A advogada britânica Gareth Peirce, célebre pela sua defesa de        vítimas da justiça, escreveu recentemente:  "Ao longo dos        anos do conflito, toda acção fora da lei por parte do Estado        britânico provocou uma reacção semelhante:  internamento,        'atirar para matar', a utilização da tortura... confissões        falsas obtidas brutalmente e provas fabricadas.  Isto foi registado pela        comunidade mais afectada, mas o público britânico, em cujo nome        estas acções foram efectuadas, permaneceu ignorante das        mesmas".  Referindo-se ao conflito na Irlanda do Norte, ela estava a fazer        uma comparação com "nossa nova comunidade suspeita", o        povo de fé muçulmana, contra o qual uma guerra viciosa,        sectária e sobretudo não relatada está a ser empreendida.        
       
       Como destaca Peirce, "o internamento, desacreditado e abandonado na        Irlanda do Norte", agora é permitido, não por 42 dias, mas        sim "a detenção indefinida sem julgamento de estrangeiros no        país, a 'prova' a ser ouvida em segredo sem que ao advogado do detido        seja permitido ver as provas contra ele".  Aqueles arrancados dos seus        lares na Grã-Bretanha a seguir ao 11 de Setembro de 2001 desapareceram        todos no gulag anglo-americano, ao qual neste país pertence a        Prisão Belmarsh, onde pessoas são destinadas ao esquecimento, a        prisão psiquiátrica de Broadmoor, para onde elas são        enviadas quando enlouquecem, e com versões kafkianas de "lar"        onde outras são sepultadas sob "ordens de controle".  Em tal        prisão no lar, escreveu Peirce, "um homem sem armas é        abandonado        só e aterrorizado, incapaz de deixar o apartamento ou contactar qualquer        pessoa sem cometer uma transgressão criminal, sujeito a um        horário de recolha                  (curvfew)                 e sem que lhe sejam permitidas visitas a menos que aprovadas previamente pelo        Home Office".  Ir ao jardim, arranjar um canalizador, falar com o        professor do filho, tudo exige permissão.  As famílias ficam        loucas também.        
       
       Preferindo "uma morte rápida... a uma morte lenta aqui", um        homem que se arriscou e retornou à Argélia ficou perdido nos        gulag subcontratados, onde os seus novos torturadores deram        "garantias" ao governo britânico e estão eles        próprios garantidos pelo facto de que a BP, a ética companhia        petrolífera britânica, enterrou £6 mil milhões        [€7,6 mil milhões] para extrair petróleo da Argélia,        no Sul do Saara.  Jordan, outro sub-empreiteiro, é mantido        economicamente à tona pela pelos EUA de modo que as                 "renditions"                 e a tortura de George W. Bush podem prosseguir aqui.         Nenhum tribunal britânico considerou qualquer destas pessoas culpadas de        qualquer crime, mas como disse muito bem Tony Blair, um genuíno        criminoso                  prima facie,                 "as regras do jogo mudaram".        
       
       Tal como no conflito irlandês, é mais uma vez sobre a nossa        ignorância, do público, com que o Estado conta.  Toda propaganda        é destinada a apurar esta ignorância e a fabricar o medo.  Isto a        tarefa primária de jornalistas.  O verdadeiro medo está nas        comunidades muçulmanas.  Visite-as e encontrará pessoas        aterrorizadas pela sua batida à porta, e mulheres que agora já        não saem.  Com efeito, foram entregues ordens de controle a milhares de        cidadãos britânicos.        
       
       Como nos recorda Peirce, os irlandeses tinham aliados na Igreja Católica        e nos 40 milhões de americanos de ascendência irlandesa.  Os        muçulmanos estão sozinhos quando enfrentam o Estado        britânico, com sua "obstinada incompreensão" da sua        fé, fazem-lhes o que nunca fariam àqueles de outras fés.         Não se pode imaginar judeus tratados deste modo;  a        abominação é demasiado grande.  O silêncio dos        judeus britânicos, os quais têm a história, também        é grande.        
       
       Como mostram os factos suprimidos do "terrorismo", os        muçulmanos são de longe as vítimas mais numerosas –        mais de um milhão de iraquianos mortos, incluindo 500 mil        crianças, durante as "sanções" contra o Iraque na        década de 1990;  talvez um outro milhão morto quando Blair e o        seu mentor atearam o actual inferno;  incontáveis mortos e mutilados        no Afeganistão por armas que incluem a          bomba termobárica        britânica, concebida para sugar o ar para fora de seres humanos.  E        há a Palestina, uma nação inteira sob uma ordem de        controle permanente.        
       
       Ao rever este registo monstruoso, é nada menos que admirável que        um dos mais violentos governos do mundo – a Grã-Bretanha é        agora        o principal mercador de armas – tenha tido apenas duas        retaliações no seu próprio solo.  Com toda a sua        acção hipócrita, ela chama por outra.  Além disso,        escreveu Gareth Peirce, "Se o nosso governo continua neste caminho        [destrutivo], nós finalmente teremos destruído grande parte do        tecido moral e legal da sociedade que clamamos estar a proteger.  A escolha e a        responsabilidade são inteiramente nossas".        
       
        Foi assim para os irlandeses?        por Gareth Peirce,                  London Review of Books.                
       
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