quinta-feira, 24 de setembro de 2020

andorinhas na poesia


foto victor nogueira - ninhos de andorinhas

Quem se lembra destes ninhos, construídos em muitos edifícios em Portugal de lés a lés, ninhos de andorinhas que com o seu chilreio anunciavam o regresso cíclico  da Primavera?  

Quem se lembra dos galos que cocoricavam de madrugada, ao despontar do sol, anunciando um novo alvorecer?

Quem se lembra dos burros, machos e mulas, que durante milénios foram as bestas de carga para transportarem mercadorias e pessoas, puxarem o arado ou a carroça ou fazerem girar as noras e outros aparelhos para extraírem água dos poços?

Poesia sobre as andorinhas

* Fernando Pessoa

Andorinha que vais alta,
Porque não me vens trazer
Qualquer coisa que me falta
E que te não sei dizer?

s.d.
Quadras ao Gosto Popular. Fernando Pessoa
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* Manuel Bandeira

Andorinha lá fora está dizendo:
— "Passei o dia à toa, à toa!"

Andorinha, andorinha, minha cantiga é mais triste!
Passei a vida à toa, à toa...
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* Casssiano  Ribeiro   

As Andorinhas de António Nobre 

—Nos
—fios
—ten
sos

—da
—pauta
—de me-
tal

—as
— an/
do/
ri/
nhas
—gri-
tam

—por
—fal/
ta/
—de u-
ma
—cl’a-
ve
—de
—sol
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* Natália Correia  

O Espírito 

Nada a fazer amor, eu sou do bando
Impermanente das aves friorentas;
E nos galhos dos anos desbotando
Já as folhas me ofuscam macilentas;

E vou com as andorinhas. Até quando?
À vida breve não perguntes: cruentas
Rugas me humilham. Não mais em estilo brando
Ave estroina serei em mãos sedentas.

Pensa-me eterna que o eterno gera
Quem na amada o conjura. Além, mais alto,
Em ileso beiral, aí espera:

Andorinha indemne ao sobressalto
Do tempo, núncia de perene primavera.
Confia. Eu sou romântica. Não falto.

Natália Correia, in “Poesia Completa
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* Florbela Espanca 

Filtro

Meu Amor, nao é nada: - Sons marinhos
Numa concha vazia, choro errante...
Ah, olhos que nao choram! Pobrezinhos...
Nao há luz neste mundo que os levante!

Eu andarei por ti os maus caminhos
E as minhas maos, abertas a diamante,
Hao de crucificar-se nos espinhos
Quando o meu peito for o teu mirante!

Para que corpos vis te nao desejem,
Hei de dar-te o meu corpo, e a boca minha
Pra que bocas impuras te nao beijem!

Como quem roça um lago que sonhou,
Minhas cansadas asas de andorinha
Hao-de prender-te todo num só vóo...
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* Maria João Brito de Sousa

Acenar a Primavera nas asas duma andorinha

Aonde as andorinhas que as não vejo?
Atrasos? Nunca os houve neste céu!
Talvez seja, afinal, engano meu
Ou talvez seja céu quanto eu desejo...

Aonde os negros fatos que eu invejo?
Aonde os aventais que Deus teceu?
Aonde as asas negras como breu
Criando aéreas pontes sobre o Tejo?

Aonde as andorinhas que chegavam,
Em louca revoada, ao Portugal
Que havia nos meus tempos de menina?

Até onde os meus olhos alcançavam
As negras asas davam-me o sinal
Para acender, num sonho, a luz divina.

 
Maria João Brito de Sousa - 18.03.2008
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(Popular)

Ó meu amor de tão longe,
Escreve-me uma cartinha;
Se não tiveres papel,
Nas asas duma andorinha

(Cancioneiro da Serra de Agra)

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