sábado, 25 de novembro de 2017

Os caminhos gráficos de Ziraldo




24 de novembro de 2017 - 15h32 

Os caminhos gráficos de Ziraldo





Alguns, sem nenhum conhecimento formal, buscam um trabalho que muitos chamam de visceral, quer dizer, não se preocupam com o estudo dos fundamentos do desenho, mas buscam mais a expressividade que a técnica propriamente dita. Outros trilham o caminho do estudo técnico, de estrutura, mas todos tentam chegar a um resultado gráfico que seja identificável à primeira olhada.

Divulgação


Entender e desenvolver seu próprio olhar sobre as formas e sobre o mundo é o que o trabalho de Ziraldo ensina a todos seus filhotes

Gosto de usar o termo identidade gráfica para isso. Alguém olha o trabalho e, imediatamente, sabe quem estava ali atrás do bico de pena, do pincel, do grafite, do programa digital. Ambos os caminhos são válidos para se chegar ao resultado de comunicar bem a ideia.

Existem vários caminhos para o contador de histórias. Seja como autor de livros ou quadrinhos vale tanto o artista visceral quanto o técnico. Ambos buscam sua personalidade narrativa, sua estética gráfica. Ziraldo é tudo isso. Todos os casos ao mesmo tempo. 

No traço, na cor, na narrativa, na composição de cenas, na criação de personagens, na consciência e consistência de sua estética gráfica, em tudo Ziraldo sempre se expôs através de uma personalidade gráfica muito forte. O artista gráfico, o narrador, reproduz o real ou imagina novas realidades através de seu trabalho... e eu quando olho para um trabalho do Ziraldo sempre me pergunto: “como? Como ele faz isso? Como ele enxergou em uma árvore, uma nuvem, na água, em um sofá, em um olho, em uma mão, aquela interpretação gráfica?” Magritte diz: “isso não é um cachimbo”. Ziraldo sabe exatamente o significado disso... não é uma mão, é uma interpretação gráfica de mão; não é uma nuvem, é uma interpretação gráfica de nuvem. É o olhar e a interpretação do artista sobre o que existe. 

A busca do artista gráfico não é “só” por saber desenhar ou pintar bem, é ter justamente essa visão, é criar para que as outras pessoas enxerguem através dos seus traços e cores a maneira pela qual ele concebe a realidade. É perceber como ele pensa o tempo, o espaço, a cena, através de seus olhos. É assim que ele vê o mundo. É assim que conta histórias, como passa para o leitor, o que sente e o que entende. E essa é uma das muitas invejas que guardo comigo sobre o trabalho do Ziraldo. Não se trata de desenhar bem, mas sim de ter personalidade gráfica e, ao mesmo tempo, desenhar tecnicamente muito bem. 

Quando conheci o trabalho dele, fiz uma pasta com recortes de revistas, capas... tudo o que encontrava. Olhava para o trabalho e tentava entender o processo, entender como chegou àquele resultado. Em desenho temos a estrutura e o acabamento. Na estrutura, entendemos como ele constrói as formas, como é a construção de uma mão, de um rosto, de objetos, etc. No acabamento escolhemos o tipo de traço, de linha, de texturas de cor, de composição cromática que estarão “sobre” essa estrutura...em termos práticos, ela é a fundação de uma casa, de um prédio, as vigas, o estilo arquitetônico, o encanamento, a parte elétrica...enfim, tudo o que é necessário para que uma casa fique em pé e funcione. O acabamento é o tipo de piso, azulejos, janelas, portas, vidros, a decoração da casa, etc. Ziraldo foi um dos artistas que me fizeram entender o processo de construção da forma e de como ela pode ser esculpida de maneira consciente até resultar em uma personalidade gráfica. Ele me ajudou a perceber que essa personalidade é a reunião harmônica entre esses dois fundamentos. 

Todo artista tem seus ídolos, suas referências...mas copiar não é opção. Entender o processo deste artista, sim. Entender e desenvolver seu próprio olhar sobre as formas e sobre o mundo é o que o trabalho de Ziraldo ensina a todos seus filhotes...me considero um deles. Não é ser como ele, é ser como você é. Ensinar a construir para que depois você possa seguir seu próprio caminho. É ensinar liberdade para ser você mesmo. Arte é isso e este é o maior elogio que acho que um artista que é referência, que é influência, pode receber. Ziraldo fez isso por mim. Por isso...agradeço! 

Veja a galeria de imagens selecionadas por Marcelo: 








http://www.vermelho.org.br/noticia/304613-1




*Marcelo Campos é desenhista e ilustrador. Trabalhou para editoras como DC Comics (Justice League, Guy Gardner, Extreme Justice, Action Comics), Marvel Comics (Uncanny Originis, Journey Into Mystery, 2099 A.D,) Dark Horse (The Mask), Image (Darkness - arte-final), Cosmic Comics (Death Race 2000) e Disney (Hércules, Mulan, Tarzan). Foi criador do personagem Quebra-Queixo e ganhador de vários prê

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