sábado, 2 de novembro de 2013

Cantigas Medievais


Cantigas de amor

Noutro dia, quando me despedi
da minha Senhor, e quando ela me ouviu ir
e não me falou, nem me quis ouvir,
tão sem ventura foi que não morri,
mas, se mil vezes pudesse morrer,
menor seria a dor que ela me faz sofrer.
E eu lhe disse: "me ouça, minha Senhor" !
Olhou-me pouco e teve por mim desdém;
e, sem me dizer nem mal nem bem,
me deixou sofrendo, e com grande pavor,
mas, se mil vezes pudesse morrer,
menor seria o sofrimento de minha dor.
E sei muito bem, eu que ela deixei,
e dali me fui, que não me quis falar,
e então quase morri de pesar,
mas de pesar nuncam mais morrerei,
pois, se mil vezes pudesse morrer,
menor dor teria do que ela me faz sofrer.

(D. Joan Soares Coelho)
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Quer'eu em maneira de proençal
fazer agora un cantar d'amor,
e querrei muit'i loar mia senhor
a que prez nen fremusura non fal,
nen bondade; e mais vos direi en:
tanto a fez Deus comprida de ben
que mais que todas las do mundo val.

Ca mia senhor quiso Deus fazer tal,
quando a faz, que a fez sabedor
de todo ben e de mui gran valor,
e con todo est'é mui comunal
ali u deve; er deu-lhi bon sen,
e des i non lhi fez pouco de ben,
quando non quis que lh'outra foss'igual.

Ca en mia senhor nunca Deus pôs mal,
mais pôs i prez e beldad'e loor
e falar mui ben, e riir melhor
que outra molher; des i é leal
muit', e por esto non sei oj'eu quen
possa compridamente no seu ben
falar, ca non á, tra-lo seu ben, al.

El-Rei D. Dinis, CV 123, CBN 485
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Proençaes soen mui ben trobar
e dizen eles que é con amor;
mais os que troban no tempo da frol
e non en outro, sei eu ben que non
an tan gran coita no seu coraçon
qual m'eu por mha senhor vejo levar.

Pero que troban e saben loar
sas senhores o mais e o melhor
que eles poden, soõ sabedor
que os que troban quand'a frol sazon
á, e non ante, se Deus mi perdon,
non an tal coita qual eu ei sen par.

Ca os que troban e que s'alegrar
van eno tempo que ten a color
a frol consigu', e, tanto que se for
aquel tempo, logu'en trobar razon
non an, non viven [en] qual perdiçon
oj'eu vivo, que pois m'á-de matar.

El-Rei D. Dinis, CV 127, CBN 489

Cantigas de amigo

Ai de mim, coitada !
Como vivo em grande cuidado
por meu amigo
que se ausenta alongado !
Muito me tarda
o meu amigo na Guarda !
Ai de mim, coitada !
Como vivo em grande desejo
por meu amigo
que tarda e que não vejo !
Muito me tarda
o meu amigo na Guarda !

(El-rei D. Sancho I, séc. XII-XIII)
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Ondas do mar de Vigo,
se vistes meu amigo!
E ai Deus, se verrá cedo!

Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!
E ai Deus, se verrá cedo!

Se vistes meu amigo,
o por que eu sospiro!
E ai Deus, se verrá cedo!

Se vistes meu amado,
por que hei gran cuidado!
E ai Deus, se verrá cedo!

Martin Codax, CV 884, CBN 1227
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Pois nossas madres van a San Simon
de Val de Prados candeas queimar,
nós, as meninhas, punhemos de andar
con nossas madres, e elas enton
queimen candeas por nós e por si
e nós, meninhas, bailaremos i.

Nossos amigos todos  lá irán
por nos veer, e andaremos nós
bailando ante eles, fremosas en cós,
e nossas madres, pois que alá van,
queimen candeas por nós e por si
e nós, meninhas, bailaremos i.

Nossos amigos irán por cousir
como bailamos, e podem veer
bailar moças de bon parecer,
e nossas madres pois lá  queren ir,
queimen candeas por nós e por si
e nós, meninhas, bailaremos i.

Pero de Viviãez, CV 336, CBN 698

Cantigas de escárnio

Vaiamos, irmã, vaiamos dormir
nas ribas do lago, u eu andar vi
a las aves meu amigo.
Vaiamos, irmã, vaiamos folgar
nas ribas do lago, eu vi andar
a las aves meu amigo.
Nas ribas do lago, u eu andar vi
seu arco na mão as aves ferir
a las aves meu amigo.
Nas ribas do lago, u eu vi andar
seu arco na mão a las aves tirar
a las aves meu amigo.
Seu arco na mão as aves ferir
a las que cantavam leixá-las guarir
a las aves meu amigo.
Seu arco na mão a las aves tirar
a las que cantavam non nas quer matar
a las aves meu amigo.

(Fernando Esguio)
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Foi um dia Lopo jograr
a casa duü infançon cantar,
e mandou-lhe ele por don dar
três couces na garganta,
e foi-lhe escasso, a meu cuidar,
segundo como el canta

Escasso foi o infançon
en seus couces partir' enton,
ca non deu a Lopo enton
mais de três na garganta,
e mais merece o jograron,
segundo como el canta.

Martin Soarez, CV 974

Cantigas de maldizer

Don Foão, que eu sei que á preço de livão,
vedes que fez en guerra - daquesto soo certão:
sei que viu os genetes, como boi que fer tavão,
sacudiu-se e revolveu-se, alçou rab’ e foi sa via a Portugal.
Don Foão, que eu sei que á preço de ligeiro,
vedes que fez en guerra - daquesto sou verdadeiro:
sol que viu os genetes, come bezerro tenreiro,
sacudiu-se e revolveu-se, alçou rab’ e foi sa via a Portugal.
Don Foão, que eu sei que á prez de liveldade,
vedes que fez e na guerra - sabede-o per verdade:
sol que viu os genetes, come can que sal de grade,
sacudiu-se e revolveu-se, alçou rab’ e foi sa via a Portugal.

(D. Afonso Mendes de Besteiros)
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Foi um dia Lopo jograr
a casa duü infançon cantar,
e mandou-lhe ele por don dar
três couces na garganta,
e foi-lhe escasso, a meu cuidar,
segundo como el canta

Escasso foi o infançon
en seus couces partir' enton,
ca non deu a Lopo enton
mais de três na garganta,
e mais merece o jograron,
segundo como el canta.

Martin Soarez, CV 974
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Roi Queimado morreu con amor
en seus cantares, par Sancta Maria,
por Da dona que gran ben queria:
e, por se meter por mais trobador,
porque lhe ela non quis ben fazer,
feze-s'el en seus cantares morrer,
mais resurgiu depois ao tercer dia!

Esto fez el por üa sa senhor
que quer gran ben, e mais vos en diria:
por que cuida que faz i maestria,
enos cantares que faz, á sabor
de morrer i e des i d'ar viver;
esto faz el que x'o pode fazer,
mais outr'omem per ren' nono faria.

E non á já de sa morte pavor,
senon sa morte mais la temeria,
mais sabe ben, per sa sabedoria,
que viverá, des quando morto for,
e faz-[s'] en seu cantar morte prender,
des i ar vive: vedes que poder
que lhi Deus deu, mais que non cuidaria.

E, se mi Deus a mim desse poder
qual oj'el á, pois morrer, de viver,
já mais morte nunca temeria.

Pero Garcia Burgalês, CV 988, CBN 1380

Bibliografia:

http://sites.uol.com.br/guilhermelentz/ensino.html
http://www.geocities.com/CollegePark/Grounds/2969/cantigas.htm

Seleção: Bernard Moura, Diogo Vollstet, Lauro Manuel, Thiago Garrido, Tiago Lima

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