quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

eugénia cunhal (1927 / 2015)




* Victor Nogueira


Eugénia Cunhal era  a irmã caçula de Álvaro, que lhe escrevia contos infantis e desenhos, e que surge neste seu poema:


Quando vieres 
Encontrarás tudo como quando partiste.
A mãe bordará a um canto da sala...
Apenas os cabelos mais brancos
E o olhar mais cansado.
O pai fumará o cigarro depois do jantar
E lerá o jornal.

Quando vieres
Só não encontrarás aquela menina de saias curtas
E cabelos entrançados
Que deixaste um dia.
Mas os meus filhos brincarão nos teus joelhos
Como se te tivessem sempre conhecido.

Quando vieres
Nenhum de nós dirá nada
Mas a mãe largará o bordado
O pai largará o jornal
As crianças os brinquedos
E abriremos para ti os nossos corações,

Pois quando tu vieres
Não és só tu que vens
É todo um mundo novo que despontará lá fora
Quando vieres.


Maria Eugénia Cunhal in "Silêncio de Vidro"Lisboa, 1962



Era uma pessoa com ar frágil e doce e nos seus poemas e crónicas há uma grande solidariedade e atenção pelos "ventres ao sol", assim designados por Fernão Lopes.

Em cada já 
Se nasce
Para ser

E só em cada já 
Se pode estar 

Foi 
Ou será 
Quem é 

Como no mar 
Onde a onda é um onde 
Contínua sucessão de jás 
Num só quebrar.

in "Histórias de m Condenado à Morte", 1983

BASTASTE TU

Bastou aquele gesto
Da tua mão tocar tão docemente a minha
Pra nascerem raízes
Que me prendem à terra e me alimentam
Nas horas mais vazias
Bastou aquele olhar
- O teu olhar tão brando, prolongando-se um pouco sobre o meu-
Para iluminar as noites em que a lua se esconde
E a escuridão envolve um mundo sem sentido.
Bastou esse teu jeito de sorrir,
Um sorriso em que vejo despontar a confiança
Na vida não vivida, nas emoções ainda não sentidas,
Nos passos que ressoam noutros passos
Bastaste tu.

In «Silêncio de Vidro», Editorial Escritor


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CRÓNICAS

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