sexta-feira, 22 de novembro de 2013

o domingo na poesia segundo vários escritores - 17 - os bobos e truões - 02

22 de Novembro de 2013 às 18:23
* António Gomes Leal - A Senhora de Brabante
* António Gomes Leal - Aquela Orgia
* Cruz e Sousa - Soneto
` Marcus Machado - Truão
* ... - Coringa ou Joker
* Vinícius de Morais - Elegia, quase uma ode


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* António Gomes Leal

 A Senhora de Brabante

Tem um leque de plumas gloriosas,
na sua mão macia e cintilante,
de anéis de pedras finas preciosas
a Senhora Duquesa de Brabante.
N'uma cadeira d'espaldar dourado,
escuta os galanteios dos barões.
- É noite: e, sob o azul morno e calado,
concebem os jasmins e os corações.
Recorda o senhor Bispo acções passadas.
Falam damas de jóias e cetins.
Tratam barões de festas e caçadas
à moda goda: - aos toques dos clarins.
Mas a Duquesa é triste. - Oculta mágoa
vela seu rosto de um solene véu.
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
- Cantando, os rouxinóis lembram o céu...
Dizem as lendas que Satã vestido
de uma armadura feita de um brilhante,
ousou falar do seu amor florido
à Senhora Duquesa de Brabante.
Dizem que o ouviram ao luar nas águas,
mais louro do que o sol, marmóreo e lindo,
tirar de uma viola estranhas mágoas,
pelas noites que os cravos vêm abrindo...
Dizem mais, que na seda das varetas
do seu leque ducal de mil matizes...
Satã cantara as suas tranças pretas,
- e os seus olhos mais fundos que as raízes!
Mas a Duquesa é triste. - Oculta mágoa
vela seu rosto de um solene véu.
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
- Cantando, os rouxinóis lembram o céu...
O que é certo é que a pálida Senhora,
a transcendente Dama de Brabante,
tem um filho horroroso... e de quem cora
o pai, no escuro, passeando errante.
É um filho horroroso e jamais visto! -
Raquítico, enfezado, excepcional,
todo disforme, excêntrico, malquisto,
- pelos de fera, e uivos de animal!
Parece irmão dos cerdos ou dos ursos,
aborto e horror da brava Natureza...
- Em vão tentam barões, com mil discursos,
desenrugar a fronte da Duquesa.
Sempre a Duquesa é triste. - Oculta mágoa
vela seu rosto de um solene véu.
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
- Cantando, os rouxinóis lembram o céu...
Ora o monstro morreu. - Pelas arcadas
do palácio retinem festas, hinos.
Riem nobres, vilões, pelas estradas.
O próprio pai se ri, ouvindo os sinos...
Riem-se os monges pelo claustro antigo.
Riem vilões trigueiros das charruas.
Riem-se os padres, junto ao seu jazigo.
Riem-se nobres e peões nas ruas.
Riem aias, barões, erguendo os braços.
Riem, nos pátios, os truões também.
Passeia o duque, rindo, nos terraços.
- Só chora o monstro, em alto choro, a mãe!..
Só, sobre o esquife do disforme morto,
chora, sem trégua, a mísera mulher.
Chama os nomes mais ternos ao aborto...
- Mesmo assim feio, a triste mãe o quer!
Só ela chora pelo morto!.. A mágoa
lhe arranca gritos que ninguém mais deu!
- Ao luar, sobre os tanques chora a água...
- Cantando, os rouxinóis lembram o céu...


 - em Claridades do Sul de Gomes Leal, dedicado a Alberto Osório de Castro

Stańczyk, bobo polaco por Jan Matejko  - Stańczyk por Jan Matejko - O bobo é o único personagem preocupado com a notícia de que os russos  capturaram Smolensk, em 1514
Stańczyk, bobo polaco por Jan Matejko - Stańczyk por Jan Matejko - O bobo é o único personagem preocupado com a notícia de que os russos capturaram Smolensk, em 1514


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* António Gomes Leal

Aquella Orgia

Nós eramos uns dez ou onze convidados,
- Todos buscando o gozo e achando o abatimento,
E todos afinal vencidos e quebrados
No combate da Vida inutil e incruento.

Tocava o termo a ceia - e ia surgindo o alvor
Da madrugada vaga, etherea e crystallina,
A alguns trazendo a vida, e enchendo outros de horor,
Branca como uma flor de prata florentina.

Todos riam sem causa. - A estolida batalha
Da Materia e da Luz travara-se afinal,
E eram já côr de vinho os risos e a toalha,
- E arrojavam-se ao ar os copos de crystal.

Crusavam-se no ar ditos como facadas;
Escandalos de amor, historias sensuaes...
- Rolavam nos divans caindo, ás gargalhadas,
Sujos como truões, torpes como animaes.

Um agitando o ar com risos desmanchados,
Recitava canções, farças, Hamlet e Ophelia;
- Outro perdido o olhar, e os braços encruzados,
De bruços, n'um divan, roia uma camelia!

Outros fingindo a dôr, fallavam dos ausentes,
Das amantes, dos paes, com gritos d'afflicção,
- Um brandia um punhal, com ditos incoherentes;
- Outro sobre um sophá ladrava como um cão.

Era um delirio atroz de risos pelos ares!
- Ah! mas eu, que só quero a paz dos vegetaes,
Feliz! então feliz! matava os meus pesares
N'aquelle ocio imbecil da pedra e dos metaes!

Havia extinto em mim as ultimas scentelhas; -
Julgava achar-me só n'aquelle phrenesim,
Não sentia pungir as minhas magoas velhas,
Feliz! muito feliz! - ah! descansava emfim!

Repousava a final da pallida batalha,
Espalhava-se em mim o grande esquecimento;
Cuidava achar-me emfim cingido da mortalha,
Ou minhas cinzas já dispersas pelo vento.

Quando um d'elles então--n'uma ironia rude,
E erguendo-se de pé, na vasta confusão,
Com um rir bestial ergueu uma saude
- Áquella que tornou-me em cinza o coração!...

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- Ah! seu nome cruel, de subito lembrado,
De novo reabriu todas as minhas magoas!
E desfeito, de pé, senti-me transmudado,
Como um morto trazido á praia pelas aguas!

E como o morto errante ás luas silenciosas,
Ao vento, aos temporaes, ás algas das marés,
Trazendo inda a visão das noutes tempestuosas,
- Todos calou o horror da minha pallidez.

E em lagrimas bradei, então: - Ó Infelizes!
Imbecis! histriões! heroes do Soffrimento!
Como haveis de fechar as vossas cicatrizes,
- Se nem aqui deixaes matar o pensamento?!


António Gomes Leal, in 'Claridades do Sul' 
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* Cruz e Sousa

SONETO
Por ocasião da comemoração do sexagésimo primeiro aniversario natalício do ilustre pregador catarinense Joaquim Comes d'Oliveira Paiva.

Rompeu-se o denso véu do atroz marasmo
E como por fatal, negro hebetismo
De antro sepulcral, de fundo abismo
O povo ressurgiu com entusiasmo!
O Zoilo mazorral se queda pasmo
Supõe quimera ser, ser cataclismo
Roga, já por dobrez, por ceticismo
De néscio, vil truão solta o sarcasmo.
Perdão, Filho da Luz, minh'alma exora,
Porém, a pátria diz, somente agora
Os grilhões biparti de atroz moleza!

E ele, o nosso herói já redivivo
De pé, sem se curvar, sereno, altivo
Co'as raias do porvir mede a grandeza!


http://www.sinergia-spe.net/editoraeletronica/autor/025/02500300_2.htm
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* Marcos Machado

"TRUÃO"

Truão demissionário sou emissário do rei faço rir o hipócrita rirá também o idiota Se tenho imunidade ela é flha da maldade da corja que me sustenta O bobo da corte não é por motivo torpe que faz sua ladainha sua tarefa é eximir da culpa o adultério da rainha o desfalque do tesoureiro os crimes de todo o reino A graça deste palhaço vive hoje no asco que habita este palácio Enquanto riem deste anão há agora uma multidão, não percebe a Coroa que o cetro é majestade mas lá fora há tempestade e do medo o grito sôa: Liberdade! Liberdade! (Caos Markus)

http://critiqueacritica.blogspot.pt/2011_01_23_archive.html

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Coringa (português brasileiro) ou Joker (português europeu) (em inglês:Joker, literalmente "piadista") é um dos maiores vilões dos quadrinhos da editora norte-americana DC Comics, arqui-inimigo de Batman. Foi criado por Bill Finger e Bob Kane a partir de uma sugestão de Jerry Robinson, aparecendo pela primeira vez na revista Batman #1 (1940). Ele é um psicótico com uma aparência similar a um palhaço ou a de um curinga das cartas de baralho, de cabelos verdes, pele branca eboca vermelha sempre sorridente, que constantemente desafia o Homem-Morcego lhe provocando grandes traumas como deixar paralítica a Batgirl Barbara Gordon e matar o Robin Jason Todd, além da esposa do Comissário Gordon.

É um dos personagens mais famosos dos quadrinhos. São raros os vilões que conseguem popularidade como ele, sendo considerado por muitos como o mais célebre vilão das histórias em quadrinhos.


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* Vinícius de Morais

ELEGIA QUASE UMA ODE
Itatiaia-RJ , 1943

Meu sonho, eu te perdi; tornei-me em homem.

O verso que mergulha o fundo de minha alma
É simples e fatal, mas não traz carícia...
Lembra-me de ti, poesia criança, de ti
Que te suspendias para o poema como que para um seio no espaço.
Levavas em cada palavra a ânsia
De todo o sofrimento vivido.

Queria dizer coisas simples, bem simples
Que não ferissem teus ouvidos, minha mãe.
Queria falar em Deus, falar docemente em Deus
Para acalentar tua esperança, minha avó.
Queria tornar-me mendigo, ser miserável
Para participar de tua beleza, meu irmão.
Queria, meus amigos... queria, meus inimigos...
Queria...
                              queria tão exaltadamente, minha amiga!

Mas tu, Poesia
Tu desgraçadamente Poesia
Tu que me afogaste em desespero e me salvaste
E me afogaste de novo e de novo me salvaste e me trouxeste
À borda de abismos irreais em que me lançaste e que depois eram abismos verdadeiros
Onde vivia a infância corrompida de vermes, a loucura prenhe do Espírito Santo, e idéias em lágrimas, e castigos e redenções mumificados em sêmen cru
Tu!
Iluminaste, jovem dançarina, a lâmpada mais triste da memória…

Pobre de mim, tornei-me em homem.
De repente, como a árvore pequena
Que à estação das águas bebe a seiva do húmus farto
Estira o caule e dorme para despertar adulta
Assim, poeta, voltaste para sempre.

No entanto, era mais belo o tempo em que sonhavas...

Que sonho é minha vida?
A ti direi que és tu, Maria Aparecida!
A vós, no pudor de falar ante a vossa grandeza
Direi que é esquecer todos os sonhos, meus amigos.
Ao mundo, que ama a lenda dos destinos
Direi que é o meu caminho de poeta.
A mim mesmo, hei de chamá-lo inocência, amor, alegria, sofrimento, morte, serenidade
Hei de chamá-lo assim que sou fraco e mutável
E porque é preciso que eu não minta nunca para poder dormir.
Ah
Devesse eu jamais atender aos apelos do íntimo...

Teus braços longos, coruscantes; teus cabelos de oleosa cor; tuas mãos musicalíssimas; teus pés que levam a dança prisioneira; teu corpo grave de graça instantânea; o modo com que olhas o âmago da vida; a tua paz, angústia paciente; o teu desejo irrevelado; o grande, o infinito inútil poético! tudo isso seria um sonho a sonhar no teu seio que é tão pequeno...

Ó, quem me dera não sonhar mais nunca
Nada ter de tristezas nem saudades
Ser apenas Moraes sem ser Vinicius!
Ah, pudesse eu jamais, me levantando
Espiar a janela sem paisagem
O céu sem tempo e o tempo sem memória!
Que hei de fazer de mim que sofro tudo
Anjo e demônio, angústias e alegrias
Que peco contra mim e contra Deus!
Às vezes me parece que me olhando
Ele dirá, do seu celeste abrigo:
Fui cruel por demais com esse menino...
No entanto, que outro olhar de piedade
Curará neste mundo as minhas chagas?
Sou fraco e forte, venço a vida: breve
Perco tudo; breve, não posso mais...
Oh, natureza humana, que desgraça!
Se soubesses que força, que loucura
São todos os teus gestos de pureza
Contra uma carne tão alucinada!
Se soubesses o impulso que te impele
Nestas quatro paredes de minha alma
Nem sei o que seria deste pobre
Que te arrasta sem dar um só gemido!
É muito triste se sofrer tão moço
Sabendo que não há nenhum remédio
E se tendo que ver a cada instante
Que é assim mesmo, que mais tarde passa
Que sorrir é questão de paciência
E que a aventura é que governa a vida
Ó ideal misérrimo, te quero:
Sentir-me apenas homem e não poeta!

E escuto... Poeta! triste Poeta!
Não, foi certamente o vento da manhã nas araucárias
Foi o vento... sossega, meu coração; às vezes o vento parece falar...
E escuto... Poeta! pobre Poeta!
Acalma-te, tranqüilidade minha... é um passarinho, só pode ser um passarinho
Eu nem me importo... e se não for um passarinho, há tantos lamentos nesta terra...
E escuto... Poeta! sórdido Poeta!
Oh angústia! desta vez... não foi a voz da montanha? Não foi o eco distante
Da minha própria voz inocente?

Choro.
Choro atrozmente, como os homens choram.
As lágrimas correm milhões de léguas no meu rosto que o pranto faz gigantesco.
Ó lágrimas, sois como borboletas dolorosas
Volitais dos meus olhos para os caminhos esquecidos…
Meu pai, minha mãe, socorrei-me!
Poetas, socorrei-me!
Penso que daqui a um minuto estarei sofrendo
Estarei puro, renovado, criança, fazendo desenhos perdidos no ar…
Venham me aconselhar, filósofos, pensadores
Venham me dizer o que é a vida, o que é o conhecimento, o que quer dizer a memória
Escritores russos, alemães, franceses, ingleses, noruegueses
Venham me dar idéias como antigamente, sentimentos como antigamente
Venham me fazer sentir sábio como antigamente!
Hoje me sinto despojado de tudo que não seja música
Poderia assoviar a idéia da morte, fazer uma sonata de toda a tristeza humana
Poderia apanhar todo o pensamento da vida e enforcá-lo na ponta de uma clave de Fá!

Minha Nossa Senhora, dai-me paciência
Meu Santo Antônio, dai-me muita paciência
Meu São Francisco de Assis, dai-me muitíssima paciência!
Se volto os olhos tenho vertigens
Sinto desejos estranhos de mulher grávida
Quero o pedaço de céu que vi há três anos, atrás de uma colina que só eu sei
Quero o perfume que senti não me lembro quando e que era entre sândalo e carne de seio.
Tanto passado me alucina
Tanta saudade me aniquila
Nas tardes, nas manhãs, nas noites da serra.
Meu Deus, que peito grande que eu tenho
Que braços fortes que eu tenho, que ventre esguio que eu tenho!
Para que um peito tão grande
Para que uns braços tão fortes
Para que um ventre tão esguio
Se todo meu ser sofre da solidão que tenho
Na necessidade que tenho de mil carícias constantes da amiga?
Por que eu caminhando
Eu pensando, eu me multiplicando, eu vivendo
Por que eu nos sentimentos alheios
E eu nos meus próprios sentimentos
Por que eu animal livre pastando nos campos
E príncipe tocando o meu alaúde entre as damas do senhor rei meu pai
Por que eu truão nas minhas tragédias
E Amadis de Gaula nas tragédias alheias?

Basta!
Basta, ou dai-me paciência!
Tenho tido muita delicadeza inútil
Tenho me sacrificado muito demais, um mundo de mulheres em excesso tem me vendido
Quero um pouso
Me sinto repelente, impeço os inocentes de me tocarem
Vivo entre as águas torvas da minha imaginação
Anjos, tangei sinos
O anacoreta quer a sua amada
Quer a sua amada vestida de noiva
Quer levá-la para a neblina do seu amor...

Mendelssohn, toca a tua marchinha inocente
Sorriam pajens, operárias curiosas
O poeta vai passar soberbo
Ao seu abraço uma criança fantástica derrama os óleos santos das últimas lágrimas
Ah, não me afogueis em flores, poemas meus, voltai aos livros
Não quero glórias, pompas, adeus!
Solness, voa para a montanha, meu amigo
Começa a construir uma torre bem alta, bem alta..
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http://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/poesia/poesias-avulsas/elegia-quase-uma-ode 
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vem de o domingo na poesia segundo vários escritores - 16 - os bobos e truões - 01
https://www.facebook.com/notes/victor-nogueira/o-domingo-na-poesia-segundo-v%C3%A1rios-escritores-16-os-bobos-e-tru%C3%B5es-01/10151800820534436

continua em o domingo na poesia segundo vários escritores - 18 - os bobos e truões - 03
https://www.facebook.com/notes/victor-nogueira/o-domingo-na-poesia-segundo-v%C3%A1rios-escritores-18-os-bobos-e-tru%C3%B5es-03/10151812781524436





John Watson Nicol - The court jester

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Mary Browning - A jester joust

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Charles Cattermole - A-Court-Jester-With-A-Captive-Audience

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Costume-Design-For-A-Jester-For-A-Midsummer-Nights-Dream,-C.1881-93

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