quinta-feira, 8 de julho de 2021

Miguel Esteves Cardoso - Setúbal é que é

CRÓNICA

* Miguel Esteves Cardoso

Estou a apaixonar-me por Setúbal há sessenta anos – mas só nos últimos 30 é que a coisa se agravou. Quando ia com os meus pais, a paixão por Setúbal não era minha – era deles. Mas alguma coisa se infiltrou pelos meus olhos meninos, durante aqueles almoços ao ar livre, quando me estavam a ensinar a comer peixe.

Só nos últimos dias, graças a circunstâncias felizes que me levaram a Setúbal várias vezes, é que me dei conta que era amor e que já não havia nada a fazer. Para mim, é uma revolução apaixonar-me agora por Setúbal quando eu já tinha o coração configurado.

Até aqui, tenho vivido alegremente no meu triângulo das Bermudas: os três sítios que amo, onde me sinto à vontade para andar de bermudas, de pernas ao léu: Lisboa, Cascais e Sintra.

A paixão por Setúbal rouba-me essa piada barata e introduz a figura do quadrilátero. É mais quadrada, mas quero lá saber: Lisboa, Cascais, Sintra e Setúbal.

Não é só Setúbal, a cidade e a gente, a maneira de conviver e a graça, a honestidade e o civismo. É também tudo o que Setúbal tem à volta. Para além da Arrábida e de Tróia – como se fosse preciso mais – há tantas praias e aldeias, tantas paisagens e surpresas, que o único problema para um andarilho é nunca mais parar quieto e não poder assim ver a mesma beleza mais de uma vez.

A vantagem de pertencer ao quadrilátero é que não é nenhum bico-de-obra saltar de aresta para aresta: de Setúbal a Cascais ou Sintra são dois ou três pulinhos, com a vantagem imensa do primeiro pulinho ser Lisboa.

Depois, há a pequena questão dos almoços e jantares. Em Lisboa, Cascais e Sintra é cada vez mais difícil – e caro – comer bem. Mas em Setúbal é preciso muito azar e muita dedicação para comer mal. Pelo menos por enquanto, não é?

8 de Julho de 2021, 6:05

https://www.publico.pt/2021/07/08/opiniao/cronica/setubal-1969516


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