terça-feira, 19 de março de 2024

Carlos Coutinho - Dá que pensar



* Carlos Coutinho

2024 03   PASSOU há dias pela Gulbenkian, em Lisboa, o corajoso historiador David Eltis que veio apresentar-nos o seu livro estarrecedor “Atlas do Comércio Transatlântico de Escravos”, o que prova que já há norte-americanos que não ignoram nem ocultam parte alguma do comportamento humano. 

   Escrito em coautoria com outro norte-americano, o historiador David Brion Davis, recentemente falecido, este livro revela números que dão para pôr um morto aos saltos na cova. 

   Nos 366 anos do tráfico legalmente admitido, ou seja, entre 1501 e 1867, atravessaram o Atlântico nada menos que 12 500 milhões de escravos, num dos “maiores crimes contra a Humanidade”. 

    Chegaram ao continente americano apenas uns 11 700 milhões, porque foram despejados para a água, por terem falecido durante a agrilhoada viagem, mais de 800 mil africanos, mercadoria maioritariamente transacionada no Golfo da Guiné por negreiros portugueses e espanhóis.

   Estive há anos num entreposto cabo-verdiano que foi assaltado algumas vezes por Sir Francis Drake e por outros corsários legalizados, franceses e holandeses. Trata-se de um espaço agora monumentalizado que fica na Cidade Velha, Ilha de Santiago. 

   Esse comércio hediondo, que também teve práticas generalizadas, embora muito menos lucrativas, em quase todo o resto do mundo,  rendeu tanto à coroa imperial ibérica que o rei Felipe II de Espanha e I de Portugal pôde importar da Itália cargas e cargas do branquíssimo mármore de Carrara para construir, ao lado do hipermercado de negríssimos escravos, uma basílica espaventosa que agora está em ruinas, mas ainda recebe sem qualquer relutância os turistas estrangeiros, mostrando-lhes até os muitos lagartos e relas que se refugiam na sombra escassa que há entre os arbustos. 

   Na presente versão portuguesa, este atlas macabro, com tradução de Helder Gregués e chancela da Universidade de Lisboa, estão 189 mapas criados a partir de mais de 30 mil viagens de navios negreiros onde Portugal surge como um dos grandes protagonistas do crime, ao lado da Espanha e, mais tarde, também da Grã-Bretanha, da Holanda e da França, etc., todos “ligados â geografia”, ou seja, “à mistura e colisão de povos, culturas e imperativos económicos pela ganância, império, correntes oceânicas e desejo de converter os corpos  dos humanos em culturas comerciais”.

   Convenhamos que esta é uma forma um pouco arrevesada de trazer à baila o assunto, mas salta à vista que não lhe falta a razão.

   É pena faltar o ponto que localizaria Cabo Verde neste mapa, o sítio em que está escrito 1560 - 1866

segunda-feira, 11 de março de 2024

O desprezível governo PS ou as acrobacias do Costa

quarta-feira, 8 de julho de 2020


Foto de Garry Winogrand (1928-1984)

Como é do conhecimento comum, o PS é catapultado para o governo quando a direita tout court já não consegue governar e/ou quando é necessário aplicar medidas, geralmente medidas de fundo, de carácter estrutural e inevitavelmente impopulares, devido a sua ainda maior base social de apoio; em 2015, tratava-se também da própria sobrevivência do PS, cujo espectro de desaparecimento a breve prazo era anunciado pelo afundamento dos congéneres europeus. Foi graças ao apoio dos dois partidos ditos de “esquerda”, BE e PCP/PEV, que o PS formou governo, ganhou umas eleições legislativa e se mantém ainda no poder, para legislar a favor de Bruxelas e da burguesia nacional.

A recente aprovação do Orçamento Suplementar, com a abstenção activa do PSD, relembrando que o Bloco Central não morreu, apenas se mantém adormecido, assim como do BE e do PAN, mostra que o prazo de validade do governo e do próprio PS ainda não chegou ao fim. Mostra, por outro lado, que o voto contra do PCP não passa de uma habilidade para manter o seu eleitorado, enquanto por detrás do pano mantém o diálogo, ou seja, a colaboração e o apoio activo à política do PS. Ao mesmo tempo, os partidos da ultra-direita marcam o ponto “anti-sistema”, quanto muito anti-regime democracia burguesa, porque este Orçamento, como todos os outros, dá com as duas mãos aos patrões o que rouba com a mão esquerda aos trabalhadores; aqueles poderão ter achado que o bolo que lhes calha é ainda insuficiente, como verberou o chefe da CIP.

Costa, depois de se manifestar satisfeito com o resultado da votação, tem a desfaçatez, como já nos habituou, de afirmar que “este não é um momento para a austeridade”, como o aumento de mais de 100 mil desempregados, em menos de um ano e segundo números oficiais, ou os 1 milhão e 400 mil trabalhadores a receber dois terços do salário durante 4 meses, não seja já por si uma austeridade, e bem grande. O PS, no governo, teve a habilidade de manter a austeridade em banho-maria sem nunca ter acabado com ela, e por uma simples razão, é que não há outra solução para vencer a crise do capitalismo senão apertar a tarracha da exploração; a habilidade consistiu em manter a paz social enquanto as coisas corriam bem, senão seria a revolta de quem trabalha. Agora, com o agudizar da crise, o PS mostra o que sempre defendeu: o grande capital e, em particular, os bancos.

A forma que o governo PS-marca-Costa encontrou para resolver os problemas da TAP e da Efacec, um pouco à semelhança da que foi arranjada para o Novo Banco, mostra mais uma vez, e de forma indisfarçável, que a sua missão é encontrar meios de o capital nunca deixar de se rentabilizar, isto é, sejam sempre garantidos os lucros dos patrões. Na TAP, o Estado entra com os 1200 milhões de euros, com o despedimento de trabalhadores cujo número irá ultrapassar os 3 mil, contando com os que já foram dispensados pelo lay-off, aliás, o que tem sido uma prática habitual neste tipo de reestruturação das empresas; na Efacec, o Estado nacionaliza a parte pertencente a uma empresária cleptocrata (seria um escândalo se o não fizesse) para depois a entregar a outros capitalistas, não importando se são nacionais ou estrangeiros, desde que entrem com o dinheiro e entreguem discretamente a devida comissão a quem por parte do governo intermediou o negócio. Sérgios Monteiros há muitos! 

Tem sido sempre assim, seja em governos PSD ou em governos PS, privatização=corrupção.

O caminho correcto, de um ponto de vista dos interesses dos trabalhadores, dos das empresas em causa e do povo trabalhador português em geral, seria o da nacionalização, sem indemnização, porque os lucros arrecadados pelos accionistas privados para além de ilegítimos já foram mais que suficientes, e sob inteiro controlo dos trabalhadores. Quanto à transportadora aérea nacional, tudo se prepara para ser entregue, mais dia menos dia, à alemã Lufthansa, depois de ser limpa das rotas que dão prejuízo, incluindo as que têm início no Porto, o que tem arreliado a cacicagem do Norte que gostaria andar de avião à custa do Orçamento do Estado, e de outros custos considerados supérfluos, nomeadamente os referentes aos salários dos trabalhadores. Será tempo do governo considerar que o futuro está no transporte ferroviário, que será o transporte por excelência por toda a Eurásia, de mercadorias e de passageiros, por mais económico, seguro e menos poluidor. É tempo de se apostar numa rede ferroviária eficiente e de qualidade, quer interna, inter-regional e suburbana, quer externa, com ligação à Europa e de bitola europeia, para acabar com o constrangimento da bitola espanhola, e fazer com que a economia nacional deixe de ser um prolongamento da economia espanhola (foi interessante ouvir o Costa falar portunhol em Elvas enquanto o seu homólogo falava em castelhano).

O caminho de ferro é fundamental para o desenvolvimento económico de um país e em Portugal nos últimos trinta anos não se fez outra coisa senão destruir as linhas existentes, acabar com as composições, deixou de se investir na manutenção do que existia e muito menos na inovação e na modernização, o aumento dos casos de infectados pelo coronavírus, o aparecimento de novos surtos em Lisboa, é a expressão da falta de qualidade dos nossos transportes ferroviários, e também rodoviários. Estes últimos foram entregues a privados, nacionais e estrangeiros, permitindo o surgimento de novos ricos, como é o caso Humberto Pedrosa (Grupo Barraqueiro/Fertagus), cuja fortuna pessoal começou no tempo do cavaquismo e nunca deixou de aumentar à custa do Estado e durante os governos do PS; foi no governo de PS/Guterres que lhe foi entregue a concessão da exploração do Eixo Ferroviário Norte-Sul da Região de Lisboa por 30 anos. É nesta lógica que temos de ver a solução para a TAP e a contínua degradação do transporte ferroviário.

Ouvir dizer ao ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, que a solução encontrada para a TAP foi a melhor para o país ou que os transportes públicos não são uma das origens do aumento da propagação da covid-19 é ouvir um mentiroso, tal como a ministra da Saúde, que não passa de uma chica-esperta e incompetente e cuja continuação no cargo é já posta em causa pelo dirigente do PS e presidente da Câmara de Lisboa, que vê a coisa mal parada quanto ao turismo neste Verão; e que há muito aqui temos reivindicado a sua demissão, bem como da incompetente Graças Freitas. Mas, diga-se em abono da verdade, ouvir aquelas duas araras a debitar mentiras e atoardas não difere muito de ouvir um primeiro-ministro, em programa humorístico, conduzido pelo novel bobo da corte oficial, afirmar que os antibióticos curam viroses. Aliás, ouvir isto ou ouvir um Trump que a covid-19 se pode tratar com injecções de lixívia não haverá grande diferença, estamos perante duas pessoas ignorantes e muito pouco humildes.

Esta gente não consegue esconder a sua verdadeira natureza, pessoas arrogantes que desprezam o povo, e por vezes, quando se distraem e baixam a guarda, mostram o que na realidade são e o que as faz mover, como diz o povo, a boca foge-lhes para a verdade. Foi revoltante ouvir a uma directora geral da saúde, na habitual homilia diária, tratar os assistentes operacionais, profissionais de saúde insubstituíveis e sem os quais o SNS simplesmente pararia, por “AO's”; o mesmo desprezo, a mesma insanidade, se assistiu quanto às recomendações para a noite de S. João depois de esta ter já passado. Os assistentes operacionais na saúde não são doutores, não têm protagonismo político, são tratados como gente de segunda, exactamente como os trabalhadores que são obrigados todos os dias a utilizar transportes públicos sobrelotados para irem trabalhar em fábricas e empresas, sem condições mínimas de higiene e sem dispor do mais elementar equipamento de protecção. Assim se percebe que os últimos focos da pandemia ocorram em empresas ou nos próprios serviços da administração pública: Sonae/Continente, Pingo Doce, DHL, conserveira Gencoal, S.A em Vila do Conde, Câmara Municipal Lisboa. Só para citar os últimos casos em empresas, porque em lares da terceira idade, a saga do coronavírus continua, espalhando-se agora pelas creches, ou seja, em áreas de protecção social que foram entregues aos privados, cujo móbil é o lucro, pelo Estado/governos que se demitiu das suas responsabilidades e entendeu malbaratar o dinheiro do contribuinte.

Caso curioso, nem as empresas onde ocorreram os surtos foram fechadas pelas autoridades e nem a concentração de convidados na embaixada dos EUA em Lisboa, para comemorar o dia da independência, foi impedida de se realizar pela PSP, apesar de esta estar presente, ao contrário de outras concentrações em festas por parte de pessoas do povo; nem ninguém foi preso, como aconteceu com um elemento do povo em Casal de Cambra, no concelho de Sintra, tendo estado preso durante dois meses por alegadamente ter apedrejado a polícia. E com a agravante é que para a festa dos americanos foram convidados políticos, que tiveram a protecção da PSP; pelos vistos, aqui já não há perigo de contaminação. Ou como vivemos num país com dois pesos e duas medidas e como a repressão é somente para ser exercida sobre os trabalhadores. Patrões, capitalistas, agentes do imperialismo, políticos vendidos, polícias corruptos (“Forças de segurança lideram suspeitas de corrupção na administração central”, título dos jornais) são imunes ao vírus, impunes perante a justiça e livres da repressão do Estado.

O Costa é um habilidoso, gosta de acrobacias no circo, dá ao povo pouco pão e muito circo, mantém-se no poder porque conta com a colaboração de todos os partidos com o traseiro acomodado nos cadeirões de S. Bento, tem todos os órgãos de comunicação ao seu serviço, mas não conseguirá levar a mentira e a prestidigitação por tempo indefinido, tudo tem um fim. E quando os trabalhadores se encontrarem numa situação sem saída à vista, o que forçosamente acontecerá com o agravamento da crise a breve trecho (PIB a encolher mais de 7% no final do ano, desemprego a disparar para o dobro em relação a 2019,dívida pública a ultrapassar os 135% do PIB), irão abrir os olhos, tomar consciência e seguir o caminho da emancipação. A velha toupeira é incansável no seu trabalho e, enquanto isso, sair do euro e da União Europeia não é apenas uma simples reivindicação, é uma necessidade para evitar o desastre e o suicídio colectivo.

Postado por O BÁRBARO às 14:22 
https://cronicasdobarbaro.blogspot.com/2020/07/o-desprezivel-governo-ps-ou-as.html

Banqueiros, governo psd/cds e fascismo



 
quarta-feira, 5 de julho de 2023


Quando dava o fanico a Cavaco, o BES já em falência e o governo aumentava a austeridade e a repressão, se previa o desaparecimento do CDS, a vitória do PSD sem maioria e a possibilidade do PS ir para o governo e mais tarde a necessidade de maioria absoluta. Estávamos em 2014

Banqueiros e governo almejam o fascismo

Foi o presidente do BPI, como tem sido habitual em situações semelhantes, um dos primeiros a vituperar a decisão dos juízes do Tribunal Constitucional em chumbar as normas ilegais da Lei do Orçamento de Estado que levaram aos cortes dos salários dos trabalhadores da função pública, utilizando argumentos falaciosos, em sentido análogo ao dos governantes e dirigentes do psd, querendo justificar os interesses da classe dos banqueiros a todo o custo. Custo da política de austeridade que continua e irá redobrar no horizonte mais próximo, certo e sabido até 2019 (é o incontornável governador do Banco de Portugal que o afirma, mais uma vez bota palavra), e assacado ao povo português.

Conta que irá agravar-se, nem que seja por razões “nacionais”, por exemplo, o banco do regime, o também inconfundível BES, desvenda mais um pouco o buraco em que se encontra: o BES Angola apresenta um rombo de 5,7 mil milhões de dólares, resultante de empréstimos concedidos a altas figuras do regime corrupto daquele país, mas que a gerência diz não saber bem onde foi parar o dinheiro, numa demonstração clara de impunidade e de confiança de quem alguém (o povo português e possivelmente o povo angolano) irá pagar o desfalque.

O fascismo é o governo exercido pelos banqueiros

Nunca se tinha visto banqueiros e governadores do BdP, para além dos habituais economistas, ex-ministros e outros comentadores/paineleiros, a botar faladura com tanta frequência e prosápia sobre política e, principalmente, sobre as contrariedades governativas. Os argumentos são mais que falaciosos, são demagógicos, mentirosos, deliberadamente confusos e enganadores para a opinião pública.

Argumentar que o TC está a imiscuir-se na actividade legislativa e que “assuntos económicos” não são da sua competência, e vão para além da questão jurídica, é dizer, através de uma fraseologia pretensamente técnica, que vale tudo, que o Parlamento, nas mãos do executivo, pode decidir a bel-prazer, ou seja, se pode governar em ditadura, desta vez sem fechar o Parlamento como já aconteceu em outros períodos de profunda crise política da história do povo português, estamos lembrados da ditadura de João Franco, em véspera do regicídio e do imediato fenecimento da monarquia.

Não há dúvidas de que os banqueiros controlam abertamente o governo, sem intermediários e disfarces, só falta serem eles os ministros, como acontece na actual fascista Ucrânia em que os principias governantes, desde o Presidente da República recentemente eleito em eleições fantoches aos governadores das regiões, são os indivíduos mais ricos do país, enriquecidos, diga-se de passagem, pelo saque das empresas públicas que foram “vendidas” dez vezes mais baixo que o seu real valor.

E se há partidos e gente que faz o frete não será somente por serem corruptos e de estarem à espera de boa recompensa em lugares de conforto nos conselhos de administração dos bancos e de outras empresas que enriqueceram à custa dos negócios com o estado, mas porque a nossa burguesia e os partidos que a servem fizeram profissão de fé aliarem-se ao grande capital financeiro europeu, com o alemão em posição dominante, com o duplo objectivo de sobreviverem e de sobre-explorarem os trabalhadores e o povo português.

Os fanicos do senhor Silva




Enquanto o povo caminha a passos largos para a miséria e o país para bancarrota, sendo indisfarçável a necessidade de um segundo resgate e daí o preparar da opinião pública para tal, ao PR senhor Silva dá-lhe o fanico em situação de contestação pública e em dia de comemoração da “raça”, e ao PS, o “principal partido da oposição”, dá-lhe a guerra intestina pela disputa do pote e para salvação do regime e dos banqueiros e capitalismo nacionais.

O fanico do senhor Silva, ao que consta é o terceiro (e não o segundo, o primeiro foi quando os estudantes uma vez irromperam pelo gabinete quando era professor) desde que se meteu na política, vale pelo simbolismo, ele é também a falência do governo psd-cds e do próprio regime de democracia de opereta. Os espasmos vagais são resultantes não de uma hipotética doença de Alzheimer, como alguém quer fazer crer, mas próprios de personalidades histriónicas que não admitem a contrariedade nem a frustração, são expressão de um mau carácter, de quem deseja e prepara o fascismo; que bem pode vir pela mão de um ps, com ou sem o Costa.

Porque a revolta do povo a isso obrigará, fazendo com que a burguesia adopte formas de governo mais musculadas que, por sua vez, irão precipitar e provar sem margem para dúvidas que a única alternativa que os trabalhadores têm para a saída da crise do capitalismo é o socialismo.

Enquanto se adensam no horizonte próximo as nuvens da austeridade levada a expoente máximo, o tal de “principal partido da oposição” desintegra-se em disputas internas em vez de envidar todos os esforços e recursos para o derrube do governo fascista psd/cds. Contudo a verdadeira natureza das pretensas divergências internas torna-se clara e evidente: não se pretende um ps com uma direcção forte para fazer inverter a 180 graus a política defendida e aplicada pelo psd/cds, mas para impor a mesma política em grau redobrado.

O PS como tábua de salvação do capitalismo

Não será um ps sem maioria absoluta, e com a impossibilidade de se aliar mais uma vez com o cds, que irá ser reduzido à sua expressão mais simples em termos eleitorais, que conseguirá colocar em prática as medidas económicas que mantenham ou venham mesmo aumentar a exploração do povo português para salvação do capitalismo nacional e para benefício dos lucros e da concentração do grande capital financeiro europeu e internacional (norte-americano, mais precisamente, via FMI).

O partido que foi fundado pelos herdeiros da I República e com os marcos da social-democracia alemã será ainda o único capaz de trazer de novo o apoio da dita “classe média” causticada pela política de austeridade do governo ainda em funções a uma política de pretensa “salvação nacional”, mas para tal precisará de maioria absoluta. O resultado das eleições europeias revelaram que não só o ps não consegue formar governo sozinho, como o cds irá desaparecer do mapa, como o psd também pode ganhar as eleições mas também sem maioria e sem possibilidade de repetir a aliança com o actual parceiro, e que só duas saídas estarão disponíveis: ou a aliança de ps com psd, tão de agrado do senhor Silva e de alguns altos dirigentes do ps, ou ps terá de criar uma maioria que não sabemos como conseguirá atendendo a que o povo português, apesar de ser acusado frequentemente de amnésia, ainda está bem recordado do que foi o governo ps/engº Sócrates.

Caso o Costa de Lisboa alcance o poder dentro do partido e venha a ser o primeiro ministro de Portugal a seguir a 2015, e as eleições terão que ser realizadas na data prevista para que haja tempo para o assalto ao castelo, daí o ps nunca se ter empenhado em derrubar o governo, virá a revelar-se um “filho da puta” (estamos a falar em termos políticos, como é óbvio) muito parecido senão pior que o dito “engenheiro Sócrates”. Ele igualmente bom para ir buscar o fascismo, pese o rótulo de “democrata” colado pela extrema-esquerda, ansiosa de também aceder à gamela do orçamento e do aparelho da administração burguesa.

São mais que numerosos os sinais enviados pelo psd/cds e seus amos banqueiros para o regresso do fascismo em Portugal e em curto prazo de tempo. O senhor Silva não enviou a Lei do Orçamento para o Tribunal Constitucional porque os pareceres que lhe apresentaram não detectaram qualquer inconstitucionalidade e o senhor Coelho depois do chumbo do TC quer mudar os critérios de nomeação dos juízes daquela instituição apesar de dos 13 juízes 10 serem de nomeação partidária. É o oitavo chumbo do TC, os dirigentes dos psd e cds eriçam-se porque não podem cumprir a tarefa de transferência da riqueza do trabalho para o capital sem obstáculos, querem tomar as medidas que bem entendem, fazendo do Parlamento, o órgão por excelência e símbolo da democracia dos cravos, um simples ornamento.

O fascismo é sempre bem-amado pela elite

Querem o fascismo, a acumulação do capital não se compraz com democracias quando se tornam um estorvo, estas servem só na justa medida em que permitem uma mais fácil ilusão dos trabalhadores a fim de se deixaram explorar mais docilmente. Quando isto começa a deixar de resultar, então o mais prático e rápido é o fascismo; a Ucrânia é neste momento a melhor prova desta mudança de actuação do grande capital. E a exemplo do que se passa na União Europeia, onde os órgãos eleitos mais não passam de decoração de um regime autoritário onde tudo o que é essencial é decidido em órgãos não eleitos. Razão que justifica em grande medida a enorme abstenção nas eleições do passado dia 25 de Maio.

E a par da abstenção assistiu-se à subida dos partidos da extrema-direita e dos ditos eurocéticos, em geral, que, no dizer de certa esquerda nacional (resistir.info) até apresentou “propostas perfeitamente razoáveis, corajosas e até meritórias”, ou seja, o caminho a seguir será o da “saída do euro, defesa da indústria nacional, ruptura com a globalização e a independência”, tout court. 

Em suma, entre a extrema-direita e a esquerda que ainda se arvora oficialmente do comunismo, como é no caso presente, não há diferença de monta, depois não venham queixar-se da ascensão eleitoral dos partidos da extrema-direita e a quebra (ou inútil ténue subida) dos PC's ortodoxos de ex-tendência soviética, já para não falar do quase desaparecimento de BE's (o grego Syriza será a excepção, porque ocupando o lugar do Pasok). Esta gente, e não terá sido só o ps, meteu o socialismo na gaveta, e pior ainda, enfiaram o socialismo e o comunismo em cova bem funda, ficando-se pela social-democracia, o quer dizer, o aperfeiçoamento e regulação do capitalismo, de preferência, um capitalismo com cor nacional; que é onde conduzem as medidas avançadas por um FN da família le Pen.

O caminho é o socialismo/comunismo

Quando o capitalismo se encontra na sua fase última de vida, em estertor que, e apesar e por isso mesmo, pode ser demorado e doloroso para o mundo do trabalho, esta gente não aponta abertamente para uma solução socialista, porque presas aos medos e complexos da classe de onde provém a maioria dos dirigentes destes partidos, a classe média, melhor dizendo, a pequena-burguesia que tem mais medo do comunismo que do fascismo. Querem pôr a roda da história a andar para trás, depois não venham queixar-se do regresso do fascismo ou de soluções populistas, do género Marinho e Pinto, que a prazo conduzem ao mesmo.

O caminho é o do socialismo/comunismo e não das pretensas “democracias do século XXI” ou das “revoluções democratas e patrióticas” chinesas, como se a situação na Europa meridional e periférica (PIIGS) fosse ainda semelhante à que existia no mundo não industrializado da primeira metade do século passado. Neste mundo globalizado capitalista a alternativa é o socialismo/comunismo, não há etapas intermédias, estas servem para empatar e dar mais fôlego à burguesia e prolongar o capitalismo. Cada vez mais se sente a necessidade de uma alternativa socialista e revolucionária, ou seja, o comunismo.

15 Junho 2014

www.osbarbaros.org

Postado por O BÁRBARO às 14:53 
https://cronicasdobarbaro.blogspot.com/2023/07/banqueiros-governo-psdcds-e-fascismo.html

A Economia em estado comatoso, o fascismo brando e o PS em fim de linha

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

 

cartoon de João Abel Manta 

O alarme, o medo, o estado de emergência, com a mentira e a manipulação pelo meio, têm sido a estratégia do governo PS/Costa neste segundo mandato para impôr uma segunda vaga de austeridade, agora em dose maciça. Para atingir o objectivo há que amedrontar o povo e os trabalhadores e atirar com a responsabilidade para uma falsa pandemia, por sua vez, amplificada por uma imprensa subserviente, paga por muitos milhões de euros através de contratos de publicidade institucional e que agora, em final de Novembro, serão renovados, para continuar a propagar a mentira e induzir o medo. A declaração de estado de emergência, com o apoio servil da Assembleia da República, cada vez mais secundarizada para o papel de caixa de ressonância do executivo, e sob o alto patrocínio do PR Marcelo, que em segundo mandato irá mostrar os dentes, tal como o faz presentemente o Costa, e a explicitação em reunião extraordinária de ministros das medidas concretas que enformam a situação de suspensão de algumas liberdade e direitos dos cidadãos foram antecedidas, acompanhadas e seguidas por números manipulados e até falsos com um único fito de lançar o pânico e levar à aceitação de uma inevitabilidade, como se a vida de cada português estivesse em causa com uma virose que não mata mais do que qualquer outra patologia de causa infecto-contagiosa já existente em Portugal.

Os números apresentados são para isso mesmo, para aterrorizar, os títulos da imprensa o dizem: “Nunca em Portugal se registaram tantos casos em 24 horas: mais 5.550 infetados, a maioria no Norte (3.006)“ (DN, 06), “Pico de 6500 casos por dia de covid-19 esperado para o fim de Novembro” (JN, 07), “COVID-19: Portugal com novo recorde de óbitos. Mais 63 mortes e 4.096 infetados em 24 horas” (DN, 09), “Portugal ultrapassa as 3 mil mortes, com mais 62 nas últimas 24 horas” (DN,11), contudo a imprensa passa ao de leve ou não fala de todo que se em Março se começou a testar 800 pessoas se passou em Novembro (dia 05) a testar mais de 40 mil por dia, o que prova que a letalidade é pequena (1,7%), mas o medo devido ao matraquear constante dos números fica. Números que afinal até serão falsos, como denunciam os 12 investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto em estudo publicado que aponta que os dados do Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SINAVE) que têm sido fornecidas à comunidade científica, nos últimos meses, sobre os casos de Covid-19, “têm uma qualidade baixa, erros, inconsistências e muita informação em falta”, onde são encontrados “casos de um doente com 134 anos e três homens classificados como 'grávidos', bem como 19 doentes que supostamente teriam tido a doença antes do primeiro caso que se sabe que foi diagnosticado em Portugal”, colocando por terra a fiabilidade de todos os dados. O governo pode mentir uma vez e mais vezes, mas não conseguirá mentir sempre de molde a continuar com a intimidação, os factos são a contraprova da mentira e o povo mais cedo ou mais tarde abrirá os olhos e enviará o PS para o sítio onde já deveria estar, a história do lixo político.

A economia nacional encontra-se em estado comatoso

Por que é que o governo do Costa e do PS se encarniça na mentira e decretou o estado de emergência, não foi para “controlar e reprimir a pandemia” ou “apoiar os profissionais de saúde”, como Costa não se cansa de afirmar? Por uma simples razão, é que a economia nacional se encontra em estado comatoso, se em 2010 eram os bancos que se encontravam à beira da falência, agora são as empresas em geral que vêem os lucros a estagnar, muitas delas estão descapitalizadas e com o mercado a não conseguir consumir o excesso de produção do capitalismo devido à diminuição dos rendimentos dos trabalhadores – uma das contradições do capitalismo. As medidas que irão ser aplicadas daqui para frente, na continuidades das que foram no quadro do primeiro estado de emergência, serão para salvar as grandes empresas, os grandes capitalistas e patrões, não os pequenos e mesmo médios, como diz Costa: “"as medidas... não são alternativas ao layoff, somam-se ao layoff", reforçando que "o layoff continua a existir, quer o geral como a medida de apoio à retoma que substituiu o layoff simplificado", e já foram 1.550 milhões de euros, para além da “bazuca” que já está a caminho, são 750 milhões em subsídios a fundo perdido para as ditas “micro e pequenas empresas” que apresentem uma quebra de facturação de pelo menos 25% nos primeiros nove meses deste ano. Ora, iremos ver muitas empresas a apresentar subfacturação sem necessitar de ajudas e outras já com a corda ao pescoço a falirem inapelavelmente. Costa não acredita que seja possível "impedir a insolvência de todas as empresas" e assim estaria a pensar, já depois do estado de emergência em vigor e com o seu ar de hipócrita crónico, nas medidas mais adequadas, que irão sobretudo para os grandes hoteleiros e cadeias de restauração... um dia destes quem quiser tomar uma refeição pouco mais terá para além de um McDonald's ou de um Burger King e em centros comerciais. O pequeno comércio de rua terá desaparecido por força da prisão domiciliária dos portugueses , e em especial aos fins de semana!

Não será só o pequeno comércio ligado ao turismo, mas serão todas as pequenas e empresas que terão de fechar, no processo pandémica acelerado da concentração do capital, e é entidade insuspeita, agência Moody's, que o revela de forma insofismável: “Portugal é dos países que poderá ter maior destruição económica”. E em função disso, e não só, será um dos países que terá mais dificuldade em sair da crise económica e se alguma vez o conseguir fazer, porque economia dependente e subsidiária dentro da UE, onde faz 70% das suas trocas comerciais. E, mais importante ainda, a dívida pública que irá subir para os 135,1% do PIB, segundo perspectiva da Comissão Europeia, acima dos 134,8% previstos pelo Governo no OE 2021 – uma dívida cada vez mais impagável. E não será apenas Portugal, como todos os países do sul, Grécia e Itália, a que se pode acrescentar Espanha, com a maior quebra do PIB neste momento, devido ao grande número de pequenas empresas e, por essa razão, “de reduzida dimensão, possuem menores alternativas de financiamento e menores horizontes”. Uma perspectiva de uma situação que, segundo o relatório “Perpectivas Mundiais dos Soberanos (estados)”, que se irá estender por 12 a 18 meses. Será ainda mais grave no nosso país porque não há indústria nem o país se poderá reindustrializar no quadro da União Europeia, como a emigração, escape para a mão-de-obra excedentária, se encontra bloqueada na justa medida em que os países mais ricos e industriais, Alemanha e França, ou tradicionais destinos da emigração portuguesa, se encontram igualmente em crise (o Reino Unido já não faz parte da UE) e as suas necessidades de mão-de-obra barata e dócil já foram supridas pela imigração de refugiados.

Daqui para a frente será mais desemprego e mais miséria sem que o sistema económico consiga dar solução, já que a reorganização e possível recuperação do capitalismo será sempre com menos mão-de-obra e salários mais baixos, a robotização anunciada, tal como a introdução da máquina a vapor nos primórdios do capitalismo, será feita com mais desemprego (espera-se que um robot faça o trabalho de pelo menos três trabalhadores) e miséria para os trabalhadores, agora para todos e não apenas para os operários, daí a proletarização da pequena-burguesia que vai dando terreno para o medrar dos populismos e da extrema-direita. E os números não metem: a diferença do rendimento médio bruto por agregado entre aquele com maior rendimento (IRS) e o com menor rendimento era, em 2011, de 171 vezes, em 2015 de 174 vezes e, em 2018, era já de 182 vezes; no 4º trimestre de 2019 havia 522.300 desempregados, no 3º trimestre de 2020 são já 655.100, sendo o desemprego é a causa mais importante da pobreza no país; antes da pandemia, 47,5% dos desempregados estavam no limiar da pobreza e a maioria dos desempregados não recebe o subsídio de desemprego porque a lei os exclui; no fim do 3º trimestre de 2020, o teletrabalho já abrangia 681.900 trabalhadores, segundo o INE, e a partir da imposição do segundo estado de emergência com a sua obrigatoriedade, irá disparar, o que significa menos rendimentos para os trabalhadores e mais lucros para os patrões. A pandemia traz mais pobreza e miséria enquanto permite aos ricos ficarem cada vez mais ricos.

A pandemia do medo como distracção

A pandemia do medo tem outra finalidade, além do resultado de justificar a miséria, o de distrair os trabalhadores e o povo de assuntos que neste momento são questões de primordial importância para a sobrevivência de quem trabalha e produz, como é a discussão e aprovação do Orçamento de Estado para 2021. Em artigo anterior já denunciáramos o facto da disputa entre as diversas cliques da classe dominante e outras clientelas dependentes dos dinheiros públicos era o pote não ser suficiente, para mais em tempo de vacas magras, e não é que, sem surpresa para nós, que o incontornável advogado dos negócios e ministro da Economia veio desabafar para a opinião pública que “Ninguém está satisfeito; à mesa do Orçamento, todos acham que é insuficiente aquilo que lhes toca". O homem, para além de verberar que “todos acham que é insuficiente aquilo que lhes toca”, deixa claro que “o Governo tem de gerir aquilo que tem” e será neste cuidado que o governo e o ministro não deixarão de dar às grandes empresas, onde se inclui a banca, o maior quinhão, abrangendo todos aqueles que à mama da pandemia vão enchendo os bolsos: 496 milhões de euros para testes, equipamentos e outros serviços.

Perante a pressão dos lóbis, foi dado como garantido pela ministra da Saúde, e já orçamentado, mais 35 milhões de euros para os hospitais privados pela ocupação de umas, por enquanto, largas centenas de camas para doentes não só covid-19, como para de outras patologias, tendo ordenado o fecho, alegando caso de necessidade, dos serviços do SNS no atendimento dos casos não covid-19, o que irá engrossar as listas já de si enormes para cirurgias, consultas, exames complementares de diagnóstico e outros cuidados de saúde, incluindo os de enfermagem. Não deixa de ser curioso assistir ao perorar de um Marques Mendes, o conhecido recadeiro de Marcelo, na televisão do sócio nº1 do PSD, contra as dificuldade do SNS, já que o homenzinho é responsável máximo de um dos mais importantes grupos económicos privados da saúde, a Lenitudes! No entanto, os cuidados prestados no privado não serão de qualidade e haverá sempre o risco de o sector também estourar como o público, porque a maior parte dos enfermeiros e médicos que ali trabalham ser constituída por funcionários públicos que acumulam os dois lados. É todo o SNS que está a ser degradado e sem haver uma resposta de qualidade e à altura por parte do sector privado ou social, estando aí outros casos a comprová-lo: "desde 29 de outubro foram detetados 64 casos de legionella no norte do país", com 6 mortes, não se conhecendo exactamente qual a fonte do contágio. Outros casos surgirão, o concentrar de meios no pretenso combate à pandemia irá fazer com que outras patologias atinjam números que não existiam até agora, estando aí o número de mortes a mais para o atestar.

A pandemia como meio para endurecer as medidas de controlo e de repressão dos trabalhadores

A pandemia é, a par do espantalho do terrorismo, um bom pretexto para endurecer as medidas de controlo e de repressão dos trabalhadores e do cidadão em geral, é com o recolher obrigatório, ainda circunscrito a 121 concelhos em Portugal, mas que facilmente se prevê que será estendido a todo o território continental, visto que o número de infectados aumentará em proporção ao número de testes diários e de mortes, que poderão atingir as 100 por dia, e não será preciso ser matemático para ver isto, já que não se está a proteger os grupos mais vulneráveis, idosos e doentes crónicos que agora vêm as portas do SNS a fechar, e se testa inclusivamente os mortos suspeitos de terem tido contacto com alguém com teste positivo apesar de não sintomático, chegando-se ao cúmulo de se considerar “paciente assintomático” as pessoas saudáveis.

Mais liberdades, direitos e garantias reprimidas pelo governo a nível interno e mais limitação de entrada de imigrantes é a política que vai prevalecer em todos os estados da UE, e as medidas estão aí a começar por alguns países: o presidente francês Macron anunciou reforço de patrulhas fronteiriças e quer reforma de Schengen e o chefe da diplomacia italiana, Luigi Di Maio, propôs um `Patriot Act` europeu, semelhante à lei antiterrorista nos EUA. Qualquer indivíduo pode ser detido por tempo indeterminado desde que acusado de “terrorismo”, sabendo nós que estes grupos de mercenários foram criados pelos países do Ocidente para fazerem o trabalho sujo das suas forças armadas, como ficou bem provado na Síria. Como se acaba com a democracia, sob pretexto de se querer defender a vida dos cidadãos a nível da saúde e da segurança física! Costa já o afirmou, o estado de emergência poderá ir até ao fim da pandemia, e a Ordem dos Médicos concorda com o estado de emergência. Os portugueses ficarão em prisão domiciliária até quando calhar!

A par da repressão pelo cacete, a repressão sobre aqueles que pensam diferente, independentemente de ser por boas ou más razões, há muito, ainda antes da pandemia, se faz sentir: são os facebook ou twitter que fazem censura sobre as opiniões politicamente incorrectas, estejam mais à esquerda ou mais à direita, ou os artigos de opinião pagos a milhares de euros para descredibilizar quem contesta os dados e o discurso apresentados pelo governo, taxando de nagacionistas e de ignorantes e de outros impropérios mais violentos os que desalinham, ou são as televisões do império que cortam a palavra ao candidato que se pretende derrotado. O dito quarto poder cada vez com mais força para controlar a mente e o comportamento dos cidadãos. São as televisões que anunciam oficialmente o candidato vitorioso, ainda antes da instituição do estado que tem essa missão, são as televisões que vendem um candidato Marcelo que ganha sem precisar de fazer campanha no tempo próprio, são as televisões que lançam o impedimento de presidentes democraticamente eleitos quando deixam de ser convenientes para o sistema, são as televisões que amplificam os números deturpados da DGS, são as televisões de difundam o medo e criam o alarmismo, são as televisões que promovem a bufaria, sendo frequente ver pessoas na rua a olhar desconfiadas para outras que não usam a máscara, ou a telefonar para a polícia porque há um grupo de jovens em alegre farra em casa ou em bar já fora de horas. As televisões, nas mãos de grandes grupos económicos financiados com dinheiros públicos ou públicas dirigidas por ex-deputados e dirigentes do partido da oposição são os olhos do Big Brother. Em Dezembro irão receber outros 15 milhões de euros.

A democracia parlamentar burguesa está suspensa e dará lugar ao fascismo brando

É toda uma política económica de impôr a austeridade sobre os trabalhadores, uma política de repressão e de silenciamento, atentatória dos mais elementares direitos individuais, sobre o povo em geral, políticas impostas por um governo, cingindo-nos agora ao nosso país, por um governo que se diz de esquerda e que fará com que o próximo governo seja um governo aberta e formalmente de direita, aproveitando demagogicamente de uma política que facilmente terá sido identificada de “esquerda”, na medida em que foi aplicada por um governo também dito de “esquerda” e apoiado por toda a esquerda bem comportada do regime, pese toda a desculpabilização pela pandemia. Ninguém se admire que este governo PS/Costa não chegue ao fim de mandato por diversas razões, porque a mentira não dura sempre e Costa será escorraçado pela falsidade e pelo agravamento inaudito das condições de vida do povo português e porque Marcelo já em segundo mandato fará a este governo bem pior que o seu antecessor fez ao governo Sócrates/PS e não descansará de pôr na governação o seu partido e mais uns acrescentos. A democracia parlamentar burguesa está suspensa, dará lugar ao fascismo brando, porque o capitalismo se encontra falido.

Os resultados das eleições para a Assembleia Regional dos Açores marcam o princípio do fim de linha do PS,

porque já deixaram indício do que poderá acontecer no Continente, quando a miséria aqui igualar a miséria no arquipélago, esta agora ainda a vários pontos acima no que concerne a privação material severa, beneficiários do RSI e taxa de desemprego, será uma geringonça de direita, com o ainda principal partido da burguesia nacional a aliar-se com a extrema-direita; extrema-direita essa que apenas teve o trabalho de se mostrar porque sempre esteve lá dentro, desde que o PPD foi fundado. E ninguém se admire com a participação do partido de extrema-direita no governo, que irá sendo entretanto normalizado, quer pelo PR Marcelo quer por toda a imprensa de referência, com o seu dirigente-comentador-desportivo-televisivo a sobraçar alguma pasta mais importante, género Administração Interna ou Defesa. Se isto vier a acontecer, a exemplo do que está a suceder por essa Europa fora, devemos agradecer a um PS, com a sua política de direita a destruir a sua base de apoio, e aos partidos de dita “esquerda”, BE, ansioso em ir para o governo, e PCP, com as suas oportunistas abstenções e votos contras a pensar no próximo acto eleitoral, aplanaram o caminho para o fascismo - como já aconteceu no passado. De nada valerão as lágrimas de crocodilo dos falsos democratas nem os abaixo-assinados-cordões-sanitários... porque é da sobrevivência do capitalismo, e da burguesia, que se trata.

À medida que os campos se extremam, a luta de classes se intensifica, a revolução comunista surge como iminente e necessária.

Postado por O BÁRBARO às 10:42 
https://cronicasdobarbaro.blogspot.com/2020/11/a-economia-em-estado-comatoso-o.html? 

domingo, 10 de março de 2024

A economia e os efeitos na pobreza


Gaza-Poverty  Independent Press

 
“Ás vezes falamos da fome no mundo como se fosse um flagelo que todos nós queremos ver abolido, considerando-a comparável à peste ou à sida. Mas esta visão ingénua impede-nos de compreender o que causa e mantém a fome. A fome tem um grande valor positivo para muitas pessoas. De facto, é fundamental para o funcionamento da economia mundial. As pessoas com fome são as mais produtivas, especialmente quando há necessidade de trabalho manual. (...) Grande parte da literatura sobre a fome fala da importância de assegurar que as pessoas sejam bem alimentadas para que possam ser mais produtivas. Isso é um disparate. Ninguém trabalha mais do que as pessoas com fome. Sim, as pessoas bem nutridas têm maior capacidade para a atividade física produtiva, mas as pessoas bem nutridas estão muito menos dispostas a fazer esse trabalho. (...) Para os que se encontram no topo da escala social, acabar com a fome a nível mundial seria uma catástrofe. Se não houvesse fome no mundo, quem é que iria lavrar os campos? Quem colheria os nossos legumes? Quem trabalharia nas fábricas de transformação de subprodutos? Quem limparia as nossas casas de banho? Teríamos de produzir os nossos próprios alimentos e limpar as nossas casas de banho. Não é de admirar que as pessoas de topo não se apressem a resolver o problema da fome. Para muitos de nós, a fome não é um problema, mas um trunfo.” George Kent, Os benefícios da fome no mundo – UN Chronicle 28nov2021.


“Algumas observações sobre a construção, pelo Presidente Biden, de um "cais temporário" para fazer chegar a ajuda a Gaza. 1. Biden está a violar o bloqueio de 17 anos de Israel a Gaza com este plano. Gaza não tem um porto marítimo, nem um aeroporto, porque Israel, o seu ocupante, há muito que a proibiu de os ter. Israel proibiu a entrada em Gaza de tudo o que não passasse pelos pontos de passagem terrestres que controla. Israel impediu, muitas vezes de forma violenta, que as frotas de ajuda internacional chegassem a Gaza para trazer medicamentos. O bloqueio também criou um mercado cativo para os produtos de má qualidade de Israel, como a fruta e os legumes estragados, e permitiu que Israel desviasse dinheiro nas passagens terrestres que deveria ter ido para os palestinianos em taxas e impostos. 2. Com o seu cais, Biden não está a inverter essa conivência de longa data com um crime contra a humanidade. Ele sublinhou que será temporário. Depois disso, Gaza voltará a funcionar como sempre: as crianças que sobreviverem voltarão a morrer de fome em câmara lenta, a um ritmo que não será registado pelos media e que pressionará Washington para que se veja que está a fazer alguma coisa. 3. Biden poderia fazer chegar a ajuda a Gaza muito mais depressa do que construindo um cais, se quisesse. Poderia simplesmente insistir para que Israel deixasse passar os camiões de ajuda pelos pontos de passagem terrestres e ameaçá-lo com graves repercussões caso não cumprisse. Poderia ameaçar reter as bombas americanas que está a enviar para matar mais crianças em Gaza. Ou pode ameaçar cortar os milhares de milhões de dólares de ajuda militar que Washington envia todos os anos para Israel. Ou pode ameaçar recusar o veto dos EUA para proteger Israel das consequências diplomáticas nas Nações Unidas. Podia fazer tudo isto e muito mais, mas opta por não o fazer. 4. Mesmo depois de Biden comprar a Israel mais algumas semanas para continuar a matar agressivamente à fome os palestinianos em Gaza, enquanto esperamos que o seu cais temporário esteja concluído, na prática, nada poderá mudar. Israel continuará a efetuar os mesmos controlos que faz atualmente nos pontos de passagem terrestres, mas em Lanarca, Chipre, onde a ajuda será carregada nos navios. Por outras palavras, Israel continuará a poder criar os mesmos intermináveis bloqueios, utilizando como pretexto "preocupações de segurança". 5. Biden não está a mudar de rumo - temporariamente - porque de repente se preocupa com as pessoas, ou mesmo com as crianças, de Gaza. Há décadas que sofrem na sua prisão ao ar livre, em diferentes graus. Se ele se preocupasse, teria feito alguma coisa para acabar com esse sofrimento depois de se tornar presidente. Se tivesse feito alguma coisa nessa altura, o dia 7 de outubro poderia nunca ter acontecido e todas as vidas perdidas de ambos os lados - vidas que continuam a ser perdidas do lado palestiniano a cada poucos minutos - poderiam ter sido salvas. E se ele realmente se importasse, não teria ajudado Israel nos seus esforços para destruir a UNRWA, a agência das Nações Unidas de assistência aos palestinianos e uma tábua de salvação vital para Gaza, congelando o seu financiamento, com base em alegações não comprovadas de Israel contra a agência.” JONATHAN COOK, Substack.

Posted by OLima at domingo, março 10, 2024 
https://onda7.blogspot.com/2024/03/bico-calado_01998493720.html

António Guerreiro – As sondagens: modo de usar

 CRÓNICA ACÇÃO PARALELA

* António Guerreiro

 7 de Março de 2024 

 

A política-espectáculo cresce à medida que diminui o poder político que se exerce no interior de um Estado que é cada vez menos soberano.

 

Um dos slogans inventados no Maio de 68, às vezes recordado como uma peça de arqueologia revolucionária, como muitos outros surgidos nesse tempo, desdenhava alegremente do acto essencial da afirmação da democracia: “Élections, piège à cons”. Traduzido em português nunca funcionaria porque perde a rima e o ritmo prosódico: “Eleições, armadilha para imbecis”.

 

Actualmente, não existe no espectro político nenhum extremo que ouse pôr em causa o formalismo democrático do voto. “Porquê votar?” não é pergunta que hoje se faça publicamente e com um alcance político programático. Em contrapartida, tem aumentado incessantemente os que se interrogam – “Em quem votar?” – até ao momento de colocar a cruz no boletim e os que, incapazes de decidir, engrossam as fileiras dos abstencionistas.

 

Os “indecisos” tornaram-se uma categoria decisiva. Por isso é que as sondagens, outrora tão fiáveis, se tornaram um deficiente instrumento de medição do resultado final. Podemos pressentir que se deu um fenómeno de inversão ou de reversibilidade: as sondagens, que dantes calculavam com precisão as intenções de voto sem interferir nelas de maneira significativa, tornaram-se um elemento que determina, em última instância, a escolha do eleitor. O eleitor informado toma as sondagens para calcular o sentido do seu voto.

 

Evidentemente, isso deu-se à medida que se multiplicaram as sondagens pré-eleitorais e que os cidadãos aprenderam a lê-las e a avaliá-las na sua dimensão performativa, isto é, enquanto acção pragmática. Mas tal aconteceu porque aumentou o voto estratégico que oscila em função das configurações da paisagem eleitoral, das posições dos partidos nos rankings. Isto significa que as sondagens, através deste processo de retroacção, entram ilegitimamente no jogo eleitoral? Se elas, afinal, são um instrumento do cálculo do eleitor e não a sua instrumentalização, então não devemos tirar essa conclusão. O problema está noutro lado: na modalidade do discurso político que engendrou este cidadão-termostato cuja acção é profundamente uma reacção.

 

Vivemos colectivamente (refiro-me ao espaço público mediático), durante estas últimas semanas, sob o primado da política dos políticos e da política dos media. A cena política, em momentos como este, transforma-se numa arena onde cada um exibe uma virtual potência de decisão em todos os domínios da sociedade. Sabemos, no entanto, que tanta vontade e preparação para fazer mil e uma coisas não passa de tagarelice por várias razões: porque quem chega ao poder governamental tem de se conformar com uma fraca soberania, só pode agir respeitando os poderes formais e informais das instituições europeias, das contingências internacionais do mundo globalizado (as guerras, as crises económicas, os ditames da grande finança mundial, etc.); porque a classe política, por mais que tenha a seu cargo a acção administrativa e gestionária, não consegue realizar o que propõe nos seus discursos porque se confronta com o condicionamento dos poderes burocráticos.


Há uma regra que não devemos esquecer: a política-espectáculo cresce à medida que diminui o poder político que se exerce no interior de um Estado que é cada vez menos soberano.

 

Este discurso funciona sob o signo da infantilização. Por todo o lado a política é vista como uma vulgata para crianças retardadas. E as campanhas eleitorais não são mais do que um simulacro. Mas talvez esta seja uma condição benévola: muito pior seria que não se cumprissem os protocolos para salvar as aparências que asseguram, apesar de tudo, alguma estabilidade do sistema.

 

Seria, no entanto, muito interessante saber em que acreditam verdadeiramente os protagonistas políticos, quando já estão fora do jogo eleitoral. Ao contrário do que se passa noutros domínios de actividade, este é um campo onde raramente se pratica o metadiscurso, o desdobramento reflexivo: há um pathos de primeiro grau que sobrevive e se torna duro como pedra em quem ocupou cargos políticos de relevo. Entre nós, Cavaco Silva ilustra com uma rara intensidade expressiva esta persistência do discurso naïf de primeiro grau.

 

Livro de Recitações

“Travar a crise climática não está na mesa de voto

Slogan do movimento máximo

 

Entre as várias razões que tornam inadequado e até contraproducente alguns aspectos do discurso e da acção destes “activistas” (tratarei de analisar em breve esse discurso) está o uso da expressão “crise climática”.

 

É certo que ela chega até nós mediada por muitas instâncias e entrou na linguagem corrente. Mas quem assumiu a missão – louvável e grandiosa – de alertar a opinião pública para este problema e levar os poderes políticos e económicos a agir de modo a interromper uma desastrosa corrida tem de começar por rejeitar a linguagem que neste campo é acriticamente usada e transmitida: a metáfora da “crise”, que até na política e na economia tem muitas vezes um objectivo de ocultação, revela-se pouco certeira para designar as alterações climáticas. As crises são momentos breves no curso das sociedades, correspondem a situações temporárias em que se dá uma perturbação do que antes dela era a normalidade.

 


A saída de uma crise implica, em maior ou menor grau, uma metamorfose. Ora, aquilo que é designado como “crise climática” afecta o receptáculo de todas as nossas actividades, não é uma “crise” particular e localizada.

 

 E, ainda mais importante, a temporalidade dos acontecimentos ambientais não tem nada que ver com a temporalidade das perturbações sociais e políticas que a palavra “crise” designa: trata-se de uma temporalidade que se situa numa escala geológica. 

  

sexta-feira, 8 de março de 2024

Gustavo Carneiro - LEVANTADOS DO CHÃO

* Gustavo Carneiro

Azi­nhaga, con­celho da Go­legã. Ali nasceu José Sa­ra­mago, o único es­critor de língua por­tu­guesa ga­lar­doado com o Prémio Nobel da Li­te­ra­tura. Oriundo de fa­mí­lias tra­ba­lha­doras, também ele o foi: ser­ra­lheiro me­câ­nico, pri­meiro; fun­ci­o­nário pú­blico, de­pois. Nos seus li­vros tomou par­tido pelos que nada são neste mundo, como diz A In­ter­na­ci­onal. Exemplo maior dessa opção, que foi a sua (José Sa­ra­mago foi mi­li­tante do PCP du­rante dé­cadas e até ao fim da vida), será por­ven­tura Le­van­tado do Chão, essa mag­ní­fica obra onde de­finiu um es­tilo li­te­rário in­con­fun­dível.

Nela acom­panha-se três ge­ra­ções da fa­mília Mau Tempo no la­ti­fúndio alen­te­jano e, através delas, a fome, o obs­cu­ran­tismo e a ex­plo­ração a que os ope­rá­rios agrí­colas eram su­jeitos às mãos dos agrá­rios, e a brutal vi­o­lência da po­lícia ao seu ser­viço, num lugar e num tempo pro­fun­da­mente de­si­guais e in­justos. Mas ali estão também ins­critos, e ma­gis­tral­mente des­critos, o des­pertar das cons­ci­ên­cias, a co­ra­josa e pa­ci­ente re­sis­tência, a luta por uma vida me­lhor – que de­sem­bo­caram na Re­vo­lução de Abril e na sua mais bela con­quista, a Re­forma Agrária.

Há dias, na terra que viu nascer o es­critor, a can­di­da­tura da CDU es­teve reu­nida com de­zenas de imi­grantes, mai­o­ri­ta­ri­a­mente oriundos da Índia e do Pa­quistão. Tra­ba­lham em ex­plo­ra­ções agrí­colas, so­bre­tudo, mas oca­si­o­nal­mente também na cons­trução civil, num como noutro caso a troco de muito pouco, por vezes até de quase nada. Nesta busca diária do ganha-pão, nas con­di­ções di­tadas pelo pa­trão (tantas vezes abaixo da lei e da ele­mentar hu­ma­ni­dade), é di­fícil não ver se­me­lhanças com as praças de jorna de má me­mória.

Nessa reu­nião, se­me­lhante a tantas ou­tras re­a­li­zadas em tantos ou­tros lu­gares, afirmou-se que o PCP e a CDU não fazem dis­tinção entre tra­ba­lha­dores, in­de­pen­den­te­mente da sua origem: «nós de­fen­demos a classe tra­ba­lha­dora» e todos – sem ex­cepção – devem ter sa­lá­rios dignos, con­tratos, pro­tecção so­cial, ha­bi­tação, saúde. Tudo aquilo, por­tanto, «a que um ser hu­mano deve ter di­reito».

Ali re­a­firmou-se também a de­ter­mi­nação em dar com­bate firme aos que pre­tendem res­pon­sa­bi­lizar os imi­grantes pelos pro­blemas do País, pro­cu­rando que se es­queça que também os por­tu­gueses emi­gram em busca de uma vida me­lhor e ili­bando os ver­da­deiros res­pon­sá­veis: os par­tidos que servem aqueles que en­ri­quecem com a ex­plo­ração dos tra­ba­lha­dores, sejam eles imi­grantes ou por­tu­gueses.

Pese em­bora as di­fe­renças cul­tu­rais e lin­guís­ticas, saiu re­for­çada a so­li­da­ri­e­dade que une sob uma mesma ban­deira – e uma mesma luta – os ex­plo­rados de todo o mundo e foram en­ce­tados ca­mi­nhos de or­ga­ni­zação, esse chão fértil de onde brotam todas as vi­tó­rias. Como dizia Sa­ra­mago, é pre­ci­sa­mente do chão que se le­vantam as se­aras e as ár­vores, mas também os ho­mens e as suas es­pe­ranças.

 https://www.avante.pt/pt/2623/opiniao/174875/Levantados-do-ch%C3%A3o.htm

quinta-feira, 7 de março de 2024

Dulce Maria Cardoso - Un juguete frágil en manos toscas (excerto)


*  Dulce Maria Cardoso 

Los portugueses tendrán que pronunciarse en las elecciones del domingo sobre el lugar de la extrema derecha de Chega y sobre la herencia de la dictadura de Salazar


Como nasce o populismo? O que alguém sedento por holofotes precisa fazer para chamar a atenção? Como e por que começamos a prestar atenção “aquela pessoa”?

Para começar, “aquela pessoa” fala alto, interrompe os outros e é desrespeitoso. Ela age assim porque está indignada, com raiva. Sendo um bom ator e um bom comunicador, ele dá a impressão de que não tem filtros, que é autêntico, mesmo que minta descaradamente. A competição desenfreada que a sociedade exige de nós leva-nos a recriar as nossas relações com os outros, distanciando-nos da necessidade primordial que temos de não nos sentirmos sozinhos. Portanto, somos atraídos por aqueles que parecem, mesmo sabendo que não são, genuínos. Nós os recompensamos com nossa atenção e, muitas vezes, com nosso carinho. Permitimos que “essa pessoa” desafie códigos sociais ou mesmo leis. Há também quem aprecie. A selvageria “daquela pessoa” funciona como prova de sua independência e pode ser interpretada como um sinal de bravura. Para captar a atenção dos outros e mantê-la a longo prazo, “essa pessoa” deve escolher cuidadosamente as razões da sua indignação e raiva. Assim, demoniza dois grupos: um minoritário ou desprotegido e outro poderoso. O grupo dos poderosos inclui todos os seus adversários políticos. A suposta bravura com que pretende atacar os poderosos mascara a desprezível covardia com que persegue os desprotegidos. Para os populistas de direita, o grupo desprotegido é quase sempre constituído por imigrantes que, convenientemente e na sua maioria, não são eleitores.

“Essa pessoa” afirma que os grupos demonizados são a fonte de todo o mal e que devem ser odiados e perseguidos. Portanto, “aquela pessoa” não é considerada um agressor, mas sim uma vítima que atua em legítima defesa, querendo ser porta-voz de uma multidão de vítimas que tenta recrutar para a sua “guerra santa”. A vitimização que promove, misturando vítimas reais com falsas vítimas, é uma arma muito perigosa: além de ser uma poderosa estratégia empática, torna as verdadeiras vítimas ainda mais vulneráveis.

No entanto, esta manipulação “daquela pessoa” resultaria numa farsa inútil se não houvesse um mal-estar geral na sociedade, fruto, sobretudo, de uma injustiça económica e social imperdoável. Neste contexto, é fácil capitalizar o descontentamento dos cidadãos: aqueles que se sentem abandonados estão mais dispostos a ouvir “aquela pessoa”, que insiste em dizer que não tem responsabilidade pelas causas que levam a esse descontentamento. O abandono é o terreno onde emergem os populismos incipientes. Outros partidos externos ao governo também têm à sua disposição o mesmo terreno e têm à sua disposição a mesma possibilidade de manipulação , mas não prosperam nem definham. Para evitar tal fim, “essa pessoa” deve ser um comunicador competentemente histriónico e demagógico, elogiado pelas redes sociais e explorado pelos meios de comunicação social, e não ter escrúpulos em perseguir injustamente a minoria ou os grupos desprotegidos que escolhem demonizar. Hoje, em Portugal, o populismo de direita prospera mais facilmente do que o populismo de esquerda pelas opções que ambos têm nessa escolha: mais facilmente contribui para a incitação ao ódio contra os imigrantes do que, por exemplo, contra os proprietários (apesar da valor obsceno das rendas) ou aos empregadores (apesar dos baixos salários).~

07 MAR 2024 

https://elpais.com/opinion/2024-03-07/un-juguete-fragil-en-manos-toscas.html?
 

terça-feira, 5 de março de 2024

Carlos Coutinho - Guerra é guerra

* Carlos Coutinho

   ESTE ano absolutamente inaceitável, iníquo, sangrento, com duas guerras fratricidas mesmo ao lado desta Europa zaragateira que recupera heranças milenares de conflitos armados, enquanto várias outras calamidades do mesmo género estão semeadas por todo o resto do mundo, este ano infernal, insisto, pode ter efeitos decisivos para a Humanidade, a curto, médio e longo prazos.

   Consideram alguns dos entendidos nestas matérias que estamos já mergulhados numa “guerra cognitiva que transforma a mente no campo de batalha e ameaça a integridade de sociedades e nações”, até porque “continua a redefinir-se o equilíbrio de forças entre as grandes potências”.

    O futuro do mundo – acham eles e eu tendo a concordar – decide-se numa era de capacidade tecnológica sem precedentes, na qual as novas ferramentas de inteligência artificial aperfeiçoam as estratégias de desinformação e potenciam a sua interferência na formação da opinião pública, pondo em causa o funcionamento de todo o tipo de democracias.

   Na presente era digital, de facto, a informação surge como a arma das novas operações no domínio cognitivo.    

   Mais do que nunca se torna necessário “ler o cérebro dos nossos adversários para anteciparmos a suas reações”, de modo a podermos influenciá-las “ e fazer com que atuem de acordo com os nossos desejos”. E isto “à medida que nós próprios devemos ser capazes de proteger o nosso cérebro e melhorar as nossas capacidades cognitivas de compreensão e de decisão”, explicava em junho de 2021 o general e vice-chefe da Defesa francesa, Eric Autellet, citado no “Público” de há quatro dias, na primeira reunião científica da NATO, sobre a guerra cognitiva, que é um novo domínio da guerra moderna.

   Enquanto guerra sobre a mente e o pensamento de um determinado alvo, “o seu objetivo é atacar ou até mesmo destruir a forma como constrói a sua própria realidade e visão do mundo”, em conjunto com “a sua confiança nos processos e nas abordagens necessárias para o funcionamento eficiente de grupos, sociedades ou mesmo nações”, destaca, por sua vez, Bernard Claverie, cientista cognitivo e professor no Instituto Politécnico de Bordéus. 

   Trata-se, neste caso, de um tenente-coronel reformado do Exército francês que apresentou o problema na mesma reunião da NATO. Segundo ele, a guerra cognitiva combina elementos da guerra de informação – incluindo a militarização da psicologia e das neurociências – para o cumprimento de ações militares, situando-se “entre dois domínios operacionais: as operações psicológicas e de influência, em conjunto com as operações cibernéticas”. 

   No seu potencial extremo, pode “subjugar sem recurso à força e coerção”, fragilizando-as “e mesmo fraturando-as”, segundo investigadores da Universidade Johns Hopkins e Imperial Colledge, de Londres.

   Para o português Manuel Poêjo Torres, consultor da NATO desde 2013, a gramática da guerra evolui com a introdução de novas tecnologias e práticas, “e nós próprios começamos a encontrar novos chavões para caraterizar aquilo que já existe e faz parte da natureza humana há muitos anos.” 

   Mais, “enquanto operações psicológicas operam apenas no domínio da influência política e diplomática” e constituem um sistema de informações que “se reflete num ambiente de múltiplos sistemas”, inseridos num grande espaço, uma “nuvem de informações com várias dimensões: a dimensão das informações – a coleção e análise dos dados, a dimensão física – os sistemas que correm os dados, e a dimensão cognitiva dos dados, e a dimensão cognitiva – o domínio da mente”.

   Para mim que, não sendo perito nestas questões também não sou muito ingénuo, fica a confirmação de que não estava enganado quando me punha a avaliar os critérios de escolha dos pivôs televisivos, dos repórteres enviados para a Ucrânia e para Israel, da grande maioria da canalha comentadora e até de um fulano difícil de catalogar com rigor como o penteadinho natista – muito competente em propaganda remunerada – major-general Isidro de Morais Pereira.

2024 03 05

https://www.facebook.com/carlos.coutinho.71

segunda-feira, 4 de março de 2024

Fernando Pessoa e Oliveira Salazar


Cartoon - Fernando Pessoa visto por Rita Ravasco


* Fernando Pessoa

 Sim, sou situacionista. Mas vamos lá a uma coisa…
 

Há três maneiras de ser situacionista, isto é, de ser partidário de qualquer situação política. A primeira é a conformidade por doutrina; a segunda a conformidade por aceitação; a terceira a conformidade por não-oposição. Deixo de parte uma das mais vulgares — a conformidade por vantagem —, porque não é disso que se trata, pelo menos em mim.

A conformidade por doutrina quer dizer que o partidário está de acordo com o programa político da situação a que adere. A conformidade por aceitação quer dizer que o partidário, sem que adira ao todo ou a parte desse programa, confia todavia na situação e se abstém de pôr pontos doutrinários. A conformidade por indiferença vale por adesão por só não ser hostilização.

Sou situacionista por aceitação. Não discuto problemas políticos, constituições ou programas. Confio instintiva mas não irracionalmente, no General Carmona e no Professor Salazar.

Confio no General Carmona porque tem a mais segura mão de timoneiro que há muitos anos temos tido. Desde quando, no período agudo da Ditadura, apoiou a acção defensiva e patriótica do General Vicente de Freitas, até quando, havendo já calma para pensar, deu apoio à acção coordenadora do Prof[essor] Salazar, o Presidente da República tem-se mantido numa atitude que é rara em qualquer caso, e raríssima em política — a maleabilidade dentro da dignidade. É um aristocrata da adaptação.

Confio no Prof[essor] Salazar por um motivo primário e dois motivos secundários. O motivo primário é aquele de ter as duas notáveis qualidades que ordinariamente falecem no português: a clareza firme da inteligência, a firmeza clara da vontade. Dos motivos secundários, o primeiro é o que tenho notado de realmente feito e que antes se não fazia — tudo isso que vai desde os navios e as estradas até tentar dar a um país sem ideal nacional pelo menos o pedido de que pense em tê-lo. O segundo desses motivos é o acréscimo do nosso prestígio no Estrangeiro. Conheço a sua realidade por informações directas, e não por citações de jornais, susceptíveis sempre de suspeitas reais, factícias ou fictícias. E, neste esquema de adesão translata, é de meu dever dizer que junto ao nome do Prof[essor] Salazar o do Prof[essor] Armindo Monteiro.

Disse que confio porque confio. Não vou mais longe. Se me perguntarem se compreendo a obra financeira do Prof[essor] Salazar, digo que não, porque nada sei de finanças. Confio. Se os seus opositores me disserem que por estas e aquelas razões, essa obra é má, digo, com igual fundamento, que não sei. Confio.

Dito isto, compreendamo-nos melhor. Além do situacionista que sou, sou um individualista absoluto, um homem livre e um liberal. E isto faz que tenha uma perfeita tolerância pelas ideias dos outros, que seja incapaz de considerar um crime o pensar outro do modo que não penso.

Por isso, esta confiança, que tenho no Prof[essor] Salazar, me não impõe a mais pequena sombra de aversão a, por exemplo, o Prof[essor] Afonso Costa. Timbro em afirmar por ele a minha absoluta consideração. Esse homem foi o único que cumpriu integralmente, no Governo Provisório, o que prometera na propaganda. Prometeu a Lei do Divórcio: fê-la. Prometeu a Lei da Família: fê-la. Prometeu a Lei da Separação: fê-la. Se as fez bem ou mal, do ponto de vista jurídico, não sei, porque não sou jurista. Sei que prometeu e cumpriu. Não sou, evidentemente seu correligionário, mas não consigo ser seu inimigo. Nego-lhe o meu apoio; não posso negar-lhe o meu respeito. Sigo o preceito do Prof[essor] Salazar: política de verdade.

E neste critério, e com os fundamentos de que for capaz, continuarei, sempre que Deus quiser, a defender a Maçonaria.

1928
Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.  - 217.

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ANTÓNIO DE OLIVEIRA SALAZAR

António de Oliveira Salazar.

Três nomes em sequência regular...

António é António.

Oliveira é uma árvore.

Salazar é só apelido.

Até aí está bem.

O que não faz sentido

É o sentido que tudo isto tem.

......

Este senhor Salazar

É feito de sal e azar.

Se um dia chove,

A água dissolve

O sal,

E sob o céu

Pica só azar, é natural.

Oh, c'os diabos!

Parece que já choveu...

......

Coitadinho

do tiraninho!

Não bebe vinho.

Nem sequer sozinho...

Bebe a verdade

E a liberdade.

E com tal agrado

Que já começam

A escassear no mercado.

Coitadinho

Do tiraninho!

O meu vizinho

Está na Guiné

E o meu padrinho

No Limoeiro

Aqui ao pé.

Mas ninguém sabe porquê.

Mas enfim é

Certo e certeiro

Que isto consola

E nos dá fé.

Que o coitadinho

Do tiraninho

Não bebe vinho,

Nem até

Café.

s.d.

Da República (1910 - 1935) . Fernando Pessoa. (Recolha de textos de Maria Isabel Rocheta e Maria Paula Mourão. Introdução e organização de Joel Serrão). Lisboa: Ática, 1979. 

 - p. 349.

1ª publ. in Diário Popular , Lisboa, 30 Maio e 6 Junho 1974 . inc? CF. lello - fotoc



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Salazar - Um cadáver emotivo,

Salazar


Um cadáver emotivo, artificialmente galvanizado por uma propaganda...

Duas qualidades lhe faltam — a imaginação e o entusiasmo. Para ele o país não é a gente que nele vive, mas a estatística d'essa gente.


Soma, e não segue.

1932?

Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.

  - 221.

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O Prof. Salazar é muito mais inteligente e muito mais culto,

O Prof. Salazar é muito mais inteligente e muito mais culto, ainda que a sua inteligência seja monocórdica e a sua cultura unilateral. Tem uma inteligência do tipo científico, mas sem ser céptica; tem uma cultura do tipo humanístico, mas sem ser literária. Isto lhe dá aquela unidade psíquica de onde resulta a sua formidável disciplina e energia; isto, ao mesmo tempo, o desumaniza.

s.d.

Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.

  - 220.

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O Prof. Salazar tem, em altíssimo grau, as qualidades secundárias…

O Prof. Salazar tem, em altíssimo grau, as qualidades secundárias da inteligência e da vontade. É o tipo do perfeito executor da ordem de quem tenha as primárias.


O chefe do Governo tem uma inteligência lúcida e precisa; não tem uma inteligência criadora ou dominadora. Tem uma vontade firme e concentrada, não a tem irradiante e segura. É um tímido quando ousa, e um incerto quando afirma. Tudo quanto faz se ressente d'essa penumbra dos Reis malogrados.


Quando muito, na escala da governação pública, poderia ser o mordomo do país.


Faltam-lhe os contactos com todas as vidas — com a vida da inteligência, que vive de ser vária e, entre os conflitos das doutrinas, não sabe decidir-se; com a vida da emoção, que vive de ser impulsiva e incerta; com a vida da (...)

O Chefe do Governo não é um estadista: é um arrumador. Para ele o país não se compõe de homens, mas de gavetas. Os problemas do trabalho e da miséria, como há ele de entendê-los, se os pretende resolver por fichas soltas e folhas móveis?


A alma humana é irredutível a um sistema de deve e haver. É-o, acentuadamente, a alma portuguesa.


Às vezes aproxima-se do povo, de onde saiu. E traz-lhe uma ternura de guarda-livros em férias, que sente que preferiria afinal estar no escritório.


É sempre e em tudo um contabilista, mas só um contabilista. Quando vê que o país sofre, troca as rubricas e abre novas contas. Quando sente que o país se queixa, faz um estorno. A conta fica certa.


O Prof. Salazar é um contabilista. A profissão é eminentemente necessária e digna. Não é, porém, profissão que tenha implícitas directivas. Um país tem que governar-se com contabilidade, não pode governar-se por contabilidade.


Assistimos à cesarização de um contabilista.

s.d.

Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.

  - 222.

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POEMA DE AMOR EM ESTADO NOVO

Tens o olhar misterioso

Com um jeito nevoento,

Indeciso, duvidoso,

Minha Marta Francisca,

Meu amor, meu orçamento!

A tua face de rosa

Tem o colorido esquivo

De uma nota oficiosa.

Quem dera ter-te em meus braços,

Ó meu saldo positivo!

E o teu cabelo — não choro

Seu regresso ao natural —Abandona o padrão-ouro

Amor, pomba, estrada, porta,

Sindicato nacional!

Não sei por que me desprezas.

Fita-me mais um instante,

Lindo corte nas despesas,

Adorada abolição

Da dívida flutuante!

Com que madrigais mostrar-te

Este amor que é chama viva?

Ouve, escuta: vou chamar-te

Assembleia Nacional

Câmara Corporativa.

Como te amo, como, como,

Meu Acto Colonial!

De amor já quase não como,

Meu Estatuto de Trabalho,

Meu Banco de Portugal!

Meu crédito no estrangeiro!

Meu encaixe — ouro adorado!

Serei sempre o teu romeiro...

Pousa a cabeça em meu ombro,

Ó meu Conselho de Estado!

Ó minha corporativa,

Minha lei de Estado Novo,

Não me sejas mais esquiva!

Meu coração quer guarida

Ó linda Casa do Povo!

União Nacional querida,

Teus olhos enchem de mágoa

A sombra da minha vida

Que passa como uma esquadra

Sobre a energia da água.

Que aristocrático ri,

O teu cabelo em cifrões — Finanças em mise-en-plis! —

Meu activo plebiscito,

Nunca desceste a eleições!

Por isso nunca me escolhes

E a minha esperança é vã.

Nem sequer por dó me acolhes,

Minha imprevidente linda

Civilização cristã!

Bem sei: por estes meus modos

Nunca me podes amar.

Olha, desculpa-mas todas.

Estou seguindo as directrizes

Do professor Salazar.

9-9-1935

Fernando Pessoa - O Último Ano. (Catálogo da Exposição Comemorativa do Cinquentenário da Morte de Fernando Pessoa, organizada e coordenada por Teresa Sobral Cunha e João Rui de Sousa.) Lisboa: Biblioteca Nacional, 1985.

  - .

N. do A.: «o demoliberalismo maçónico-comunista»



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[Carta ao Presidente da República - b]

Quer isto dizer, Senhor Presidente, que uma nação haja sempre de ser governada por chefes acentuadamente tais, que não haja período em que possam estar no poder os inteligentes sem aura e os patriotas sem prestígio? Não o quer dizer. O que porém quer dizer é que esse prestígio de chefe, desnecessário muitas vezes num governo de época normal, é indispensável num governo de época anormal, imprescindível num governo de autoridade. O que porém quer dizer é que o Prof[essor] Salazar, não tendo tal prestígio, nem maneira de o ter, se deixou investir da aparência d'ele. É a sua túnica de Nessus[.J


Ninguém pode legitimamente culpar o actual Presidente do Conselho de não ter qualidades que não tem; pode legitimamente fazer-se de, não tendo tais qualidades, pretender tê-las e ter-se colocado em situação de, não podendo tê-las, ser todavia necessário que as tenha.


Culpa-se o Prof[essor] Salazar d'isto: de ser incompetente para o cargo que assumiu.

1935

Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.

  - 229.


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[Carta ao Presidente da República - d]

Destinado assim naturalmente por Deus para executor de ideias de outrem, visto que as não tem próprias, de secretário de prestígio alheio, porque o não pode conquistar seu, o Prof[essor] Salazar quis alçar-se, ou deixou que o quisessem alçar, a um pedestal onde mal se acomoda, a um trono onde não sabe como sentar-se. Não conseguiram os titãs, e eram titãs, escalar o Olimpo; como o conseguirão os anões, condenados, para que possam parecer grandes, ao desequilíbrio constante das andas que lhes ataram às pernas?

1935

Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. (Orientação, coordenação e prefácio de Teresa Rita Lopes). Lisboa: Livros Horizonte, 1993.

  - 231.


Pesquisa porsalazar:  in Arquivo Pessoa  http://arquivopessoa.net/ 

Cartoon in https://industriacriativa.pt/projeto/3171/fernando-pessoa