domingo, 10 de maio de 2015

Frei António das Chagas - Romance de uma Freira Indo às Caldas

Frei António das Chagas


Belisa, aquela beldade, 
Cujas perfeições são tais, 
Que a formosura e juízo 
Vivem nela muito em paz; 
Aquela Circe das almas, 
Cuja voz sempre será 
Encanto dos alvedrios 
E o pasmo de Portugal; 
Enferma, bem que sublime, 
De uns achaques mostras dá, 
Pois às deidades também 
Os males se atrevem já. 
Por se livrar das moléstias 
Que a costumam magoar, 
Se negou remédio às vidas, 
Por remédio às Caldas vai. 
Aquele sol escondido 
Entre as nuvens de um saial, 
Se ocaso faz de um convento, 
Do campo eclíptica faz. 


Mas, logo que os campos lustra, 
Alento e desmaios dá 
Ao dia para luzir, 
Ao Sol para se eclipsar. 
Aos prados, a quem o Estio 
Despe a gala natural, 
Quando os olhos podem ver, 
Flores tornam a enfeitar. 
Dando-lhe a música os bosques 
Com citara de cristal, 
Parece entre os ramos verdes 
Cada rouxinol um Brás. 
A viração que entre as folhas 
Sempre buliçosa está, 
Ou já murmure ou suspire, 
Faz de cada assopro um ai. 
Cuido que, por festejá-la 
Com contentamento igual, 
As fontes querem tanger 
E as plantas querem bailar. 

Frei António das Chagas, in 'Fénix Renascida' 

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