14 de abril de 2010
Fumo
Longe de ti são ermos os caminhos,
Longe de ti não há luar nem rosas;
Longe de ti há noites silenciosas,
Há dias sem calor, beirais sem ninhos!
.
Florbela Espanca
Longe de ti não há luar nem rosas;
Longe de ti há noites silenciosas,
Há dias sem calor, beirais sem ninhos!
.
Florbela Espanca
13 de abril de 2010
Antoine Pesne
A bailarina Barbara Campanini, em 1745
Da Injustiça
Amaldiçoado em lágrimas
rasgo olhos ao horizonte
poente
inutilizo a noite
na chegada
em refúgio
(os cães ladram)
rememoro a hora
da notícia transmitida
palavra por palavra
revejo minha imagem
cristalizada
no congelamento
da lágrima depositada
(os cães farejam)
as dores se afastam
no distanciamento
necessário ao medo
o corpo estremece
ao se pertencer em dores
no horizonte hostil
da janela aberta
o futuro se depara
com a impertinência
do presente
(os cães comem)
afasto suas mãos das minhas:
o contato é lucidez
inoportuna na desesperança
a oração despercebida
rompe o silêncio
e se perpetua
afago o deslizar da hora
em horas subsequentes
(os cães se defendem)
murmuro o nada acontecido
e desacordo em sonhos
o retorno convive
com o fato
desproporcionado
revivo o outono em folhas
pelo chão
recupero a sanidade
e me faço cristal
de rocha esfacelado
(os cães se diferenciam)
sofro o instante
e gesto
o silêncio
o emudecer transmite
a incerteza da pergunta
na vastidão ampliada
da insensibilidade
(os cães desfazem)
posso perguntar
o que bem entendo:
mas não entendo
posso exprimir
a minha raiva:
mas não pretendo
posso aproximar
os olhos à fotografia:
mas não enxergo
(os cães confundem)
calendários dizem que os anos passam
o exercício diuturno de recuperar
o inconsciente e o aguardar
refulgente: recomposto
o exército lancinante dos ataques
distribuí ossos que estalam
(os cães apavoram)
um dia destaco na pedra
o sinal: acordo
um dia acordo e na pedra
destaco o sinal
um sinal na pedra
é destaque quando acordo
(os cães se acovardam)
olho e enxergo
ouço e escuto
pego e sinto
levo à boca
e o sal amarga
o recesso de onde retirado
avaros dias de permanências
permanentes signos
aparentes esboços
o processo desarruma o fato
em procedimentos
(os cães arfam)
ouvidas as testemunhas
os peritos dizem
das especialidades
nada
nada
a improvável condenação
confundida em versos
na reversão da realidade
(os cães obedecem)
choro atravessar o espaço
desconsolado em fatuidades
remoço a fotografia
e me instalo diante
da orfandade
perder significa atos
ao despropósito
de continuar vivo
(os cães silenciam).
Pedro Du Bois
rasgo olhos ao horizonte
poente
inutilizo a noite
na chegada
em refúgio
(os cães ladram)
rememoro a hora
da notícia transmitida
palavra por palavra
revejo minha imagem
cristalizada
no congelamento
da lágrima depositada
(os cães farejam)
as dores se afastam
no distanciamento
necessário ao medo
o corpo estremece
ao se pertencer em dores
no horizonte hostil
da janela aberta
o futuro se depara
com a impertinência
do presente
(os cães comem)
afasto suas mãos das minhas:
o contato é lucidez
inoportuna na desesperança
a oração despercebida
rompe o silêncio
e se perpetua
afago o deslizar da hora
em horas subsequentes
(os cães se defendem)
murmuro o nada acontecido
e desacordo em sonhos
o retorno convive
com o fato
desproporcionado
revivo o outono em folhas
pelo chão
recupero a sanidade
e me faço cristal
de rocha esfacelado
(os cães se diferenciam)
sofro o instante
e gesto
o silêncio
o emudecer transmite
a incerteza da pergunta
na vastidão ampliada
da insensibilidade
(os cães desfazem)
posso perguntar
o que bem entendo:
mas não entendo
posso exprimir
a minha raiva:
mas não pretendo
posso aproximar
os olhos à fotografia:
mas não enxergo
(os cães confundem)
calendários dizem que os anos passam
o exercício diuturno de recuperar
o inconsciente e o aguardar
refulgente: recomposto
o exército lancinante dos ataques
distribuí ossos que estalam
(os cães apavoram)
um dia destaco na pedra
o sinal: acordo
um dia acordo e na pedra
destaco o sinal
um sinal na pedra
é destaque quando acordo
(os cães se acovardam)
olho e enxergo
ouço e escuto
pego e sinto
levo à boca
e o sal amarga
o recesso de onde retirado
avaros dias de permanências
permanentes signos
aparentes esboços
o processo desarruma o fato
em procedimentos
(os cães arfam)
ouvidas as testemunhas
os peritos dizem
das especialidades
nada
nada
a improvável condenação
confundida em versos
na reversão da realidade
(os cães obedecem)
choro atravessar o espaço
desconsolado em fatuidades
remoço a fotografia
e me instalo diante
da orfandade
perder significa atos
ao despropósito
de continuar vivo
(os cães silenciam).
Pedro Du Bois
12 de abril de 2010
Vivir es caminar
(gentileza de Amélia Pais)
.
Vivir es caminar breve jornada,
y muerte viva es, Lico, nuestra vida,
ayer al frágil cuerpo amanecida,
cada instante en el cuerpo sepultada.
Nada que, siendo, es poco, y será nada
en poco tiempo, que ambiciosa olvida;
pues, de la vanidad mal persuadida,
anhela duración, tierra animada.
Llevada de engañoso pensamiento
y de esperanza burladora y ciega,
tropezará en el mismo monumento.
Como el que, divertido, el mar navega,
y, sin moverse, vuela con el viento,
y antes que piense en acercarse, llega.
Francisco de Quevedo
.
Vivir es caminar breve jornada,
y muerte viva es, Lico, nuestra vida,
ayer al frágil cuerpo amanecida,
cada instante en el cuerpo sepultada.
Nada que, siendo, es poco, y será nada
en poco tiempo, que ambiciosa olvida;
pues, de la vanidad mal persuadida,
anhela duración, tierra animada.
Llevada de engañoso pensamiento
y de esperanza burladora y ciega,
tropezará en el mismo monumento.
Como el que, divertido, el mar navega,
y, sin moverse, vuela con el viento,
y antes que piense en acercarse, llega.
Francisco de Quevedo
11 de abril de 2010
De regresso
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Fernando Pessoa
.
Fernando Pessoa
.
Mácula
Desprovido de mácula mancho o passo
com o sangue: acetinado preço
do inocente declarado; o pecado
urdido em mortes se rebela
contra o antagonismo da verdade;
o sangue jorra minha vida esvaída
ao sentido de me dizer libertado;
maculo histórias em interpretações
despropositadas, reinvento atos
de coragem em paródias
prosódias
sarcasmo
desprovido em mácula.
O sangue cessa o alvor
do corpo despropositado.
.-
Pedro Du Bois
com o sangue: acetinado preço
do inocente declarado; o pecado
urdido em mortes se rebela
contra o antagonismo da verdade;
o sangue jorra minha vida esvaída
ao sentido de me dizer libertado;
maculo histórias em interpretações
despropositadas, reinvento atos
de coragem em paródias
prosódias
sarcasmo
desprovido em mácula.
O sangue cessa o alvor
do corpo despropositado.
.-
Pedro Du Bois
10 de abril de 2010
The Laughter Of Women
The laughter of women sets fire
to the Halls of Injustice
and the false evidence burns
to a beautiful white lightness
It rattles the Chambers of Congress
and forces the windows wide open
so the fatuous speeches can fly out
The laughter of women wipes the mist
from the spectacles of the old;
it infects them with a happy flu
and they laugh as if they were young again
Prisoners held in underground cells
imagine that they see daylight
when they remember the laughter of women
It runs across water that divides,
and reconciles two unfriendly shores
like flares that signal the news to each other
What a language it is, the laughter of women,
high-flying and subversive.
Long before law and scripture
we heard the laughter, we understood freedom.
.
Lisel Mueller
to the Halls of Injustice
and the false evidence burns
to a beautiful white lightness
It rattles the Chambers of Congress
and forces the windows wide open
so the fatuous speeches can fly out
The laughter of women wipes the mist
from the spectacles of the old;
it infects them with a happy flu
and they laugh as if they were young again
Prisoners held in underground cells
imagine that they see daylight
when they remember the laughter of women
It runs across water that divides,
and reconciles two unfriendly shores
like flares that signal the news to each other
What a language it is, the laughter of women,
high-flying and subversive.
Long before law and scripture
we heard the laughter, we understood freedom.
.
Lisel Mueller
09 de abril de 2010
Stay
Now the journey is ending,
the wind is losing heart.
Into your hands it's falling,
a rickety house of cards.
The cards are backed with pictures
displaying all the world.
You've stacked up all the images
and shuffled them with words.
And how profound the playing
that once again begins!
Stay, the card you're drawing
is the only world you'll win.
.
Ingeborg Bachmann
the wind is losing heart.
Into your hands it's falling,
a rickety house of cards.
The cards are backed with pictures
displaying all the world.
You've stacked up all the images
and shuffled them with words.
And how profound the playing
that once again begins!
Stay, the card you're drawing
is the only world you'll win.
.
Ingeborg Bachmann
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