quarta-feira, 31 de março de 2010

Tudo está bem, Enid Blyton

Literatura infantil

Tudo está bem, Enid Blyton

Público - 29.03.2010 - 09:55 Por Susana Moreira Marques
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Ela animou a nossa infância com as aventuras de Os Cinco. É talvez a mais famosa autora de livros infantis e juvenis mas também a mais criticada. Descobrimos que Enid Blyton não é heroína nem vilã. O seu maior sucesso - e maior pecado - foi ter construído um mundo para onde se quer escapar. Era uma vez quatro crianças e um cão...
A escritora no seu jardim no Buckinghamshire, em Maio de 1949 
A escritora no seu jardim no Buckinghamshire, em Maio de 1949 
(Hulton-Deutsch Collection/Corbis/VMI)
Se fizessem de Enid Blyton uma personagem de fantasia ou um desenho animado, ela seria uma mulher-máquina-de-escrever, com teclas em vez de dedos e uma cabeça onde corria tinta.

Por dia, produzia seis mil palavras - no seu melhor, 10 mil palavras. Noddy, Os Cinco, Os Sete, a colecção Aventura, a colecção Mistério, As Gémeas, As Quatro Torres, em 71 anos de vida, 43 anos de carreira, publicou mais de 700 livros - muitos traduzidos em português e outras 90 línguas, fazendo dela a quinta autora mais traduzida do mundo -, e é quase impossível ser criança sem ler Enid Blyton. Assim como é quase impossível ser adulto sem se lembrar de momentos a ler Enid Blyton.

Até hoje, Enid Blyton já vendeu 500 milhões de livros. Quando sai uma notícia sobre Enid Blyton, não é simplesmente mais uma informação sobre a biografia de uma autora, é pôr em causa a infância de milhões. É assim que Enid Blyton - uma assinatura quase adolescente com dois traços por baixo do "d" e com um aspecto tão inofensivo numa capa de livro - atrai polémicas.

A última foi a acusação de que Blyton talvez não antipatizasse totalmente com Hitler. Aos 101 anos, Ida Pollock, viúva de Hugh Pollock, o primeiro marido de Blyton, disse ao jornal britânico The Independent que, segundo Pollock, ele e Blyton estiveram juntos num jantar, no final dos anos 30, e ouviram simpatias sobre Hitler. Ele levantou-se furioso e saiu. Ela não.

A história é só isto, mas os jornais capricharam nos títulos, e novamente, perguntaram se Enid Blyton é própria para consumo das crianças.

Dela já foi dito que é racista - e já se modificaram personagens negras e tirou-se a palavra nigger das reedições - e xenófoba. Os livros estão cheios de más mães que trabalham e boas mães que fazem bolos. E porque é que as personagens dela são sempre de classe média, tão educadas e a tanta distância do comum dos trabalhadores? Blyton chegou a estar banida de bibliotecas públicas, embora a razão não fosse nenhum dos seus preconceitos, mas aparentemente um problema de pobreza de vocabulário.

E enquanto os adultos discutiam, as crianças liam. E liam e liam e liam, geração após geração, e só isso explica que quando em 2008 o Prémio Literário Costa organizou uma votação para escolher o autor mais querido do Reino Unido, não tenha ganho Shakespeare ou Jane Austen e nem sequer J.K. Rowling, a criadora de Harry Potter. Os britânicos escolheram Enid Blyton.

Em 2009, a BBC mostrava Enid e Helena Bonham-Carter era uma Enid fria, manipuladora e até cruel, mas simultaneamente um outro canal ressuscitava Os Cinco - a par de Noddy, as criações mais populares de Blyton - e estreava uma série de animação com Os Cinco filhos de Os Cinco originais.

Na última década de vida de Blyton - os anos 60, a década que parecia irreversível -, os críticos diziam que Blyton passaria de moda. Mas depois de ela morrer em 1968, o que aconteceu foi que se tornou num clássico. E um clássico continua a precisar do seu tempo e o dela é a Segunda Guerra Mundial, o período do pós-guerra e os anos 50, quando se sabia distinguir os heróis dos vilões, e numa Inglaterra mais homogénea do que hoje não havia dúvidas sobre o que era ser inglês, a que horas tomar o chá e como deve agir um gentleman ou uma lady.

1. Como Blyton "viu" "Os Cinco"
Em 1942, Enid Blyton tinha um abrigo no jardim para onde corria com as filhas quando soavam os alarmes a avisar que se aproximava um bombardeamento.

No mesmo jardim, tinha demarcado uma horta para "cavar para a vitória" como tantas outras mulheres e crianças e velhos, todos aqueles que não podiam combater, para que durante a guerra não faltassem pelo menos batatas e couves.

Nas cartas que escrevia às crianças que liam os seus livros, uma a uma, Enid Blyton ensinava-lhes segredos de plantas e animais e dizia-lhes que quando voltassem a Londres, depois da guerra, iriam lembrar-se por muitos anos de coisas boas do tempo em que estiveram evacuados no campo.

Nesse ano, livros com a assinatura de Enid Blyton continuaram a ser impressos em grandes tiragens, ainda que faltasse papel. Ela tinha dito aos seus editores que não podia parar: escrever era o seu esforço de guerra; as crianças já tinham perdido tantas coisas, não deveriam ainda perder os seus livros.

Em 1942, Hugh Pollock, major em tempo de guerra, editor em tempo de paz (chegou a ser editor de Churchill), já não vivia na mansão de Green Hedges, em Buckinghamshire, perto de Londres, e quase não via as duas filhas, que Enid Blyton mantinha afastadas do pai. Em Green Hedges, ela visitava muitas vezes o cirurgião Kenneth Darrell Waters. Ele e Enid aguardaram todo o ano que os respectivos divórcios se resolvessem e o de Enid ficou tratado antes do fim do ano. No ano seguinte, ela passou a ser Mrs. Darrell Waters.

Foi um dia em 1942 que Enid Blyton se sentou numa cadeira confortável com uma tábua ao colo e a máquina de escrever por cima e fechou os olhos. Quando os abriu, tinha as mãos em cima do teclado e os dois dedos indicadores escreviam o que "via" no "cinema da sua mente":

"As crianças começaram a ficar muito entusiasmadas. Ia ser divertido ir para um lugar que nunca tinham ido antes e ficarem em casa de uma prima que nunca tinham conhecido."

"Via" cinco personagens: quatro crianças e um cão, que ainda hoje partilham as suas aventuras com um milhão de crianças por ano. E, como não podia deixar de ser, cada um dos cinco foi criado um pouco à sua imagem.

Gostava mais de Anne (Ana) do que da mãe, mas Anne lembrava-lhe a mãe. Anne era tudo o que Enid não tinha sido e a mãe desejaria: uma criança que aprenderia a cozinhar, a limpar, a costurar e cresceria para ser uma jovem sensata e preparada para a vida.

Julian (Júlio), o mais velho, o líder do grupo, era a personagem mais próxima de um adulto (os adultos são figuras quase sempre ausentes durante as aventuras). E Enid adulta, ou o mais perto que chegaria de ser adulta, era mandona e não admitia que a sua liderança fosse contestada.

Dick (David), o bonacheirão, era o único que trazia livros para a aventura das férias e fazia todos rir mesmo nas alturas mais difíceis, uma espécie de palhaço querido do grupo, como teria sido Enid a uma dada altura, capaz de ver em qualquer coisa uma pequena anedota.

Georgina - George, porque se lhe chamarem Georgina não responde (Maria José ou Zé, na versão portuguesa) - era a sua criação favorita, disse várias vezes. Ao contrário de outras personagens, explicou numa entrevista à BBC, George era inspirada numa pessoa real. A outra jornalista, Blyton descreveu George como uma miúda ruiva e sardenta que tinha um dia conhecido e admirado. Para Barbara Stoney, que escreveu a primeira biografia de Enid Blyton, essa descrição era para despistar. Enid tinha sido George. George era simplesmente Enid. Uma rapariga que queria acompanhar o pai em passeios no campo, aprender os nomes de todos os bichos e de todas as plantas, que queria ler, escrever, representar, cantar para o pai, aprender como se expressar, fazer tudo como se tivesse um futuro à sua frente, como os rapazes tinham um futuro. Como George, revoltava-se contra o seu destino de mulher.

E Timmy (Tim) era o cão que nunca teve: seria o mais inteligente do mundo e poderia desabafar com ele.

"Os nossos livros", escreveu numa carta a um psicólogo que pesquisava o processo criativo de escritores, "são facetas de nós próprios".

Mas a verdade é que os livros tanto podem ser uma maneira de olhar para nós próprios como uma maneira de evitar olhar para nós próprios. E talvez não haja nenhum exemplo como o de Enid Blyton. Os seus mais de 700 livros foram a forma que encontrou de parar o tempo. De ficar sempre naquele momento em que se abre um livro, e página após página, nada nem ninguém nos podia magoar: nem bombas nem pais que discutem.

Pais firmes mas carinhosos, às vezes um pouco distraídos, corrigindo-se sempre; mães que nunca se zangam quando chegamos tarde a casa depois de uma aventura e dão-nos um abraço e uma fatia de bolo delicioso; homens bons ou maus e vê-se logo pelas caras.

Havia um mundo onde se podia ir e tudo funcionava como um relógio a que Deus nunca se esquecia de dar corda.

Se as crianças crescessem nesse mundo - com valores morais fortes e saudáveis, acreditava Blyton -, seriam melhor adultos.

"O meu amor pelas crianças é a fundação de todo o meu trabalho. Eu amo-os e quero que cresçam para serem seres humanos decentes", disse em 1963, numa entrevista à rádio. "Isto soa, claro, muito pomposo, mas não é de todo pomposo. É simplesmente o que cada mãe quer para o seu filho. Eu quero-o para todas as crianças."

Não percebia quando diziam que era paternalista e ficava muito surpreendida quando havia quem não gostasse desse mundo e preferisse o outro, o real. Mas todos esses eram adultos e ela não aceitava críticas de ninguém com mais de 12 anos.

Os que tinham menos de 12 anos escreviam-lhe, davam opiniões sobre o que tinham lido, diziam o que gostariam ainda de ler, e com ela construíam esse mundo ideal, para onde - ela primeiro enquanto escrevesse, e eles depois quando lessem - pudessem escapar.

Até que um dia ela deixou de conseguir responder a essas cartas. E um dia não sabia quem eram Julian, Dick, Anne, George and Timmy (Júlio, David, Ana, Zé e Tim). Tinha regressado inteiramente a esse tempo em que ainda que não houvesse certezas, pelo menos não havia dúvidas. Estava em Hampstead, em Londres, numa casa de repouso, as duas filhas a viver fora da capital e poucos amigos que a visitassem, mas julgava estar em Beckenham, um subúrbio de Londres.

O pai ainda a levava a dar longos passeios e ouvia as suas histórias. A mãe ainda achava que as histórias não tinham utilidade.

No fim da vida tinha-se esquecido de que o pai e a mãe tinham morrido e que ela não tinha ido ao funeral de nenhum dos dois, e terá esquecido até que um dia o pai se tinha ido embora de casa, ela tinha 12 anos e tinha - como iria fazer o resto da vida, acontecessem guerras, divórcios, doenças, morte - fingido que tudo estava bem.

2. Como era ler "Os Cinco"
Por causa de Enid Blyton, ia-me saltando a retina. Pelo menos era o que os meus pais me diziam: "Olha que te vai saltar a retina." Saltar-me a retina parecia-me uma coisa grave, mas não terminar o livro que estava a ler parecia-me ainda mais grave. E, para saber o que acontecia a seguir, era preciso ler em andamento ou ler toda torcida ou ler com pouca luz (tudo coisas, diziam-me, que faziam saltar a retina) ou, pior ainda, ler em andamento toda torcida e com pouca luz. Ainda me lembro dos efeitos de luz sobre a página, dentro do carro à noite, "vuumm-vumm", o livro quase encostado à janela e cada vez que o carro passava por mais um candeeiro de rua eu lia - muito rápido - mais uma frase.

Por causa de Enid Blyton, podia ter-me metido seriamente em apuros quando decidia seguir alguém na rua porque tinha um aspecto "suspeito" ou entrava em casas em ruínas à procura de contrabandistas.

Por causa de Enid Blyton, escondi no compartimento com chave da minha secretária de madeira uma fechadura ideal para a minha futura cabana secreta, e descobri-a muitos anos mais tarde quando já só via uma fechadura partida e enferrujada. Escondi tesouros em caixas de Nesquik, que por sua vez eram escondidas em sítios que só eu e a minha prima conhecíamos e não desvendávamos nem que as nossas irmãs nos arrancassem os cabelos.

Por causa de Enid Blyton, fugi com a minha prima da quinta da minha avó e ficámos o resto das férias de castigo a fazer trabalhos de casa. Fugimos dos pais numa praia do Algarve para ir explorar grutas; e, quando éramos adolescentes e era já uma questão de nostalgia, desaparecemos na serra da Estrela.

O meu dia da semana preferido era a sexta-feira, quando ficava em casa dos meus avós. Por baixo do prédio deles havia um pequeno centro comercial e, no centro comercial, uma papelaria que vendia livros.

Cada sexta-feira comprava um novo livro de aventuras, sentava-me no sofá dos meus avós e já não me levantava mais. Que criança sossegada, diziam os avós, os pais, os tios. Enganava-os a todos.

Por causa de Enid Blyton, quando finalmente saía para a rua, ia determinada a que me acontecesse uma história. E de certa forma, até hoje desconfio que coisas extraordinárias acontecem, exactamente como nos livros, eu é que não procurei o suficiente.

3. Cinco razões para não reler "Os Cinco"
Realmente não consigo pensar em cinco razões para não reler Os Cinco. Não é pior do que muitos livros para adultos que se lêem no mesmo período de tempo que uma aventura de Os Cinco.

No primeiro livro, Os Cinco na Ilha do Tesouro, é um prazer conhecer as personagens, sobretudo a Georgina, perdão, George, que não é uma simples maria-rapaz, mas uma verdadeira rebelde a estabelecer as suas próprias regras. Na versão portuguesa chama-se Zé, mas qualquer Maria José é uma Zé. No original, ela muda de nome, constrói a sua própria identidade. Além disso, George tem uma ilha, e alguém já imaginou algo mais fixe do que ter uma ilha (não, ter um iPhone não é mais fixe do que ter uma ilha)?

Os ingredientes estão lá todos desde o número 1: Os Cinco ficam sozinhos durante algum tempo e vão ter de se desenvencilhar sozinhos. Os maus são bastante maus, mas não muito inteligentes. As crianças, de certeza, vão conseguir vencê-los, apanhá-los, fazer uma boa acção e uma acção importante, ser heróis. Há lingotes de ouro, fechaduras que não abrem para chegar aos lingotes e caminhos subterrâneos para portas fechadas, para os quais é preciso encontrar mapas muito velhos. O problema, depois, é que os ingredientes repetem-se de livro para livro e por mais que se esforce não vai conseguir entender como é que conseguiu, um dia, ler 21 aventuras destas, e todas de seguida.

Uma razão bastante sensata para não reler Os Cinco é, no caso de ter sido um verdadeiro fã em criança, o risco de se desiludir. Mas só há uma razão verdadeiramente importante para não reler Os Cinco: no dia em que desempoeirar os livros na garagem como se encontrasse um tesouro e os abrir, vai perceber que deixou de ser criança.

(Texto publicado na edição da revista Pública de 28 de Março de 2010)


terça-feira, 30 de março de 2010

Arte e Poesia em Modus Vivendi

segunda-feira, 29 de março de 2010

Escrever poemas em Monsanto mudou-lhes a vida


Anna Reckin e John Mateer na casa de pedra em Monsanto: o silêncio e o cenário bucólico inspiram-lhes poemas

Escrever poemas em Monsanto mudou-lhes a vida

Há uma casa de pedra e silêncio que, entre Janeiro e Março, é de poetas de todo o mundo. Eles andam a escrever sobre nós em Monsanto, Idanha-a-Nova. Por Maria João Lopes (texto) e Sérgio Azenha (fotografia)

Em Monsanto, o silêncio faz parte da paisagem. Todos os poetas que durante uns meses vivem numa daquelas casas de pedra o ouvem. Entra-lhes pela janela de vidro enorme, que cobre uma das paredes. Muitos, que nunca viram nem ouviram nada assim, escrevem sobre essa experiência. Em três anos, o Programa Poetas em Residência, criado pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, com o apoio da Câmara Municipal de Idanha-a-Nova, já levou àquela aldeia seis poetas estrangeiros. Para o ano, vai ser publicada uma antologia que reúne o que eles escreveram sobre Portugal.

Haverá muito silêncio nesse livro. Um cenário bucólico que pode, para alguns, ser uma experiência "exótica". Pelo menos para John Mateer, um dos poetas em residência este ano. Sul-africano a viver na Austrália, garante que nunca viu nada como Monsanto.

John Mateer e Anna Reckin são os poetas escolhidos para a residência deste ano, que começou em Janeiro e termina este mês. Os dois habitam a casa de pedra que a autarquia de Idanha-a-Nova recuperou e disponibilizou para o programa. É uma casa dividida em duas: cada uma com um quarto, casa de banho, kitchnette, uma sala com salamandra e uma janela enorme sobre Monsanto. Na secretária, o computador de Anna Reckin está aberto sobre a paisagem. "O espaço da página é como uma paisagem, com umas palavras contra as outras", diz.

Já escreveu mais nos três meses da residência do que no resto do ano em Norwich, Inglaterra, onde vive. "Num cenário diferente, tenho tempo para pensar, sem deadlines, sem interrupções. Aqui a poesia vem primeiro, de manhã. Em Inglaterra não. Escrevo, mas entre outras actividades e é importante quebrar a rotina."

Em Monsanto, tem tempo para passeios, para se distanciar das letras, voltar a elas, ler. Nas caminhadas, ouve um pássaro, cães a ladrarem, depois vê uma cobra: três dimensões que tem que criar de forma artificial na página.

Anna Reckin e John Mateer estão sentados lado a lado no sofá. Anna vai falando sobre a portuguesa Ana Hatherly e como lhe interessa a sua poesia visual e experimental. "Ela põe as coisas duma forma que não vi mais ninguém pôr", diz Anna, que ensina escrita criativa na Universidade de East Anglia, Inglaterra. É autora de Broder, livro que ganhou o Minnesota Book Award. Tem 51 anos.

John não revela a idade, mas é mais novo. Abre-se um parêntese na conversa para falar sobre as teorias de não-discriminação pela idade. Anna Reckin até conta que em Inglaterra é proibido perguntar a idade numa entrevista de trabalho e já não se usa colocá-la no currículo. Agora é que John Mateer não diz mesmo quantos anos tem.

O poeta, que vive em Perth, é um viajante incessante. Como Camões, o seu poeta preferido e de quem tem andado a seguir os passos no mundo. Há muitos poetas portugueses que despertam o interesse de John Mateer, mas a trilogia por excelência é Camões, Camilo Pessanha e Fernando Pessoa. "Os três tiveram a experiência do mundo."

Vai lançar brevemente em Portugal, pela editora Tea For One, Namban, poemas sobre o império português, e ainda, em Abril, The Azanians, poemas sobre Lisboa. Já tinha estado antes em Portugal. Mas Monsanto é diferente. "É um sítio muito remoto", diz. As ruelas mexem-lhe com a imaginação. Aliás, acha que "um sítio pequeno tende a aumentar a imaginação".

Som da névoa

Seja em Monsanto, em Coimbra ou em Lisboa, o que John Mateer nota é que as cidades portuguesas têm "uma vida social" que na Austrália não existe. "Em Coimbra, uma pessoa senta-se no Tropical [café da praça central], encontra um amigo e outro e fica quatro ou cinco horas à conversa. Essa experiência é típica. E o café é um sítio onde as pessoas falam, o que tem a ver com a forma como usam a língua, e isso tem a ver com poesia", diz o poeta que já esteve noutras residências, em Nova Iorque e em Pequim. Também Anna Reckin já teve uma "experiência semelhante" na Bulgária, igualmente "numa vila remota". Mas foram "só umas semanas".

O Programa Poetas em Residência foi criado pela comissão organizadora dos Encontros Internacionais de Poetas - que se realiza em Coimbra de três em três anos. Tirando os meses em que é para os poetas, durante o resto do ano, a casa de Monsanto continua a ser ocupada por artistas - já lá estiveram 22. É outro programa da Câmara de Idanha-a-Nova que se destina a criadores portugueses e estrangeiros de todas as áreas.

Em Portugal, há outros projectos parecidos, por exemplo, na Madeira, onde o Solar de São Cristóvão, em Machico, foi transformado em Casa do Artista. Ali, artistas portugueses ou estrangeiros podem ficar até dois meses, a convite do Governo da Região Autónoma da Madeira ou por proposta de instituições culturais.

Também em Montemor-o-Novo há residências para artistas nacionais e estrangeiros em locais como as Oficinas do Convento e ainda o Espaço do Tempo, estrutura também apoiada pela câmara local e pelo Ministério da Cultura, que acolhe artistas de diversas áreas por períodos que podem ir até quatro meses.

Por Monsanto, e no Programa Poetas em Residência, já passaram John Taggart e Cristina Babino, na primeira edição, em 2008. No ano passado, foi a vez do poeta brasileiro Márcio-André e do galego Miro Villar.

Nascida em Ancona, Itália, em Julho de 1976, Cristina Babino já recebeu diversos prémios. Recorda-se de Monsanto como uma "aldeia muito peculiar", onde o "silêncio" e "tranquilidade" a ajudaram a escrever. Inspirou-se na "paisagem" e nos "elementos naturais" que a compõem, como as "rochas típicas de Monsanto", explica por e-mail.

Também ao poeta Márcio-André, nascido no Rio de Janeiro em 1978, o silêncio falou. "Como sou um poeta também sonoro, não só a escrita sofreu influência, mas também a minha percepção dos sons. Ali eu pude explorar aquilo que está para além do som: o silêncio. O sentido de contemplação e quietude em Monsanto foi muito forte e eu pude pesquisar todas a mínimas particularidades dos timbres que a natureza rochosa e enevoada à volta me ofereciam. Pois ali até a névoa tinha som e isso foi realmente tocante", diz por e-mail.

"Para quem sempre foi acostumado a viver num grande ambiente urbano como o Rio de Janeiro e que havia tido interesse somente em cidades caóticas ou abandonadas, viver na aldeia foi um choque monstruoso", explica o também editor da revista Confraria do Vento.

"Lidar com a paisagem bucólica, um castelo medieval, templos romanos, caminhos na floresta, longas distâncias entre pequenas aldeias, rebanhos de ovelhas e seus pastores e mesmo a reclusão e isolamento marcaram profundamente a minha maneira de ser e de compreender a vida."

Com Márcio-André esteve o poeta Miro Villar. Nascido em 1965, faz parte da organização de escritores Batallón Literario da Costa da Morte. Por e-mail, a partir de Santiago de Compostela, conta que, durante o mês que esteve em Portugal, participou em leituras públicas com outros poetas da Oficina de Poesia de Coimbra e que "desse convívio" surgiram "diálogos e intercâmbios".

De todos os poetas que passaram pela casa, haverá poemas sobre Portugal na antologia bilingue que será publicada para o ano - edição financiada pela Câmara de Idanha-a-Nova. A ideia é publicar um livro semelhante de três em três anos.

Poesia viva

Para além dos momentos de escrita em Monsanto, todos os poetas participam em seminários, conferências e sessões de leitura de poemas na Universidade de Coimbra.

Para a docente responsável por este programa, Graça Capinha, "é muito importante que os alunos tenham uma relação com a poesia viva e possam participar nos processos de criação literária".

"Os alunos mantêm-se em contacto com estes poetas, participam muito activamente, e para mim isso é o fundamental. Como diziam os modernistas, "expandir as consciências" através da arte", diz Graça Carapinha.

O contacto com a poesia, com os poetas, nestes cursos tem "implicações na vida das pessoas", continua: "Altera a sua visão do mundo, transforma-as, torna-as mais universais e é isso que a universidade quer." De resto, as leituras, aulas, conferências e cursos dados por estes poetas não se destinam apenas a alunos da universidade. São para toda a gente.
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Escritos em residência


Monsanto


toda cidade é esboço dela mesma

ou labirinto móvel para cães

e de tanto haver coisas sempre nos adequamos a ser outro:

a cidade contém dentro três outras cidades

que nunca se tocam

e somatizam nos habitantes: até deformá-los

mas o pôr do sol é sempre esse

desde o princípio do sol e do estado das coisas

o pôr do sol que se ama como latão velho

e tudo o mais é variação de pedra

nesta cidade onde até o deus é de granito

e tem sonhos de pedra

com fêmeas mortais num jardim de areia e pedra

convém fugir da cidade antes que a velhice chegue

pois também as coisas perecem mais rápido do que podemos perceber

aqui cada dia é um dia

é preciso partir antes que chegue outro

e é triste notar que nada permanece de nosso

antes mesmo que não estejamos mais aqui
Márcio-André ?(primeira parte de um inédito)


Miradouros


Olhando pelos lugares onde ando, mas aqui ruelas, vielas, até os caminhos que levam ao campo desaparecem. Planos vagueiam para longe das ruas, massas inesperadas presentes. Telhados criam novos padrões. Pequenos pedaços de jardim, mantidos altos (uma vintena de vasos florais de terracota, cada um com o seu ainda invernoso rebento de verde) ocultam igrejas. Fontes desaparecidas; bem como os largos à sua volta. Terraços eu vejo, e onde os telhados cederam. Cascos de granito. O que é privado, o que está aberto para os céus e para a chuva. Comandar as alturas cria brechas graves.


Anna Reckin ?(inédito traduzido por Sandra Guerreiro)

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Ode


Ó Lisboa,

só nas tuas íngremes ruas calçadas

é que uma mulher, cansada depois de um dia de trabalho,

se atreveria a ascender em saltos altos!
John Mateer ?(poema que faz parte do livro Namban, que vai ser publicado ainda este ano em Portugal, numa edição bilingue, com tradução de Andreia Sarabando)
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O negócio do livro eletrônico, por Jason Epstein





Digestivo nº 457 >>> O negócio do livro eletrônico, por Jason Epstein
Jason Epstein ficou conhecido por escrever quase um clássico do mercado editorial: O Negócio do Livro (Record, 2002). Nele, falava das suas cinco décadas de experiência no assunto, enquanto revisitava iniciativas das quais participou: como a Library of America (a equivalente, nos EUA, da nossa Nova Aguilar), com Edmund Wilson; The New York Review of Books (sim, o célebre periódico – que ajudou a fundar); até um precursor do nosso Círculo do Livro (vendendo obras por catálogo); e até um encontro com Jeff Bezos, da Amazon (o qual foi aconselhado a abandonar o negócio porque, segundo Epstein, não havia como ganhar dinheiro com a venda de livros por correspondência...) E, para quem sentia falta da “voz da experiência”, Jason Epstein ressurgiu agora, em março, no New York Review of Books, para comentar, justamente, sobre a “revolução” do livro eletrônico – do Kindle até o iPad. Começa afirmando que a transição da indústria do livro físico (das gráficas até as distribuidoras) para o livro eletrônico “no ciberespaço”, “despachado para qualquer lugar da Terra”, “de modo tão rápido e barato quanto um e-mail”, está andando a passos largos e é irreversível. “Com chão tremendo debaixo de si”, continua Epstein, é natural que editores mantenham um pé “no passado que desmorona”, enquanto procuram “terreno firme” no futuro, para eles “hesitante”, da “digitalização”. “Novas tecnologias, no entanto, nunca pedem licença” e – evocando Joseph Schumpeter – alerta que, como os terremotos, elas “não estão abertas à negociação”. Para Epstein, a capacidade, “sem precedentes”, de “Kindles” e “iPads” oferecerem uma “plataforma multilíngue”, com uma “escolha ilimitada de títulos”, vai destronar o tradicional “sistema gutenberguiano” (“com ou sem a cooperação dos executivos do mercado editorial”). A digitalização, continua Epstein, torna possível um mundo em que “qualquer um [virtualmente] pode se considerar editor” e onde “qualquer um pode se chamar de autor”. Contudo, alerta que o “solitário trabalho da criação literária”, em ficção, “quase nunca é colaborativo”: “As redes sociais podem ajudar na divulgação desse ou daquele título, mas violam a privacidade necessária para forjar a verdadeira literatura”. A crítica, segundo Epstein, será mais necessária do que nunca; e “gênios literários” devem surgir nos quatro cantos do mundo. Direitos autorais, regulados de maneira diferente em cada país, perderão o sentido. E, “com a eliminação de gráficas, distribuidoras e livrarias” – do processo todo –, leitores de livros eletrônicos pagarão cada vez menos, e autores de livros eletrônicos ganharão cada vez mais (enquanto muitos grupos editoriais simplesmente desaparecerão...). Epstein ainda teme a pirataria e, comparando aos músicos, que podem viver de shows, camisetas e até propaganda, avisa que “escritores não podem se dar ao luxo”... Como já havia previsto a invasão, cada vez maior, dos best-sellers nas livrarias (em O Negócio do Livro), Epstein apenas espera que o livro eletrônico preserve o que chama de “nossa memória cultural” – sem a qual “nossa civilização entraria em colapso”... [1 Comentário(s)]
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>>> Publishing: The Revolutionary Future
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Volume 57, Number 4 · March 11, 2010

Publishing: The Revolutionary Future

By Jason Epstein

The transition within the book publishing industry from physical inventory stored in a warehouse and trucked to retailers to digital files stored in cyberspace and delivered almost anywhere on earth as quickly and cheaply as e-mail is now underway and irreversible. This historic shift will radically transform worldwide book publishing, the cultures it affects and on which it depends. Meanwhile, for quite different reasons, the genteel book business that I joined more than a half-century ago is already on edge, suffering from a gambler's unbreakable addiction to risky, seasonal best sellers, many of which don't recoup their costs, and the simultaneous deterioration of backlist, the vital annuity on which book publishers had in better days relied for year-to-year stability through bad times and good. The crisis of confidence reflects these intersecting shocks, an overspecialized marketplace dominated by high-risk ephemera and a technological shift orders of magnitude greater than the momentous evolution from monkish scriptoria to movable type launched in Gutenberg's German city of Mainz six centuries ago.
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Though Gutenberg's invention made possible our modern world with all its wonders and woes, no one, much less Gutenberg himself, could have foreseen that his press would have this effect. And no one today can foresee except in broad and sketchy outline the far greater impact that digitization will have on our own future. With the earth trembling beneath them, it is no wonder that publishers with one foot in the crumbling past and the other seeking solid ground in an uncertain future hesitate to seize the opportunity that digitization offers them to restore, expand, and promote their backlists to a decentralized, worldwide marketplace. New technologies, however, do not await permission. They are, to use Schumpeter's overused term, disruptive, as nonnegotiable as earthquakes.

NYRB / Fortunes of War

Gutenberg's technology was the sine qua non for the rebirth of the West, as if literacy, scientific method, and constitutional government had been implicit all along, awaiting only Gutenberg to throw the switch. Within fifty years presses were operating from one end of Europe to the other, halting only at the borders of Islam, which shunned the press. Perhaps from the same fear of disruptive literacy that alarmed Islam, China ignored a phonetic transcription of its ideographs, attributed to a Korean emperor, that might have permitted the use of movable type.
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The resistance today by publishers to the onrushing digital future does not arise from fear of disruptive literacy, but from the understandable fear of their own obsolescence and the complexity of the digital transformation that awaits them, one in which much of their traditional infrastructure and perhaps they too will be redundant. Karl Marx wrote of the revolutions of 1848 in his Communist Manifesto that all that is solid melts into air. His vision of a workers' paradise was of course wrong by 180 degrees, the triumph of wish over experience. What melted soon solidified as industrial capitalism, a paradise for some at the expense of the many. But Marx's potent image fits the publishing industry today as its capital-intensive infrastructure—presses, warehouses stacked with fully returnable physical inventory, its retail market constrained by costly real estate—faces dissolution within a vast cloud in which all the world's books will eventually reside as digital files to be downloaded instantly title by title wherever on earth connectivity exists, and printed and bound on demand at point of sale one copy at a time by the Espresso Book Machine[1] as library-quality paperbacks, or transmitted to electronic reading devices including Kindles, Sony Readers, and their multiuse successors, among them most recently Apple's iPad. The unprecedented ability of this technology to offer a vast new multilingual marketplace a practically limitless choice of titles will displace the Gutenberg system with or without the cooperation of its current executives.
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Digitization makes possible a world in which anyone can claim to be a publisher and anyone can call him- or herself an author. In this world the traditional filters will have melted into air and only the ultimate filter—the human inability to read what is unreadable—will remain to winnow what is worth keeping in a virtual marketplace where Keats's nightingale shares electronic space with Aunt Mary's haikus. That the contents of the world's libraries will eventually be accessed practically anywhere at the click of a mouse is not an unmixed blessing. Another click might obliterate these same contents and bring civilization to an end: an overwhelming argument, if one is needed, for physical books in the digital age.
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Amid the literary chaos of the digital future, readers will be guided by the imprints of reputable publishers, distinguishable within a worldwide, multilingual directory, a function that Google seems poised to dominate—one hopes with the cooperation of great national and university libraries and their skilled bibliographers, under revised world copyright standards in keeping with the reach of the World Wide Web. Titles will also be posted on authors' and publishers' own Web sites and on reliable Web sites of special interest where biographies of Napoleon or manuals of dog training will be evaluated by competent critics and downloaded directly from author or publisher to end user while software distributes the purchase price appropriately, bypassing traditional formulas. With inventory expense, shipping, and returns eliminated, readers will pay less, authors will earn more, and book publishers, rid of their otiose infrastructure, will survive and may prosper.
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This future is a predictable inference from digitization in its current stage of development in the United States, its details widely discussed in the blogosphere by partisans of various outcomes, including the utopian fantasy that in the digital future content will be free of charge and authors will not have to eat.
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Digitization will encourage an unprecedented diversity of new specialized content in many languages. The more adaptable of today's general publishers will survive the redundancy of their traditional infrastructure but digitization has already begun to spawn specialized publishers occupying a variety of niches staffed by small groups of like-minded editors, perhaps not in the same office or even the same country, much as software firms themselves are decentralized with staff in California collaborating online with colleagues in Bangalore and Barcelona.
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The difficult, solitary work of literary creation, however, demands rare individual talent and in fiction is almost never collaborative. Social networking may expose readers to this or that book but violates the solitude required to create artificial worlds with real people in them. Until it is ready to be shown to a trusted friend or editor, a writer's work in progress is intensely private. Dickens and Melville wrote in solitude on paper with pens; except for their use of typewriters and computers so have the hundreds of authors I have worked with over many years.
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In preliterate cultures, the great sagas and epics were necessarily communal creations committed to tribal memory and chanted under priestly supervision over generations. With the invention of the alphabet, authors no longer depended on communal memory but stored their work on stone, papyrus, or paper. In modern times, communal projects are limited mainly to complex reference works, of which Wikipedia is an example. Though social networking will not produce another Dickens or Melville, the Web is already a powerful resource for writers, providing conveniently online a great variety of updated reference materials, dictionaries, journals, and so on instantly and everywhere, available by subscription or, like Google search and Wikipedia, free. Most time-sensitive reference materials need never again be printed and bound.
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Informed critical writing of high quality on general subjects will be as rare and as necessary as ever and will survive as it always has in print and online for discriminating readers. Works of genius will emerge from parts of the world where books have barely penetrated before, as such works after Gutenberg emerged unbidden from the dark and silent corners of Europe. Gutenberg's press, however, did not give Europe, with its tight cultural boundaries, a common tongue. Digitization may produce a somewhat different outcome by giving worldwide exposure to essential scientific and literary texts in major languages: Rome redux, while translators will still find plenty of work.
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The cost of entry for future publishers will be minimal, requiring only the upkeep of the editorial group and its immediate support services but without the expense of traditional distribution facilities and multilayered management. Small publishers already rely as needed upon such external services as business management, legal, accounting, design, copyediting, publicity, and so on, while the Internet will supply viral publicity opportunities of which YouTube and Facebook are forerunners. Funding for authors' advances may be provided by external investors hoping for a profit, as is done for films and plays. The devolution from complex, centralized management to semi-autonomous editorial units is already evident within the conglomerates (for example, Nan A. Talese at Random House and Jonathan Karp at Hachette), a tendency that will strengthen as the parent companies fade. As conglomerates resist the exorbitant demands of best-selling authors whose books predictably dominate best-seller lists, these authors, with the help of agents and business managers, will become their own publishers, retaining all net proceeds from digital as well as traditional sales. With the Espresso Book Machine, enterprising retail booksellers may become publishers themselves, like their eighteenth-century forebears.
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Traditional territorial rights will become superfluous and a worldwide, uniform copyright convention will be essential. Protecting content from unauthorized file sharers will remain a vexing problem that raises serious questions about the viability of authorship, for without protection authors will starve and civilization will decline, a prospect recognized by the United States Constitution, which calls for copyright to sustain writers not primarily as a matter of equity but for the greater good of public enlightenment.
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Some musicians make up for lost royalties by giving concerts, selling T-shirts, or accompanying commercials. For authors there is no equivalent solution. Refinements of today's digital rights management software, designed to block file sharing, will be an ongoing contest with file sharers who evade payment for themselves and their friends, often in the perverse belief that "content wants to be free"—much as antiviral software is engaged in a continuing contest with hackers. Unauthorized file sharing will be a problem but not in my opinion a serious one, perhaps at the level that libraries and individual readers have always shared books with others.
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These and other solutions will emerge opportunistically in response to need, as such solutions usually have. It is futile at this early stage, however, to anticipate the new publishing landscape in detail or to specify the rate of evolution, which will be sporadic and complex, or the future role of traditional publishers as digitization advances along a ragged and diverse front, while publishers, writers, and readers adapt accordingly. Timing will be apparent only in retrospect.
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So far I have attempted to foresee the digital future in instrumental terms. There is also a moral dimension, for we are a troublesome species with a long history of self-destruction. The industry that Gutenberg launched eventually made possible wide distribution of Montaigne, Shakespeare, and Cervantes, to say nothing of Babar the Elephant and The Cat in the Hat. But his technology also gave us The Protocols of the Elders of Zion, Mein Kampf, and the nonsense that turned Pol Pot in Paris from a mere fool into a mass murderer. Digitization will amplify our better nature but also its diabolic opposite. Censorship is not the answer to these evils.
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Digital content is fragile. The secure retention, therefore, of physical books safe from electronic meddlers, predators, and the hazards of electronic storage is essential. Amazon's recent arbitrary deletion of Orwell's 1984 at its publisher's request from Kindle users who had downloaded it suggests the ease with which files can be deleted without warning or permission, an inescapable hazard of electronic distribution.[2] In Denmark music downloaded by subscription self-destructs when the subscription expires. So does my annual subscription to the online Oxford English Dictionary unless I renew it. Much other reference material that is usually time-sensitive and for that reason need never be printed and bound is already sold by renewable subscription. If I were a publisher today I would consider a renewable rental model for all e-book downloads—the "lending library" technique of the Depression era—that more accurately reflects the conditional relationship, enforced by digital rights management software, between content provider and end user.
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I would like to add a few words about the evolution of my own interest in digitization. From the beginning of my career I have been obsessed with the preservation and distribution of backlist—the previously published books, still in print, that are the indispensable component of a publisher's stability and in the aggregate the repository of civilizations. In this sense, it is fair to say that book publishing is more than a business. Without the contents of our libraries—our collective backlist, our cultural memory—our civilization would collapse.
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By the mid-Eighties I had become aware of the serious erosion of publishers' backlists as shoals of slow-moving but still viable titles were dropped every month. There were two reasons for this: a change in the tax law that no longer permitted existing unsold inventory to be written off as an expense; but more important, the disappearance as Americans left the cities for the suburbs of hundreds of well-stocked, independent, city-based bookstores, and their replacement by chain outlets in suburban malls that were paying the same rent as the shoe store next door for the same minimal space and requiring the same rapid turnover.
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This demographic shift turned the book business upside down as retailers, unable to stock deep backlist, now demanded high turnover, often of ephemeral titles. Best-selling authors whose loyalty to their publishers had previously been the norm were now chips in a high-stakes casino: a boon for authors and agents with their nonrecoverable overguarantees and a nightmare for publishers who bear all the risk and are lucky if they break even. Meanwhile, backlist continued to decline. The smaller houses, unable to take these risks, merged with the larger ones, and the larger ones eventually fell into the arms of today's conglomerates.
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To offset the decline of backlist I launched in the mid-Eighties the Reader's Catalog, an independent bookstore in catalog form from which readers could order 40,000 backlist titles by telephone. The Internet existed but had not yet been commercialized. The Reader's Catalog was an instant success, confirming my belief in a strong worldwide market for backlist titles. But I had underestimated the cost of handling individual orders and concluded, with my backers, that if we continued our losses would become intolerable. The Internet was now available commercially. Amazon bravely took advantage of it and in the beginning suffered the losses that I feared. But by this time I had begun to hear of digitization and its buzzword, disintermediation, which meant that publishers could now look forward to marketing a practically limitless backlist without physical inventory, shipping expense, or unsold copies returned for credit. Customers would pay in advance for their purchases. This meant that even Amazon's automated shipping facilities would eventually be bypassed by electronic inventory. This was twenty-five years ago. Today digitization is replacing physical publishing much as I had imagined it would.
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Relatively inexpensive multipurpose devices fitted with reading applications will widen the market for e-books and may encourage new literary forms, such as Japan's cell-phone novels. Newborn revolutions often encourage utopian fantasies until the exigencies of human nature reassert themselves. Though bloggers anticipate a diversity of communal projects and new kinds of expression, literary form has been remarkably conservative throughout its long history while the act of reading abhors distraction, such as the Web-based enhancements—musical accompaniment, animation, critical commentary, and other metadata—that some prophets of the digital age foresee as profitable sidelines for content providers.
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The most radical of these fantasies posits that the contents of the digital cloud will merge or be merged—will "mash up"—to form a single, communal, autonomous intelligence, an all-encompassing, single book or collective brain that reproduces electronically on a universal scale the synergies that occur spontaneously within individual minds. To scorn a bold new hypothesis—the roundness of the earth, its rotation around the sun—is always a risk but here the risk is minimal. The nihilism—the casual contempt for texts—implicit in this ugly fantasy is nevertheless disturbing as evidence of cultural impoverishment,[3] more offensive than but not unrelated to the assumption of e-book maximalists that authors who spend months and years at their desks will not demand physical copies as evidence of their labors and hope for posterity.
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The huge, worldwide market for digital content, however, is not a fantasy. It will be very large, very diverse, and very surprising: its cultural impact cannot be imagined. E-books will be a significant factor in this uncertain future, but actual books printed and bound will continue to be the irreplaceable repository of our collective wisdom.
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I must declare my bias. My rooms are piled from floor to ceiling with books so that I have to think twice about where to put another one. If by some unimaginable accident all these books were to melt into air leaving my shelves bare with only a memorial list of digital files left behind I would want to melt as well for books are my life. I mention this so that you will know the prejudice with which I celebrate the inevitability of digitization as an unimaginably powerful, but infinitely fragile, enhancement of the worldwide literacy on which we all—readers and nonreaders—depend.
Notes
[1]A project that I helped found.
[2]See also Amazon's more recent attempt to block sales of books by a major publisher because of a pricing dispute.
[3]For a critical account of this view, see Jaron Lanier, You Are Not a Gadget: A Manifesto (Knopf, 2010), pp. 26, 46.

Letters
March 25, 2010: Paul R. Goldin, Where China Failed


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sábado, 27 de março de 2010

Velha Poesia Árabe na Península Ibérica (séc. XI) - "Itimad"

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domingo, 7 de Março de 2010


Velha Poesia Árabe na Península Ibérica (séc. XI) - "Itimad"

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Invisível a meus olhos,
trago-te sempre no coração.
Envio-te um adeus feito de paixão
e lágrimas de pena com insónia.
Inventaste como possuir-me,
e eu, o indomável, submisso vou ficando!
Meu desejo é estar contigo sempre,
oxalá se realize tal vontade!
Assegura-me que o juramento que nos une
nunca a distância o fará quebrar.
Doce é o nome que é o teu
e que deixo escrito no poema: Itimad.
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Al-Mutamid - Nasceu em Beja (Portugal) no ano de 1040. Faleceu em Marrocos em 1095.
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A Queda de Berlim, a Última Batalha - Cornelius Ryan

terça-feira, 24 de Fevereiro de 2009


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Tradução Tenete Cporonel Augusto Pastor Fernandes
Livraria . Bertrand,  Lisboa sd [1966]
“Nas latitudes mais setentrionais, o amanhecer verifica-se muito cedo. Até mesmo quando os bombardeiros se afastavam da cidade, a leste já despontavam os primeiros raios de luz. No meio da tranquilidade da manhã, podiam ver-se grandes colunas de fumo negro a elevarem-se sobre os bairros de Pankow, Weissensee e Lichtenberg, enquanto as nuvens baixas tornavam difícil separar a suave luminosidade da aurora e os reflexos dos incêndios na cidade de Berlim destroçada pelas bombas.
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À medida que o fumo se ia dissipando vagarosamente, por entre as ruínas surgia no seu macabro esplendor a cidade mais bombardeada da Alemanha, enegrecida pela fuligem, crivada de milhares de crateras e decorada com as vigas retorcidas dos edifícios destruídos.
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Tinham desaparecido numerosos quarteirões de prédios de apartamentos no coração da cidade, o mesmo sucedendo com as zonas suburbanas, completamente volatilizadas. Agora, em todo aquele caos, as largas avenidas e as ruas de outrora eram apenas simples veredas cheias de crateras que serpenteavam através de montanhas de destroços. Por toda a parte, acre após acre, só se viam, escancarados para o céu, edifícios descarnados, sem janelas e sem telhados.
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A seguir aos ataques caía do céu uma chuva muito fina de fuligem e de cinzas que polvilhava os destroços, enquanto nos enormes montões de tijolos esmigalhados e vigas de aço torcidas a única coisa que se movia eram os turbilhões de poeira que rodopiavam ao longo da vasta extensão da Unter den Linden, com as suas famosas árvores agora nuas e os rebentos das folhas queimados nos ramos.
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Eram raros os bancos, livrarias ou estabelecimentos elegantes situados no famoso boulevard que não tivessem sofrido estragos; todavia, no seu extremo oeste, o mais famoso monumento de Berlim – a porta de Brandeburgo – com as suas doze colunas dóricas maciças e de altura igual a um edifício de oito andares, embora crivado de profundos golpes, ainda permanecia de pé na via triumphalis. (…)
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(…) Nessa manhã luminosa, os berlinenses dos vinte bairros da capital apareceram à luz do dia como os habitantes das cavernas neolíticas, emergindo dos túneis do metropolitano, dos abrigos situados por baixo dos edifícios públicos e das caves ou pavimentos inferiores dos prémios semidestruídos.
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Fossem quais fossem as suas esperanças ou receios, as suas lealdades ou crenças políticas, todos os berlinenses compartilhavam dum sentimento comum: os que haviam sobrevivido mais uma noite estavam resolvidos a sobreviver mais um dia.
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O mesmo se podia dizer quanto à nação.
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Nesse sexto ano da Segunda Guerra Mundial, a Alemanha de Hitler estava a lutar desesperadamente pela sobrevivência. O Reich que havia de durar mil anos tinha sido invadido a oeste e a leste. As forças anglo-americanas estavam a limpar toda a região ao longo do Reno, haviam atravessado o rio em Remagen e precipitavam-se já em direcção a Berlim, da qual só distavam 300 milhas. Na margem oriental do Oder, tinha-se materializado uma ameaça muito mais urgente e infinitamente mais temerosa, traduzida na presença dos exércitos russos, situados apenas a 50 milhas.

Estava-se a 21 de Março de 1945, uma quarta-feira, com a qual se iniciava a Primavera. Nessa manhã, os berlinenses ouviram através dos aparelhos de rádio de toda a cidade o último êxito em canções: Esta Primavera não terá fim. (…)”
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A Última Batalha (A Queda de Berlim) - Cornelius Ryan (1920-1974) - Publicado por Livraria Bertrand, Lisboa, 1967.
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Disponível na Biblioteca Nacional de Lisboa (Cota ----> H.G. 25078 V.)
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http://torredahistoriaiberica.blogspot.com/2009/02/aberturas-de-grandes-livros-ultima.html


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''Erich Bayer também só pensava numa data especial. Há semanas que o contabilista de Wilmersdorf se sentia preocupado acerca do que deveria fazer na terça-feira, dia 10 de Abril, ou seja, no dia seguinte. O pagamento tinha de ser efectuado nessa data, pois de outro modo poderia resultar para ele uma série de perturbações burocráticas. Bayer possuía o dinheiro. Não era esse o seu problema. Mas teria isso agora qualquer importância? O exército que tomasse Berlim - americano ou russo - importar-se-ia com o pagamento? E se ninguém conquistasse a cidade? Bayer considerou o problema sob todos os aspectos. A seguir, dirigiu-se ao seu banco e levantou 1400 marcos. Depois, entrou na repartição próxima e pagou os seus impostos respeitantes ao ano de 1945.''.

- Cornelius Ryan, in A Queda de Berlim, A última Batalha, Documentos de Todos os Tempos, 1965, ed. Bertrand
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http://lili-one.livejournal.com/1344904.html
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Os últimos dias do III Reich
Este curto relato, pretende dar ao leitor uma pequena ideia, de uma forma cronológica, do que foram os últimos dias do III Reich de Hitler. Não se trata de um trabalho com grande profundidade, para especialistas, mas sim, de um relato sobre o que se passava na frente de batalha às portas de Berlim, e dentro do abrigo do comandante em chefe de um império que devia durar 1000 anos, mas que não chegou sequer a 1000 semanas
De entre os vários livros de História que serviram como base, para o que a seguir se descreve, resalta a obra de Cornelius Ryan, A queda de Berlim, a última Batalha”. No entanto, os factos relatados, e as datas, nem sempre se referem exclusivamente àquela obra. É porém a sua estrutura base, a utilizada para iniciar este relato, que começa quando em 22 de Março de 1945, o General Gothard Henrici, um general desconhecido da maioria dos Alemães, por ter o seu nome ligado, não ás grandes vitórias, mas sim ás retiradas estratégicas e à guerra defensiva, é nomeado Comandante do Grupo de exércitos do Vístula, a última defesa, entre Berlim, e a avalanche de forças russas.
Com inicio em 22 de Março, relata-se a situação desde que o coronel-general Heinrici, é nomeado como comandante do grupo de exércitos do Vístula.
A partir de 16 de Abril, e até 30 de Abril, faz-se um relato diário, onde se incluem mapas da posição da frente de batalha, e/ou fotografias que tenham a ver com os acontecimentos. Ao mesmo tempo, incluem-se pequenos extractos sobre a situação dentro da cidade de Berlim, e sobre os acontecimentos dentro do abrigo de Hitler.
O relato diário, tem o seu fim, quando ocorre a rendição da Alemanha.
A acção, decorre durante o período final da curta vida do III Reich. Depois das grandes conquistas de 1939,1940 e 1941, e do periodo de impasse de 1942 e 1943, veio em 1944 a resposta dos aliados, com a invasão da Normandia e os enormes avanços soviéticos para ocidente.
Em Março de 1945, a situação da Alemanha é desesperada. As forças soviéticas, na sua última ofensiva, haviam atacado com uma força devastadora na Prussia oriental, e haviam tomado toda a Alemanha até ao rio Oder, que se encontrava a apenas 90 quilometros de Berlim. A Oceidente, as forças americanas e britânicas, haviam chegado ao Reno, tendo os americanos tomado uma ponte em Remagen, conseguindo por isso estabelecer uma testa de ponte naquele lugar. No entanto, outras passagens do Reno são eminentes. É perante esta situação que Hitler é convencido a nomear o general Gothard Heinrici para chefe do grupo de Exércitos do Vístula (grupo de exércitos que havia recuado desde o rio Vístula, até ao rio Oder, em frente a Berlim)
Além do diário, estão disponiveis resumos sobre, as principais figuras da batalha, as principais armas da batalha, e sobre o abrigo de Hitler, nos subterrâneos do complexo de edificios da chancelaria.

http://www.areamilitar.net/historia/1945_QuedaBerlim/quedainicio.asp
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Cornelius Ryan

Cornelius Ryan nasceu em Dublin, na Irlanda, em 1920, onde foi criado. Com pouco mais de vinte anos, cobriu os conflitos da Segunda Guerra Mundial, de 1941 a 1945, para a agência de notícias Reuters e para o jornal britânico London Daily Telegraph. Participou de quatorze missões de bombardeio junto às forças aéreas norte-americanas, do desembarque no Dia D, do avanço aliado através da França e da Alemanha e, após o final dos conflitos em solo europeu, cobriu os últimos meses da campanha no Pacífico, tornando-se um dos mais proeminentes correspon­dentes de guerra da época. Em seu trabalho, baseava-se tanto em fontes oficiais e entrevistas com líderes militares quanto em depoi­mentos de soldados comuns e civis, de modo que toda a sua obra está impregnada de uma for­te tensão humana. Foi com rigor jornalístico de detalhes e informações e com extrema compaixão para com os dramas das pessoas envolvidas que Ryan escreveu a sua trilogia da Segunda Guerra Mundial: The longest day, 1959 (O mais longo dos dias (L&PM POCKET, 2004), sobre o Dia D; The last battle, 1966 (A última batalha, L&PM Editores, 2005), sobre o final da Segunda Guerra Mundial e a queda de Berlim; e A bridge too far, 1974 (Uma ponte longe demais), sobre a malsucedida operação aliada Market Garden.

O mais longo dos dias vendeu cerca de quatro milhões de exemplares em quase 30 línguas e foi levado às telas do cinema em 1962, em uma megaprodução internacional de mesmo nome sob a direção de Darryl F. Zanuck, estrelada por vários dos grandes atores da época, como Robert Mitchum, John Wayne, Sean Connery, Richard Burton, Henry Fonda, Alain Dellon e outros. A bridge too far também foi transformado em filme, em 1977. Em 1973, Cornelius Ryan recebeu a medalha da Legião de Honra do governo francês. Morreu de câncer, em 1976.
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Livros do Autor


MAIS LONGO DOS DIAS, O

Cornelius Ryan
Tradução de William Lagos

Coleção L&PM Pocket
Ref. 363
384 páginas
ISBN-10 85.254.1323-2
ISBN-13 978.85.254.1323-9
R$ 22,00

ÚLTIMA BATALHA, A

Cornelius Ryan
Tradução de Pedro Gonzaga

Outros Formatos
448 páginas
ISBN-10 85.254.1384-4
ISBN-13 978.85.254.1384-0
R$ 56,00

http://www.lpm-editores.com.br/site/default.asp?TroncoID=805134&SecaoID=948848&SubsecaoID=0&Template=../livros/layout_autor.asp&AutorID=108

Estalinegrado, Notas do Comandante em Chefe - A. I. Emerenko

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Estalinegrado - s/d
A. I. Eremenko
broch c/ sobre capa/485 pág
Editora Arcádia - Lisboa.
tradução - Jorge Sampaio
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65 anos da vitória soviética que decidiu a 2º Guerra
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No final da tarde do dia 23 de agosto de 1942, mil aviões nazistas começaram a lançar toneladas de bombas incendiárias sobre a população de Stalingrado. Esta cidade, onde na época residiam 600 mil homens, mulheres e crianças, e onde haviam muitas construções de madeira e depósitos de combustíveis, se transformou em poucos minutos numa gigantesca fogueira. “Stalingrado foi imersa nos clarões do incêndio, rodeada de fumaça e fuligem. Toda a cidade ardia. Enormes nuvens de fumaça e de fogo turbilhonavam acima das usinas. Os reservatórios de petróleo pareciam vulcões vomitando suas lavas. O coração apertava de compaixão pelas vítimas inocentes do canibalismo fascista”, informava o general Eremenko, comandante da frente de Stalingrado.
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Um terror genocida e sem precedentes era a arma de Hitler com o objetivo de dobrar a moral soviética e se apoderar dos imensos recursos naturais da Pátria socialista. “Sem possuir recursos vitais importantes, a Alemanha nazista não poderá sustentar uma guerra muito prolongada”, advertia José Stalin na primavera de 41, conclamando o povo a acelerar os esforços de guerra visando fazer frente ao inimigo e prevendo a proximidade da agressão a seu país.
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Quase dois anos depois, sob o comando firme e decisivo de Stalin, essa mesma cidade, brutalmente agredida, e esse mesmo povo, vítima da insana covardia nazista, escreveria a sangue, ferro e fogo uma das mais belas páginas de heroísmo da História, dando ao mundo a primeira grande vitória contra a besta-fera nazista no dia 2 de fevereiro de 1943.
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Stalingrado foi o principal marco da Segunda Guerra Mundial, abrindo as portas para a libertação dos países ocupados e vilipendiados - como a França, Espanha, Holanda, Noruega, Grécia, entre outros - como tão bem resgata Pablo Neruda em seu “Novo Canto de Amor a Stalingrado”, que abaixo publicamos numa homenagem à Batalha que decidiu o futuro de Hitler e da Humanidade.
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Novo Canto de Amor a Stalingrado
PABLO NERUDA
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Escrevi sobre a água e sobre o tempo,
descrevi o luto e seu metal acobreado,
escrevi sobre o céu e a maçã,
agora escrevo sobre Stalingrado.
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As noivas já guardam no seu lenço
raios de meu amor enamorado,
meu coração agora está no solo,
na fumaça e na luz de Stalingrado.
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Já toquei com as mãos a camisa
do crepúsculo azul e derrotado:
agora toco a própria luz da vida
nascendo com o sol de Stalingrado.
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Sinto que o velho-jovem transitório
de pluma, como os cisnes adornado,
despe a roupagem de seu mal notório
por meu grito de amor a Stalingrado.
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Ponho minh`alma onde quero.
E não me nutro de papel cansado
temperado de tinta e de tinteiro.
Nasci para cantar a Stalingrado.
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Minha voz esteve com teus inúmeros mortos
contra teus próprios muros esmagados,
minha voz soou como o sino e o vento
vendo-te morrer, Stalingrado.
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Agora americanos combatentes
brancos e escuros como a romã,
matam no deserto a serpente.
Já não estás a sós, Stalingrado.
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França volta às velhas barricadas
com pavilhão de fúria hasteado
sobre as lágrimas recém derramadas.
Já não estás a sós, Stalingrado.
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E os grandes leões da Inglaterra
voando sobre o mar de furacões
cravam as garras na parda terra.
Já não estás a sós, Stalingrado.
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Hoje abaixo de suas montanhas de escarmento
não estão apenas os teus enterrados:
tremendo está a carne de teus mortos
que tocaram tua frente, Stalingrado.
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Teu aço azul de orgulho construído,
seu cabelo de planetas coroados,
teu baluarte de pães divididos,
tua fronteira sombria, Stalingrado.
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Tua Pátria de louros e martírios,
o sangue no teu esplendor nevado,
o olhar de Stalin sobre a neve
tingida com teu sangue, Stalingrado.
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As condecorações que teus mortos
colocaram sobre o peito transpassado
da terra, o estremecimento
da morte e da vida, Stalingrado.
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O sal profundo que de novo traz
ao coração do homem estremecido
com a rama de vermelhos capitães
saídos de teu sangue, Stalingrado.
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A esperança que se rompe em seus jardins
como a flor da árvore esperada,
a página gravada de fuzis,
as letras de sua luz, Stalingrado.
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A torre que concebes nas alturas,
os altares de pedra ensanguentados,
os defensores de tua idade madura,
os filhos de tua pele, Stalingrado.
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As águias ardentes de tuas pedras,
os metais por tua alma amamentados,
os adeus de lágrimas imensas
e as ondas de amor, Stalingrado.
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Os ossos dos assassinos feridos,
os invasores de pálpebras fechadas
e os conquistadores fugitivos
atrás de sua centelha, Stalingrado.
Os que humilharam a curva do Arco
e as águas do Sena transpuseram
com o consentimento do escravo,
se detiveram em Stalingrado.
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Os que a bela Praga sobre lágrimas,
sobre o emudecido e o traído,
passaram pisoteando suas feridas,
morreram em Stalingrado.
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Os que na gruta grega esculpiram
a estalactite de cristal quebrado
em seu clássico azul escasso,
agora onde estão, Stalingrado?
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Os que a Espanha incediaram e dividiram
deixando o coração encarcerado
dessa mãe de ensinos e guerreiros,
se puseram a seus pés, Stalingrado.
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Os que na Holanda, água e tulipas
salpicaram no lodo ensanguentado
e derramaram o açoite e a espada,
agora dormem em Stalingrado.
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Os que na branca noite da Noruega
Um uivo de chacal soltaram
incendiando esta gelada primavera,
emudeceram em Stalingrado.
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Horror a ti pelo que o ar traz,
o que se há de cantar e o cantado,
horror por tuas mães e teus filhos
e teus netos, Stalingrado.
Horror ao combatente da névoa,
horror ao comissário e ao soldado,
horror ao céu por traz da tua lua,
horror ao sol de Stalingrado.
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Guarda-me um pedaço de violenta espuma,
guarda-me um rifle, guarda-me um arado,
e que o coloquem em minha sepultura
com uma espiga vermelha de teu estado,
para que saibam, se há alguma dúvida,
que morri amando-te e que me tens amado,
e se não estive combatendo em tua cintura
deixo em tua honra esta granada escura,
este canto de amor a Stalingrado.
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http://www.horadopovo.com.br/2008/fevereiro/2639-08-02-08/P8/pag8c.htm
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Novembro de 1942 a fevereiro de 1943

 

Dramática Stalingrado


Tópicos do capítulo:

Distorção das linhas alemães na Rússia
Stalingrado, objetivo acessório, para o alvo principal
Hitler destrói List e Halder
19 de novembro: ataque russo no Don
O Fuhrer recusa o abandono de Stalingrado. Paulus obedece
Manstein assume o comando do Grupo Don
Paulus condenado a permanecer cercado
Derrota italiana. Agonia do 6o Exército alemão
8 de janeiro: os russos propõem uma capitulação
31 de janeiro: fim em Stalingrado, fúria de Hitler


Paroxismo


Já é hora de voltarmos à estepe russa. A tragédia que aí se desenrola eqüivale em intensidade dramática à do inverno de 1941, em frente a Moscou, e ultrapassa-o em alcance histórico.

De Voronej ao Cáucaso, a extensão e distorção das linhas alemães atingiram um grau espantoso. O Grupo de Exércitos Sul começara sua campanha de verão numa frente de 800 km. Fracionara-se em dois, A e B, cujas frentes, somadas, representavam nada menos de 2.600 km. A ligação dos combatentes com as bases que os abastecem resume-se em estradas que a mais leve chuva torna intransitáveis e em ferrovias, geralmente de linha única, cujos trilhos estão colocados no chão sem qualquer escora de cascalho ou pedras. A circulação do material rodante, extremamente lenta, é ainda agravada pelos atentados dos partisans, que atingem a média de 700 por mês, sendo que repressão alguma consegue diminuir seu índice de crescimento.

O objetivo da ofensiva era a conquista da Transcaucásia. Essa tarefa cabia ao Grupo A, comandado pelo Marechal-de-Campo Von Kleist. O Grupo B, confiado sucessivamente ao Marechal Von Bock e ao General Von Weichs, tinha apenas uma missão de cobertura, contudo grandiosa. Deveria prolongar a barreira do Don, aferrolhando o istmo de 60 km que separa o Don do Volga, e aproximar-se paulatinamente do curso deste último, que acompanharia até Astracã. No final da campanha, isto é, antes da chegada do inverno, as posições alemães ao sul da URSS deveriam ser limitadas pelo litoral do mar Negro, a depressão transcaucásica de Batum e Bacu através de Tíflis, o litoral do mar Cáspio e, finalmente, o Volga e o Don.

Seria absurda essa ambição? Sim e não.

Não: o plano de Hitler daria à Alemanha o petróleo do Cáucaso. Eliminaria os russos do mar Negro, fazendo desaparecer a ameaça de contra-ofensiva na direção da Criméia, da Ucrânia e da Romênia. O Volga tonar-se-ia o extenso e sólido pilar do edifício alemão na Rússia. O prosseguimento da campanha acarretaria operações num perímetro de 4.200 km, mas a vitória permitiria reduzir a frente efetiva em cerca de 1.000 km, da foz do Volga ao curso médio do Don. Era essa, na verdade, a única possibilidade de vitória, já que desaparecera a esperança do pronto e total aniquilamento do Exército Vermelho.

O absurdo flagrante e fatal residia na desproporção entre fim e meios. Para realizar o plano de Hitler, os exércitos alemães deveriam dispor de efetivo duplo, tríplice mobilidade e aviação quádrupla. As tropas deveriam estar repousadas e reintegradas. Vinham combatendo sem tréguas desde o início da guerra com a Rússia, e as perdas sofridas não haviam sido reparadas quer em pessoal quer em material. Muito raramente o efetivo das companhias ultrapassava 60 homens, e os das Panzerdivisionen, 80 tanques. Hitler, que jamais ia ao front, e nunca permitira que seus colaboradores próximos lá fossem, não tinha a menor idéia concreta do desgaste que seus exércitos acusavam em meio das vitórias obtidas. Caso o conhecesse, ter-lhe-ia sido impossível sacar, de uma Alemanha insuficientemente preparada para o impasse de uma guerra mundial, os recursos que agissem como paliativos nessa instância.

À inquietação que se elevaria em torno dele, o Fuhrer respondia apoiando-se no argumento de que os exércitos soviéticos estavam a um passo do fim. Acolhia calorosamente todos os indícios comprovadores do esgotamento do inimigo, e repelia com furor toda prova em contrário. A audácia dessa estratégia justificava-se, sustentava Hitler, pela proximidade do último quarto de hora. Toda guerra é ganha com restos; diante dos destroços russos, as sobras dos alemães conservavam o poder da decisão.

Passara-se o verão. Passa-se o outono. Tórrido ainda ontem, o vento da estepe volta a ser glacial. A neve cai na montanha e surge na planície. Os chefes dos corpos de tropas redigem relatório sobre relatório, pedindo o aceleramento do envio de equipamentos de inverno. Segundo o calendário do Alto-Comando, os objetivos de 1942 deveriam estar atingidos. Em que medida o são, ou ainda podem sê-lo, antes que de fato se instaure o verdadeiro inverno?

Batum, junto ao mar Negro, deveria ser tomada; faltam ainda 500 km para isso. Nenhum progresso importante, foi realizado após a tomada de Novorossisk, e, no interior, a escalada do Elbruz (5.800 m) parece ter marcado com uma proeza esportiva o limite do esforço alemão. O Subgrupo do Exército Ruoff, composto do 17o Exército alemão e do 3o Exército romeno, combate em sublimes paisagens; florestas virgens, gargantas selvagens, esporões rochosos, de onde se descortina a verdejante planície costeira e a grande mancha escura do mar. Fracassaram, porém, todas as tentativas para descer até essa costa.

No Cáucaso central, Tíflis já deveria ser alemão. Não o é nem ao menos seu vestíbulo, Ordjonikidze. O 1o Exército Blindado reuniu no cotovelo do Terek todas as forças que pôde sacar de seus 700 km de frente, a 13a Divisão Panzer tentou subir de novo as gargantas que introduzem diretamente à estrada militar da Ossetia: as dificuldades do terreno, a penúria de gasolina e a resistência russa conjugaram-se para detê-la. Mais a leste, a Divisão Viking, formada por voluntários nórdicos, tentou apoderar-se da importante zona petrolífera de Grozny. Foi feita uma cabeça-de-ponte sobre o Terek, ao preço de sobre-humanos esforços, mas faltava inteiramente o reforço necessário para tirar partido desta vantagem. A 12 de novembro, em meio duma tempestade glacial, os Vikings tornaram a cruzar o rio. Em parte alguma a Wehrmacht irá mais longe do que isso.

O objetivo real da campanha era Bacu. Nenhum soldado alemão dela se aproximará, a não ser num raio de 600 km. “Se não tomo o petróleo de Bacu - dissera Hitler -, ver-me-ei obrigado a acabar com a guerra”.

Entre o Terek e o baixo Volga, na estepe calmuque, uma única divisão, a 16a Motorizada, atravessou o vazio de 400 km existente entre os grupos de Exércitos A e B. Os próprios russos, na verdade, não conseguem saturar tão enormes espaços. A 16a Motorizada toma Elista, capital dos nômades, e uma patrulha, conduzida por um certo Oberleutnant Gottlieb, avança até a 25 km de Astracã. Corta a linha férrea de Bacu, incendeia um trem de petróleo e volta sem ter visto um único soldado inimigo. Um vazio praticamente total se estende entre os exércitos que combatem no Cáucaso e os que se comprimem no Volga.

Ao norte de Elista, o 4o Exército romeno, composto de dois débeis corpos, esboça uma frente ofensiva, formando ao longo de uma cadeia de lagos, comprovantes de um antigo curso do Volga. À sua esquerda, o 4o Exército Blindado, do General Hoth, alcança o grande rio perto do cotovelo que este desenha, para deixar a direção do mar Negro e tomar a do Cáspio. Até 16 de setembro, essa força participara da luta por Stalingrado, e depois cedera parte de suas unidades ao 6o Exército, encarregado de concluir a conquista da cidade. Reduzido ao 4o Corpo e à 29a Divisão Motorizada, o 4o Exército Blindado se encontrava em condições de apoderar-se das alturas de Krasno-Armensjk, de onde os russos dominavam suas linhas.

Entramos no setor do 6o Exército, nos limites de Stalingrado. O oficial que o comanda, General Friedrich Paulus, é o mais recente dos grandes chefes alemães. Com apenas 52 anos de idade, ex-general-intendente, ex-chefe do Estado-Maior do Marechal Reichenau, ele fora chamado, não sem despertar ciúmes, para ficar à frente de uma das principais peças do tabuleiro do xadrez militar.

Hitler, entretanto, tem os olhos sobre ele para outro papel, menos invejável: pretende, quando Paulus conquistar Stalingrado, confiar-lhe as funções de Jodl, promovendo-o a seu estrategista particular.

O favor político não influi na brilhante promoção de Paulus. Oriundo de um meio de modestos funcionários, elevado socialmente por sua aliança com uma boa família romena, ele é neutro em política, como é morno de personalidade. A obediência é o principal esteio do Exército, mas a desobediência leva regularmente à glória os grandes chefes. Paulus é incapaz de desobedecer.

A incumbência que lhe fora confiada para a campanha de 1942 torna-se cada vez mais pesada. As operações do 6o Exército só haviam sido inicialmente previstas para o ferrolho do Don, permanecendo Stalingrado como objetivo suplementar, antes uma presa do que uma meta. Depois, o que era acessório revestiu-se da maior importância. Hitler começara por declarar que não exigia a ocupação da cidade, contentando-se com a destruição de seu potencial industrial. Vê agora, pela feroz batalha que ele provoca, o impasse capital e decisivo da luta contra a Rússia.

O cerco teve início a 2 de setembro, pela junção, nas colinas que dominam a cidade, do 6o Exército e do 4o Exército Blindado. A causa parece perdida para os russos. Todas as comunicações terrestres de Stalingrado são cortadas, e o abastecimento da guarnição só é realizável pelo Volga. O General Lopatine, comandante do 62o Exército, considera a cidade indefensável, e solicita autorização para tornar a cruzar o rio. Voltando, porém, ao sistema de defesa elástica adotado no início do verão, Stalin acaba de proclamar que a Rússia não pode mais ceder território algum. O comandante do grupo de exércitos, Eremenko, e seu novo comissário político, Kruschev, substituem Lopatine pelo General Tchuikov, recém-chegado do Extremo Oriente. Suas ordens resumem-se a uma frase: conservar Stalingrado, ou morrer.

Stalingrado é um cais do Volga. Vira as costas à estepe e contrai-se ao longo da enorme massa líquida. As margens escarpadas interrompem-se por um declive abrupto, o que complica as relações da aglomeração e do rio, fornecendo contudo um ângulo morto às armas de longo alcance. Os barrancos erodidos, os balkas da estepe, prolongam-se pela cidade por uma série de depressões, sendo a mais profunda ocupada pelo rio, que conservara o nome de Tzaritza, quando a Tzaritzina se tornara Stalingrado. A cidade velha fica ao sul. A cidade central, cujo coração é a Praça Vermelha, desce por vários lances de escada da colina Mamai ao desembarcadouro do ferry, que substitui as pontes ausentes. Desenvolve-se em direção ao norte a faixa das pequenas cidades industriais. A fábrica de produtos químicos Lazur ocupa o centro de um entroncamento ferroviário nitidamente visível em fotografias aéreas, provindo daí seu apelido, Raquete de Tênis. Vem a seguir a Usina Siderúrgica Outubro Vermelho, a fundição de canhões Barricada e a fábrica de tratores Djerjinski. Os subúrbios de Spartokovska e de Rynok prolongam Stalingrado até a vasta superfície líquida a partir da qual a extensa sangria do Achtuba começa a desmembrar o Volga. O comprimento total dessa cadeia urbana e industrial ultrapassa 50 km. A largura raramente excede 3.000 passos.

A cidade velha caiu primeiro. A conquista do grande silo pela 29a Divisão Motorizada foi o primeiro dos combates fantásticos que dão um caráter único à batalha de Stalingrado. As detonações, a ressoar na enorme carapaça de concreto, arrebentavam os tímpanos, quais elásticos esticados em demasia. O edifício ainda estava cheio de trigo: russos e alemães matavam-se em meio a uma dourada cascata. Os alemães levaram vantagem. No meio de outubro, haviam conquistado, no setor sul, 10 km de margem, de Kuperovskie ao pé das escadas da Praça Vermelha. No setor norte, ocuparam uma ala eqüivalente, de uma ponta a outra de Rynok.

Se os russos fossem razoáveis, teriam desistido. Só conservavam, de Stalingrado, uma parte dos bairros industriais do Norte, como também, na cidade central, o sopé da escarpadura: uma faixa de algumas dezenas de metros de largura, finalizando em bisel à entrada do desembarcadouro. A batalha, contudo, revestira-se de caráter irracional. Não mais punha em choque dois comandos sensíveis à lógica militar, e sim jogava, um contra o outro, dois incontroláveis fanatismos. Do lado alemão, o absurdo era ainda mais flagrante.

Quando se constatou, em outubro, que o Grupo de Exércitos A perdera qualquer possibilidade de conquistar em 1942 o petróleo do Cáucaso, a ponta de Stalingrado ficou destituída de interesse estratégico. Sua última justificativa econômica, a intercepção do tráfego do Volga, encontrava-se às vésperas de desaparecer, pois o congelamento do rio deveria interromper a navegação muito mais efetivamente do que a presença dos soldados de Paulus em Rynok e a dos de Hoth em Kuperovskoie. A principal tarefa do Comando alemão constituiria, daí em diante, em receber o segundo inverno russo em melhores condições do que o primeiro, encurtando e consolidando uma desmesurada frente. O avanço em direção a Tíflis e a punção até o Volga encabeçavam os sacrifícios a serem admitidos.

Hitler, porém, desligara-se da realidade, e os que tentavam fazê-lo voltar a ela pagavam caro por isso.

No começo de setembro, um general fora massacrado por sustentar a necessidade da limitação da marcha para a frente, e um outro caíra em desprestígio por havê-lo defendido. O primeiro era o Marechal-de-Campo List; o segundo, o General Jodl. Ao voltar de uma missão ao QG do Grupo de Exércitos A, Jodl ousara lançar ao rosto de Hitler que as faltas reprovadas a List eram conseqüência das ordens que o próprio Fuhrer dera. Este deixou o recinto lívido, como se fosse desmaiar, vagueou durante horas pelos bosques de Vinnitsa, e fechando-se de vez num círculo de solidão, deixou para sempre de fazer as refeições à mesa de seus oficiais. Destituído de seu comando, List desaparece da história das hostilidades.

No fim de setembro, Halder, por sua vez, desaparece. Mantivera-se no posto de chefe do Estado-Maior Geral do Exército desde a crise de Munique. Mas seu espírito crítico, seu discurso, seus protestos, advertências, somadas a seu catolicismo, indispunham-no junto a um ditador que se deixava proclamar por seus cortesão como “o maior gênio de todos os tempos”. A taça transbordou em 24 de setembro. “Tanto os seus nervos como os meus - disse Hitler - estão esgotados. Não é de um mestre-escola, mas de um homem imbuído do fanatismo nacional-socialista, que necessito para conduzir minha guerra na Rússia..”

Kurt Zeitzler, que substituiu Halder, não passa de um simples general-major - No Exército alemão, as patentes de general obedecem à seguinte hierarquia: general-major (sem estrelas); general-tenente (1 estrela); general-capitão (2 estrelas); general-coronel (3 estrelas).  Seu OKH tem por única atribuição a frente oriental, ficando os palcos de operações colocados diretamente sob a autoridade do OKW, isto é, Keitel. Na realidade, tudo se torna confuso sob a onipotência caprichosa e verborrágica de Adolf Hitler. Depois do rompante contra Jodl, estenógrafos registram todas as conferências com caráter de relatório Lagebesprechungen feitas em seu QG. Delegarão assim à história um lenga lenga fantástico, onde se vê Hitler passar das mais sublimes considerações a pormenores sem importância, mostrando-se a cavaleiro do mundo, para, no minuto seguinte, deslocar uma companhia, sem contudo sentir-se tentado uma só vez a ir ao front, ou de roçar-se em outros Feldgrauen que não são os heróis condecorados, enluvados e desinfetados que faz trazer à sua presença de vez em quando.

Em vez de renunciar a Stalingrado, o Exército alemão encarniça-se em mantê-la. Todos os batalhões de engenharia militar são trazidos em aviões e formados em grupos de assalto para abrir caminho à infantaria nos grandes bastiões industriais. Os combates desenrolam-se no meio da confusão da maquinaria quebrada das fábricas, de pontes rolantes tombadas, de estruturas espatifadas de edifícios. Os alemães sabem que nada lhes será cedido, e que até a última pedra de Stalingrado deverá ser regada com seu sangue.

A 9 de novembro, na 19a celebração do Putsch de Munique, Hitler alardeia: “Eu quis atingir o Volga na própria cidade que leva o nome de Stalin. Tomamos essa cidade, exceção feita de duas ou três insignificantes ilhotas. Perguntam-me: “Por que não acaba mais depressa com ela?”. Respondo: Porque não quero saber de um segundo Verdun. Deixo a pequenos grupos de assalto o cuidado de ultimar a conquista de Stalingrado”.

Ao dizer que Stalingrado se encontrava inteiramente conquistada, o Fuhrer em nada falseara a verdade. Os russos conservavam o desembarcadouro, agarravam-se à Raquete de Tênis e detinham uma parte da Usina Outubro Vermelho, assim como as saídas orientais das fábricas Barricada e Djerjinski. Tudo mais, correspondendo a nove décimos de Stalingrado, 50 km de ruínas, estava nas mãos do inimigo. Todos os imóveis de madeira, queimadas, ficando apenas os vestígios de milhares de chaminés enegrecidas. Não podendo transpor o Volga, a população fugira para a estepe desprovida de recursos, e milhares de inocentes morreram de fome.

Mas Hitler subestima sua platéia ao fazer crer que os combates de Stalingrado se resumem agora à tarefa de uns poucos varredores de destroços. A totalidade do 51o Corpo, repartido em oito divisões, está empenhada na batalha das ruas. Os melhores elementos do grupo de exércitos são por ela sorvidos. Ao invés de perder tempo em diletantismos, o Fuhrer apressa-se em terminar a operação. A 17 de novembro, de Berchtesgaden, para onde fora após o desembarque anglo-americano na África do Norte, ele se dirige a todos os coronéis que ocupam postos de comando em Stalingrado. “Conheço as dificuldades de sua tarefa. As que os russos enfrentam não são menores, e os gelos flutuantes irão aumentá-la. Conto com sua energia para tirar proveito dessa circunstância favorável, e conquistar definitivamente a fábrica de canhões e a siderúrgica”.

Os regimentos alemães correspondem a esse apelo. A 19 de novembro, Djerjinski e Barricada encontram-se inteiramente em seu poder. São conquistadas várias centenas de metros do rio. Os gelos que flutuam no Volga efetivamente interrompem o abastecimento dos defensores. Tchuikov dá a conhecer que está à míngua de munição, de víveres, de sangue...

O cerco aproxima-se do fim. E é então que chega ao comandante do 6o Exército uma ordem completamente inesperada: suspender todos os ataques na frente de Stalingrado...



O flanco de vidro do aríete


O exército de Paulus não combate apenas em Stalingrado. Dobrando-se, qual braço protetor, barra o istmo que separa o Volga do Don. Transpõe este último e, rodeando o ferrolho de Kremenskaia, em poder dos russos, estende-se até Kletskaia. Dois corpos de exércitos, o 8o e o 11o, guardam essa frente defensiva.

Além de Kletskaia, até a vizinhança de Voronej, estendem-se os setores mantidos pelos aliados da Alemanha: romenos, italianos e húngaros.

Os três exércitos eqüivalem-se em fraqueza. Uma testemunha italiana, que vira passar em Viena seus compatriotas a caminho da Rússia, assim registrou suas impressões: “Nossos soldados não tem boa aparência. Estão sujos, mal equipados e principalmente mal enquadrados e muito mal armados. Caso venham realmente a combater contra o Exército russo, encontrar-se-ão logo em má situação. Nosso coração está apertado por causa deles”. A motorização dos três exércitos é, a bem dizer, nula. Equipamento, vestuário, transmissores, material óptico, etc, são de última categoria. A artilharia é antiquada. A defesa antitanque não dispõe de canhão superior ao canhão 37 hipomóvel. O moral é incerto. Como os contingentes estrangeiros no Grande Exército, os soldados tem consciência de que essa guerra não é deles, e não podem deixar de ressentir-se da inferioridade material e moral com que combatem.

Numericamente, a contribuição húngaro-ítalo-romena à guerra de Hitler é considerável. O 2o Exército húngaro, mais próximo à Voronej, conta com três corpos, e o 4o Exército romeno, mais próximo à Stalingrado, com quatro - somando-se aos dois corpos do 3o Exército alinhados na estepe e às sete divisões que combatem ao lado do 17o Exército alemão. Como húngaros e romenos são inimigos hereditários, foi preciso intercalar entre eles o 8o Exército italiano, com quatro corpos, entre os quais o corpo alpino. Trinta e duas divisões, 24 das quais dispostas ao longo do Don, perfazem assim a ordem de batalha da Wehrmacht. Mas ainda se estará fazendo uma estimativa generosa reduzindo-lhes o número de dois terços, ao avaliar seu poder combativo pelos padrões alemães.

Os generais alemães sempre pediram para que esses débeis auxiliares fossem “cintados”, isto é, diluídos nas tropas alemães. Mas considerações de alta política opuseram-se a isso. Os governos satélites queriam exércitos constituídos, sob o comando de nacionais. Devido a seu fraco valor ofensivo, foram confiadas frentes passivas a esses exércitos. É esse motivo pelo qual a proteção dos dois flancos da ofensiva dirigida a Stalingrado se encontra quase exclusivamente confiada aos seus aliados.

Sobre a gênese da contra-ofensiva - sobre a preparação de uma das mais belas vitórias da história russa - as fontes soviéticas são, mais uma vez, profundamente decepcionantes. A história da guerra mundial editada pelo General Platonov diz que os planos começaram a ser elaborados no mês de setembro, resumindo-os de maneira bastante clara. A narrativa, entretanto, reveste-se de extremo laconismo. São omitidas as condições em que foi armada a manobra magistral, assim como as discussões a que deu lugar. Temos de nos contentar com esse estilo convencional e declamatório, com essa verdade oficial que sucede a uma verdade oficial totalmente diversa. Até 1953, o único vitorioso de Stalingrado era Stalin. De 1956 em diante, Stalin morre para a história: seu nome nem ao menos figura no texto de Platonov.

Três frentes, ou grupos de exércitos, cercavam a eminência de Stalingrado: Frente Sudoeste, comandada por Vatutin; Frente do Don, comandada por Rokossovski; Frente de Stalingrado, comandada por Eremenko. A manobra consistiu em atacar simultaneamente ao norte e ao sul, para trancar o ferrolho do Don; uma concepção mais ampla, que teria selado o destino de toda a direita alemã, consistiria em visar diretamente Rostov, ou mesmo Stalino, nó vital das comunicações inimigas. Ignoramos se foi considerada.

“A estepe - diz Platonov - não favorecia a concentração soviética, que conseguimos, contudo, camuflar. Todos os movimentos foram feitos à noite. Ao primeiro clarão da aurora, as tropas se detinham, dissimulando-se nas aldeias ou colando-se ao chão dos balkas. Nossa ofensiva foi uma surpresa total para o Comando inimigo”.

Platonov engana-se. O ataque era esperado. A fragilidade do flanco defensivo consistia há muito tempo uma fonte de inquietações. Hitler assinalara, desde agosto, a fraqueza da linha do Don, ao lembrar que o exército dos russos brancos fora batido em 1920, quando atacava Tzaritzina, por uma ofensiva procedente do rio. Movimentos nas retaguardas e concentrações de tropas nas perigosas cabeças-de-ponte haviam sido assinaladas inúmeras vezes. Nos estados-maiores, discutia-se apenas um problema: recairia o golpe sobre húngaros, italianos ou romenos? “Eu dormiria melhor se o Don estivesse guardado por alemães” - dizia Hitler.

A 7 de novembro, na conferência do Fuhrer, o novo chefe do Estado-Maior, Zeitzler, comunicou uma informação do serviço de espionagem, revelando que uma grande ofensiva soviética sobre o Don fora decidida pelo Kremlin quatro dias antes. A única reserva mecanizada, o 48o Corpo Blindado, que se encontrava atrás do 8o Exército italiano, recebeu ordens para vir colocar-se atrás do 3o Exército romeno. Comandado pelo General Von Heim, o corpo de exército compunha-se da 22a Panzer e da 1a Divisão Blindada romena. Esta, de formação recente, possuía apenas cerca de 40 veículos tchecos, fracamente armados de um canhão de 37 mm. A 22a, por sua vez, estava longe de encontrar-se em condições mais satisfatórias. Seu regimento de tanques fora cortado em dois, para formar o núcleo da 27a Divisão Panzer, e a maior parte das armas que recebera em substituição consistia em PzKw 2 e 3, sem condições para medir-se com o T-34. Além disso, uma cômica surpresa aguardava Von Heim. Como não fora abastecido de gasolina, havia deixado os tanques da 22a camuflados sob a palha. Quando os descobriram, constatou-se que os ratos, que infestavam a palha, tinham devorado os revestimentos de guta-percha (espécie de látex) e inutilizado a aparelhagem elétrica. Dos 104 tanques da divisão, apenas 60 se puseram em marcha para cobrir o percurso de 250 km, por uma estrada coberta de gelo. Apenas 32 chegaram ao novo estacionamento; nos dias seguintes, outros 12 vieram juntar-se a eles. A 19 de novembro, o 48o Corpo Blindado, única força de contra-ataque do ferrolho do Don, constituía-se de um punhado de tanques romenos desemparelhados e de 44 tanques alemães, dos quais 31 leves.

A noite de 18 para 19 era fantasmagórica. O nevoeiro, segundo as testemunhas, era “um leite”. À meia-noite, a neve começou a cair. Às 4 horas, a artilharia russa iniciou um pesado bombardeio, concentrado em dois limitados setores: as cabeças-de-ponte de Serafimovitch e Kremskaia. Às 8 horas, surgiram os tanques, trazendo pencas de soldados de infantaria agarrado às superestruturas. O ataque do oeste, com o 5o Exército Blindado, abateu-se sobre o 2o Corpo romeno. O ataque, do leste,  com o 3o Exército de Choque, caiu, sobre o 4o Corpo romeno. Os romenos estavam longe de ser os mais medíocres aliados dos alemães. Muitas de suas unidades eram aguerridas; alguns de seus generais, excelentes; os soldados eram muito resistentes, mais acostumados ao clima, com melhor preparação ideológica para uma guerra contra a URSS do que os húngaros e, principalmente, os italianos. Nem por isso a derrota foi menos fragorosa. A irrupção dos tanques russos produziu o mesmo efeito que a dos tanques alemães em Sedan. A debandada propagou-se cava vez mais, empolgando unidades que nem ao menos se viam atacadas. Entre as duas investidas, um grupamento comandado pelo General Lascar escorou-se no Don e defendeu-se com bravura, mas, de modo geral, o 3o Exército romeno se desagregou. Pelas estradas cobertas de neve, massas de homens chicoteados pela intempérie fugiam às cegas. A única saída consistia num contra-ataque. As perdas e a dispersão, contudo, haviam enfraquecido a Wehrmacht numa extensão difícil de ser concebida. Uma intervenção espontânea da 14a Panzer, à esquerda do Exército de Paulus, conseguiu liberar o 11o Corpo alemão, mas o 48o Corpo Blindado, sacudido por ordens contraditórias, turbilhonou a esmo pelo campo de batalha enregelado, submergindo em hordas de fugitivos e chocando-se em toda parte contra forças superiores. Para não ser envolvido, terminou por fugir. Von Heim, que tivera metade dos seus carros blindados inutilizados pelos ratos, foi apontado como responsável pelo desastre e permaneceu encarcerado na prisão militar de Moabit até 1945.

A 20 de novembro, enquanto Vatutin e Rokossovski galopavam a oeste do Don, Eremenko, por sua vez, atacava ao sul de Stalingrado. O 4o Corpo alemão susteve o choque, mas o 4o Exército romeno desintegrou-se, como fizera na véspera o 3o . O 51o Exército soviético correu em direção a Kalatch, principal passagem do Don, gargalo vital das comunicações de Paulus. Quando a atingiu, no dia 22, a ponte já fora tomada pelos soldados de Rokossovski. O grupo de DCA que a guardava e a bateria de 155 que lhe dava cobertura estavam tão longe de esperar uma penetração russa, que tomaram os T-34 que se aproximavam do Don pelos tanques, capturados do inimigo, que a companhia de instrução de Kalatch utilizava. Alguns minutos depois a ponte, intacta, encontrava-se em poder dos russos. O 6o Exército estava cercado!

O próprio Paulus quase fora aprisionado. Encontrava-se sem eu PC de Globulinskaia, 15 km ao norte de Kalatch, na margem ocidental do Don, quando, às 14 horas, surgiram os russos. O Estado-Maior escapou pelo Don enregelado, abandonando o material da companhia e utensílios de cozinha. Paulus e seu chefe de estado-maior, General Arthur Schmidt, levantaram vôo em dois Fieseler-Storch e foram pousar no QG de inverno do exército, em Nijni-Tchirkaia, na confluência do Don e do Tchir, isto é, fora do bolsão demarcado pelo inimigo. Poucas reviravoltas da sorte foram tão brutais. Na antevéspera, Paulus podia considerar uma questão de horas a tomada de Stalingrado, vitória que iria ilustrar seu nome. Na véspera, recebera do comandante do grupo de exércitos, General Von Weichs, a inesperada ordem de reenviar suas unidades móveis e direção ao oeste. Pela manhã, procurava compreender o que teria tão repentinamente acontecido ao exército vizinho. Ao meio-dia, sem ter sido vencido, encontrava-se na ridícula situação de um general separado de seu exército, fugindo antes de qualquer soldado!

Ao escapar da armadilha, Paulus acreditou por um momento poder dirigir do exterior as operações de salvamento de seu exército. Um telegrama de Hitler chamou-o a uma concepção draconiana do dever: “O Oberbefehlschaber (Generalíssimo) do 6o Exército voltará a Stalingrado. O Exército se organizará em uma frente fechada e esperará novas ordens”. A situação era das que pedem reações imediatas, iniciativas ousadas. As primeiras instruções de Hitler - ditadas de Berchtesgaden - impunham espera e imobilidade.

Pronto a voar para Stalingrado, Paulus vê aparecer um companheiro de infortúnio, Hoth, comandante do 4o Exército Blindado. Ele perdera tudo; tanto suas unidades alemães, cercadas no bolsão de Stalingrado, como as romenas, dispersadas pela estepe. Os adeuses são rígidos, embora carregados de emoção entre os dois chefes: um representa um exército aniquilado, o outro vai juntar-se a um exército condenado. Em seguida, o pequeno avião de Paulus voa baixo, sobre a planície branca, e pousa perto da estação de Gumrak, a 15 km de Stalingrado, onde já funciona o novo PC do exército.

Paulus é um exemplar oficial de estado-maior: rapidez de análise, facilidade de exposição. A partir das 16 horas, dirige ao OKH um lúcido resumo da situação. O 6o Exército, cercado, conserva uma cabeça-de-ponte a oeste do Don, mas tem o flanco sul a descoberto; falta-lhe combustível e só dispõe de víveres para seis dias.

Ainda que a exposição seja clara, as conclusões carecem de firmeza. Paulus hesita. Trava-se uma discussão em Nijni-Tchirkaia. Por-se em ferrenha defensiva, como deseja Hitler, implica num abastecimento aéreo até o momento do cerco ser rompido pela intervenção de um novo exército. O comandante da 4a Luftflotte, Wolfram Von Richthofen, foi categórico: manutenção, por via aérea, de 200.000 a 300.000 homens, empenhados em duros combates, ultrapassa a capacidade da aviação de transporte. O general de DCA Martin Fiebig opinara no mesmo sentido, ao dizer a Paulus que só lhe restava uma coisa a fazer: retirar seu exército da armadilha, sem perda de uma única hora. Mas o chefe de estado-maior Schmidt mantivera parecer oposto: uma retirada, dissera ele, seria “napoleônica”, exigindo o abandono de enorme material e 15.000 feridos. Indeciso, Paulus limitara-se a pedir ao Fuhrer liberdade de ação, e licença para abandonar Stalingrado “caso o 6o Exército não conseguisse fechar seu flanco sul”.

Vinte e quatro horas depois, as idéias de Paulus evoluíram. A situação lha parece sob uma luz mais sombria, e a nova mensagem que endereça ao Fuhrer propõe a abertura imediata de uma brecha, ao menos para salvar “preciosos combatentes”. Acrescenta - sob o risco de ser acusado de conjuração - que os comandantes dos cinco corpos de seu exército, Heitz, Von Seydlitz, Strecker, Hube e Jaennicke, compartilham de sua opinião.

Nesse meio-tempo, o comandante do grupo de exércitos, Von Weichs, falara mais energicamente ainda. O abastecimento aéreo de 20 divisões, notifica ele a Angerburgo, só poderá satisfazer um décimo das necessidades das mesmas. Cercado, o 6o Exército se vê condenado a perder em alguns dias a maior parte de seu valor combativo. Uma tentativa para abrir caminho acarretará a perda de considerável material, porém não há outro meio de evitar um desastre total.

Hitler chega a Rastenburgo no dia 23, à uma hora da manhã. Zeitzler, que o esperava devorado de impaciência, é avisado que o Fuhrer se encontrava cansado da viagem e que só daria audiência ao meio-dia. Zeitzler protesta, alega urgência, consegue fazer-se receber e, para sua grande surpresa, encontra um homem sereno. Ao trabalhar com Jodl, em seu trem, Hitler encontrara um meio de conjurar a crise de Stalingrado: chamar do Cáucaso uma, talvez duas divisões blindadas, que reabrissem as comunicações com o 6o Exército. Zeitzler retruca que seriam necessários 15 dias para transportar uma divisão, e que o 6o Exército, a essa altura, já estaria completamente esgotado. Mas quando propõe a abertura imediata de uma brecha, Hitler pergunta-lhe com ar ameaçador se tenciona abandonar Stalingrado. Ao obter resposta afirmativa, bate com o punho na mesa e grita inúmeras vezes: “Nunca deixarei o Volga! Nunca deixarei o Volga!”

Durante o dia, as notícias pioram. A cabeça-de-ponte a oeste do Don é penosamente mantida. Voltando à carga, Zeitzler abala Hitler e, às duas horas da manhã, telefona a Von Sodenstern, chefe do estado-maior do Grupo de Exército B, dizendo que o Fuhrer concorda em reconsiderar a questão, e que dará a conhecer sua decisão às 8 horas. “Parece fora de dúvida - acrescenta - que essa decisão consistirá na ordem de abrir imediatamente passagem para sair. O 6o Exército pode começar seus preparativos. “Por uma linha telefônica que os russos cortarão um minuto depois, Sodenstern comunica a notícia ao PC de Gumrak. Esta de espalha pelo bolsão, propiciando a sensação de alívio que conhecem os emparedados ao receberem a primeira lufada de ar puro.

Às 10 horas, nenhuma outra comunicação alcança o grupo de exércitos. Inquieto, Sodenstern telefona para Rastenburgo, nada obtendo além de um impaciente convite a ser paciente. Alguns minutos depois, o rádio de escuta capta uma ordem direta de Hitler a Paulus. O 6o Exército é convidado a organizar-se na seguinte frente: Stalingrado - Norte, cota 137, Marinovka, Zybenko, Stalingrado - Sul. Isto desenha no mapa uma espécie de ameba com cerca de 60 km de comprimento e 40 de largura. A cabeça-de-ponte no Don, possível porta de evasão, deve ser abandonada. O Fuhrer termina sua mensagem dizendo que o 6o Exército pode contar com ele para um abastecimento satisfatório, assim como para ser tirado do cerco a tempo...

Assim, Hitler não pôde resignar-se a abandonar Stalingrado! Quando Zeitzler se apresentou em sua residência, às 8 horas, o Fuhrer trazia nos lábios uma nova expressão; Stalingrado é uma fortaleza. E o 6o Exército é sua guarnição. Uma guarnição não abandona a fortaleza que lhe é confiada. “Se for necessário, a guarnição de Stalingrado sustentará o cerco durante todo o inverno e eu a libertarei com minha ofensiva de primavera”. Quando Zeitzler tentou demonstrar que Stalingrado nada tinha de fortaleza, Hitler recomeçou a agitar o punho no ar. “Nunca deixarei o Volga!”. Primeira e última palavra a ilustrar a servidão em que o chefe militar é mantido pelo condutor de massas: o estrategista submisso ao demagogo. A 9 de novembro, em Munique, Adolf Hitler pronunciara as seguintes palavras: “Aquilo que o soldado alemão guarda, força alguma no mundo poderá arrancar-lhe”. Como poderia ele aceitar um desmentido tão rápido?

Zeitzler encolerizou-se, e exclamou por sua vez: “Meu Fuhrer! Seria um crime abandonar o 6o Exército! Isto significaria a morte ou a captura de um quarto de milhão de valentes soldados. E mais ainda! A perda de um grande exército quebraria a coluna vertebral da frente oriental!”.

Ao ouvir a palavra “crime” - verbrechen - Hitler estremeceu. Mas conteve-se, chamou o SS de serviço e ordenou que introduzissem no recinto o Marechal Keitel e o General Jodl. Declarou em tom compenetrado que estava na iminência de tomar uma grave decisão, e que não desejaria fazê-lo sem que seus melhores colaboradores lhe dessem a conhecer sua opinião, com a mais completa liberdade: “Feldmarschall Keitel?” “Meu Fuhrer, não abandone Stalingrado!”. Keitel falou num tom de quem dita posição de sentido, com inflexões teatrais, os olhos flamejantes. Jodl, ao contrário, pesou os prós e os contras, mas acabou por concluir que, ao menos até nova ordem, era preciso permanecer em Stalingrado.

Interrogado por sua vez, Zeitzler manteve sua conclusão: abertura imediata de uma brecha, e retirada. Hitler ouviu-o calmamente, e depois retrucou, com polidez glacial: “O senhor está vendo, general, que não sou o único a defender minha opinião. Ela é compartilhada por dois oficiais, ambos mais graduados e mais experientes que o senhor. Atenha-se pois à decisão que tomei. Ordeno que se defenda a fortaleza de Stalingrado”.

Uma questão, todavia, condiciona tudo: a possibilidade de abastecer o 6o Exército por meio de uma “ponte aérea”. Fizera-se isso, no inverno anterior, pelo bolsão de Demiansk, mas este continha menos de 100.000 homens, e a fortaleza de Stalingrado abriga o triplo disso.

Interrogado, o 6o Exército informou que, para satisfazer o mínimo de suas necessidades, precisaria, por dia, de 750 toneladas de munições, combustível, forragem, víveres (40 toneladas unicamente para o pão). Interrogado, o chefe da aviação de transportes respondera que 350 toneladas representavam o máximo de suas possibilidades. Segundo a tradição militar, considerara-se a primeira cifra uma superestimação sistemática, e a segunda uma subestimação prudente. Goering, o eterno ausente, encontrava-se em Paris, que, decididamente, ele considerava uma estância mais refinada que Rastenburgo. Consultado por telefone, declarou que a verdade estava na medida áurea, in dem goldenen Mittelweg. Sua Luftwaffe disporia de meios para depositar 500 toneladas por dia na fortaleza de Stalingrado. Poderia, assim, responder pelas necessidades primordiais do 6o Exército. Seu chefe de estado-maior, Jeschonnek, veio assegurar isso a Hitler, omitindo uma comunicação de Von Richthofen, em que este pedia que fosse levada ao conhecimento de Hitler sua opinião sobre a impossibilidade da “ponte aérea”.

Para os sitiados, a decisão de Hitler fora um golpe terrível. A palavra “fortaleza” poderia iludir um público ignorante. Stalingrado encontrava-se inteiramente em ruínas. As poucas localidades do perímetro cercado haviam sido queimadas até o chão. A estepe achava-se rigorosamente nua. Na frente norte, alguns trabalhos para organizar o terreno haviam sido executados durante o verão, mas as frentes oeste e sul não tinham uma só vala a demarcá-las. Não era mais possível cavar o solo enregelado. Não havia madeira alguma para a construção de abrigos. Os soldados teriam apenas a lona de suas tendas como proteção contra o fogo inimigo e as tempestades de neve, de 40 graus negativos. A primeira reação dos generais é de revolta. O comandante do 4o Corpo, Jaennicke, exclama, dirigindo-se a Paulus: “Reichenau não obedeceria!”. Paulus abaixa a cabeça: “Ich bin kein Reichenau” - “Não sou um Reichenau”. E abafa os protestos de seus subordinados com o argumento incontestável de que a um soldado só compete obedecer.

Um único general não se resigna: Von Seydlitz Kurbach, comandante do 51o Corpo. Estava tão convencido de que iria romper as linhas inimigas, que fizera evacuar seus postos avançados e destruído todos os itens supérfluos e intransportáveis, inclusive suas calças e capote sobressalentes. Ele escreve uma nota a Paulus exigindo que este a transmita aos escalões superiores. Ainda que 500 aviões transportassem 1.000 toneladas por dia, sustenta ele, as necessidades do 6o Exército não seriam atendidas. Urge aproveitar o breve instante em que o inimigo ainda se encontra fraco ao sudoeste de Stalingrado, para romper através de suas linhas em direção a Kotelnikovo. “Se o OKH mantém a ordem de resistir in loco, o dever de consciência para com o Exército e o povo alemão exige imperiosamente que o senhor tome nas mãos a iniciativa de evitar uma grande catástrofe, o aniquilamento de 200.000 combatentes e a perda de seu material. Não há escolha possível!”.

O nome Seydlitz figura entre os mais altos expoentes da história militar da Prússia. O Seydlitz da guerra dos Sete Anos, amigo íntimo do grande Frederico, é considerado como um dos melhores generais de cavalaria de todos os tempos. As linhas citadas acima, o mais ousado desafio que um oficial fez chegar a Hitler, constituem ao mesmo tempo uma sentença de morte. Seydlitz fica à espera de que um avião venha buscá-lo, para jogá-lo diante de um poste de execução. Von Weichs, porém, intercepta o memorando, e o que chega a Seydlitz é apenas a ordem de assumir o comando de toda a frente norte do bolsão. “Que pretende fazer o senhor?” - pergunta-lhe Paulus. “Já que o senhor não desobedece - diz ele -, só me resta obedecer”.

A “ponte aérea” começa a funcionar. Uma centena de trimotores Junker decola dos aeródromos de Tazinskaia e Morosovskaia, no ferrolho do Don e, depois de percorrerem 200 km, pousam em Pitonik ou em Gumrak. Retornam carregados de feridos. As perdas ocasionadas pelo inimigo não são, a princípio, muito elevadas, porém as que resultam das más condições atmosféricas e do desgaste do material revelam-se desde logo extremamente pesadas. O rendimento cotidiano começa com cerca de 50 toneladas e só lentamente atinge uma centena. A Luftwaffe pede que os sitiados tenham paciência, dizendo ser-lhe necessário algum tempo para organizar-se.

Arrolam-se no bolsão o 4o, o 8o, o 11o e o 51o Corpos de Exército, e o 14o Corpo Blindado; as divisões de infantaria números 44, 71, 76, 79, 94, 100, 113, 295, 297, 305, 371, 376, 384, 389; as divisões motorizadas números 3, 29 e 60; as divisões blindadas números 14, 16 e 24; o 8o Corpo de DCA; os regimentos de canhões de bombardeio 243 e 245; 12 batalhões de engenharia militar; e mais 149 formações independentes, que vão da artilharia pesada ao correio militar; e, finalmente, duas divisões romenas e um regimento croata. Um grande, possante e denodado exército...

Manstein entra em cena


A fim de libertar o exército cativo, Hitler apela para seu mago militar, o estrategista que dispunha com ele a glória do plano Sedan, o artilheiro que esmagara Sebastopol, o idealizador das manobras que impediram o levantamento do cerco de Leningrado: Marechal-de-Campo Erich von Manstein.

À tardinha do dia 21, em Vitebsk, Manstein recebe a ordem para assumir o comando do Grupo de Exércitos do Don. O despacho que determina sua missão revela a que distância da realidade se encontra o Alto-Comando, e também a decadência a que chegara o pensamento militar alemão. Manstein deve “sustar a ofensiva inimiga e restaurar as antigas posições exatamente da mesma maneira”. O general “Fechar a Brecha e Retomar”, Gamelin, tornara-se mestre de seu vencedor.

Manstein não se apressa. A correr o risco de um vôo entre as tormentas de neve, prefere viajar em seu trem de comando, só chegando no dia 24 a Starobelsk, QG do Grupo B, que deve desmembrar a fim de formar o seu. Ali, ele avalia a gravidade da situação, o peso de seu encargo e a pobreza de meios de que dispõe para realizá-lo.

Haviam sido colocados sob as ordens de Manstein o 6o Exército (encerrado em Stalingrado e pregado ao solo por ordem de Hitler), o 4o Exército Blindado (reduzido à 16a Divisão Motorizada), o 3o Exército romeno (que só apresenta intacta a ala esquerda) e o 4o Exército romeno (ainda mais mutilado do que o 3o). Dispõe ainda dos restos do 4o Corpo Blindado e o Destacamento Hollidt, formado por um conjunto de tropas alemães e romenas. E, finalmente, encontram-se a caminho várias divisões blindadas. Duas, a 23a, proveniente do Cáucaso, e a 6a, a chegar da França, vão reconstituir  ao sul de Stalingrado o 4o Exército Blindado, encarregado de tirar Paulus do cerco. Uma outra, a 17a juntar-se-á posteriormente a elas.

Concentradas e repousadas, essas forças seriam suficientes para a dupla tarefa de deter a ofensiva soviética e salvar o 6o Exército. Encontram-se, porém, fatigadas, incompletas e dispersas. Os reforços provenientes do Cáucaso e da França demoram-se em ferrovias desconjuntadas, com os homens a padecer o inferno do frio em vagões abertos ao quatro ventos. As outras unidades estão disseminadas por um campo de batalha de 800 km, que vão do Don, no qual Hollidt apoia sua ala esquerda, até a estepe, onde a 16a Divisão Motorizada dá prosseguimento, no descampado, à missão de ligar o Cáucaso ao Volga. É um milagre que os russos parem no Tchir, diante de uma salada de exércitos formada por fugitivos detidos na debandada, membros da Luftwaffe, soldados do exército de Paulus em licença, etc - em vez de correrem até Rostov, onde barrariam as linhas de saída do Grupo de Exércitos A. Mas a metódica estratégia russa não quer passar o carro adiante dos bois, não se atira sobre oportunidades muito brilhantes e não avalia bem a deterioração do formidável adversário do ano anterior. O Comando soviético poderia impor a Manstein uma batalha desesperada por Rostov. Deixa-lhe o vagar de fazer uma suprema tentativa por Stalingrado.

Esta tentativa suprema, declara o Marechal Eremenko, teria conseguido bom êxito caso houvesse sido conduzida com audácia.

“Até o dia 24 de dezembro - diz ele -, só tínhamos forças de menor importância no setor de Kotenikovo. O 51o Exército encontrava-se muito enfraquecido, e o 4o Corpo de cavalaria representava uma densidade de menos de um pelotão por quilômetro. Desde 4 de dezembro, a 6a Divisão Panzer, completíssima e inteiramente repousada, uma vez que chegava da França, poderia ter aberto caminho até os sitiados... Uma vez mais, os adeptos de Hitler foram vítimas da rotina. Manstein nos deu 10 dias de presente”.

Manstein preparara de início uma engenhosa manobra. No ferrolho do Don, Hollidt deveria atacar, para retomar Kalatch. O 48o Corpo Blindado, reconstituído com a 2a Divisão Panzer, desembocaria da cabeça-de-ponte que conservara diante de Nijni-Tchirkaia, a fim de apoiar o ataque principal, realizado pelo 47o Corpo Blindado, procedente da região de Kotelnikovo. O Grupamento Hollidt, porém, estava absorvido pela defesa de Tchir e, ao invés de participar da ofensiva, o 48o Corpo Blindado é expulso da cabeça-de-ponte. Em lugar de uma pressão concêntrica, a tentativa para romper o cerco reduz-se a um solitário esforço do 57o Corpo. Fixado para 2 de dezembro, o ataque é adiado para 8, depois para 12, devido à desesperante lentidão dos transportes.

Existe, além do mais, um conflito entre as concepções de Manstein e Hitler. O rompimento do cerco de Stalingrado é considerado pelos dois homens com objetivos inteiramente diversos.

O marechal quer recuperar o 6o Exército para reintegrá-lo nas forças móveis da frente oriental. Vê seu escoamento pela brecha aberta, para reconstituí-lo na região de Rostov. Vê igualmente o Grupo de Exércitos A a retirar-se do Cáucaso até o Don. Tendo o conjunto de manobras reconstituído pela diminuição do teatro de operações, Manstein acredita ser possível dobrar a ofensiva soviética e talvez infligir ao Exército Vermelho a tão esperada derrota decisiva. Aspira a dirigir o quadro da batalha e, quando demonstra a necessidade de um comandante-chefe na frente oriental, não há dúvida possível sobre a identidade do titular que tem em vista...

Ninguém contesta que Manstein seja o mais apto talvez mesmo o único homem para desempenhar essa tarefa. A hora militar de Hitler já passou. Se é bem verdade que ele tivera, no início da guerra, admiráveis inspirações; se é indiscutível que salvara as Forças Armadas durante o inverno de 1941-1942; se é fato verídico que o plano de sua campanha de verão representara a última oportunidade de evitar a derrota total da Alemanha, é igualmente verdadeiro que o Fuhrer constitui agora um imenso perigo para suas tropas, configurando-se em seu mais cruel inimigo. Apagou-se em seu cérebro todo e qualquer raciocínio estratégico, permanecendo apenas a vontade cega e feroz de manter tudo o que conquistara. Romper o bloqueio de Stalingrado não significa para ele a recuperação de um exército, para depois retomar a iniciativa das operações, mas unicamente a possibilidade de manter o pé fincado no Volga.

A marcha sobre Stalingrado tem uma brilhante estréia. Das duas divisões blindadas do 47o Corpo, a 23a, procedente do Cáucaso, está reduzida a cerca de 40 tanques, porém a 6a, procedente da França, encontra-se completa. O primeiro choque leva-a à passagem do monte Akssai, que franqueia no dia 13. À direita, apesar de sua fraqueza, a 23a progride ao longo da ferrovia, na qual consegue acumular 3.000 toneladas de víveres e combustível para os sitiados. Mo dia 19, Mischkova é atingida. São cobertos 130 dos 180 km que separam o 6o Exército do 4o Exército Blindado, e os libertadores vêem no céu as luzes dos projetores dos que defendem Stalingrado.

Manstein, entretanto, não alimenta ilusões. Sabe que os acontecimentos a precipitar-se diante de Rostov só lhe deixam um limitado espaço de tempo para agir. A única possibilidade de salvação para o 6o Exército consiste em ajudar-se a si mesmo, dirigindo-se com rapidez ao encontro de Hoth. Manstein ordena-lhe que o faça, multiplica as conversações radiofônicas com Paulus e, preocupado com  as reticências deste, envia ao bolsão um oficial de seu estado-maior, o Major Eismann - que retorna confirmando o singular estado de espírito em que se encontravam o comandante do 6o Exército e seu chefe de estado-maior. A tese destes era a de que não fôra a troco de nada que se encontravam cercados, e, logo, tinham direito de esperar a libertação. Estimavam-se que a mobilidade da centena de tanques que lhe restava limitava-se a 30 km, aproximadamente, e, dessa forma, sofreria pane, condenando-se à mais completa destruição caso atacasse antes que Hoth atingisse ao menos aquela distância. Eismann retruca vivamente que o risco que recusam correr nada é perto do de morrer de fome ou apodrecer na prisão. Paulus e Schmidt são inabaláveis, e quando Eismann invoca a autoridade do Marechal Von Manstein, eles invocam outra ainda mais alta, a do Fuhrer.

E é realmente Adolf Hitler quem proíbe a saída da guarnição de Stalingrado. A Zeitzler, que a requer noite e dia, ele responde que considera o 6o Exército praticamente fora de perigo, e que, longe de admitir o abandono de Stalingrado, tem em mira a expansão de suas forças pelo Volga. Certo dia, acreditando tê-lo convencido, Zeitzler apresenta-lhe a ordem de abrir passagem, a fim de que a assine. Hitler assina, e depois acrescenta de seu punho a seguinte condição, que invalida tudo: “sob a expressa reserva de que o Exército alemão continuará a manter a linha do Volga...”. Quanto ao mais a situação é bem nítida. Uma nova catástrofe atinge as forças do Eixo e sela o destino do exército sitiado em Stalingrado.

Após a derrota romena, a frente situada a oeste do Don estabilizara-se aos poucos. Ela segura  o curso do rio até Veschenkaia, dobrara em direção ao sul, alcançara novamente o Tchir, no qual se fundira até seu confluente, e reencontrara o Don ao norte de Potemkiskaia. Inteiramente enregelados, os cursos de água não apresentam o menor valor como obstáculo. As posições defensivas são inexistentes e, à progressão dos tanques, a estepe opõe apenas sua superfície coberta de neve. O termômetro baixa a 30 ou 35 graus negativos, para grande surpresa dos italianos, a quem seus aliados haviam garantido que o frio, no sul da Rússia, não ultrapassava jamais os ou 5 ou 6 graus. Insuficientemente agasalhados, mal alimentados, os homens sofrem. Algumas vezes, o sol faz magias na neve, mas o tempo normal é o de um nevoeiro grelado, que só desaparece para descobrir um céu cor de chumbo.

Na direção leste-oeste, a frente é sustentada pelos restos do 3o Exército romeno, o destacamento do Exército Hollidt, o 8o Exército italiano e o 2o Exército húngaro. Ninguém ignora que o elo mais frágil dessa longa corrente é o italiano. Hitler se inquieta por causa dele, ao ver o relatório de 12 de dezembro, porém não existe nenhuma força alemã disponível para “cintar” as divisões do General Gariboldi. Estendendo-se por 270 km de frente, quatro corpos do Exército italiano, o 29o, o 35o, o 2o alpino, esperam um embate cuja preparação é lida pelos estados maiores como uma carta aberta.

O encontro ocorre no dia 16 de dezembro. O 1o Exército Soviético da Guarda cruza o Don em meio ao nevoeiro e abate-se sobre o centro da frente italiana. A estepe é novamente invadida por massas em debandada. Uma testemunha, o general alemão Fretter-Pico, descreve o efeito surrealista produzido pelos bandos de soldados italianos, “tendo por única arma um violão”, e andando rumo ao oeste a cantar, malgrado o rigor do frio. Hitler telegrafa a Mussolini, pedindo que lance um apelo a seus soldados, para que interrompam a fuga. O Duce, irritado, não responde.

Durante o dia 16, os russos avançaram 25 km. Nos dias seguintes, a ofensiva se estende. À direita russa, o 6o Exército marcha sobre Vorochilovgrado e Stalino. À esquerda, o 3o Exército da Guarda e o 5o Exército Blindado prolongam o ataque na frente do Tchir. Obrigado a voltar-se, o Grupo Hollidt combate em difíceis condições. As passagens do Donetz inferior, Kamensk, Schatinsk e Forchstadt, são ameaçadas. Rostov está em perigo. Tem-se em vista uma Stalingrado ampliada, uma Stalingrado de um milhão de homens!

A situação do 4o Exército Blindado é particularmente arriscada. Enquanto a frente alemã se desmorona e o avanço russo ameaça Rostov, ele se agarra à passagem da Mischkova, esperando que o exército de Paulus se decida a sair de Stalingrado. O caráter sagrado de sua missão, que consiste em salvar 200.000 camaradas, sustenta o moral, mas Hoth não cessa de advertir que sua presença ali pende por um fio, e que sua retirada é apenas uma questão de horas, se o 6o Exército não vier a seu encontro. Na antevéspera do Natal, um apelo do grupo de exércitos precipita esta retirada: Manstein, ao informar Hoth da situação a oeste do Don pede-lhe a cessão de uma de suas divisões blindadas, para tentar restabelecer o combate na região de Morosovskaia. Hoth, consciente do perigo designa a mais forte, a 6a. Esta se põe a caminho em direção a Potiomkinskaia, entre uma nevasca, levando a última oportunidade de salvação dos sitiados de Stalingrado.

A agonia do 6o Exército

Deixou-se passar o Natal, para depois reduzir de 200 para 100 gramas a quota de pão. No dia 1o de janeiro, o serviço de saúde assinala as primeiras mortes por inanição. Esta provado que o 6o Exército não pode ser abastecido por via aérea. Para manter a promessa de seu chefe culposo, a Luftwaffe faz, em vão, um heróico esforço, admitindo perdas que, contando 536 aviões de transporte, 149 caças e 123 bombardeiros, farão de Stalingrado, uma batalha aérea tão dispendiosa quanto a da Inglaterra. As condições do tempo, contudo, são especialmente desfavoráveis: quando o céu se apresenta claro sobre Stalingrado, geralmente está nublado na região de Rostov, e vice-versa - de tal forma que o funcionamento da “ponte-aérea” se vê entravado tanto na partida quanto na chegada. Como os russos haviam tomado Tazinskaia e Morosovskaia, os aeródromos de partida são transferidos para Salsk, Novocherassk e Cheretkovo, o que duplica a distância e reduz o rendimento dos aparelhos. A média diária de entregas, durante o cerco, não ultrapassará 94 toneladas, menos de um quinto do prometido por Goering!

A fim de conferir-lhe as folhas de carvalho da cruz de comandante, Hitler faz sair do bolsão o General Hube. “Meu Fuhrer - diz-lhe Hube -, o senhor mandou fuzilar vários generais do Exército. Por que não manda fuzilar o general da Aeronáutica que lhe prometera abastecer Stalingrado?”.

Esfuma-se toda esperança de libertação. Hoth batera em retirada, a princípio, passo a passo, com dor no coração, depois às pressas. O início de 1943 encontra o 4o Exército Blindado junto a Kuberle, a 200 km de Stalingrado. É inapelável o abandono do 6o Exército.

No bolsão, a situação é indescritível. A ração de pão está reduzida a 50 gramas. A gasolina é tão escassa que os únicos veículos autorizados a movimentar-se são as motocicletas com side-car. Os únicos feridos evacuados são os que tem força para arrastar-se até os aeródromos. A neve alteia-se em montículos: cadáveres de homens mortos de fome e frio.

A 8 de janeiro, uma bandeira branca flutua diante dos postos avançados. Três parlamentares soviéticos vem oferecer a Paulus uma capitulação honrosa. Seguindo ordens de Hitler, Paulus a repele, determinando responder com fogo a qualquer nova tentativa de parlamentação. No dia seguinte, os russos atacam. Os alemães defendem-se desesperadamente. O móvel da batalha é o terreno de Pitomnik, pelo qual se escoa a maior parte do tráfego aéreo. Os russos apoderam-se da área no dia 16. Agora o abastecimento só é possível pelo terreno ruim de Gumrak, tomado logo depois, e a  seguir por meio de pára-quedas. Quatro quintos do bolsão foram perdidos. Os alemães são repelidos até o Volga, enclausurados em sua fatal conquista - as ruínas de Stalingrado. A 24 de janeiro, Paulus se comunica com Hitler. Não tem sentido, diz ele, o prolongamento da resistência: 18.000 feridos jazem sem assistência nos porões; o tifo alastra-se com virulência; esgotaram-se os víveres e munições. O comandante do exército solicita, em conseqüência disso, autorização para capitular, e o comandante do grupo de exércitos, Manstein, apoia seu pedido em uma conversação de 45 minutos com Hitler. Este permanece intratável. “Proíbo qualquer capitulação. O exército  deve resistir até a última bala. Seu heroísmo é uma inesquecível contribuição para o salvamento do Ocidente”.

No dia 25, os ataques russos recomeçaram. No dia 26, o 62o Exército reúne-se ao 21o, na colina Mamai. O 6o Exército alemão é cortado em dois. Ao norte, o que sobra do 51o Corpo entrincheira-se na fábrica de tratores. Ao sul, os despojos de quatro outros corpos amontoam-se no setor central da cidade, e Paulus instala seu último QG no subsolo da Univermag da Praça Vermelha. Com pressa de liquidar o inimigo, os russos bombardeiam furiosamente as ruínas de Stalingrado. Nenhum canhão responde, mas, quando a infantaria tenta avançar entre os destroços, os últimos cartuchos barram-lhe o caminho.

No dia 30, Hitler nomeia Paulus Generalfeldmarschall. “Nunca - diz ele a Keitel - um marechal alemão se rendeu”. O Fuhrer só espera um gesto do oficial que acaba de elevar à mais alta dignidade militar: o suicídio. Ignora que Paulus interditara precisamente essa porta de saída aos oficiais, ao dizer que deveriam compartilhar até o fim da sorte de seus soldados.

No dia 31, a luta se encontra praticamente terminada. Uma das últimas emissões radiofônicas do 6o Exército descreve dessa maneira a situação: “Os soldados vagabundeiam; poucos ainda combatem; o comando não é mais exercido...”. Um momento após, às 5h45: “Os russos estão diante do bunker (abrigo contra bombardeio); vamos destruir o posto...”. Depois, por três vezes repetidas, o sinal: “CL”, significando: “Esta estação encerra suas irradiações”. Os russos alcançam efetivamente a Univermag, cujo porão abriga o mais recente marechal, o primeiro marechal da derrota criado por Hitler. Ninguém atira. Um parlamentar soviético adianta-se e exige a rendição. É conduzido ao bunker, de onde sai um Paulus esquelético, quase indiferente. Sim, capitula. Nada tem a acrescentar ao “Heil Hitler!” que proferira ainda na véspera. O modelo dos oficiais do Estado-Maior parte em silêncio para o cativeiro.

Conhecemos, pelo texto estenográfico, as imprecações de Hitler. “Há que matar-se com a última bala... Desprezo um soldado que se rende, como Giraud... 20.000 pessoas se suicidam por ano na Alemanha e é absurdo que um general não seja capaz de fazer o mesmo que uma mulher ultrajada...Não farei mais marechais... o heroísmo de dezenas de milhares de soldados é manchado pela covardia de um só... Verão que antes de oito dias os russos farão Paulus e Seydlitz falaram no rádio. Eles incitarão os homens do bolsão, incitarão toda a Wehrmacht a render-se...”

Paulus nem teve tempo para incitar os homens do bolsão a render-se: os últimos deles capitularam a 2 de fevereiro.

Adolf Hitler se enganava igualmente em relação à data em que Paulus convidaria o Exército e o povo alemães a depor as armas. O Nationalkomitee Freies Deutschland (Comitê Nacional da Alemanha Livre) só foi fundado em 13 de julho de 1944, sob a presidência do Conde Bismarck-Enkel e do General Von Seydlitz. O plebeu Paulus demorou-se mais do que esse nomes históricos a aderir à resistência alemã no exterior. Só deu esse  passo depois de 20 de julho de 1944, quando soube do suplício a que foram submetidos alguns dos soldados por quem experimentara o maior respeito, como Witzleben e Hoeppner.

“Paulus - diz um de seus biógrafos - tinha muita dificuldade em tomar decisões, e raramente distinguia o falso do verdadeiro...”. Os maiores talentos militares não teriam salvado o Exército alemão da derrota em 1942; as deficiências pessoais de Paulus contribuíram para dar-lhe um caráter esmagador”.
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http://adluna.sites.uol.com.br/300/319.htm
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Andrey Yeryomenko

From Wikipedia, the free encyclopedia

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Andrey Ivanovich Yeryomenko
October 14, 1892(1892-10-14) – November 19, 1970 (aged 78)
AI Eremenko 01.jpg
Andrey Yeryomenko in 1938
Place of birth Markovka, Kharkov Governorate, Russian Empire (now Ukraine)
Place of death Moscow, Soviet Union
Resting place Kremlin Wall Necropolis
Allegiance  Russian Empire (1913-1918)
 Soviet Union (1918-1958)
Service/branch Russian Imperial Army
Red Army
Years of service 1913 — 1958
Rank Marshal of the Soviet Union
Commands held Red Army
Battles/wars World War I
Russian Civil War
Great Patriotic War
Awards Hero of the Soviet Union
Hero of Czechoslovakia
Order of Lenin (5)
Order of the Red Banner (4)
Order of the October Revolution
Order of Suvorov, 1st Class (3)
Order of Kutuzov, 1st Class[1]
Andrey Ivanovich Yeryomenko (Russian: Андре́й Ива́нович Ерёменко; Ukrainian: Андрій Іванович Єрьоменко) (October 14, 1892 - November 19, 1970) was a Soviet general during World War II, Marshal of the Soviet Union, born in Markovka in the province of Kharkov in Ukraine to a peasant family.

Contents

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Military career

Draft and early service

Drafted into the Imperial Army in 1913, Yeryomenko served on the Southwest and Romanian Fronts during World War I. Joined the Red Army in 1918, where he served in the legendary “Budyonny Cavalry”. Attended the Leningrad Cavalry School and then the Frunze Military Academy, which he graduated from in 1935.

[edit] World War II

In 1940, Yeryomenko was placed in command of the 6th Cavalry Corps, which was responsible for invading Eastern Poland, as part of the Molotov–Ribbentrop Pact. The operation was characterized by poor organization and command. Yeryomenko had to request an emergency airlift of fuel so as to continue his advance. Afterwards, he held a number of commands, ending up in control of the Transbaikal Military District, the post he held when Operation Barbarossa began in June 1941.
Eight days after the invasion began, Yeryomenko was recalled to Moscow where he was made the Acting Commander of the Soviet Western Front, two days after its original commander, General of the Army Dmitri Pavlov, was executed for incompetence. Yeryomenko was thrust into a very precarious position. Pavlov's incompetence (and Soviet unpreparedness) had completely destroyed the Western Front, but Yeryomenko was able to patch together what remaining forces he had, and halt the German offensive just outside of Smolensk. During this vicious defensive Battle of Smolensk, Yeryomenko was wounded. Because of his injuries, he was transferred to the newly created Bryansk Front. In August 1941, Yeryomenko was ordered to launch an offensive using Bryansk Front, despite the obvious superiority of German forces. The offensive failed to accomplish its desired results.
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In October the Germans launched Operation Typhoon, which was an offensive operation aimed at capturing Moscow. Yeryomenko's forces were pushed back, but eventually, a number of counterattacks were able to halt the German push. On October 13, Yeryomenko was once again wounded, this time severely. He was evacuated to a military hospital in Moscow, where he spent several weeks recovering. In January 1942, Yeryomenko was appointed commander of the 4th Shock Army, part of the North-Western Front. During the Soviet Winter Counteroffensive, Yeryomenko was again wounded; this time on January 20, when German planes launched a bombing raid on his headquarters. Yeryomenko refused to go to a hospital until the fighting around him abated.
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Stalin gave Yeryomenko the command of the Southeastern Front, on August 1, 1942, [2] where he proceeded to launch vicious counterattacks against the German offensive into the Caucasus, Operation Blau. Yeryomenko and Commissar Nikita Krushchev planned the defense of Stalingrad. When his subordinate, Gen. Lopatin, expressed self-doubt in his ability to save Stalingrad, Yeryomenko replaced him with lieutenant general Vasily Chuikov as 62nd Army commander on September 11, 1942.[3] On September 28, Southeastern Front was renamed Stalingrad Front. During Operation Uranus, November 1942, Yeryomenko's forces helped surround the German 6th Army, which was eventually destroyed in the Battle of Stalingrad. After German General Erich von Manstein attempted to counterattack the Soviet forces and break through the blockade, Yeryomenko counterattacked and was able to halt his push.
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On January 1, 1943, Stalingrad Front was renamed Southern Front. After the end of the winter offensive, in March 1943, Yeryomenko was transferred north to the Kalinin Front, which remained relatively quiet until September, when Yeryomenko launched a small, but successful offensive. In December, Yeryomenko was once again sent south, this time to take command of the Separate Maritime Army, which was a motley force put together so as to retake the Crimea, which was accomplished in conjunction with Fyodor Tolbukhin's 4th Ukrainian Front. In April, Yeryomenko once again was sent north, to command 2nd Baltic Front. During the summer campaign, 2nd Baltic was very successful in crushing German opposition, and was able to capture Riga, helping to bottle up some 30 German divisions in Latvia. On March 26, 1945, Yeryomenko was transferred to the command of the 4th Ukrainian Front, the unit he controlled until the end of the war. Fourth Ukrainian was positioned in Eastern Hungary. Yeryomenko's subsequent offensive helped capture the rest of Hungary, and paved the way for the Soviet liberation of Czechoslovakia. His army liberated many cities and towns in Czechoslovakia, most notably Ostrava. Today, many streets in the Czech Republic bear his name.

After the war

After the war, Yeryomenko had three major commands: between 1945-1946, he was the Commander in Chief of the Carpathian Military District, from 1946-1952 he was the Commander in Chief of the Western Siberian Military District, and from 1953-1958 he was the Commander in Chief of the North Caucasus Military District.

Promotion to Marshal

On March 11, 1955, Yeryomenko, along with five other noteworthy commanders, was given the rank of Marshal of the Soviet Union. He was made Inspector General for the Ministry of Defense in 1958, a largely ceremonial role that allowed Yeryomenko to retire that same year.

Death

He died November 19, 1970. The urn containing his ashes is buried in the Kremlin.

References

  1. ^ Biography on War Heroes site (Russian)
  2. ^ Craig, William (1973). Enemy at the Gates: The Battle for Stalingrad. Old Saybrook, CT: Konecky and Konecky. p. 25. ISBN 1-56852-368-8. 
  3. ^ Craig, William (1973). Enemy at the Gates: The Battle for Stalingrad. Old Saybrook, CT: Konecky and Konecky. p. 83. ISBN 1-56852-368-8. 
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