ai da papoila, ai de Catarina!
Ai da papoila, ai de Catarina!

Ah!

Na fome negra das searas rubras trinta balas,
Trinta balas gritaram na campina

Trinta balas
Trinta balas
Te mataram a fome

Catarina
 

As Papoilas
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O papoilas dos trigais,
Em ondas de cor...
Em ondas de cor...
Sangrentas como os punhais
Do nosso suor...
Do nosso suor...

Dá vontade de arrancá-las,
Pô-las nas lapelas...
Pô-las nas lapelas...
E, depois,
E, depois, dependurá-las
Na luz das estrelas
Na luz das estrelas.

O papoilas como chagas
Em ondas de flor...
Em ondas de flor...
No sangue das vossas vagas
Anda a nossa dor
Anda a nossa dor.

Outras papoilas um dia,
Pela terra fora
Pela terra fora
Darão ao mundo a alegria
Duma nova aurora
Duma nova aurora.
 

Canção do Camponês
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Adeus trigo, ai, adeus trigo,
Depois de ceifado, adeus:
Amanho-te e não mastigo,
Ai, nem eu, nem eu nem os meus.

O escravo da campina
Ouve o motor do tractor
Com ele mudas a sina -
Da terra és conquistador!.

Searas cor de sol posto,
Meu mar alto de aflição
Enche-o com suor do rosto,
Ai, em troca falta-me o pão.

O escravo da campina
Etc.

Ai campos, como os meus olhos.

Ai campos, como os meus olhos,
Rasos de água tanta vez:
Foram-se espigas nos molhos,
Ai, vem fome para o camponês.

O escravo da campina,
Etc.
 

Quando a Alegria for de todos
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Quando a Alegria for de todos
Como bem que não tem dono
Como bem que não tem dono;
Quando a alegria for de todos
E tão naturalmente
E tão naturalmente
Como o ar que respiramos
Quando a alegria for de todos -
Que bom será viver
E Respirar a plenos pulmões
O ar saudável da alegria!
Como será bom e belo e fecundo
O riso da Vida
O riso da Vida
Nas bocas floridas,
Nas bocas floridas de palavras de Amor!
Ah!

Quando a alegria for de todos
Quando a alegria for de todos
todos, todos!.
 

Não te deites, Coração
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Não te deites, coração,
À sombra dos teus amores.
Não durmas, olha para eles,
Com alegrias e dores.

Não tenhas medo. O calor,
Que vem das serras ao mar,
Erguendo incêndios não queima
Erguendo incêndios não queima
O que não é de queimar.

Agradece ao vento frio
Que traz chuva miudinha
É neve que se aproxima,
Tormenta que se avizinha...
Nos incêndios naturais
Queima o ramo das saudades
E faz a tua canção
E faz a tua canção
Do surgir das tempestades!
 

Hino do Homem
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Homem, se homem queres ser
E não uma sombra triste,
Olha para tudo o que existe
Com olhos de bem ver.

Nada,
Nada receies saber.
Ao que não amas, resiste.

Mesmo vencido, persiste
E acabarás,
E acabarás por vencer.

Quere,
Quere e poderás poder.
Vai por onde decidiste.

A liberdade consiste
No que a razão
No que a razão
No que a razão te impuser.

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http://tv1.rtp.pt/canais-radio/antena2/arquivo_cancoes/fernando-lopes-graca-1.html
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Fernando Lopes-Graça (1906-1995)
Fernando Lopes-Graça foi um dos mais notáveis compositores e musicólogos contemporâneos. Nasceu a 17 de Dezembro de 1906, em Tomar. Estudou em Coimbra, no Conservatório Nacional. As «Variações Sobre um Tema Popular Português para Piano» são a sua primeira obra, datada de 1929.
Biografia de Fernando Lopes Graça: http://www.citi.pt/cultura/temas/frameset_graca.html






Portuguese Folk Music
Vol. IV – Alentejo  
«Esta antologia é o fruto das primeiras pesquisas que Giacometti realizou em Portugal. Contou com a preciosa colaboração de Fernando Lopes Graça, na selecção de trechos musicais e na análise dos mesmos»:
http://montra.alentejodigital.pt/cd.htm
Fernando Lopes-Graça dedicou toda uma vida à recolha de temas tradicionais. Juntamente com Michel Giacometti, fez uma recolha sobre os ritmos e cantares do povo português que é considerada como uma das mais importantes para os estudos etnográficos.  


Ouvir Cantares Tradicionais dirigidos por Fernando Lopes Graça:

Para ouvir poemas tradicionais cantados aceda a: http://www.utad.pt/~cmisto/repertoriobai.html
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Sobre as Canções Heróicas
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As Canções Heróicas/ /Canções Regionais Portuguesas foram compostas musicalmente por Fernando Lopes-Graça e cantadas pelo Coro da Academia de Amadores de Música com Olga Prats ao piano.
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São canções politicamente empenhadas que contribuíram para exaltar a liberdade e dar força a todos aqueles que lutavam contra o antigo regime. A primeira versão foi publicada, em 1946, sob o título de «Marchas, Danças e Canções – próprias para grupos vocais ou instrumentos populares». Foi apreendida pela Censura o que impediu que os poemas fossem ouvidos e cantados em espectáculos ou sessões públicas, como até então. Contudo, muitos resistentes continuaram a cantar as canções nos encontros clandestinos ou nos países onde se encontravam exilados. Em 1960, surge uma  colecção, mais alargada, com o nome de «Canções Heróicas, Dramáticas, Bucólicas e Outras». A nova edição destinava-se a celebrar o 50º aniversário da implantação da República e foi divulgada com grandes precauções, num meio muito restrito de pessoas. Finalmente, a versão final ficou conhecida por «Canções Heróicas».
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http://cvc.instituto-camoes.pt/poemasemana/05/02.html
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Lopes Graça

Juntamente com os poetas José Gomes Ferreira, João José Cochofel, Carlos de Oliveira, entre outros, compõe as Canções Heróicas, cantadas em defesa da paz e ...
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    Canciones de Canções Heróicas / Canções Regionais Portuguesas

  1. CANÇÕES HERÓICAS: Acordai (02' 08'')
  2. Jornada (01' 13'')
  3. Mãe Pobre (01' 52'')
  4. Convite (01' 06'')
  5. Firmeza (01' 26'')
  6. Cantemos o Novo Dia (01' 28'')
  7. Combate (02' 00'')
  8. Ronda (01' 52'')
  9. Livre (01' 32'')
  10. Canto da Esperança (02' 19'')
  11. Canto de paz (02' 46'')
  12. Canto Livre (03' 02'')
  13. Clamor (01' 33'')
  14. Ó Pastor que Choras (01' 22'')
  15. Canção de Catarina (01' 47'')
  16. As Papoilas (01' 14'')
  17. Canção do Camponês (02' 38'')
  18. Quando a Alegria for de Todos (01' 09'')
  19. Não te Deites Coração (01' 19'')
  20. Hino do Homem (01' 37'')
  21. CANÇÕES REGIONAIS PORTUGUESAS: Nossa Senhora das Preces (01' 54'')
  22. Lá em Sta. Iria (01' 31'')
  23. Nem contigo nem sem ti (02' 06'')
  24. S. João Adormeceu (03' 26'')
  25. Andorinha Gloriosa (01' 35'')
  26. Quatro Laços da Dança dos Paulitos (02' 15'')
  27. Fui-te ver, 'stavas lavando (02' 23'')
  28. Anda Duermente Niño (01' 02'')
  29. Oração de Sto. António (02' 18'')
  30. Ai de Mim Tanta Laranja (01' 51'')
  31. Moradoras Desta Casa (01' 12'')
  32. Deus Te Guarde, Pastorinha (03' 16'')
  33. Vai Colher a Rosa (02' 10'')
  34. Milho Verde, Milho Verde (01' 50'')
  35. Senhora do Livramento (01' 45'')
  36. Sete varas tem (02' 44'')
  37. Tascadeiras do Meu Linho (01' 45'')
  38. Ó Senhora do Amparo (02' 19'')
  39. Passarinha Trigueira (02' 02'')
  40. À Moda da Rita (03' 04'')
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sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Não contem com o fim do livro, uma conversa com Umberto Eco


Digestivo nº 468 >>> Não contem com o fim do livro, uma conversa com Umberto Eco
Entre os livros que discutem, justamente, o "fim do livro", o melhor, em português, até agora, tem sido Não contem com o fim do livro (Record, 2010), transcrevendo conversações entre Umberto Eco e Jean-Claude Carrière, que trabalhou com Luis Buñuel e Peter Brook. A presença do semiólogo e autor de O Nome da Rosa (1980) e O Pêndulo de Foucault (1988) se justifica, afinal, Eco tem sido um dos principais eruditos a discutir o fenômeno da internet desde o início. Já Carrière, embora homem de teatro e de cinema, tem uma bagagem literária invejável e, ao contrário do que poderia parecer, não defende a "civilização de imagens" preconizada por McLuhan. Fora que o título do volume, ainda que chame a atenção nas livrarias, não corresponde ao seu conteúdo com precisão. Contrariando, mais uma vez, as expectativas, não se trata de um libelo contra os novos "leitores eletrônicos", da Amazon e da Apple, nem mesmo de uma visão apocalíptica sobre a ascensão do Google, ou mesmo de um ataque à suposta "literatura" (ou ao suposto "jornalismo") praticado em blogs. Não contem com o fim do livro, à maneira de Borges, faz uma belíssima defesa da leitura, da cultura e da civilização, abordando o livro como objeto, mas também com conceito e como ferramenta humana, imperecível, na visão de Eco. Séculos ou até milênios de História desfilam nas conversas entre Carrière e o semiólogo, num nível que a própria discussão, avançadíssima, sobre os formatos eletrônicos para leitura, nos EUA, ainda não alcançou. É o velho continente – e, não, o novo – discutindo o que os suportes digitais significam para o Homem, no sentido mais amplo, e, não, para os jornalistas, escritores ou publishers. Talvez as elucubrações de Eco e Carrière não alterem em nada o curso da tecnologia, mas sua perspectiva é fundamental em termos humanísticos. Não contem com o fim do livro deve, portanto, ser lido tanto por quem ama os livros quanto por quem já se acostumou à ideia do desaparecimento do objeto físico "livro". [3 Comentário(s)]
>>> Não contem com o fim do livro

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quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Á lvaro Cubhal - dois extractos e dois desenhos



Sábado, 17 de Outubro de 2009


Um dia mais, um dia menos...


"(...) Nesse dia, como todos os dias, semana após semana, mês após mês, ano após ano, a vida decorreu no ritual de sempre.
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O silêncio da noite cotado pelos apitos da alvorada e o súbito expandir do barulho da movimentação geral da cadeia. O ruidoso e cadenciado abrir (umas atrás das outras) das fechaduras e ferrolhos das celas. O bater de tairocas dos faxinas circulando com os baldes dos despejos. O baque metálico dos baldes ao serem atirados para o chão de cimento. O fedor espalhando-se nas alas logo misturado e coberto pelo da creolina. Novos apitos, formatura, conto. A distribuição do café e do casqueiro. O deslocar em cortejo para as oficinas. De novo ferrolhos e fechaduras, agora com novo bater das portas e o isolar dos reclusos nas celas. Depois o amortecer dos ruídos e o alastrar do vazio da imensidão das alas, cortado apenas pelo bater desencontrado das tairocas e tamancos dos faxinas e o barulho de marteladas, da serra e de máquinas vindo das oficinas(...)"

Excerto de "A Estrela de Seis Pontas" de Manuel Tiago, Pseudónimo literário de Álvaro Cunhal
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Domingo, 30 de Agosto de 2009

Moços que parecem homens e nunca forma meninos

"(...) O telhal está silencioso e deserto, e o vento zune no caniço dos esteiros, negros como breu. No céu, nem uma estrela. As luzes mortiças dos saveiros, ao longe, adensam a noite.
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Mas o Gineto não tem medo. Já por duas vezes que atravessou o esteiro, com o lodo pelos joelhos, para ir roubar carvão da Fábrica Grande. No Largo da Vila já há armações para a Feira - e ele quer voltar a ver Rosete na barraca de tiro; quer comprar-lhe beijos com dinheiro que no telhal não chegou a juntar.
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Por isso, atravessa de novo o esteiro, agora cheio de água; depois rasteja e corre para junto do carvão, com que vai enchendo a saca, precipitadamente, atento aos ruídos e focos de luz. As máquinas, porém, abafam os passos dos guardas, confundidos com as trevas. Quando esboça a fuga, é tarde de mais, perante homens lestos e potentes como o Rex - o canzarrão da Quinta Alta.
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Preso e manietado, dorme no posto da Guarda Republicana, depois do interrogatório sumário. Dorme?... Não: Congemina fugas e pensa que os companheiros o virão salvar, como naquela noite de temporal em que o Boa Sorte naufragou. Não permitirão que o chefe permaneça ali, longe das ruas em que se joga e brinca, longe dos pomares carregadinhos de frutos. Ele tem, planos maravilhosos para a quadrilha, que , até então, nada mais fizera do que roubar algumas sacas de laranjas, durante o Inverno que passou.
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Mas os amigos não vêm, e a mãe, com as suas lágrimas, não consegue anular o depoimento dos guardas, dos caseiros e do Cabo do Mar, que tem uma cicatriz indelével no braço, feita pelo canivete do Gineto...
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Rolam dias iguais a todos os dias; o Outono chega, cavalgando o vento. E Gineto mantém a mesma fé de quando entrou na prisão.
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Através da cela, ouve um tropel de cavalos e alarido de muito povo, a entrecortar um sussurro distante, confuso, de música e tiros e vozes... É a Feira. Gineto anima-se, crente de que os companheiros virão buscá-lo neste dia de festa, trazendo Rosete com eles. Encosta a face às grades, espera o regresso à vida livre.
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Uma voz canta, mesmo por baixo da janela, uma canção que ele ouviu, certa tarde, no alto do Mirante. Ele grita: - Gaitinhas! Tou aqui, Gaitinhas!
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Mas a voz afasta-se. Gaitinhas-cantor vai com saguí correr os caminhos do mundo, à procura do pai. E, quando o encontrar, virá então dar liberdade ao Gineto e mandar para a escola aquela malta dos telhais - moços que parecem homens e nunca forma meninos."

Excerto de "Esteiros" de Soeiro Pereira Gomes
Desenho de Álvaro Cunhal


A reconfiguração do Estados ao serviço do grande capital - Filipe Diniz


 
Filipe Diniz
24.Fev.10 :: Colaboradores

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“Se o Estado que a política de direita gera se coloca em confronto insanável com os interesses, direitos, aspirações e liberdades dos trabalhadores e do povo, a luta dos trabalhadores e do povo fará com que, cedo ou tarde, chegue a momento em que essa contradição será superada, numa radical ruptura que retome o caminho de Abril.”

Para abordar o tema que me foi proposto – o da reconfiguração do Estado ao serviço dos grandes interesses económicos – será talvez necessário recuar mais longe do que a década que temos em análise, incluindo até o período da resistência antifascista. É útil relembrar, no contexto actual, o que Álvaro Cunhal escreveu acerca das posições da burguesia liberal sobre as necessidades de modificação ou substituição do Estado fascista pela revolução democrática: [existe uma] «íntima relação entre os objectivos políticos que cada sector atribui à revolução antifascista e as suas posições em relação ao problema do Estado: quanto menores são as transformações de ordem social e política encaradas, tanto menores são as exigências de modificação ou substituição do Estado fascista».
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Um dos traços mais originais da nossa Revolução consistiu no facto de se terem operado no País, num muito curto período de tempo, transformações sociais e económicas profundas sem que, em algum momento, se tivesse constituído um poder coerentemente revolucionário e sem que se tivesse criado um aparelho de Estado correspondente às transformações alcançadas. Mais ainda, essas transformações prosseguiram ainda quando já se instalara nos órgãos de poder uma correlação de forças profundamente desfavorável.
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Muito do que fora alcançado foi destruído. Mas que tenha sido possível, primeiro, realizar tão profundas transformações nas condições existentes e, depois, defendê-las de forma tão prolongada num quadro de relações de poder profundamente desfavoráveis continua a constituir um dos traços mais notáveis do processo de Abril. 
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No decurso do período mais criador da Revolução e apesar das contradições internas nos órgãos de poder existentes foi possível a tomada de muitas decisões e medidas progressistas. E mesmo quando o ímpeto transformador de Abril foi detido ter-se-á prolongado durante um certo período uma situação com características muito semelhantes àquelas que Lenine prevê no seu texto clássico sobre o Estado, ou seja, a possibilidade de ocorrerem «excepcionalmente períodos em que as classes em luta se mantêm uma à outra tão perto do equilíbrio que o poder de Estado [….] alcança momentaneamente uma certa autonomia face a ambos». 
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Quando Marx e Engels reflectiram sobre a questão do Estado, a única experiência real de um poder exercido pela classe operária e pelo povo eram os breves e heróicos dias da Comuna de Paris. Quando Lenine escreveu «O Estado e a Revolução» os sovietes eram já uma nova e importante realidade, mas não fora ainda criado o primeiro Estado proletário da história nem existia ainda verdadeiro poder soviético. A teorização marxista identificou justamente, desde as primeiras formulações, o Estado como instrumento de dominação e opressão de classe e como factor de reprodução dessa dominação. Mas ao longo de todo o século XX e até aos dias de hoje surgiram diferentes formas de organização do Estado, desde os estados fascistas às democracias burguesas que, pressionadas pela luta dos trabalhadores – animada pela ampla consagração de direitos aos trabalhadores e aos povos nos países socialistas – integraram no sistema do Estado um conjunto de importantes funções sociais. Desde o final do século passado e até hoje um processo complexo de hegemonização do campo capitalista pelo imperialismo levou à derrota do campo socialista e a um feroz ataque, sob a bandeira do neoliberalismo, aos direitos conquistados pelos trabalhadores. A constituição de instituições supranacionais – decorrente da tendência para a uma ordem internacional hegemonizada por uma só potência – com o imperialismo assumir no plano internacional tarefas de repressão anteriormente reservadas aos estados nacionais (como sucede ao abrigo do chamado «direito de ingerência humanitária»); a abdicação de parcelas – cada vez mais importantes – da sua soberania por parte dos estados dependentes. 
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Mas a avaliação do papel do Estado permanece necessariamente centrada na identificação dos interesses de classe ao serviço dos quais é organizado. No decurso da década cujo balanço fazemos a prevalência desses interesses tornou-se ainda mais evidente do que em qualquer período anterior desde 1976. Tornou-se mais evidente nomeadamente no plano das funções sociais do Estado, no que diz respeito aos direitos dos trabalhadores, no que diz respeito ao papel e às missões das forças armadas e de segurança, no que diz respeito à justiça, no que diz respeito ao papel do Estado na economia e no ordenamento do território, no que diz respeito às liberdades e garantias dos cidadãos e ao regime democrático, no que diz respeito à mutilação da soberania nacional. Os fenómenos de desresponsabilização do Estado manifestam-se tanto no plano das leis com no das estruturas do aparelho de Estado.

Ofensiva em todas as frentes
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Quando a direita afirma que há funcionários públicos a mais isso significa fundamentalmente que do que se trata é de reduzir as funções sociais e culturais do Estado. A colocação de milhares de trabalhadores do Ministério da Agricultura na situação de disponíveis acompanhou o processo de destruição da agricultura portuguesa; o emagrecimento do orçamento para a cultura artística e a abdicação do projecto da sua democratização traduziu-se no esvaziamento técnico-financeiro e humano da Direcção Geral da Cultura. O Estado externaliza aspectos das suas funções técnicas e as estruturas, descentralizadas ou meramente desconcentradas, dos ministérios deixam de ser órgãos de apoio aos trabalhadores para se tornarem tentáculos do aparelho de Estado, exercendo funções de controlo e propaganda. 
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Depende determinantemente do papel assumido pelo Estado a concretização do direito dos cidadãos à educação, à cultura, à saúde, à justiça. E é assim porque incumbe ao Estado proporcionar condições de igualdade na concretização desses direitos a cidadãos que, por força não apenas da sua situação social e económica mas também da sua localização no território nacional estão à partida em posições de profunda discriminação e desigualdade. Mas o que se acentuou ao longo desta década foram processos de redução do papel do Estado no sentido de assegurar esses direitos, de alienação de responsabilidades pela privatização directa ou indirecta e a mercantilização de serviços públicos, de reorganização das redes de equipamentos e serviços em termos que agravam ainda mais as desigualdades regionais. A escola pública, o posto de saúde, a maternidade, o tribunal ficam mais longe e mais caro. O interior do País fica mais discriminado e desertificado, a faixa litoral mais congestionada e subequipada, o País mais assimétrico. 
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A reconfiguração da Escola Pública torna mais desiguais as crianças e os jovens no que diz respeito à rede e aos custos, mas torna-as ainda mais desiguais perante a organização curricular, os programas de ensino, os conteúdos, as condições de funcionamento que encaminham para o insucesso as crianças e os jovens oriundos de meios social, económica e culturalmente mais marginalizados. 
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O desmantelamento dos direitos sociais, nomeadamente o direito à saúde e o direito à segurança social, avançou sob a capa da «sustentabilidade». Mas aquilo que é dito insustentável enquanto universal e público, torna-se um bom negócio quando passa a privado e acessível apenas aos que o podem pagar, porque o Estado assegura aos privados que se houver lucros são seus, mas se houver prejuízos o Estado pagará por eles. 
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A reconfiguração do Estado ao serviço do capital monopolista constitui uma longa narrativa, que passa por todo o processo de privatizações, nesta década sobretudo marcada pelas obscuras negociatas em torno do sector energético. Privatizações no interesse do grande capital mas também, no final da década, nacionalizações com o mesmo sentido, enterrando milhões provenientes do sector público da banca em socorro dos bancos afundados em resultado de operações que, em alguns casos, são simplesmente do foro criminal.
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O Estado não só vem transferindo para o sector privado o que é rentável, tanto no sector empresarial como nos serviços públicos. O Estado age também no sentido de que esses sectores se tornem ainda mais lucrativos e rentáveis, nomeadamente através das comissões ditas «reguladoras» para a fixação das tarifas e dos preços, dos benefícios fiscais, da tolerância face ao funcionamento em cartel, ao desinvestimento, à fraude e à evasão fiscal, de uma política laboral que incentiva o constante agravamento da exploração dos trabalhadores. Acompanhando e apoiando a financeirização da economia o Estado tornou-se peça fundamental no empolamento da especulação fundiária e imobiliária (à qual os grandes grupos financeiros estão intimamente associados), nomeadamente através dos processos de alienação do património imobiliário público sob a tutela de diferentes ministérios, do favorecimento de amplas operações ditas de reabilitação urbana nas quais a componente especulativa é central, como sucedeu em Lisboa com a Expo 98 e como sucede com várias das operações POLIS, ou com a escandalosa excepcionalidade atribuída aos processos PIN e PIN+.
O Estado não é neutro
As Forças Armadas que desempenharam um tão decisivo papel na Revolução de Abril existem hoje num quadro profundamente diferente, com efectivos profissionais e contratados, subordinadas a um conceito estratégico desprovido de efectivo compromisso patriótico e ligado ao povo, participando, contra a Constituição, em operações de agressão e ocupação imperialista no Kosovo, no Iraque, no Afeganistão. O papel do Estado não pode ser o mesmo numa democracia antimonopolista ou num regime em que o grande capital controla de forma cada vez mais determinante o poder político. O Estado não é neutro, e a sua intervenção ou é democrática, como instrumento de defesa e concretização dos direitos, aspirações e liberdades populares e dos trabalhadores, esmagadoramente maioritários, ou assume a defesa e concretização dos interesses do grande capital, dos exploradores, dos interesses infinitamente minoritários de todos aqueles cuja prosperidade reside na perpetuação das desigualdades, das injustiças, da hipoteca dos interesses nacionais, e, nesse caso, configura-se tendencialmente como um Estado antidemocrático.
Quando vemos hoje construir-se passo a passo um processo de governamentalização do aparelho da justiça, de centralização dos serviços de informações e das forças de segurança, de pressão e controle de toda a comunicação social, já de si tão controlada e desprovida de pluralismo, quando vemos uma política que justifica toda a sua iniciativa pela defesa dos grandes interesses económicos, ao mesmo tempo que conduz uma brutal ofensiva contra os direitos dos trabalhadores, quando vemos aprovar-se legislação que tem como único objectivo estrangular financeiramente o PCP e negar ao PCP o direito de se organizar de acordo com os seus estatutos e a vontade dos seus militantes, quando se sucedem os propósitos de alterar a legislação eleitoral em termos que visam distorcer radicalmente a expressão da vontade popular, este quadro já nada tem a ver com o Portugal de Abril, mas tem muito a ver com tudo contra o qual Abril se realizou.
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Dizem os nossos clássicos que o Estado surge, não em consequência das contradições internas numa dada sociedade, mas a partir do momento em que essas contradições se tornam irremediavelmente insanáveis.
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Se o Estado que a política de direita gera se coloca em confronto insanável com os interesses, direitos, aspirações e liberdades dos trabalhadores e do povo, a luta dos trabalhadores e do povo fará com que, cedo ou tarde, chegue a momento em que essa contradição será superada, numa radical ruptura que retome o caminho de Abril.
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Texto da intervenção de Filipe Diniz, em 6 de Fevereiro, no seminário organizado pelo PCP, «Dez anos de Política de Direita».
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http://odiario.info/?p=1493
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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Tus Pies por Pablo Neruda



Tus Pies

Cuando no puedo mirar tu cara
miro tus pies.

Tus pies de hueso arqueado,
tus pequeños pies duros.

Yo sé que te sostienen,
y que tu dulce peso sobre ellos se levanta.

Tu cintura y tus pechos,
la duplicada púrpura de tus pezones,
la caja de tus ojos que recién han volado,
tu ancha boca de fruta,
tu cabellera roja, pequeña torre mía.

Pero no amo tus pies
sino porque anduvieron sobre la tierra
y sobre el viento
y sobre el agua,
hasta que me encontraron.
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Teus Pés

Quando não te posso contemplar
Contemplo os teus pés.

Teus pés de osso arqueado,
Teus pequenos pés duros,

Eu sei que te sustentam
E que teu doce peso
Sobre eles se ergue.

Tua cintura e teus seios,
A duplicada purpura
Dos teus mamilos,
A caixa dos teus olhos
Que há pouco levantaram vôo,
A larga boca de fruta,
Tua rubra cabeleira,
Pequena torre minha.

Mas se amo os teus pés
É só porque andaram
Sobre a terra e sobre
O vento e sobre a água,
Até me encontrarem. 
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topomoroko123 | 29 de Agosto de 2009
não existe nenhuma descrição disponível
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familiaMariaRita | 11 de Novembro de 2008
Poema de Pablo Neruda, na voz da cantora brasileria Maria Rita
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Um poema de Jorge de Sena

o
Lurdes Martins
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Uma pequenina luz bruxuleante
não na distância brilhando no extremo da estrada
aqui no meio de nós e a multidão em volta
une toute petite lumière
just a little light
...una picolla... em todas as línguas do mundo
uma pequena luz bruxuleante
brilhando incerta mas brilhando
aqui no meio de nós
entre o bafo quente da multidão
a ventania dos cerros e a brisa dos mares
e o sopro azedo dos que a não vêem
só a adivinham e raivosamente assopram.
Uma pequena luz
que vacila exacta
que bruxuleia firme
que não ilumina apenas brilha.
Chamaram-lhe voz ouviram-na e é muda.
Muda como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Brilhando indeflectível.
Silenciosa não crepita
não consome não custa dinheiro.
Não é ela que custa dinheiro.
Não aquece também os que de frio se juntam.
Não ilumina também os rostos que se curvam.
Apenas brilha bruxuleia ondeia
indefectível próxima dourada.
Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha.
Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha.
Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha.
Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha.
Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não:
brilha.
Uma pequenina luz bruxuleante e muda
como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Apenas como elas.
Mas brilha.
Não na distância. Aqui
no meio de nós.
Brilha

Jorge de Sena
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há 2 horas · GostoNão gosto · 4 pessoas4 pessoas gostam disto.
o
Victor Nogueira Um descanso para a vista esta paisagem primaveril em tempo de outono :-)
há alguns segundos · 
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terça-feira, 26 de outubro de 2010

PEQUENOS MUNDOS E VELHAS CIVILIZAÇÕES (1937-38) - Ferreira de Castro

 

Sunday, October 24, 2010

errância - Andorra (1929), PEQUENOS MUNDOS E VELHAS CIVILIZAÇÕES (1937-38)

O encanto desta viagem à aventura, das poucas, se não a única, que a indústria do turismo ainda não destruiu na Europa, rompeu-se, uma noite, na redacção de La Dépêche, em Toulouse. Um dos redactores, que já tinha peregrinado pelos confins do Ariège, disse-me que, como eu supunha, Hospitalet, aldeiazita francesa sepultada nos Pirenéus orientais, dava acesso a Andorra. Não havia, porém, estradas... E, quanto ao passaporte, nenhum visto se exigia...

Ferreira de Castro, Pequenos Mundos e Velhas Civilizações, 5-ª edição, Lisboa, Guimarães & C.ª. 1955.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Comemorações do 5 de Outubro: Novos olhares sobre a I República

 
Número 157 · 20 de Outubro de 2010 · Suplemento do JL n.º 1045, ano XXX
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Uma «releitura da história da I República», nos planos cívico e académico, é «para já» o legado deixado pelas comemorações da implantação do regime republicano de governo em Portugal, de que se comemoram por estes dias os cem anos.
I RepúblicaA opinião é da professora universitária Maria Fernanda Rollo, vogal da Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário da República (CNCCR). «Essa dimensão do património histórico, da cultura histórica e da leitura da história da I República» tem sido uma das linhas de força das comemorações, em resultado da ação da CNCCR, segundo esta professora da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa que desempenha as funções de comissária executiva das comemorações. 
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«Há um fenómeno de descoberta deste património e desta história», sustenta. Maria Fernanda Rollo considera «inquestionável» o «contributo e o estímulo» que o centenário tem dado neste campo. «Os resultados estão a surgir todos os dias, com publicações novas em vários domínios», explica. Criada pelo governo em 2008, a CNCCR, presidida pelo antigo banqueiro Artur Santos Silva e integrada ainda pelo jornalista Sarsfield Cabral, pela docente universitária Raquel Henriques da Silva e pelo musicólogo Rui Vieira Nery, assumiu, segundo um texto relativo à sua missão, apresentado no seu sítio, que «uma das dimensões comemorativas» seria «necessariamente virada para o conhecimento do ideário republicano, dos valores que legitimaram o novo regime e dos acontecimentos e protagonistas da sua história», evitando, contudo, «uma visão passadista» e «contrapondo-lhe uma preocupação prospetiva». 
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Fernanda Rollo chama a atenção que «aquilo que se tem feito é à escala nacional». «São as leituras ao nível do local e do regional, com contribuições múltiplas por todo o país, é esta noção de comemorações participadas, com conteúdos próprios, que têm sido muito enriquecedoras», segundo diz.
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De tudo isto resulta, em seu entender, que se esteja «no caminho de tentar ultrapassar um conjunto de preconceitos complexos, que tem prevalecido na leitura da história da I República», «de alguma maneira sujeita a uma dicotomia de diabolização e sacralização», que «os anos e o conhecimento histórico permite matizar um pouco».
SERENAR LEITURAS DE VELHOS CONFLITOS
D. António de Sousa Barroso
Bispo do Porto, D. António de Sousa Barroso chega a Lisboa
para ser interrogado, 1911. Foto Anselmo Franco, Arquivo
Municipal de Lisboa
As comemorações vieram, assim, «serenar também algumas leituras». «Veja-se o que tem acontecido no campo da apreciação das relações entre a República e a Igreja», aponta. «Há hoje uma visão bastante mais serena, sem obviamente retirar a dimensão mais radical, e violenta até, da I República, no que respeita às relações com a Igreja. Mas, por outro lado, percebendo a dimensão mais positiva da laicização do Estado e, como dizia há pouco [o bispo auxiliar de Lisboa] D. Carlos Azevedo, para além de [o bispo do Porto] D. Manuel Clemente, acaba por ser favorável à própria Igreja». Entre as temáticas que a descoberta ou redescoberta de algumas fontes permitiu reavivar, durante as comemorações, está «a questão do reconhecimento internacional» da República, «quer num primeiro momento em que os revolucionários, ainda em preparação, decidem criar uma missão para enviar para o estrangeiro e, nomeadamente, para os países mais próximos de Portugal, a começar pela Grã-Bretanha, e pela França, para sondar as potências sobre a sua aceitação» quer mais tarde, quando tudo se intensifica, com «a questão da relação do Estado com as igrejas, as relações com o Vaticano, a questão da I Guerra, a proposta de entrarmos na I Guerra e a controvérsia que isso suscita».
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«É um mundo de imensa riqueza, como de resto o próprio Magalhães Lima [jornalista e escritor republicano], em Paris, conta e que tem uma história que ainda vale a pena conhecer e explorar, porque a documentação que existe sobre esses materiais é muitíssimo rica e ainda muito por explorar».
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No plano cívico, refere que a Comissão procurou suscitar ao nível das comemorações «o debate e a reflexão sobre os valores e os ideários da República, outrora, e a sua atualização, e uma reflexão sobre o presente e sobre o futuro». Fernanda Rollo destaca aqui o tratamento dado à questão da identidade nacional, feita através da própria história dos símbolos – a bandeira, A Portuguesa – «que têm agora sido divulgados de outra forma».


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http://www.instituto-camoes.pt/encarte-jl/comemoracoes-do-5-de-outubro-novos-olhares-sobre-a-i-republica.html
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