quinta-feira, 5 de abril de 2018

Bertold Brecht - SOBRE O POBRE B. B.

* Bertold Brecht


Marcel Petrus
Publicado a 10/02/2012


Sobre o pobre B.B.

Eu, Bertolt Brecht, sou das florestas negras.
Minha mãe me trouxe para as cidades
Dentro do ventre. E o frio das florestas
Estará comigo ao me cobrir a laje.

Na cidade de asfalto estou em casa e a caráter,
Com todos os últimos sacramentos
Ministrados: jornais, tabaco, conhaque:
Desconfiado, indolente e enfim satisfeito.

Sou amável com os outros. E visto
Meu chapéu-coco, como todo o mundo.
Digo: são bichos de cheiro esquisito
E digo: e daí? Também sou, no fundo.

Às vezes, nas cadeiras de balanço,
Coloco algumas moças, de manhã,
E digo: em mim vocês têm, eu garanto,
Alguém em quem não podem confiar.

À tarde me reúno com colegas.
Tratamo-nos de “gentleman”, então.
Eles dizem, com os pés à minha mesa:
As coisas vão melhorar. E não pergunto: quando.

Na madrugada cinza, abetos mijam
E piam os pássaros, que são seus vermes.
Na cidade, meu copo se esvazia,
Largo o charuto e durmo um sono leve.

Assentamo-nos, uma geração leviana,
Em prédios que quiséramos indestrutíveis
(assim construímos os arranha-céus da ilha de Manhattan
E as finas antenas sobre o Atlântico a nos divertirem).

Destas cidades ficará quem as atravessou, o vento!
A casa faz feliz quem nela come: quem a esvazia.
Sabemos sermos efêmeros
E que depois de nós o que virá será sem valia.

Nos terremotos vindouros, que não seja meu fado
Deixar por amargura o meu Virginia se apagar,
Eu, Bertolt Brecht, largado nas cidades de asfalto,
Oriundo das florestas negras, no ventre da mãe, tempos atrás.

Tradução de António Cícero
http://antoniocicero.blogspot.pt/2007/03/poema-de-brecht.html

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