D'ali e D'aqui

Textos e Obras Daqui e Dali, mais ou menos conhecidos ------ Nada do que é humano me é estranho (Terêncio)

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Homenagem a Adriano Correia de Oliveira


* F. Bruto da Costa


Homenagem a Adriano


O meu reencontro com Adriano


Adriano Correia de Oliveira foi um grande Amigo meu (e aliás, de muitíssimas outras pessoas).

Os seus olhos claros e húmidos, frequentemente rasos de água por algum motivo aparentemente fútil, eram um farol de bondade, de amizade, de humanismo.

Penso que era virtualmente impossível conhecê-lo e não se gostar dele imediata e instintivamente.

O Adriano foi um artista extraordinário, um compositor e intérprete de grande valor, hoje pouco divulgado, talvez porque era um Homem simples e pouco dado a aparições mediáticas.

Desde a sua morte que eu não conseguia tocar e cantar uma canção dele musicando um poema de Manuel Alegre que sempre me disse muito, a "Canção com Lágrimas".

Hoje consegui !

Clique aqui para ouvir "Canção com Lágrimas" em formato MP3.

Se depois disso o som não surgir, volte a clicar no "link" anterior com o botão direito do rato e escolha a opção

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"Guardar o ficheiro em disco", grave-o no disco e depois poderá abri-lo através do seu programa de leitura de Mp3 (o "Windows Media Player" lê estes ficheiros) - o ficheiro foi testado com o anti-vírus Norton 2.000, que o declarou isento de quaisquer problemas - aplique este modus faciendi a todos os restantes ficheiros Mp3 que se seguem.


Clique aqui para ouvir "Menina dos Olhos Tristes".

Clique aqui para ouvir "Tejo que levas as águas".

Clique aqui para ver/ouvir um trabalho de som e imagem sobre o Adriano, que intitulei
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"Saudades do Adriano e uma viola".

É esta a homenagem que te posso fazer, meu bom Adriano.


Eu canto para ti um mês de giestas
Um mês de morte e crescimento ó meu amigo
Como um cristal partindo-se plangente
No fundo da memória perturbada


Eu canto para ti um mês onde começa a mágoa
E um coração poisado sobre a tua ausência
Eu canto um mês com lágrimas e sol o grave mês
Em que os mortos amados batem à porta do poema

Porque tu me disseste quem em dera em Lisboa
Quem me dera em Maio depois morreste
Com Lisboa tão longe ó meu irmão tão breve
Que nunca mais acenderás no meu o teu cigarro


Eu canto para ti Lisboa à tua espera
Teu nome escrito com ternura sobre as águas
E o teu retrato em cada rua onde não passas
Trazendo no sorriso a flor do mês de Maio

Porque tu me disseste quem me dera em Maio
Porque te vi morrer eu canto para ti
Lisboa e o sol Lisboa com lágrimas
Lisboa a tua espera ó meu irmão tão breve
Eu canto para ti Lisboa à tua espera...

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in Homenagem a Adriano Correia de Oliveira


Outras páginas sobre Adriano Correia de Oliveira


Pesquisa na Net sobre Adriano Correia de Oliveira



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Victor Nogueira à(s) quarta-feira, outubro 31, 2007 Sem comentários:

Adriano Correia de Oliveira - Solidário sempre


* Óscar Lopes
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Adriano Correia de Oliveira nasce no Porto, em 1942.
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Os pais mudam-se para Avintes, para a Quinta das Porcas, na margem esquerda do Rio Douro, que será sempre para Adriano o centro do mundo de todos os lugares do mundo por onde andou.

Sempre que podia ia para a varanda da Quinta das Porcas ver o rio, nadar, remar pescar. Com ele os amigos, os muitos amigos de amizades que sabia construir como ninguém.
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Em Avintes, frequenta a escola primária e, com o liceu feito no Porto no inicio de cursar Direito em Coimbra, funda com outros jovens estudantes, a União Académica de Avintes que começou a ser muito conhecida pelas actividades culturais e desportivas.
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Adriano era muito activo na música. O conjunto musical da União Académica ensaiava na Quinta das Porcas. No desporto, era um excelente praticante de voleibol, mesmo falhando quase todos os treinos.
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Adriano, nunca deixou de tocar com esse grupo, mesmo quando já era nome conhecido na canção nacional que se estava a renovar.
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Em Coimbra, inicia os estudos universitários, inscreve-se na secção de voleibol da Académica e ocupa o lugar de primeiro tenor no Orfeão Académico de Coimbra. A sua voz impar distingue-se pelo timbre e pela clareza.
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À sua volta, Portugal está sob o peso da ditadura fascista, e a resistência democrática dá e sofre vários golpes. São as lutas estudantis contra o decreto-lei 40900, é o I Congresso Republicano, são as lutas camponesas e operárias.
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Adriano, sempre activo e solidário, opta pela via da resistência consequente. Em 1960 inscreve-se no Partido Comunista Português. Meses antes, uma dezena de presos políticos, entre os quais Álvaro Cunhal, evadira-se do Forte de Peniche.
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A sua intervenção cultural é cada vez mais activa. Faz teatro no CITAC, escreve para os Cadernos Culturais.
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Publica o primeiro disco com quatro fados de Coimbra.

Anos de brasa

1961/1962 são de anos de brasa. Há greves operárias e camponesas de norte a sul do país. O 1º de Maio de 62 é a maior comemoração de sempre, em Portugal, do Dia do Trabalhador. A União Indiana liberta e recupera Goa. Começa a Guerra Colonial. Há uma tentativa de assalto ao quartel de Beja. José Dias Coelho é assassinado pela Pide. Ocorre a espectacular fuga de Caxias.
Em Lisboa, na sequência da proibição, pelo governo fascista, da comemoração do Dia do Estudante, intensificam-se as lutas estudantis, dando inicio a uma prolongada greve que alastra às outras academias. Mais de 1500 estudantes são presos.
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Adriano, então a viver e a estudar em Lisboa, regressa a Coimbra e está presente em todas as lutas académicas. Não deixa de cantar, fazendo o canto participar na luta.
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Em 1963, Adriano está em Coimbra a viver na República Rás-te-Parta onde funcionará a sede da candidatura democrática às eleições da Associação Académica. Grava um disco emblemático: “Trova do Vento que Passa”, poema de Manuel Alegre e música de António Portugal.
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A Guerra Colonial alarga-se a outras colónias. Em 1964 Álvaro Cunhal escreve o Rumo à Vitória, que viria a ter uma importância determinante na intensificação da luta contra o fascismo e rumo ao 25 de Abril. O general Humberto Delgado é assassinado pela PIDE.
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Luandino Vieira, com o romance Luuanda, ganha o prémio da Sociedade Portuguesa de Autores que na sequência é assaltada e fechada pela Pide.
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Ainda não foi cantada em verso mas, para ele, Adriano, a canção já é uma arma.

Pela mão de Adriano

Entre 1966 e 1968, Adriano Correia de Oliveira volta para Lisboa. Casa, é incorporado na tropa, nasce uma filha, continua a cantar e a lutar politicamente num país sempre em sobressalto que subitamente, vê o ditador cair da cadeira e ficar inutilizado, sendo substituído por outro ditador que simula abrir uma janela enquanto verifica se as portas continuam todas trancadas.
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Adriano canta, solidário com todas as lutas dos estudantes e dos operários. Publica o disco Adriano Correia de Oliveira que é distinguido com o prémio Pozal Henriques, a maior distinção da música «ligeira» em Portugal.
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De 1969 a 1973 vivem-se anos históricos na canção de intervenção.
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São vários os discos então surgidos que irão marcar impressivamente a canção portuguesa. O primeiro disco LP é de Adriano: O Canto e as Armas.
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É pela mão de Adriano que muitos novos cantores e músicos surgem. Acontecimentos musicais determinantes para o futuro, todos com a marca de luta antifascista, sucedem-se. A televisão cobre em directo um espectáculo de fados e baladas de estudantes de Coimbra, a propósito da Queima das Fitas. De súbito uma voz admirável eleva-se para cantar a Trova do Amor Lusíada e Trova do Vento que Passa . É a voz de Adriano que, com a coragem que o acompanhou durante toda a vida, não deixa fugir a oportunidade de enfrentar o poder. É um escândalo. A emissão é interrompida. Em 1971, no Coliseu de Lisboa dá-se o I Primeiro Encontro da Canção Portuguesa. Participam Barata Moura, Vitorino, José Jorge Letria, Fausto, Manuel Freire, Zeca Afonso e Adriano. Um espectáculo memorável rigorosamente vigiado pela Pide, enquanto lá fora o fascismo não pára de apodrecer e abanar com as lutas que irrompem por todo o país.

A canção na rua

25 de Abril! A Revolução dos Cravos. A canção salta para a rua e Adriano está na primeira linha. É um dos fundadores no Colectivo de Acção Cultural, participa no I Festival da Canção Portuguesa no Coliseu dos Recreios e no I Festival da Canção Livre. Anda pelo país fora levando a mensagem do seu partido, o Partido Comunista Português, com a sua voz inconfundível. Vai aos lugares mais longínquos onde quase ninguém ousa ir. Grava o disco Que nunca mais que lhe vale o título de Artista do Ano da revista inglesa Music Week.
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Em 1976 pertence ao Comité Organizador da 1ª Festa do Avante! onde participará sempre com imenso empenho. Continua a cantar por todo o país sempre com grande sentido de militância e companheirismo. A sua presença física, a sua afabilidade e a sua voz impõem-se mesmo em situações complicadas, muitas vezes conseguindo ultrapassar tentativas de boicote. Finalmente consegue realizar um velho sonho profissional: ser um dos fundadores de uma cooperativa artística, Cantarabril, de onde sairá em violenta controvérsia para entrar noutro colectivo de artistas, a Era Nova, com muitos dos seus primeiros companheiros de andanças musicais.
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Adriano cantou até ao fim da sua vida. Cantou sempre com voz firme as belas canções com que travejava a sua actividade de artista empenhado nas lutas do povo a que pertencia. Assim foi até ao último dia da sua vida em 16 de Outubro de 1982.
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Em princípios de Setembro participou no Coliseu dos Recreios numa festa de solidariedade com os trabalhadores da Anop. No final do mesmo mês está em Mondim de Basto, a cantar numa escola, num encontro do Partido. Foi o seu último espectáculo.
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Adriano Correia de Oliveira viveu intensamente, com imenso amor pela vida, construindo inúmeras e sólidas amizades, sempre ao lado do seu povo, sempre com o seu Partido. Fez sempre imensos projectos. Muitos concretizou, como a sua obra musical bem o evidencia. Outros, como um disco de músicas infantis, um dicionário de música de intervenção, nunca chegou a concretizar: os anos breves que viveu roubaram-lhe o tempo necessário. Nunca desistiu de colocar em prática as suas ideias mesmo até ao dia em que, brutalmente, foi ceifado da vida e da actividade criadora.



Até à morte

Adriano esteve desde cedo e até à morte com aqueles para quem a liberdade se concretiza em metas como a abolição da exploração pela mais-valia, a libertação da terra latifundiária, a realização pragmática, e até constitucional, das melhores virtualidades humanas, individuais e colectivas, e como autêntica autodeterminação nacional, na economia e na cultura. (…)
Encontramos a mais íntima associação entre o amor, o companheirismo caloroso, a devoção pátria e a solidariedade com o povo explorado, a solidariedade com a mó de baixo, que é sempre a mais consequente denúncia em qualquer processo histórico.


Óscar Lopes
in Avante 2007.10.11




ver também:
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Adriano Correia de Oliveira letras - Letras de Músicas
Victor Nogueira à(s) quarta-feira, outubro 31, 2007 Sem comentários:

Adriano - A Voz da Luta e da Fraternidade


* Urbano Tavares Rodrigues
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Foi através de José Manuel Tengarrinha que conheci o Adriano Correia de Oliveira. Vinham às vezes passar o serão a minha casa e ambos cantavam. Eram memórias da resistência italiana, trovas heróicas e também burlescas dos milicianos do 5.º regimento na guerra civil de Espanha, e também canções do Zeca Afonso e do próprio Adriano.

Não me recordo já exactamente de quando lhe propus escrever duas canções de combate, as lutas populares no Alentejo tinham crescido após a campanha pseudo eleitoral de 1969 e apareciam grupos de acção directa, sobretudo a ARA (Acção Revolucionária Armada), e as Brigadas Revolucionárias.
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A Margem Sul tinha lá tudo: o direito dos trabalhadores rurais e camponeses à posse da terra, a rejeição das guerras coloniais em África, a miséria, a evocação de Catarina Eufémia e finalmente a alusão à «foice dos teus ceifeiros como bandeira sonhada».
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Mais lírica e cifrada, a Canção Patuleia ou Canção do Soldado, aponta no mesmo sentido de luta e conquista da igualdade.
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Depois do 25 de Abril acompanhei algumas vezes o Adriano em especial ao Alentejo e até por vezes o solicitei (levei-o por exemplo à minha Faculdade de Letras, onde teve um êxito assombroso) e, embora ele colhesse o seu reportório fundamental na Praça da Canção e em O Canto e Armas, admiráveis textos poéticos de denúncia do fascismo e da guerra, uma vez ou outra lá vinha a Margem Sul, quase esquecida.
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Era infinita a disponibilidade do Adriano para acudir ao chamamento de fábricas e empresas nacionalizadas ou de colectividades populares, de organizações do PCP.
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Militante da liberdade e da esperança, com o seu sorriso cândido, a sua estatura imponente, levava a alegria aos lábios das moças e a força de ânimo a quantos recebiam a sua mensagem de combate, cheia de sol.
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Parecia às vezes um herói grego, desses que enfrentavam monstros e prodígios.
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Não o travou a recuperação capitalista, não se cansou de remar contra a corrente.
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Já nessa fase víamo-nos menos. Eram grandes abraços e ia cada qual às suas tarefas.
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Pouco conhecia a Matilde. Eram os Sucenas, o José e o Paulo seus amigos de sempre, que me davam notícias do Adriano e, mais tarde, do seu doloroso final.
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O tempo apaga as memórias, mas hei de rever sempre a chama do Adriano, frente ao público que se lhe rendia, ouvir o cristal da sua voz, em cuja limpidez nascia a fraternidade.
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in Avante 2007.10.11
Victor Nogueira à(s) quarta-feira, outubro 31, 2007 Sem comentários:

Memória de Adriano


* Ary dos Santos
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Nas tuas mãos tomaste uma guitarra
Copo de vinho de alegria sã
Sangria de suor e cigarra
Que à noite canta a festa da manhã

Foste sempre o cantar que não se agarra
O que à Terra chamou amante e irmã
Mas também o português que investe a marra
Voz de alaúde e rosto de maçã

O teu coração de ouro veio do Douro
num barco de vindimas e cantigas
tão generoso como a liberdade.

Resta de ti a ilha de um Tesouro
A jóia com as pedras mais antigas.
Não é saudade, não! É amizade.


José Carlos Ary dos Santos

in Avante 2007.10,11

Victor Nogueira à(s) quarta-feira, outubro 31, 2007 Sem comentários:

Eça - Vida e Obra





Eça de Queirós


1845 - 1900

José Maria Eça de Queirós nasceu na Póvoa de Varzim, a 25 de Novembro de 1845, filho de José Maria Teixeira de Queirós, magistrado judicial, e Carolina Augusta Pereira d'Eça, natural de Viana do Castelo. Por se tratar de uma ligação amorosa irregular, o pequeno José Maria foi registado como filho de "mãe incógnita".



Passou parte da infância longe dos pais, que só viriam a casar quando ele já tinha quatro anos. Na verdade passou a maior parte da sua vida como filho ilegítimo, pois só foi reconhecido aos quarenta anos de idade, na ocasião em que casou. Até 1851 foi criado por uma ama em Vila do Conde; depois foi entregue aos cuidados dos avós paternos que viviam perto de Aveiro, em Verdemilho.



Por volta dos dez anos foi internado no Colégio da Lapa, no Porto, onde o pai era juiz. Ramalho Ortigão era filho do director e chegou a ensinar Francês ao jovem Eça.




Em 1861 matriculou-se em Coimbra, no curso de Direito, que concluiu em 1866. Foi aí que conheceu Antero de Quental e Teófilo Braga mas não se envolveu na polémica conhecida por Questão Coimbrã (1865-66), que opôs os jovens estudantes a alguns dos mais conhecidos representantes da segunda geração romântica.


Bibliografia:

O Mistério da Estrada de Sintra (1870)

O Crime do Padre Amaro (1875); versão definitiva em 1880

O Primo Basílio (1878)

O Mandarim (1880)

A Relíquia (1887)

Os Maias (1888)

Uma Campanha Alegre (1890-91)

A Ilustre Casa de Ramires (1900)

A Correspondência de Fradique Mendes (1900)

A Cidade e as Serras (1901)

Contos (1902)

Prosas Bárbaras (1903)

Cartas de Inglaterra (1905)

Ecos de Paris (1905)

Cartas Familiares (1907)

Bilhetes de Paris (1907)

Notas Contemporâneas (1909)

Últimas Páginas (1912)

A Capital (1925)

O Conde de Abranhos (1925)

Alves e C.ª (1925)

Correspondência (1925)

O Egipto (1926)

Cartas Inéditas de Fradique Mendes (1929)

Páginas Esquecidas (1929)

Eça de Queirós entre os seus - Cartas íntimas (1949)

Folhas Soltas (1966)

A Tragédia da Rua das Flores (1980)

Dicionário de Milagres

Lendas de Santos

Edições críticas:

A Capital (1992)

O Mandarim (1993)

Alves e C.ª (1994)

Textos de Imprensa VI (1995)


Segundo o seu próprio testemunho, nesta fase leu os autores franceses que, na época, entusiasmavam a juventude letrada em Portugal. Em Coimbra, cruzavam-se a tendência romântica e as novas ideias de raiz positivista e ambas contribuíram para a formação intelectual de Eça e dos seus companheiros.




Após a formatura, chegou a estabelecer-se como advogado em Lisboa, mas rapidamente desistiu dessa carreira, que lhe parecia pouco promissora.




Em 1867 fundou e redigiu integralmente, durante perto de meio ano, o jornal "O Distrito de Évora", com o qual fez oposição política ao governo. Meses depois instalou-se em Lisboa, passando a colaborar com maior regularidade na "Gazeta de Portugal", para a qual começara a escrever no ano anterior. Os textos desta época,publicados posteriormente com o título Prosas Bárbaras, reflectem ainda uma acentuada influência romântica.




Em 1869 fez uma viagem ao Egipto e Palestina, tendo na ocasião assistido à inauguração do canal de Suez. Acompanhava-o o conde de Resende, com cuja irmã, Emília de Castro Pamplona, viria a casar em 1886. As impressões dessa viagem ficaram registadas nos textos que integram o livro O Egipto e forneceram o ambiente para o romance A Relíquia.




Ainda em 1869, de parceria com Antero de Quental e Batalha Reis, cria a figura de Carlos Fradique Mendes, que mais tarde transformaria numa espécie de alter-ego.




Em 1870 escreveu de parceria com Ramalho Ortigão uma série de folhetins a que deram o nome de O Mistério da Estrada de Sintra. A colaboração entre os dois continuou no ano seguinte com uma publicação de crítica política e social - "As Farpas". Os textos de Eça de Queirós viriam a ser publicados em livro com o título Uma Campanha Alegre.




Durante a sua estada em Lisboa reencontrou Antero de Quental e outros jovens intelectuais e juntos formaram o grupo do Cenáculo, de onde partiu a ideia das Conferências do Casino. O próprio Eça pronunciou uma das palestras, em 12/6/1871, sobre "O Realismo como nova expressão de arte".




Em 1870 havia sido nomeado administrador do concelho de Leiria. Essa curta estadia forneceu-lhe o material para imaginar o ambiente provinciano e devoto em que decorre a acção de O Crime do Padre Amaro.




Entretanto ingressou na carreira diplomática, tendo sido nomeado cônsul em Havana (Cuba, na altura colónia espanhola), em 1872. Durante a sua estada procurou melhorar a situação dos emigrantes chineses, oriundos de Macau, colocados numa quase escravidão. Durante esse período, fez uma longa viagem pelos Estados Unidos e Canadá. Foi nesta fase que redigiu o conto Singularidades de uma rapariga loura e a primeira versão de O Crime do Padre Amaro.




Em Dezembro de 1874 foi transferido para Newcastle, onde escreveu O Primo Basílio, e mais tarde para Bristol (1878). Dez anos depois (1888) foi colocado em Paris, onde permaneceu até à sua morte.




Na sequência das Conferências do Casino, em 1877 Eça projectou uma série de novelas com que faria uma análise crítica da sociedade portuguesa do seu tempo, com a designação genérica de "Cenas Portuguesas". Mesmo sem obedecer com rigor a esse projecto, muitos dos romances escritos por Eça até ao fim da sua vida nasceram dele: O Crime do Padre Amaro, O Primo Basílio, A Capital, Os Maias, O Conde de Abranhos e Alves e C.a.




Entre 1889 e 1892 dirige a "Revista de Portugal". Ao longo dos anos colaborou em muitas outras publicações, tendo esses textos sido publicados postumamente.




Pouco depois da publicação de Os Maias, que não obteve o sucesso que o autor esperava, nota-se na produção romanesca de Eça de Queirós uma significativa inflexão. Essas últimas obras (A Ilustre Casa de Ramires, A Cidade e as Serras e Contos) manifestam um certo desencanto face ao mundo moderno e um vago desejo de retorno às origens, à simplicidade da vida rural.


Eça de Queirós morreu em Paris, a 16 de Agosto de 1900.

Obras consultadas:

Breve História da Literatura Portuguesa, Texto Editora, Lisboa, 1999

Lexicoteca, Círculo de Leitores, vol. 15, 1987


Ligações externas:

Projecto Vercial

Biblioteca Nacional

Vida e Obra - Nexus

Cultur@ - Eça

Os Maias

Instituto Camões

Crime do Padre Amaro

O Primo Basílio

Ilustre Casa Ramires

Vidas lusófonas

Brasil - Eça

Fund. Eça de Queirós

Malha Atlântica



© APRENDER PORTUGUÊS • ABRIL 2000
in Aprender Português
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Victor Nogueira à(s) quarta-feira, outubro 31, 2007 Sem comentários:

terça-feira, 30 de outubro de 2007

Homenagem a Óscar Lopes (2)

Homenagem a Óscar Lopes

- intervenção de Jerónimo de Sousa na sessão comemorativa dos seus 90 anos


Posted by joaovalenteaguiar Outubro 14, 2007 in As vinhas da Ira



Permitam-me que, neste quadro de “homenagem nos 90 anos de Óscar Lopes repartida por vários lugares do Porto e Matosinhos”, saúde com apreço o empenhamento da Cooperativa Árvore e da sua Direcção e a sua contribuição para o êxito desta dignificante iniciativa.


Reconheça-se a dificuldade no construir e dizer desta intervenção que visa homenagear um homem integral, num quadro em que quase todas as palavras certas já foram ditas por quem com ele privou, aprendeu e cultivou amizades.

A sua dimensão de professor, mestre, do protagonismo na intervenção cultural, o autor, investigador ensaísta, historiador e linguista, por si só não é comportável nem acomodável nos limites de um discurso. E muito menos o é se quisermos expressar a sua dimensão cívica e política, as suas opções ideológicas. Talvez por razões de origem, tenho uma profunda admiração por todos aqueles e aquelas intelectuais que foram capazes, ao arrepio da ordem natural das coisas estabelecidas, ter não só solidariedade e simpatia por causas sociais, mas assumirem – como Óscar Lopes assumiu – as causas e o projecto de transformação social e de emancipação do ser humano.

E assumi-lo em tempos difíceis quando numa época histórica se espalhava o manto de sombras em Portugal e na Europa onde tudo o que era avanço civilizacional estava em causa.

Não deixa de ter significado a influência e o impacto que teve na consciência social do então jovem estudante o testemunho da vida e da miséria dos pescadores de Matosinhos e das suas famílias e do dramático confronto com a pobreza extrema, a mendicidade e a mortalidade infantil, consciência social em evolução face a uma série de acontecimentos históricos como o falhanço das formas de liberalismo económico e político, mais económico que político, decorrente da crise mundial em 1929 e posteriormente o arrasador avanço do fascismo na Europa e o tremendo efeito da derrota das forças democráticas em Espanha. A avaliação de quem resistia e lutava no plano nacional e internacional levou Óscar Lopes a tomar opções políticas e ideológicas integrando as fileiras do Partido Comunista Português. Poder-se-á dizer-se que seria restritivo fazer o enfoque desta opção e dimensão do camarada Óscar Lopes, do homem integral que aqui homenageamos!

Os domínios do saber ímpar em toda a actividade ensaística, literária, cultural, a sua capacidade científica na linguagem e ensino da língua, onde reflectia a teoria marxista e a sua concepção da luta de classes como motor da história, não dispensou antes convocou outros contributos científicos e metodológicos vindos de diversas áreas de saber em particular nos domínios da historiografia e da crítica literária.

Mas nesta visão ampla do intelectual, do cientista não se pode emparcelar ou muito menos ensombrar o carácter marcante das suas opções ideológicas e consequentemente a sua acção como comunista e revolucionário.

O que poderia ter sido um vida sem sobressaltos transformou-se num percurso fascinante, mas por vezes doloroso já que o fascismo nunca lhe perdoou as opções políticas, a sua coragem, a sua firmeza e resistência. Não lhe perdoou (a ele e a outros intelectuais) usar os seus saberes e prestígio como uma arma carregada de futuro e contribuição emancipadora para que um dia a liberdade e a democracia fosse conquistadas.

Na dinamização cultural e cívica desta cidade, particularmente entre os anos 50 e 70, nas suas palestras e intervenções, na co-organização de eventos culturais vigiados e reprimidos pela polícia política, nas presidenciais de 1951 com a candidatura de Rui Luis Gomes e nas legislativas de 53, Óscar Lopes marcou presença e participação.

E é neste quadro de acção, em anos em que a luta se agudizou, que Óscar Lopes é demitido do seu lugar de professor e encarcerado durante um ano. Tocante foi a acção dos jovens estudantes que elaborando uma exposição a enviaram ao tribunal encarregado do julgamento. Como recordava o Avante! em 1956 “belo exemplo dos jovens estudantes que após 30 anos de obscurantismo não se deixam enganar e sabem valentemente alinhar ao lado do mestre amigo que defende a Paz e quer um Portugal livre, pacífico e independente”.

Apesar de absolvido, as forças repressivas, proibiram-no até de usar o nome em artigos de sua autoria. Readmitido em 1957, continua a sofrer tremendas pressões das autoridades educativas, impedindo-o de leccionar Literatura, História e Filosofia. É impedido de sair do país para não apresentar os seus trabalhos de investigação e proibido de participar em júris internacionais de literatura para os quais era convidado.

O fascismo, na sua obstinação mais do que a sua inteligência, receava as suas opções. Quando tudo parecia convidá-lo a desanimar e a desistir da sua luta, ele prosseguiu tendo sempre a seu lado Maria Helena, companheira de toda a vida.

Na campanha de Humberto Delgado, integrando a Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos, e na Comissão Nacional do II Congresso de Oposição Democrática de Aveiro em 1972, esteve sempre na primeira linha de combate pela democracia.

E, quando Abril aconteceu, quando a democracia resgatou e colocou Óscar Lopes no quadro de honra dos homens que lutaram uma vida toda pela liberdade, pela justiça social, pela cultura, pela paz, passou de resistente a construtor, dando o seu melhor para salvaguardar a dignidade da instituição universitária, terminando a sua carreira docente como Vice-Reitor da Universidade do Porto e recebendo, entre outras homenagens, o grau de Doutor Honoris Causa pela Universidade Clássica de Lisboa.

Continuou como militante do Partido integrando o seu Comité Central em 1976.

Álvaro Cunhal, numa síntese admirável, afirmou:

“Porque está ante nós um homem que, tendo ao longo dos anos ensinado tanto, teve a superior virtude dos que muito sabem: não só ensinar mas aprender. Com o estudo, com a vida, com a experiência. Inserindo desde jovem a sua (…) sua acção como cidadão, na vida e na luta dos trabalhadores, do povo, da heróica resistência antifascista, do colectivo dos seus camaradas e do seu Partido.

Assim na luta pela liberdade (…). Assim na revolução de Abril. Assim na instauração, na institucionalização e na defesa da democracia até aos dias de hoje. Procurando respostas novas para os novos fenómenos e situações. Certificando dia-a-dia a opção política de há mais de meio século e a sua convicção comunista sempre confirmada e afirmada com a simplicidade e a coragem de um homem senhor dos seus direitos e da vontade própria.

E toda essa vida notável, em si mesma, se torna ainda mais notável porque Óscar Lopes a soube e sabe viver com a serenidade e a simplicidade que dão a sabedoria e a modéstia”.

Passados 11 anos desta declaração, Álvaro Cunhal se estivesse entre nós reafirmaria o que disse então.

Eis uma forma excelente de terminar esta intervenção.

Mas, ainda assim, talvez por razões de origem e de opção política e ideológica, uma palavra final que reflecte um sentir imenso de admiração e gratidão. A comunidade científica e intelectual deve muito a Óscar Lopes. Mais lhe devem os trabalhadores e o povo, tal como o seu Partido de sempre.

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Uma Resposta to “Homenagem a Óscar Lopes - intervenção de Jerónimo de Sousa na sessão comemorativa dos seus 90 anos”

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  1. GR Diz:

    Outubro 15, 2007 at 10:40 pm

    Tanto se disse naquele fim de tarde. Porém, Jerónimo de Sousa, foi o que mais me(nos) comoveu. Num discurso firme, Jerónimo colocou nas palavras todo o sentimento, orgulho e respeito, ao falar do seu/nosso camarada Óscar Lopes e com a naturalidade que já lhe é peculiar, sorriu timidamente para quem o ouvia, de voz embargada termina:”…A comunidade científica e intelectual deve muito a Óscar Lopes. Mais lhe devem os trabalhadores e o povo, tal como o seu Partido de sempre.”

    Palavras sentidas! A sala vibrou!

    Todos estiveram presentes! Todos! menos a comunicação social, alguns jornais e nenhuma televisão, quase ao terminar apareceu a rtp tentando saber o que pensava o Secretário-geral do PCP, sobre o discurso de Filipe Meneses.

    Mais uma vez a censura sonegou a grandeza do discurso do professor António Gomes/escritor João Pedro Mésseder, de Jerónimo de Sousa, professor Nuno Grande, entre outros.

Victor Nogueira à(s) terça-feira, outubro 30, 2007 1 comentário:

Homenagem a Óscar Lopes (1)


* Secretariado do PCP
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Por ocasião da passagem do 90.º aniversário de Óscar Lopes, o Secretariado do Comité Central do PCP homenageou, na segunda-feira, esta grande figura de intelectual e «infatigável combatente da liberdade», através de um comunicado (que a seguir se transcreve) e associando-se à homenagem que lhe é promovida pela Cooperativa Árvore, no próximo domingo.

«O camarada Óscar Lopes completou em 2 de Outubro 90 anos de vida.
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A sua vida e a sua obra não são apenas uma referência particularmente marcante da cultura portuguesa mas um nobre exemplo de intelectual profundamente empenhado nas causas da emancipação humana, de liberdade, sempre solidário com as lutas dos trabalhadores contra a exploração e pela justiça social.
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Nasceu em Leça da Palmeira, Matosinhos, licenciou-se na Faculdade de Letras de Lisboa e, logo a seguir, foi impedido pelo fascismo de leccionar na Universidade. Exerceu, desde então, funções docentes em escolas secundárias do Porto, tendo-se notabilizado, entre gerações de estudantes, pela qualidade das suas aulas, bem como pelas experiências pedagógicas que dirigiu, designadamente no campo da Semântica Formal.
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Após a revolução do 25 de Abril, para cujo triunfo deu activa contribuição, um grande movimento de alunos e professores elegeu-o Presidente do Conselho Directivo da Faculdade de Letras do Porto, assim se reparando uma clamorosa injustiça.
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Ao longo da sua vida, participou num sem número de debates e colóquios, no País e no estrangeiro, dirigiu cursos, e teve colaboração assídua em revistas e publicações culturais como a “Vértice” e a “Seara Nova”.
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Durante largos períodos, foi proibido de assinar textos em jornais e revistas, tendo recorrido a diversos pseudónimos.
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Autor de uma vasta obra literária, no campo da crítica, do Ensaio, da História da Literatura, dos estudos Linguísticos, veio a receber, em 2000, o Prémio Vida Literária, da Associação Portuguesa de Escritores.
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Foi Presidente da Associação Portuguesa de Escritores, fundador da Universidade Popular do Porto e dirigente da Associação de Jornalistas e Homens de Letras, entre outras associações.
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É Cidadão Emérito de Matosinhos. Foi distinguido, em Dezembro de 1988, com a Grã-Cruz da Ordem da Instrução Pública e, em 2006, com a Ordem da Liberdade.
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Infatigável combatente da Liberdade, Óscar Lopes desenvolveu desde 1942 uma intensa actividade tendo participado nas grandes batalhas democráticas sob o fascismo. Pertenceu ao MUNAF, ao MUD, ao MND, à CDE, ao movimento dos Partidários da Paz e outros movimentos progressistas.
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Militante do Partido Comunista Português desde 1945, foi preso duas vezes pela PIDE e esteve durante um longo período proibido de sair do país. Após o 25 de Abril integrou listas eleitorais apoiadas pelo PCP tendo sido candidato à Assembleia Constituinte. Foi membro do Comité Central do PCP durante vinte anos, entre 1976 e 1996.
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Professor, investigador, escritor, activista cultural, resistente anti-fascista, obreiro da democracia, o camarada Óscar Lopes está a ser alvo de várias iniciativas de homenagem, promovidas por diferentes entidades, sejam debates sobre a sua personalidade e a sua obra, iniciativas editoriais, e outros actos públicos.
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O PCP, o seu partido de sempre, associa-se a esta justa homenagem. O camarada Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP, intervirá na sessão de encerramento do ciclo de iniciativas “A Busca do Sentido na Vida e na Obra de Óscar Lopes”, promovida pela Cooperativa Árvore, que se realiza na Biblioteca Almeida Garrett, Porto, no domingo, dia 14 de Outubro, pelas 16h30m.
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O PCP saúda Óscar Lopes no seu 90º aniversário pela sua vida, pela sua obra na educação, na cultura, na vida cívica, e pela sua militância de comunista, infatigável, lúcida, corajosa, exemplar.»
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in Avante Nº 1767 11.Outubro.2007
Victor Nogueira à(s) terça-feira, outubro 30, 2007 1 comentário:

Violação dos Direitos humanos - um livro e uma relação não exaustiva


Human Rights : Human Wrongs/M.S. Gill.
New Delhi, Sarup and Sons,
2004, viii, 271 p., $54. ISBN 81-7625-502-5.
Contents:

I. Human rights:

1. Socrates's dialectic (429 B.C.) foundations of the movement of human rights.

2. United Nations universal declaration of human rights (1948).

II. Crimes against humanity:

3. Genocide, aggression and enslavement of humanity.

4. Slaughter in Indian ocean by the Portuguese with fire and sword.

5. Jallianwalabagh Massacre--an unpardonable British colonial crime--April 13, 1919.

6. The Massacre in the Island of Mauritius.

7. Greed for rubber-- the cause of human rights violation in Malaysia.

8. Slaughter in Indonesia.

9. Blood bath for 'liquid gold' (OIL) in the middle east.

10. Massacre in the Yemen-1964.

11. Massacres in Lebanon-600 B.C. 1978 A.D.

12. Massacre in Manama (Maherin)--1965.

13. Mass Massacre in the republic of Tunesia 1978.

14. Setif and Guelma Massacre in Algeria--1945.

15. British Massacre in Nataal in 1906.

16. Apartheid and slaughter of students at Soweto in South Africa.

17. Massacres in Rhodesia (Zimbabwe).

18. Murder of human rights by white racists in Rhodesia (Zimbabwe).

19. Portuguese crimes in Mozambique.

20. Carnage at Pidjiguiti (Guinea-Bissan and Cape Verde).

21. Massacres in Angola.

22. Tragedy at Sao Tome and Principe.

23. Massacre in Ghana (Gold Coast).

24. Maji-Maji Massacre by German fascists in Tanzania.

25. Colonial Massacres in Namibia.

26. The tragedy in Nigeria.

27. Monstrous murders in Kenya.

28. French colonial Massacre in Bengui (Central African Republic).

29. French colonial Massacre in Djibouti.

30. Massacres of masses and plunder of wealth in Congo (Zaire).

31. Belgain bloodshed in Rwanda.

32. Fascist holocaust in Ethiopia.

33. Inhuman carnage in Madagascar.

34. Spanish Massacre in the temple in Gulf of Mexico.

35. Dreadful decimation of population in Jamaica.

36. Tragedy perpetrated in Grenada by colonialists.

37. Extermination of native population in Santa Lucia by French and British colonialists.

38. Saint Bartholomew's day Massacre of protestants by Catholic fundamentalists of Jesuit order on August 24, 1572.

39. Death camps of German fascists.

40. Horrific slaughter of peasants after the great Peasant War in Germany.

III. Human Rights Violations in American States:

41. West Europeans forcibly occupy the land of Red Indians.

42. Prominent Anti--slavery crusaders' fights against slavery and racial discrimination.

43. Racial discrimination persists in United States even today.

IV. International conflicts and human rights:

44. Gulf War in Iraq (2003).

45. Plunder of 'Liquid Gold' (DIL) by Anglo-American multinational companies starts.

46. Horrific destruction of human heritage.

V. Right to life, liberty and dignity:

47. Torture--criminal violation of human rights. 48. Plantation of landmines--worst violation of human rights.

49. Environmental pollution and human rights.

VI. Rights of women and children and crimes against them:

50. Women's movements for equality of rights.

Index.

"With the theme: "The right of life is a non-negotiable right to live with dignity, happiness and prosperity and not a mere right to exist in misery", the author has dedicated the book to the movement of human rights. Precisely and concisely, he recounts moving episodes of violation of human rights resulting in enslavement and genocide of millions of human beings, particularly, during the colonial period. The author has chronicled the various stages of struggle for human rights resulting in eventual universal declaration of human rights, ratified and enshrined by various countries in their respective constitutions.


With intensive research and extensive study he has devoted considerable part of the book to the various topics, particularly human rights and international conflicts, environmental pollution, degrading poverty in the 'Third World', women's movement for equality of rights, child labour, alarming decline in girl population, after the end of colonial era." (jacket)

Return to Law Catalogue


in Vedams Books

Victor Nogueira à(s) terça-feira, outubro 30, 2007 Sem comentários:

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Eça de Queiroz e Páginas de jornalismo (1)


PÁGINAS DE JORNALISMO - O Distrito de Évora

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IV - CRÓNICAS
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Nº 1, 6 de Janeiro
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A crónica e como que a conversa íntima, indolente, desleixada, do jornal com os que o lêem: conta mil coisas, sem sistema, sem nexo; espalha-se livremente pela natureza, pela vida, pela literatura, pela cidade; fala das festas, dos bailes, dos teatros, das modas, dos enfeites, fala em tudo, baixinho, como se faz ao serão, ao braseiro, ou ainda de veräo, no campo, quando o ar está triste. Ela sabe anedotas, segredos, histórias de arnores, crimes terriveis; espreita porque não lhe fica mal espreitar. Olha para tudo, umas vezes melancolicamente, como faz a lua, outras vezes alegre e robustamente, como faz o sol; a crónica tem uma doidice jovial, tem um estouvamento delicioso: confunde tudo, tristezas e facécias, enterros e actores ambulantes, um poema modemo e o pé da imperatriz da China; ela conta tudo o que pode interessar pelo espírito, pela beleza, pela mocidade; ela não tem opiniões, não sabe do resto do jornal; está aqui, nas suas colunas, cantando, rindo, pairando; não tem a voz grossa da politica, nem a voz indolente do poeta, nem a voz doutoral do crítico; tem uma pequena voz serena, leve e clara, com que conta aos seus amigos tudo o que andou ouvindo, perguntando, esmiuçando.
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A crónica é como estes rapazes que não tem morada sua e que vivem no quarto de seus amigos, que entram com um cheiro de primavera, alegres, folgazões, dançando, que nos abraçam, que nos empurram, que nos falam de tudo, que se apropriam do nosso papel, do riosso colarinho, da nossa navalha de barba, que nos macam, que nos fatigam mesmo e, quando se vão embora, nos deixam cheios de saudades.
Victor Nogueira à(s) segunda-feira, outubro 29, 2007 Sem comentários:

domingo, 28 de outubro de 2007

Um artigo de Carlos Laranjeira (Brasil)


A história que não quer apagar

Carlos Laranjeira

Sempre no final do ano, lembro da figura de uma mulher esguia, baixa e magra, que eu vi pela primeira vez em Salvador, há pouco mais de 35 anos, ao sair da praia, no alvorecer de um dia lindo.

Ela batia de porta em porta e pedia mantimentos, que ia dispondo na Kombi que a companhava. Na minha falta de experiência, não podia entender como uma pessoa parecendo renunciar ao gozo material pode acordar cedo para, de casa em casa, solicitar esmola destinada a outros. Ao narrar o acontecimento à minha mãe vim a saber tratar-se da Irmã Dulce, uma mulher cuja atividade destinava-se a recolher bêbados e doentes das ruas para dar-lhes comida, além de remédios e lugar para permanecer até a cura.

Deste dia em diante ela fincou pé em minha memória e seu olhar se cruzou com o meu no final no ano seguinte. No mês de dezembro, repórter do JORNAL DO BAHIA, fui destacado, pela chefia de reportagem, para checar a veracidade da notícia, segundo a qual, faltava-lhe dinheiro para o pagamento do 13º. salário dos servidores do hospital, o qual ela insistia em construir para dar abrigo a um número cada vez maior de bêbados e desválidos. E os servidores não eram poucos. Muitos, aliás! A notícia fôra publicada e, dias depois, como uma mágica, o dinheiro lhe apareceu em forma de doações. Confesso que essas atribulações de uma pequenina mulher me levaram a refletir sobre a vida e fazer indagações para as quais não encontrava respostas.

A leitura persistente, à qual me habituei, foi me revelando que a vida é assim mesmo: nós vivemos uns para os outros, não obstante nem sempre o que oferecemos recebemos em troca. Às vezes tiram-nos mais do que podemos dar, nos roubam, nos humilham, mas, ao narrar nossas experiências nos livramos de um peso mental e acabamos por ajudar involuntariamente o leitor a resolver um problema, até então, insolúvel para ele.

Aprendi, como ia dizendo, que vivemos uns para os outros, não para nos embriagar de paixão pelo carro modelo novo e nos deixar dominar pela ambição de comprá-lo a qualquer custo. Ambição que às vezes nos leva a tirar do outro o que lhe fará falta, somente para satisfazer aos apelos comerciais de quem nos deseja tirar a tranqüilidade enquanto não atendermos ao seu chamamento.



Nessa época de festas, costumamos nos embriagar pela velocidade, pelo celular com vídeo, pelo culto do corpo, pelo televisor de 30 ou 40 polegadas, pela casa na praia, pela chácara ou fazenda, por mais um imóvel na cidade, sabe Deus para quê!



E nessa embriaguez passamos a ser dominados pelo vício de consumir, nem que para isto tenhamos de corromper e nos tornar corrompidos ou ainda ingerir drogas para tomar coragem e fazer o que passamos a considerar necessário à ambição.



Aos 57 anos, ainda não sei o que é a felicidade que todos ou quase todos buscam como a um tesouro e por ela sacrificam a saúde, a reputação, a liberdade, já que a associam a um bem material. Por ignorá-la, e não saber ao menos o que representa, sou despossuído de ambição. Valorizo a camaradagem, o esforço, o objetivo alcançado, as pessoas que executam com perfeição uma arte, mas este juízo eu pratico na contemplação do seu trabalho, me absorvendo na leitura, na admiração de uma criação artística, de um personagem, do enredo de uma história, da uma música ou de um jogo de futebol.



Valorizo modelos de valores humanos e espirituais, símbolos da realidade dos deserdados que vivem esmagado pela miséria. Exemplo deste modelo considero a Irmã Dulce que, não dando olas para aquele tipo de felicidade, pelo qual a maioria é capaz de roubar, matar e se drogar, pregou justiça sem a voz. Usou apenas o gesto e, com ele, criou um dos maiores hospitais para os pobres.



A sua pequenina figura me apareceu no alvorecer de um lindo dia de final de ano, quando eu pensava que a vida se resumia unicamente no gozo dos bens materiais e não conseguia entender como alguém sacrificava os momentos de prazer para pedir esmola para os bêbados e doentes, por cuja situação não podia acumular sentimentos de culpa. Essa sua imagem permanece em minha memória, como uma história que não quer apagar, insinuando o enredo de que o prazer da vida não está em vivê-la, mas em achar um motivo para viver.






O autor, Carlos Laranjeira é jornalista. Nasceu em Maragogipe, estado da Bahia. Iniciou sua carreira no Jornal da Bahia, em 1967, escreveu mais de 800 artigos sobre literatura, política e o pensamento de Santo Agostinho veiculados na Internet e imprensa escrita do Nordeste, do Grande ABC, da capital paulista e do interior do Estado. É autor de diversos livros.


in Casa da Cultura - A história que não quer apagar - Artigo de Carlos Laranjeira


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Jornalista, Carlos Laranjeira nasceu em Maragogipe, estado da Bahia. Iniciou sua carreira em 1967 no Jornal da Bahia, como setorista da Assembléia Legislativa, período em que Glauber Rocha respondia pela edição do Suplemento Cultural do jornal e João Ubaldo Ribeiro se iniciava na crônica. No JBa, já extinto, foi editor do Interior, tendo como seu correspondente, em Santo Amaro da Purificação, o ex-professor de língua portuguesa Genebaldo Correia, que adquiriria notoriedade nacional como deputado federal. Laranjeira esteve também na Rádio Cruzeiro da Bahia, como setorista da Câmara Municipal e junto ao gabinete do então prefeito de Salvador, Antônio Carlos Magalhães, e como diretor do Grande Jornal, veiculado às 7 horas e às 22 horas. Em São Paulo, atuou quatro vezes no Diário do Grande ABC, onde foi repórter e colunista de política; na Tribuna de Santos, no Popular da Tarde, do Grupo Diário Popular, já extinto e no grupo Folha de S. Paulo, onde foi repórter policial, setorista na Câmara Municipal de São Paulo e editor de política do Notícias Populares, também extinto.


Laranjeira é autor de mais de 800 artigos sobre literatura, política e o pensamento de Santo Agostinho veiculados na Internet e imprensa escrita. É ainda autor dos seguintes livros: Tancredo, Máximas e Citações - pensamento de Tancredo Neves em forma dicionarizada; duas edições de Histórias de Adhemar - histórias recolhidas da tradição oral; quatro edições de A Vida de Lauro Gomes; O Vocabulário da Política; A verdadeira história do rouba, mas faz - uma reportagem do conflito entre as famílias de Júlio de Mesquita Filho e do ex-governador Adhemar de Barros; A Corrupção nos Bastidores da República, em parceria com o ex-deputado Felipe Cheidde, Eleições no ABC. - série em dois livros com os resultados de eleições nas cinco maiores cidades da região; Geraldo Faria: Tempos Difíceis - biografia do prefeito de São Bernardo, Geraldo Faria Rodrigues e Vontade de Vencer - perfis de homens público e homens de letra que, mediante a força de vontade, venceram na vida pública e na literatura. Também editou e prefaciou dezenas de livros e foi assessor de imprensa do ex-deputado Adhemar de Barros Filho.


Aposentado pela prefeitura de São Bernardo do Campo, foi chefe da Divisão de Imprensa e editor do jornal oficial NOTÍCIAS DO MUNICÍPIO, no qual realizou reformulação gráfica mantida até hoje, para facilitar a leitura. Em 1996, Carlos Laranjeira fundou o jornal POLÍTIKA DO ABC . Nesses 12 anos, deu início à publicação em fascículos de Os Personagens da História do Grande ABC, começando por Tereza Delta, a rebelde. Antes, em 1985, criou o primeiro sebo no ABC, o qual veio a possuir três lojas: duas em São Bernardo e uma em Santo André, mas problemas de natureza particular o levaram a extinguir o comércio de livros usados, com o qual retornou em 2001.


Alguns de seus trabalhos foram reproduzidos parcialmente pela Folha de S. Paulo, tendo o jornalista sido alvo de reportagens no Jornal da Tarde, O Estado de S. Paulo, Jornal do Brasil e em jornais do interior e do Grande ABC. O livro Comunicação & Sociedade, publicação latino-americana de pesquisadores universitários, editado pela Universidade Metodista em 2000, aborda também parte do seu trabalho.


in Quem Somos - Carlos Laranjeira

Victor Nogueira à(s) domingo, outubro 28, 2007 Sem comentários:

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Revolução de Outubro e sua importância histórica

No domingo, 22 de janeiro de 1905, fato considerado um dos antecedentes da Revolução Russa de 1917, cerca de 200 mil cidadãos, sobretudo trabalhadores, estavam reunidos em frente ao Palácio de Inverno em São Petersburgo para manifestar pacificamente a necessidade de melhoria da sua situação política e econômica. O tio do czar Nicolau II permitiu que as tropas czaristas atirassem na multidão. Centenas de manifestantes foram mortos e feridos. O massacre dos manifestantes provocou greves e manifestações por todo o país, o que por sua vez, conduziu à Primeira Revolução Russa.






Bibliografia e Livros


Lenin -Nosso Programa - 1917-2007: 90 anos da Revolução Bolchevique
Mulheres militantes nos dias da Grande Revolução de Outubro
Revolução de Outubro - síntese histórica dos primeiros 20 anos
A revolução proletária de outubro de 1917 é produto da ação consciente e massiva dos trabalhadores
A Revolução de Outubro: 80 anos - Sebastião do Rego Barros
Partido Comunista Português - 80º aniversário da Revolução de Outubro
Outubro de 1917 - irrepetível, mas vigente - José Reinaldo Carvalho
88 anos da Revolucao Soviética: "outros Outubros virão..."
Revolucao Russa de 1917 - 90 anos
Rússia: a Luta continua - V. Lakeev
Nos 90 Anos da Revolução de Outubro - João Aguiar
Mensagem: Boletim Eletrônico do PSTU. 90 anos da Revolução de Outubro
Por que a revolução soviética não foi socialista - Leda M. Paulani
Do socialismo prematuro para o socialismo do Futuro - Fernando Penim Redondo
Revista «O Militante» - A Revolução de Outubro e a fundação do PCP - Domingos Abrantes
A REVOLUÇÃO DE OUTUBRO nos jornais portugueses em 1917 - Paulo Guinote
VERMELHO - 90 anos da Revolução de Outubro - Jerónimo de Sousa
Revoluções Russas - Filmes
A g e r a ç ã o p e r d i d a: 'Reds'
Evolução do conceito de Direitos Humanos - Victor Nogueira
Conquista dos Direitos no cotidiano ao longo dos tempos
Victor Nogueira à(s) quinta-feira, outubro 25, 2007 Sem comentários:

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Nos 90 Anos da Revolução de Outubro


* João Valente Aguiar

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Nos 90 anos da Revolução de Outubro: o legado teórico de Lenine (1/7)
Nos 90 anos da Revolução de Outubro: o legado teórico de Lenine (2/7)
Nos 90 anos da Revolução de Outubro: o legado teórico de Lenine (3/7)
Nos 90 anos da Revolução de Outubro: o legado teórico de Lenine (4/7)
Nos 90 anos da Revolução de Outubro: o legado teórico de Lenine (5/7)
Nos 90 anos da Revolução de Outubro: o legado teórico de Lenine (6/7)
Nos 90 anos da Revolução de Outubro: o legado teórico de Lenine (7/7)
Nos 90 anos da Revolução de Outubro…
Nos 90 anos da Revolução de Outubro II
.
Há 90 anos… I
Há 90 anos… II
Há 90 anos… III
Há 90 anos… IV
Há 90 anos… V
Há 90 anos… VI
Há 90 anos… VII
Há 90 anos… VIII
Há 90 anos… IX
Há 90 anos… X
Há 90 anos… XI
Há 90 anos… XII
.
in As vinhas da Ira
Victor Nogueira à(s) quarta-feira, outubro 24, 2007 Sem comentários:

A Educação colonial frente à cultura do colonizado

A EDUCAÇÃO
COLONIAL FRENTE
À CULTURA DO COLONIZADO




Enquanto se escreve a história da educação moçambicana, sou
do parecer que todos os trabalhos teóricos e científicos que queiram, de uma ou
outra forma, contribuir para a organização de um sistema de educação racional
em Moçambique, nesses anos ainda de luta pela sua real emancipação, devem
remontar ao período colonial.



Embora nem todos os problemas actuais se expliquem pelo
passado colonial, é, todavia, importante a presença dessa memória, como ponto
de partida para entender a complexidade da própria realidade histórica, para
poder questionar com objectividade a direcção do actual processo político e
aquilatar os desafios que a este homem moçambicano, que ainda traz
consigo algo do colonialismo, enfrenta, no dia-a-dia, na construção da
sua historicidade. Não parece fácil de conceber, estruturar e administrar um
sistema de educação que queira ser nega­ção e ruptura1^ em
relação ao anterior e superá-lo.



Interessa saber:, que tipo de homem visava o colonialismo
formar? A quem servia ele; e, finalmente, avaliar os seus resultados finais.



O capítulo l começa por
apresentar preconceitos (Engels, Heller) ou mitos (Rognon),
condensados na expressão sociedade tradicional, construídos para rotular
o homem colonizado e justificar aparentemente a «acção civilizadora», na qual
se inseria a acção educativa do sistema. Esse aspecto fenomenal ou apa­rente,
dentro do seu mundo da pseudo concreticidade, é também fundamental para, por
detrás dele, se descortinar a essência do colonialismo, adentrar no pró­prio
sistema de educação e terminar com a posição colonial, frente à cultura. Por
isso tento perceber os reais interesses económicos e políticos.



O mito de «Sociedade
Tradicional»



Engels mostra ainda que, nas relações quotidianas, a
ideologia é preconceituosa (MARX: 292). «O homem predisposto ao
preconceito rotula o que tem diante de si e enquadra-o numa estereotipia de
grupo» (HELLER, 1989: 57).



A antropologia portuguesa vai usar designações diferentes
para traduzir o mesmo preconceito, refinando-as no decorrer dos tempos, à
medida que se intensificavam a pressão interna e internacional sobre o Governo
Colonial.



Para mitigar a agressividade do sistema, o governo português
soube utilizar--se da hierarquia católica, assinando com a Santa Sé uma
Concordata e o Esta­tuto Missionário. Este, nos seus artigos 3°, 6°, 66°-69° e
81°, fala de «indígenas», «população indígena», «língua indígena», «pessoal
indígena».
O artigo 66° estabelece que o «ensino especialmente destinado
aos indígenas deverá ser intei­ramente confiado ao pessoal missionário e aos
auxiliares». Permite o uso da «língua indígena» somente no ensino da religião
(Art. 69°). A Concordata tole­rava, de «harmonia com os princípios da Igreja»,
o uso da língua indígena no ensino da religião católica» (Art. 16°). A
mesma Concordata discriminava «esco­las para os indígenas e europeus»
(Art. 15°) e destacava a «evangelização dos indígenas» (Art. 19°). Mais tarde,
a Lei do Indigenato entendia o uso dos «idio­mas nativos» no ensino
somente como instrumento de difusão da língua por­tuguesa: «O ensino a que
se refere este artigo procurará sempre difundir a lín­gua portuguesa, mas, como
instrumento dele, poderá ser autorizado o emprego dos idiomas nativos»
(Lei
do Indigenato, art. 6° § l, do Decreto-Lei 39666,
Suplemento ao B.O. 22,1 Série, de 31/5/1954).



Jorge Dias, professor de Antropologia cultural no Instituto
Superior de Ciên­cias Políticas Ultramarinas (I.S.C.P.V.), de Lisboa, refere-se
às «minorias étnicas de Moçambique», às «sociedades exóticas»14, quando busca, nas pesquisas
sobre os Maconde, conhecer «as características culturais tradicionais» (GALLO,
1988: 84; MOUTINHO, 1980: 73). Para António Rita-Ferreira, os diversos «Povos
de Moçambique» (1975) são «comunidades de tipo tribal», de «cultura
tradicional»,
no sentido morganiano. Quando admite a existência histórica
de «impérios», de Gaza, Marave, Mwenemutapa ou de «nações», toma o império no sentido
de «um aglomerado de povos sem unidade cultural e linguística, compulsivamente
reunidos ou que assimilou efectivamente dentro do seu sis­tema numerosos
cativos de outras etnias, como a nação Angune (Nguni)» (RITA-FERREIRA, 1975:
5/8).



Gálio regista vários trabalhos de dissertação apresentados
naquele Instituto, nos anos 60 e 70, que visavam fornecer uma base
antropológica às decisões da política colonial do regime político português: A.
Rebelo Pinto usa a expressão de «autóctones», em «Assimilação dos
Autóctones: Terapia do Ressentimento» (1961); Casimira dos Santos, em «O papel
das forças armadas na acção colonizadora», trata das «massas negras» que
carecem de reeducação e civilização; Fernando Rodrigues Leitão, em
«Contribuição para o Estudo do Sistema Pri­sional no Ultramar», sugere uma «educação
distinta para os indígenas»
e «não indígenas»', Fernando Pereira
Marques de Castro fala de «nativos», no seu traba­lho «Política de
Fronteiras e de Combate à Subversão», apresentado em 1966.





Em
relatório, para defesa de tese, sob o título «As Autoridades Tradicionais e a
Organização das Regedorias em Moçambique», o seu autor, Rafael de Almeida Rosa
Lobo, fala de «indígena português e população
indígena»,
e outras expres­sões como «povos de cor» (GALLO, 1988:
96/104).



Essa fundamentação antropológica estava presente nos
discursos políticos. Por exemplo, na cerimónia de recepção ao Presidente
Craveiro Lopes em Moçambique, em 1946, o governador do então distrito de Manica
e Sofala dizia:



«Estamos aqui depois de mais de quatro séculos e meio,
estamos aqui mais engajados hoje do que nunca numa grande e bem sucedida
tarefa.
Domesticando o mato, construindo
cidades e fazendo-as progredir, ensi­nando e dirigindo a massa
rude dos
indígenas para uma vida melhor, disci­plinando os seus instintos
primitivos (...), moldando suas almas nas formas superiores de cristandade,
administrando-lhes a justiça, com compreensão afectiva e desgastante, mas nobre
e dignificante, como poucas há. E a nossa vocação histórica emergindo outra vez
(...). Tudo seja para o bem comum e engrandecimento da Mãe-Pátria»
(DUFFY,
J. 1962: 15415).



Mesmo não se tendo constituído numa escola teórica
propriamente dita, a antropologia portuguesa desenvolveu uma práxis coerente com
os interesses político-económicos do sistema. Essa práxis foi activada nas
nossas colónias pela política de assimilação, que atribuía ao «nativo
civilizado» o status de cida­dão português». Mais tarde, perante o
insucesso dessa política assimilacionista e da multi-racialidade dos povos, o
regime passou a reconhecer as reivindicações dos «nativos» pela sua
personalidade como indivíduos, mas não como sujeitos políticos. Quais eram,
concretamente, esses interesses políticos e económicos?



A direcção ideológica
da antropologia portuguesa



Foi a partir do século XIX que esses interesses mais se
manifestaram ao nível das potências europeias. A realização substancial do
capital exigia, para isso, a ocupação efectiva dos territórios, a abolição
teórica da escravatura, a «protec­ção» da mão-de-obra e a organização da
máquina administrativa. O «Acto Geral da Conferência Industrial de Bruxelas»,
de 2 de Julho de 1890, definia os princí­pios e mecanismos necessários «à
produção dos lucros imperialistas no colonia­lismo da nova fase do capitalismo»
(I AL: 266).



Somente
nos finais do século XIX, após a Conferência de Berlim (18847 /l 885) e a «Conferência Antiesclavagista de Bruxelas»
(1889), é que o Governo Colonial Português se preocupou mais com a ocupação
efectiva da colónia para realização do capital, e, em muitos casos, por pressão
dos interesses económicos de outras potências colonizadoras, sobretudo da
Inglaterra, da Alemanha e de França. António Enes, Mouzinho de Albuquerque,
Oliveira Martins e Azevedo Coutinho aperceberam-se das consequências últimas
dessas pressões: o perigo da perda das colónias. Na realidade, as pressões
derivavam do liberalismo eco­nómico exigido pela política de mercado livre que
o capitalismo impunha. Protestos organizados por Sociedades Antiesclavagistas,
na maioria inglesas, e precedidos de um protesto oficial do Governo Britânico
ao Governo Português, a 13 de Agosto de 1887, todos «contra a expansão da
influência portuguesa na África Austral», além de inúmeras denúncias de prática
de escravatura em toda a colónia, obrigaram o Governo Português, em Moçambique,
à capitulação (idem: p. 252, 256 e 269). Por aqueles protestos, os ingleses
estavam reivindicando o «enorme espaço reservado à esfera de influência
portuguesa (Mapa Cor-de--Rosa)». Confrontavam-se, na região, as potências
capitalistas europeias. Já em 1885, o Natal
Mercury,
órgão da British South África Company, considerava uma «mera
ficção» a presença dos Portugueses na África Austral e defendia abertamente «a
ocupação alemã de Moçambique», porque «o simples facto de a bandeira portuguesa
ter tremulado durante trezentos anos na costa oriental é a maior condenação do
domínio português». Lord Salisbury (1887) retirava a Portugal a possibilidade
de «reivindicar a soberania do território compreendido entre Moçambique e
Angola, uma vez que efectivamente não ocupava o territó­rio e não estava em
condições de nele manter a ordem e de proteger a vida dos estrangeiros e a
prosperidade» (idem, p. 244 e 251).



Os governantes portugueses tinham plena consciência de que
a sua presença na(s)
colónia(s) era mais «nominal» que «efectiva», como
deixa perceber o desabafo de Oliveira Martins, referindo-se à Companhia de
Moçambique:



«A Companhia de Moçambique
fundou-se com o
interesse patriótico de
explorar essas riquesas
minerais de um modo eficaz e prático, a fim de as tornar produtivas para
Portugal, em vez de irem cair nas mãos de estran­geiros, como indubitavelmente
cairão se não houver a reivindicá-las uma iniciativa rápida e audaz»
(I
AL: 256).



Mas «a invasão
pacífica, mas absorvente, do elemento estrangeiro ameaça esse ponto litoral
(Lourenço Marques) duma desnacionalização rápida e com­pleta. Se isto é assim
na costa, e na restrita área de urna vila onde o domínio português é efectivo,
o que será nos sertões, onde ele é apenas nominal!»
(idem, p. 256).



Em 1890 descrevia o estado lamentável das possessões
portuguesas nestes termos:



«Estar de arma — sem
gatilho - ao
ombro, sobre os muros de uma forta­leza arruinada, com uma alfândega e um palácio
onde vegetam maus empre­gados, mal
pagos, e assistir de braços cruzados ao comércio que os estranhos fazem e nós
não podemos fazer, a esperar todos os dias os ataques dos negros e a ouvir a
todas as horas o escárnio e o desdém com que falam de nós todos os que viajam
em África
- não vale,
sinceramente, a pena»
(idem, p. 267).



A mesma mentalidade de exploração económica levou Júlio de
Vilhena, Ministro do Ultramar (1889), a afirmar ao Parlamento que o fim da
Inglaterra era cortar o sertão, de modo que Portugal nunca pudesse unir a costa
oriental com a costa ocidental: «Quando
tal acontecer, nós perderemos a província de Moçambique»
(idem, p. 259).



Perante esta difícil situação de Portugal em relação às
colónias e diferente­mente de outros expedicionários portugueses, Oliveira
Martins, Mouzinho de Albuquerque e António Enes16, verdadeiros
teóricos da política colonial portu­guesa'7, organizavam uma «acção (política) colonial» mais
eficiente. Todos eles realizaram reflexões e elaboraram discursos buscando
sempre articular a acumu­lação do capital, a acção militar, a ocupação efectiva
das terras, a utilização compulsiva da força de trabalho «nativa» barata e a
legislação adequada. Em seus escritos e discursos modernizantes e dúbios18,
reconheciam ultrapassadas as formas de economia mercantil com o tráfico de
escravos e propuseram novas formas de realização da economia capitalista,
impondo «a obrigação moral dos negros ao trabalho» (= «trabalho obrigatório», popularmente conhecido por «xibalo»).



Aqueles governantes político-militares justificaram sempre
a acção colonial como «civilizadora», tendo em conta o «estado primitivo dos
negros», antropo-logicamente inferiores, não raramente próximos do antropóide,
«e bem pouco dignos do nome de homens»19. Citarei alguns textos
desses teóricos da acção colonial portuguesa que procuraram modernizar o
discurso sobre o homem «negro», «selvagem», «primitivo», sobre «as sociedades
ditas tradicionais», atrasadas, em função das estratégias de dominação modernizanles.



Oliveira Martins compreendeu que a economia moderna já se
não compade­cia com as simples formas mercantis de trocas primárias de produtos
de panos, missangas, pólvora por marfins, cera, pepitas de ouro e escravos;
mas, sim, devia orientar-se na direcção da exploração de matérias-primas que
alimenta­riam a produção industrial e únicas capazes de concorrer no mercado
livre:



«O que é absolutamente
indispensável
para todas as fazendas, metropoli­tanas ou ultramarinas, é
o capital. E mister dessecar os pântanos, navegar os
rios, abrir as estradas, construir os armazéns e obter os braços, ferra­menta
humana e trabalhos»
(MARTINS, op. cit., p. 295).



A
obtenção de braços «indígenas» significava, tanto para Oliveira Martins como
para António Enes, a reorienlação do trabalho escravo
dos negros, «ferra­menta humana» indispensável ao trabalho. Não havia, para
Oliveira Martins, escrúpulo nenhum de recorrer a todas as formas desumanas,
desde que se garan­tisse a acumulação do capital. Tranquilizava-se com três
argumentos: 1) que esses territórios eram «despovoados», isto é, não habitados
por «sujeitos», mas simplesmente por «povos indígenas» sem direitos à própria
terra; 2) que os ingleses na índia, e os holandeses em Java, mantinham
«submissos os régulos indígenas que 'faziam'
trabalhar mais ou menos servilmente as populações», o que correspondia
«economicamente ao preço do escravo, ou ao salário do colono contratado»; e,
finalmente, 3) o argumento físico-antropológico que lhe permitia concluir que o
«preto (Grifos do Autor) era
congenitamente uma criança adulta»:



«... a
precocidade, a mobilidade, a agudeza próprias das
crianças não lhes
faltam; mas essas
qualidades infantis não se transformam em faculdades intelectuais superiores (...). Há
decerto, e abundam documentos que nos mostram ser o negro um tipo
antropologicamente inferior, não raro do antropóide, e bem pouco digno do nome
de homem. A transição de um para o outro manifesta-se, como se sabe, em
diversos caracteres; o aumento da capacidade da cavidade cerebral, a diminuição
inversamente relativa do crânio e da face, a abertura do ângulo facial que daí
deriva e a situação do orifício occipital. Em todos estes sinais os negros se
encontram colocados entre o homem e o antropóide»
(MARTINS, op. cit., p. 284/285).



Ao desumanizar e infantilizar o «preto», Oliveira Martins
procurava justifi­car todas as estratégias de dominação. Ironicamente O.
Martins interrogava-se: «E se não há relações entre a anatomia do crânio e a
capacidade intelectual e moral, porque há-de parar a filantropia no negro?
Porque não há de ensinar-se a bíblia ao gorila ou ao orango, que nem por não
terem fala, não deixam de ter ouvidos, e hão-de entender, quase tanto como o
preto, a metafísica da encarna­ção do Verbo e o dogma da Trindade?» (p. 284).



Indirectamente, O. Martins estava a criticar os
missionários portugueses cató­licos que, segundo Eduardo de Noronha, «ensinavam
ao preto em língua euro­peia», moendo-lhe «a inteligência com dogmas
incompreensíveis», diversa­mente dos missionários ou sacerdotes estrangeiros
que educavam «no seu dia­lecto» e não discutiam «estúpidas teses teológicas» (I
AL: 288).



Era portanto incompreensível conceder a «liberdade» a esta
«criança adulta» que só «pela força» conseguia trabalhar:



O negro,
«trabalha, sim, mas não por hábito, por instinto e com o fito de uma
capitalização ilimitada como o europeu. Trabalha, sim, mas agrilhoado pela
necessidade imediata: e as necessidades do negro são curtas, e satisfaz--se com
pouco. Não abandona a liberdade e a ociosidade, para ele felizes condições de
vida selvagem, pelo trabalho fixo, ordinário, constante, que é dura condição da
vida civilizada»





Daí a
reorientação da escravidão:



«A escravidão tinha pois um papel
positiva e economicamente eficaz, sob o ponto de vista da prosperidade das
plantações. Não basta dizer que o tra­balho escravo é mais caro, e que o preto
livre trabalha -factos aliás exactos em si - porque é
mister acrescentar que o preto livre só trabalha intermiten­temente ou
excepcionalmente; e que o mais elevado preço do trabalho escra­vo era
compensado pela constância e permanência do funcionar desse ins­trumento da
produção»
(MARTINS, 1920: 219/220).



Nesta ordem, Oliveira Martins concebia «absurda» a educação
para os negros. Admitia «o uso da força» como a única forma da sua educação:
«só pela força se educam povos bárbaros» (p. 283). Barros Gomes (1887)
considerava a religião como elemento (...) absolutamente necessário para manter
o nosso pres­tígio entre os indígenas» (I AL: 251).



Não obstante as pressões internacionais e o decreto que
pusera fim à escrava­tura, passaram-se a buscar outros meios de tornar forçado
ou «obrigatório» o tra­balho do «negro», sem aparentar o velho tipo de
escravidão do condenado (idem, p. 233) e dando uma interpretação diferente à
liberdade do negro, para melhor «explorar em proveito nosso o trabalho de esses
milhões de braços, enri­quecendo-nos à custa deles, de tal modo se faz no
Brasil» (Oliveira Martins, ibidem).



Para António Enes, «o fim da escravatura» não significava «o direito de não trabalhar».



Opondo-se ao «espírito liberal» do Regulamento Para os Contratos Serviçaes e Colonos nas Províncias de
África,
que, «embora nunca respeitado, consa­grava a liberdade de
trabalho»20, António Enes, publicou, em 1899, o seu Código de Trabalho Indígena. No mesmo
modo de António Enes reagirão mais tarde, em 1951, alguns colonialistas
portugueses, contra a redução para seis meses da duração do contrato», prazo
considerado «relativamente pequeno para civilizar o indígena» (II AL: 297).



Enes defendia as seguintes teses, traçando as linhas
mestras da «acção colo­nial», ou
seja, da política económica portuguesa nas Colónias:



— «a única maneira de Portugal fortalecer a sua posição face ao surto da
economia dos países vizinhos, é aumentar a sua produtividade»',



— esse
aumento de produtividade consegue-se: a)
obrigando
as províncias ultramarinas a
produzirem; e b)
obrigando ou forçando «os rudes negros de África» a trabalharem;



— prejudiciais
ao colono dada a inclemência do clima, a aridez do solo e a proliferação de
doenças
do branco, «a nossa África tropical não se cultiva senão com
africanos, e neste sentido,



— «não há que ter escrúpulos
em
obrigar e sendo preciso forçar estes rudes negros da África, estes
ignaros párias da Ásia, esses meios selvagens da Oceânia, a trabalhar, a
civilizarem-se a si mesmos através do trabalho», pois «precisamos dele (do indígena) para a economia da Europa e para o pro­gresso de África»;



- daí, a obrigação legal e moral do negro ao
trabalho: «todos os nativos das províncias ultramarinas estão sujeitos à
obrigação legal e moral de tra­balharem, podendo escolher o meio de cumprirem
esta obrigação» (Decreto do Código de
Trabalho de 1899, Artigo 1° do Regulamento) (I AL: 312);



- mas «se não a
cumprissem de modo algum, a autoridade pública pode impor-lhes o seu
cumprimento».



Esta articulação de interesses económicos portugueses
com a obrigação moral do negro ao trabalho é mais clara quando afirma que:



«Apenas conferirá à autoridade pública, e não a qualquer
particular, a prerrogativa de coagir à observância de uma lei social quem espontanea­mente
lhe não acatar os preceitos, de coagir os negros a trabalharem, como um pai
pode compelir os filhos a aprenderem a exercer um mister»21;



- a própria «produtividade da
economia capitalista exigia o regime de uma vassalagem real dos indígenas, e de
um trabalho mais ou menos clara e directamente forçado». Para o efeito, António
Enes justificava e estimulava as expedições militares contra as autoridades
locais (I AL: 298/300).



No relatório de 1893 ao Governo Central,
justificava a sua actuação na coló­nia, enquanto ironizava a abolição da
escravatura:



«Abolidos os crimes e horrores da escravidão, os interesses
económicos recomendaram ao legislador que diligenciasse aproveitar e conservar
os hábitos de trabalho que ela impunha aos negros, embora proibisse, para os
conservar e aproveitar, o emprego dos meios por que tais hábitos haviam sido
impostos. Converter um escravo em homem livre era um benefício para ele e para
a sociedade, mas deixar transformar um trabalhador em vadio depreciava esse benefício
(sic).



O que
se fez, porém? Por medo de que as práticas do regime abolido lhe sobrevivessem,
elaboravam-se leis e regulamentos encimados por uma espé­cie de declaração dos
direitos dos negros, que lhes dizia textualmente: de ora avante ninguém tem obrigação
de trabalhar; e os tribunais e as autori­dades administrativas foram
encarregues de proteger contra qualquer aten­tado o sagrado direito de
ociosidade reconhecido aos africanos. Na metró­pole não se reconhece aos
brancos semelhante direito. Na metrópole todos são obrigados a adquirir pelo
seu trabalho os meios de subsistência que lhes faltam, sob pena de serem
punidos como vadios. Na. metrópole professa-se uma
filosofia e uma jurisprudência que preceituam a todos os seres racionais a cuidarem do seu próprio
aperfeiçoamento, a todos os membros da sociedade a cooperarem para o bem
colectivo. Todavia, o pavor da escrava­tura, o frenesim de opor às doutrinas
dos seus defensores, revogadas procla­mações liberais e humanitárias, saltaram
por cima do código e da moral, do bom senso e das necessidades económicas para
ensinarem ao negro que tinha a
liberdade de continuar a viver no estado selvagem, pois tal é a neces­sária
consequência da
liberdade de não trabalhar, deixada a quem só pelo trabalho pode entrar no grémio da civilização» (I
AL: 286/287. Grifos do Autor).



Essas teses completavam as de Oliveira Martins, e por elas
António Enes jus­tificava a ocupação do território sem «sujeito», o domínio
militar, e as medidas legislativas, tendentes a assegurar o controlo do
capital, da terra (expropriando as melhores áreas produtivas para as fazendas
dos colonos), a cobrança de diver­sos impostos progressivos, como o «imposto da
palhota» ou «mussoko», deter­minado
pelo Decreto de Sá da Bandeira, de 3 de Novembro de 1856, e a expro­priação da
força de trabalho «abundante, disciplinada e barata». Acrescentam-se outras
medidas: o Decreto de António Enes, de 1890, sobre os prazos; a conces­são de
extensas terras às Companhias (majestáticas), todas com o capital estran­geiro,
em 1891, 1892, 1893, 1898; o Código de
Trabalho Indígena,
de 1899, continuado e reformulado pêlos de 1911, 1914
e 1926. Acompanhadas de inves­tidas militares, essas medidas visavam eliminar
em definitivo a possibilidade de prosperidade de qualquer formação
sócio-económica endógena.



Por fim, Ernesto Jardim Vilhena expressava-se nestes termos
no Parlamento Português, em defesa do investimento nas guerras de África:



«... não há administração
económica de possessões africanas sem o domínio sobre o indígena, porque sem
ele não há imposto, não há indústria, nem agricultura sem a submissão, porque
sem ela não há mão-de-obra»
(CASTRO, 1927: p. 55).



Assim, a educação dos
«negros» era:



1. Para Oliveira Martins a) «absurda, não só perante a história, como tam­bém perante a
capacidade mental dessas raças inferiores»; b) uma «ilusão» pensar «em civilizar os
negros com a bíblia, educação e panos de algodão», pois, «toda a História
provava, (...) que só pela força se educam povos bárbaros» (MARTINS, 1920:283);



2. Para Mouzinho de Albuquerque, era uma «ficção»: «As escolas são uma ficção... Quanto a mim, o que nós
devemos fazer para educar e civilizar o indí­gena é desenvolver-lhe de forma
prática as habilidades para uma profissão manual e aproveitar o seu trabalho na
exploração da província» (MEC/GSE, 1980:21);



3. Para António
Enes, a educação não era prioritária; era
«mais uma exigên­cia formal que
necessidade real».
Apesar do decreto referendado por ele em 1891, que
obrigava as Companhias a criar escolas «em localidades com mais de 500
habitantes», na prática essas Companhias não cumpriam tal obrigação, como se
comprova pela crítica da Câmara dos Deputados à Companhia de Moçambique, em
1877 (I AL: 276 e 307).



Freire de Andrade, Governador Geral
de Moçambique (1906/1910), afirmava que «o objectivo cultural da educação dos
nativos deve ser fazer deles traba­lhadores, não encorajá-los a dar vida à
fábula do boi e a rã, até porque a rã, inchando e rebentando, nos faria mal»
(II AL: 388).



De facto, o balanço do grau de instrução em 1894 era
negativo. Só em Lourenço Marques, a situação era a seguinte: analfabetos:
23,73% entre os bran­cos, 86,11% entre os negros e 8,41% entre os indianos; os
que sabiam ler e escrever: 71,56% entre os brancos, 13,89% entre os negros,
90,26% entre os indianos; cursos (diversos): 4,71% entre os brancos, 0% entre
os negros e 1,33% entre os indianos (idem, p. 293).



O bispo D. António Barroso exclamaria, em 1895: «É muito
fácil afirmar que os negros são rebeldes à instrução e ao trabalho; isso será
axiomático, mas é falso. O que é mais difícil é criar escolas para eles, que
justifiquem o seu nome» (idem, p. 296/297). Mas temos de reconhecer que esta
foi apenas uma voz que clamava no deserto.



Foi
de tal maneira determinante a «acção colonial» traçada por aqueles expe­dicionários
que ela orientou a política e o espírito do próprio Estado Novo. Como Ministro
das Colónias, Oliveira Salazar mandou publicar o «Acto Colo­nial» pelo decreto n° 18.570, de 8 de Julho de 1930.
O colonialismo salazarista admitia, «expressamente, o trabalho obrigatório em
condições de obras públicas de 'interesse geral e colectivo', por motivos penais,
estradas locais, assistência em caso de desastre, em condições animais
perigosas, cultivo das terras 'reser­vadas' a
africanos, etc.». O artigo 146° da Constituição de 1933 manteve a lega­lidade
do trabalho forçado colonial. Foi ligeiramente alterado em 1935 e 1945, mas de
novo incorporado na Constituição de 1951. Somente em 1971, três anos antes do
fim da guerra de libertação, foi revogada toda a legislação do trabalho
obrigatório (II AL: 203 e 216). Porém, em 1943, Salazar considerava as colónias
portuguesas de África «um complemento
natural da agricultura metropolitana».
Vieira Machado, então Ministro
das Colónias, traduzindo a consideração de Salazar, afirmava que «as populações
negras africanas não tinham o direito a viver sem trabalhar». Em 1954, Salazar
estendia aquela condição a todo o conti­nente africano como «complemento
cultural da Europa, necessário à sua vida, à sua defesa, à sua subsistência».
Pedro Ramos de Almeida observa ser uma «rea­firmação do princípio actual da
exploração colonialista do 'trabalho obrigató­rio' que sucedeu à escravatura» (II AL: 254
e 323). É cada vez mais claro o bjectivo
económico de tal acção civilizadora do Estado Novo: a África deve servir a
Europa» (SALAZAR, António Oliveira 1950). Não há diferença alguma entre este
discurso e o de Mouzinho da Albuquerque, no século XIX.



O próprio Salazar se encarregou
de definir e caracterizar o colonialismo, ressaltando sempre a natureza
económica e a discriminação como variável necessária:



«O colonialismo exige essencialmente o desnível das raças e
das cultu­ras, um objectivo de exploração económica pela dominação política, a
qual geralmente se exprime pela diferenciação entre cidadão e súbdito. Não há
colonialismo onde nenhum benefício estrangeiro ou financeiro se tira (...) Não
é possível conceber este estatuto ou condição de colónia quando é semelhante o
nível de vida, idêntica a cultura, indiferenciado o direito pú­blico, igual a
posição dos indivíduos perante as instituições e as leis. Não pode haver
colonialismo onde o povo faz parte integrante da Nação, onde os cidadãos
colaboram activamente na formação do Estado, em termos de igualdade com todos
os de mais, onde os indivíduos exercem funções públi­cas e se movem e trabalham
no conjunto dos territórios. E tudo isto não de agora, estabelecido ou
legislado à pressa, mas cimentado pêlos séculos, quase podemos dizer desde
sempre» (II AL: 315/316)



Dois anos mais tarde, afirmaria
na revista
Foreign Affairs, de Abril de 1956:



«O colonialismo é um regime económico e político susceptível
de exame objectivo. Passa-se na ordem real; pode dizer-se que é redutível a
números concretos, a estatutos legais. Tem-se admitido que subentende um poder
soberano estranho ao território submetido, uma exploração económica em
benefício maior ou menor do colonizador, uma vantagem política ou militar, uma
distinção entre cidadãos e súbditos, com sua diferenciação de direitos, e
sobretudo a inexistência de direitos políticos dos povos coloniais e a impos­sibilidade
de interferência nos negócios metropolitanos» (idem, p. 332).



Em discurso de 1 de Novembro de
1957, Salazar proferia a sua declaração de fé colonial:



«Acreditamos que existem raças decadentes ou, se preferem,
atrasadas, a quem sentimos ter o dever de conduzir para a civilização — tarefa esta
de formação de seres humanos que deve ser levada a cabo de maneira huma­na...» (idem, p. 343).



Na mesma linha, Marcelo Caetano defendeu, em cinco
conferências profe­ridas no Centro de Estudos Económicos da Associação
Comercial do Porto, no ano escolar de 1953/1954, que
«os negros em África devem ser dirigidos e rodeados por
europeus, mas são indispensáveis como auxiliares» (idem, p. 316). Foi mais na sua obra Tradições, Princípios e Métodos da Colonização (1951) que Marcelo
Caetano se notabilizou como o grande continuador dos teóricos da acção colonial
do século anterior. Escrevia, naquela obra, que «os portugueses sempre
consideravam a colonização como um acto de dignificação das popula­ções
nativas» (II AL: 296).



Na realidade, são esses interesses económicos que vão
nortear a concepção, a organização e a evolução do sistema de ensino na
colónia. O discurso de «civi­lizar o negro» (António Enes) e de «educá-lo»
(Oliveira Martins) ocultava a vocação expansionista do capitalismo e da
dominação colonial. Os argumentos da condição de «selvagem» visavam, assim, em
última instância, assegurar objectivos económicos de exploração das riquezas
das colónias, base real do mito.



Há que avaliar o colonialismo português também pêlos seus
resultados eco­nómicos e sociais, ou seja, pelo «estado de atraso» de
Moçambique, registado nas vésperas da independência.



Além de se caracterizar por uma economia dependente do
exterior, a agricul­tura, a indústria, o comércio e os serviços, que eram a
base da economia colo­nial, Moçambique caracterizava-se pela pauperização
crescente do povo moçam­bicano.



Em 1974, o presidente
Samora Machel traduzia-o nos seguintes termos:



«Herdamos uma situação difícil e
grave do ponto de vista social, econó­mico, financeiro e cultural, resultante
de séculos de opressão e repressão colonial-fascista e exacerbada pela aventura
criminosa de um pequeno bando de racistas e reaccionários que nos últimos dias
vitimou a cidade de Lourenço Marques.



Afrontamos a herança do analfabetismo
generalizado, da doença, da miséria e da fome. Encontramos o nosso povo, e em
particular o povo do campo, vivendo em condições sub-humanas de miséria e de
exploração. Encontramos destruição, ressentimento e ódio criados por séculos de
opres­são, estimulados pela guerra colonial de agressão que os reaccionários,
colonialistas e fascistas, desencadearam com o fim de semear a divisão e a
confusão.



E pois uma situação complexa
(...). Todavia, maiores eram as dificulda­des quando, há pouco mais de uma
década, começámos o nosso arranque para a libertação nacional»
(MACHEL, 1975a: 201/202).



Este
atraso significou, no âmbito
económico:
uma economia muito depen­dente dos serviços prestados aos
países vizinhos, particularmente à República Sul-Atricana, às Rodésias do Norte
e do Sul (actual Zâmbia e Zimbabwe, res­pectivamente) e ao Niassalândia (hoje,
Malawi), consequentemente, um país não integrado economicamente na região; um
sector industrial incipiente, dependente da importação de matérias-primas para o
seu funcionamento; uma estru­tura económica cujos factores produtivos estavam
ao serviço da burguesia colo­nial (MACHEL, 1975a: 211).



A agricultura, de produtividade baixíssima, absorvia cerca
de 75% da mão--de-obra activa, obrigada a trabalhar nas 4.500 propriedades
agrícolas existentes. Até 1970, o número de proprietários subiu para 11.428,
empregando cerca de um milhão de assalariados (idem, p. 18).



A indústria absorvia 2% da mão-de-obra activa, com cerca de
70% do parque industrial concentrado em redor das duas principais cidades:
Lourenço Marques (hoje, Maputo) e Beira. Com maquinaria toda importada e
geralmente «obsoleta, e em segunda mão», limitava-se a actividades de
transformação primária de alguns produtos de exportação como o caju, algodão,
açúcar, chá e sisal, e a pequenas transformações finais, de acabamento ou de
embalagem de produtos importados. O seu funcionamento dependia, na sua maioria,
da importação de matérias-primas de produtos semi-acabados. Em contrapartida,
importavam-se tecidos confeccionados e açúcar refinado nas indústrias da
Metrópole colonial, vendidos a preços altíssimos no mercado moçambicano.



Toda a actividade comercial era exercida por estrangeiros,
e vedada a qual­quer moçambicano negro.



Essa dependência do exterior era também assinalada pela
organização dos próprios serviços. O investimento em infraestruturas, como os
portos e os caminhos-de-ferro, era «orientado quase exclusivamente para a
África do Sul e Rodésia», pelos quais se escoava e entravam cerca de 94% do
total das mercado­rias. Segundo dados oficiais de 1970, a mão-de-obra de mais
de 113 mil traba­lhadores moçambicanos era vendida, por ano, para as minas de
ouro, carvão, urâ­nio, crómio e diamantes, e para as plantações agro-pecuárias
daqueles dois paí­ses. As receitas provenientes daqueles serviços e 60%) dos
salários dos mineiros moçambicanos na África do Sul e Rodésia eram retidas pela
Metrópole (idem, p. 14), em aplicação do artigo 26° da Convenção assinada entre
o Governo da República Portuguesa e o Governo da União da África do Sul em 11
de Setem­bro de 1928, o que deve ter rendido aos cofres da sua Metrópole cerca
de 145,5 toneladas de ouro fino entre 1946 e 1970 e cerca de 1.916.126 onças de
ouro fino ao mesmo preço de 29,75 rands a onça, entre 1970 e 1973 (idem, p.
17).



As
receitas das exportações decresceram de 57%, em 1965, para 48,5% em 1973. Os
termos de troca entre Moçambique e Portugal, totalmente desvantajo­sos para a
colónia, agravaram a dependência de Moçambique da economia por­tuguesa,
contribuindo para os enormes saldos deficitários na balança de paga­mentos. O
custo médio da tonelada importada, em 1970, era 32,5% superior à média de 1950,
enquanto que, por outro lado, os preços de exportação de 1970 eram, em média,
10,3% inferiores ao preço médio alcançado nas exportações de 1950. Enquanto, em
1960, se trocava uma tonelada de tecido de algodão importado de Portugal por
4,9 toneladas de algodão fibra vendido a Portugal, já «em 1974 esta relação
passou de uma tonelada de tecido de algodão para 6,3 tonela­das de algodão
fibra», representando um decréscimo de 25%, em cinco anos.



Essa deterioração da razão de troca acentuou-se nos finais
dos anos sessenta (período já de intensas guerras de libertação), sobretudo com
a fuga de capitais, o que agravou o endividamento exterior e a situação
financeira de Moçambique. O relatório da então Inspecção de Crédito e Seguros
para 1972 regista «uma liquidez externa na ordem dos 3,6 biliões de escudos22,
correspondentes a valo­res que eram debitados, automaticamente, como
responsabilidades de Moçam­bique no Fundo Monetário da Zona do Escudo23
e a enormes saldos de transfe­rências privadas atrasadas» (CNP, 1984: p. 16).
No seu extremo, a política de pauperização crescente não permitia, de forma
nenhuma, a formação de uma burguesia moçambicana, que, como classe económica,
podia constituir um ini­migo potencial para o regime.



Para além da necessidade de formação da força de trabalho
especializada que respondesse às exigências de uma economia baseada já na
indústria, a classe dominante colonial via na educação um espaço e instrumento
de popularização da sua ideologia, para que as suas ideias e valores se
tornassem «senso comum» no seio da sociedade colonizada, e conseguir que os
«indígenas» passassem «a pensar a partir dele e a não pensar sobre ele» (II RC:
70).



Esse movimento de popularização e assimilação da ideologia
vai iniciar-se mais especificamente a partir de 1930, com o Estado Novo.





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in http://www.macua.org/livros/AEDUCAAOOCOLONIALFRENTECULTURADOCOLONIZADO.htm
Victor Nogueira à(s) quarta-feira, outubro 24, 2007 Sem comentários:
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- Pode-se enganar todo o Povo por algum tempo, pode enganar-se algum Povo todo o tempo. Mas não se pode enganar todo Povo por todo o tempo. (Lincoln) . - O trabalho é mais importante e é independente do capital. O capital é apenas o fruto do trabalho e não existiria sem ele. O trabalho é superior ao capital e merece a consideração mais elevada. (Lincoln) . - ... que todos nós aqui presentes solenemente admitamos ... que esta Nação ... venha gerar uma nova Liberdade, e que o governo do povo, pelo povo e para o povo jamais desaparecerá da face da terra. (Abraham Lincoln - Discurso de Gettysburg (19 de Novembro de 1863) . "(...)O que importa é transformá-lo.[o Mundo]" (Karl Marx)
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