Foto - Bernardo Coelho
Margarida Rebelo Pinto: "Escrever sobre sexo não é difícil. Escrever cenas de sexo é que é. Por isso, o pudor e a elegância têm de estar sempre presentes e vigilantes."
Entrevista a Margarida Rebelo Pinto
Margarida Rebelo Pinto lança o seu primeiro romance histórico. 'Minha Querida Inês' é uma obra ousada sobre a paixão imortal do rei D. Pedro I
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Correio da Manhã - O seu novo livro, o primeiro romance histórico que escreve, vai surpreender o público a vários títulos. Para já, por ser um... romance histórico.
Margarida Rebelo Pinto - É um livro diferente porque passa-se na Idade Média, mas quem é meu leitor vai encontrar lá o mesmo tom intimista dos livros anteriores, as mesmas questões sobre amor, amizade, família, ciúme, desamor, solidão... Só que no século XIV.
- O romance histórico é um género que lhe apetecia ou o livro resulta dos desafios lançados por amigos. Cita Pedro Pina, Jorge Pereira de Sampaio e José Miguel Júdice nos agradecimentos...?
- Sim, há muito tempo que andava com a Inês de Castro na cabeça, desde 2005, quando o Jorge Pereira de Sampaio, Director do Mosteiro de Alcobaça, me pediu para escrever uma peça de teatro sobre ela. O Pedro Pina desde então foi insistindo comigo, que eu devia fazer uma coisa diferente, e o Zé Miguel sempre se interessou pelo projecto e facilitou-me estadias e visitas à Quinta das Lágrimas, onde se encontram as famosas fontes, Fonte do Amores e Fonte Nova, locais predilectos de Pedro e de Inês.
- O livro surpreende, também, porque coloca personagens históricas sob uma luz desconcertante. As cenas de sexo oral entre Pedro e Inês, apesar da elegância com que são descritas, vão deixar muita gente perplexa. Tinha consciência disso? Foi deliberado?
- Foi. Nunca escrevo nada sem ser deliberado. Já nem o poderia fazer, tenho uma grande responsabilidade perante os meus leitores. Na Idade Média, ao contrário do que as pessoas pensam, havia muita libertinagem, o sexo era uma das poucas distracções que as pessoas tinham. Inês e Pedro estiveram juntos muitos anos, é natural que entre eles existisse uma enorme cumplicidade sexual. O sexo faz parte da vida, escrever sobre sexo não é difícil. Escrever cenas de sexo é que é. Por isso, o pudor e a elegância têm de estar sempre presentes e vigilantes. Nunca se pode levantar completamente o véu.
- O carácter de Pedro sai um tanto prejudicado: para além de trair Inês com outras mulheres, fá-lo também com homens e com animais. É um facto registado pela História ou faz parte da liberdade criativa que assiste a qualquer romancista?
- Já Fernão Lopes dizia nas crónicas que Pedro amava mais Afonso Madeira do que é de bom-tom dizer. É um facto histórico. E D. João I, Mestre de Avis, Rei de Portugal, é filho de Teresa, uma mulher galega, aia de D. Inês. Depois de Inês ter morrido D. Pedro foi um bom rei, mas era vingativo e sanguinário, epiléptico, gago e insone, tal como o descrevo no livro.
- Quanto tempo demorou a escrever este livro: desde o início das pesquisas históricas até à versão final?
- Comecei a trabalhar nele em 2005 e acabei em Setembro de 2011, foi um processo muito mais longo do que é habitual.
- Conseguiu tornar totalmente credível este português que, não sendo antigo na grafia, é-o no ritmo e nas palavras usadas, na elevação da linguagem. Foi difícil de conseguir?
- Não, foi divertido. É como entrar na toada de uma canção. O maravilhoso romance de Pedro Canais, ‘A Lenda de Martim Regos', foi uma grande ajuda para conseguir utilizar alguma linguagem da época sem aumentar o grau de dificuldade da leitura. Há palavras arcaicas que as pessoas vão reconhecer, penso que isso vai divertir os leitores.
- Os seus leitores habituais podem esperar outros romances históricos da sua pena, ou vai voltar exclusivamente à linha a que os habituou?
- Não sinto que ‘Minha Querida Inês' tenha saído do meu estilo, porque aquilo que os meus leitores estão habituados a reconhecer na minha escrita está lá: a emoção, a intensidade, as reflexões sobre comportamentos amorosos, a paixão intensa e o sarcasmo na observação da condição humana... Ao mesmo tempo, o relato de um dos episódios mais fascinantes da História de Portugal. Inês de Castro é a nossa maior heroína romântica, é importante que os portugueses conheçam a sua história.
- Qual é o seu próximo projecto literário?
- Não faço ideia. Ainda tenho ‘Minha Querida Inês' debaixo da pele. Em Janeiro penso nisso. Tenho uma lista de projectos que já comecei. O mais certo é que um deles me apanhe na curva, porque são as histórias que nos apanham, e não o contrário.