quinta-feira, 17 de julho de 2008

Por que os humoristas não conseguem fazer piada com Obama

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16 DE JULHO DE 2008 - 20h49

O que Barack Obama tem de engraçado? Aparentemente, não muito, pelo menos por enquanto. Na segunda-feira, a revista The New Yorker tentou fazer uma sátira envolvendo o senador Obama, retratando em sua capa o candidato democrata e sua esposa, Michelle, como terroristas seguidores de Bin Laden no Salão Oval da Casa Branca. A reação, tanto de democratas quanto de republicanos, foi explosiva.

Por Bill Carter, no The New York Times



Charge da ''New Yorker'': mal vista

Fazer humor não tem sido fácil para a turma dos apresentadores de programas noturnos que precisam tirar sarro de líderes políticos para apimentar os seus monólogos. Jay Leno, David Letterman, Conan O'Brien, entre outros têm feito uma série de piadas sobre o candidato republicano — todas elas variantes do mesmo tema: John McCain é velho.

Mas muito pouco humor é feito sobre Obama: sua idade, sua oratória, sua inteligência, sua família, seu físico. E em um cenário de programas noturnos dominado por apresentadores brancos, roteiristas brancos e público eminentemente branco, quase não há piadas sobre a raça do candidato democrata.

''Tiramos sarro de pessoas relacionadas a ele, mas não dele propriamente.'' disse Mike Sweeney, roteirista-chefe do programa Late Night do apresentador O'Brien. As piadas sobre Obama virão, disseram os representantes dos programas noturnos, assim que Obama fizer ou disser algo que o defina — em termos humorísticos.

''Somos como urubus,'' disse Jon Stewart, apresentador do The Daily Show, produzido pelo canal Comedy Central. ''Ficamos na espreita nos perguntando 'Ele parece fraco? Já está desidratado? Então, vamos atacar.'''

Mas até agora, nenhuma piada foi feita. Por quê? A razão citada pela maioria dos envolvidos nos programas noturnos é que falta em Obama um fator fundamental: não há ''brecha'' para o humor, nada que seja fácil de gerar riso, como a suposta disposição para mulherengo de Bill Clinton, ou o jeito pateta do presidente Bush, ou a personalidade robótica de Al Gore.

''A questão é que ele não é um bufão em nenhum sentido,'' disse Mike Barry, que começou a escrever piadas políticas para os monólogos de Johnny Carson durante o governo de Johnson, e desde então tem satirizado todos os candidatos à presidência, tendo trabalhado recentemente para Letterman. ''Ele não é uma figura cômica,'' disse Barry.

Piadas foram feitas sobre a verdadeira opinião que Hillary Clinton tinha de Obama durante as primárias e sobre os comentários vulgares que o reverendo Jesse Jackson fez sobre o democrata na semana passada. Mas qualquer coisa que tenha chegado mais próximo de uma piada sobre Obama não deu certo.

Recentemente, quando Stewart do The Daily Show tentou fazer uma piada a respeito da mudança de postura de Obama sobre o financiamento de sua campanha, a platéia ficou obviamente incomodada, a ponto do apresentador dizer, ''Sabe, vocês podem rir dele.'' Stewart afirmou em uma entrevista telefônica na segunda-feira, ''As pessoas têm a tendência de reagir dentro dos limites de suas ideologias.''

Não há dúvida, segundo diversos representantes de programas noturnos, de que a audiência (e pelo menos uma parte dos roteiristas) sente empatia por Obama, o que a deixa menos confortável em relação a piadas sobre ele do que sobre a maioria dos candidatos do passado. ''Muitos estão entusiasmados com a sua candidatura,'' Sweeney disse. ''É quase como se dissessem 'Ei, não mexam com esse cara. Ele é um rosto novo; peguem leve.'''

Justin Stangel, roteirista-chefe do The Late Show With David Letterman, contestou a afirmação, dizendo: ''sempre temos que fazer piadas sobre todo mundo. Não damos desconto para o novato.'' Mas Barry disse ainda: ''acho que alguns de nós caricaturamos Al Gore e John Kerry muito precocemente e agora parece haver uma relutância em fazer o mesmo com Obama.''

Claro, a questão racial também é mencionada como um fator que dificulta satirizar Obama. ''Qualquer piada que tenha a mínima relação com racismo não terá graça para ninguém,'' disse Rob Burnett, produtor executivo do programa de Letterman. ''O público não vai permitir que ninguém faça uma coisa dessas.''

Nesta semana, a revista The New Yorker enfrentou uma hostilidade diferente por sua capa, duramente criticada pelos membros da campanha de Obama. O porta-voz da campanha, Bill Burton, declarou que ''a maioria dos leitores considera a brincadeira de mau gosto e ofensiva -- e nós concordamos.''

Quando perguntado sobre a capa em uma coletiva de imprensa na segunda-feira, McCain disse que ela é ''totalmente inapropriada e que entendia o motivo pelo qual o senador Obama e seus aliados ficaram ofendidos.''

A capa foi desenhada por Barry Blitt, que também faz ilustrações para o editorial do The New York Times. David Remnick, editor do The New Yorker, disse em uma mensagem de e-mail: ''a capa usa várias distorções, mentiras e idéias equivocadas sobre o casal Obama e as coloca na frente de um espelho, desmascarando o que de fato elas são. Isso lembra muito a espirituosidade de Stephen Colbert -- ao exagerar e satirizar algo, ele revela o seu absurdo, que é o propósito da sátira.'' Mas Colbert não tem conseguido fazer de Obama objeto de seu humor.

Stewart, que também é produtor executivo do The Colbert Report, disse que a reação dos membros da campanha de Obama à capa da The New Yorker lembra algo que se tornou quase de praxe em campanhas políticas. ''Nada acontece sem que haja uma resposta do candidato,'' ele disse. ''Colocamos as pessoas em uma situação maluca. Elas podem se ofender profundamente, mas a reação é parte do processo normal de digestão.''

Bill Maher, que apresenta um programa noturno sobre política na HBO, disse ''Se não é permitido usar ironia na capa da The New Yorker, onde então isso é possível?'' Uma particularidade que claramente teve impacto nas piadas sobre Obama pode ser vista nos mais populares programas noturnos. Não só os apresentadores, como também a vasta maioria das platéias é branca. ''Acho que platéias brancas têm mais receio com questões de raça'', afirmou Sweeney do programa de O'Brien.

As coisas poderiam ser diferentes se pelo menos um apresentador de programas noturnos fosse negro. Comediantes negros não têm problema algum em fazer piadas sobre Obama, disse David Alan Grier, um comediante que, a partir de outubro, terá um programa de notícias satíricas, chamado Chocolate News, no canal Comedy Central.

''Faço piadas de Obama em minhas apresentações'', disse Grier, citando algumas piadas que nunca seriam usadas em programas noturnos (nem no The New York Times).

Porém, ele afirma a respeito dos apresentadores noturnos: ''realmente, esses caras não podem fazer esse tipo de piada. É como piada de gay, que só os comediantes gays podem fazer. Faz parte do território''. Mesmo assim, ele disse não ter pena dos apresentadores: ''de jeito nenhum. Eles já tiveram 200 anos de piadas presidenciais. Agora é a nossa vez.''

Jimmy Kimmel, apresentador do Jimmy Kimmel Live, programa de entrevistas noturno da ABC, disse a respeito de Obama que ''agora está acontecendo um estranho racismo inverso. Não se pode fazer piada dele porque ele é metade branco. É tolice. Acho que a situação é ainda mais problemática porque Obama é muito educado, não parece ter nenhum defeito.''

Maher disse que ser mais cuidadoso ao falar de Obama não interfere em seus comentários, embora ele tenha mais liberdade para falar de certos assuntos na HBO do que outros comediantes. ''Existe essa questão sobre ele ser ou não negro o suficiente'', disse Maher. ''Tenho uma piada: O que ele precisa fazer? Enterrar uma bola? Ele é péssimo no boliche - para mim, isso é negro o suficiente.''

''Acho que podíamos fazer piada sobre as orelhas dele'', disse Kimmel. A maioria dos apresentadores noturnos parece ter a mesma opinião. ''Estamos só esperando,'' disse Eric Stangel que, como o seu irmão, é roteirista-chefe do Letterman Show. ''Ainda não há muitas referências sobre Obama, não como Hillary ou McCain. Mas haverá.''

O produtor do programa, Burnett, afirmou ''Não podemos fabricar uma percepção. Se ela não é real, ninguém vai rir sobre isso.'' Sweeney encerrou dizendo, ''Tomara que ele escolha um idiota como vice-presidente.''

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in Vermelho

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