* Jos´´e Gomes Ferreira
SONÂMBULO/I
SONÂMBULO/I
(Enquanto os aliados a caminho de Berlim
morrem, eu entretenho-me a ver chover na
Rua da Palma, espalmado num portal a
cheirar a urina podre)
Chove…
Mas isso que importa!,
se estou aqui abrigado nesta porta
a ouvir na chuva que cai do céu
uma melodia de silêncio
que ninguém mais ouve
senão eu?
Chove…
Mas é do destino
de quem ama
ouvir um violino
até na lama.
~~~~~~~~~~
Dos dedos dos homens
Sujos de morte.
Um mundo forrado
De pele de mãos
Com pedras roídas
das nossas sombras.
Um mundo lodoso
Do suor dos outros
E sangue nos ecos
Colado aos passos…
Um mundo tocado
Dos nossos olhos
A chorarem musgo
De lágrimas podres…
Um mundo de cárceres
Com grades de súplica
E o vento a soprar
Nos muros de gritos.
Um mundo de látegos
E vielas negras
Com braços de fome
A saírem das pedras…
O nosso mundo é este
Suado de morte
E não o das árvores
Floridas de música
A ignorarem
Que vão morrer.
E se soubessem, dariam flor?
Pois os homens sabem
E cantam e cantam
Com morte e suor.
O nosso mundo é este….
( Mas há-de ser outro.)
SONÂMBULO - XIV
Dói-me a boca de silêncio
e vou gritar!
- nesta noite de lua mole
a dobrar-se nos telhados
inertes de bafio...
Dói-me a boca de silêncio
e vou gritar!
- Atirar para a ferrugem do vento
da noite desmantelada
um desafio de acordar o mundo
nas janelas de súbito acesas
- com milhões de vozes
esvaídas num clamor para além do sufocar das pedras!
Dói-me a boca de silêncio
e vou gritar!
Gritar,ouviram?
Gritar esta alegria de não sentir ainda terra na boca!
Gritar esta Labareda, enfim fora dos olhos!
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