domingo, 28 de agosto de 2022

Armando Rosa - A Guerra na Ucrânia e os “Putinistas” – Uma justificação afinal necessária

* Armando Rosa, in MaisRibatejo.pt, 27/08/2021

Sempre pensei não ser necessário justificar as minhas posições gerais sobre a guerra que passa na Ucrânia. Não só por pensar ser por muitos conhecida a minha maneira de estar como elemento de uma comunidade, política e ideologicamente comprometido com a cidadania ativa, mas não afiliado a organizações partidárias ou outras igualmente castrantes do pensamento livre e autónomo. Nunca pactuando com políticas e governos de cariz autoritário ou para-fascista e sempre tendo em conta que os regimes de democracia representativa não são imunes à ditadura do capitalismo e dos mercados, bem como à corrupção desenfreada que geralmente os atola, sempre procurei balancear as minhas opções sociais e políticas, protegendo a minha vida privada, mas, ao contrário de muitos que me podem estar a ler, nunca deixando de dar a minha opinião sem olhar a possíveis consequências que, num meio pequeno e conservador, são sempre escrutinadas e, por vezes mal interpretadas.

Desde que tomei algumas posições públicas sobre o conflito, procurando relativizar o seu contexto e as suas origens,  comecei a sentir o afastamento e muita critica por parte de pessoas consideradas com opinião e conhecimentos acima da média e que faziam parte de um mesmo circulo aonde se perseguem alguns objetivos de cariz interventivo e de cidadania, cuja linha mestra de ação se pode considerar progressista. A alteração do relacionamento foi tal que cheguei a receber aconselhamentos e até intimações mais ou menos veladas, no sentido de ser mais contido ao expressar as minhas opiniões, por eles consideradas heréticas e desfasadas do senso comum, diga-se, discurso maioritário e oficial. Parece não terem conseguido superar alguns preconceitos russofóbicos, ou, então, a superficialidade dos seus conhecimentos, que apenas coletam nas doses maciças da comunicação mainstream oficial e manipulada, não lhes permite outro entendimento.

É de facto triste e preocupante ver pessoas tidas como inteligentes e com informação acima da média, enveredarem por posições que chegam a atingir extremos inquisitoriais e de censura, posições essas que alguns já teriam combatido durante os tempos remotos do anti fascismo e da luta pela liberdade de expressão, mas que presentemente parecem adotar, seguindo a onda persecutória instituída.

No que às minhas posições diz respeito, tenho apenas a dizer a alguns pseudo moralistas, cujo único critério para apoiarem um energúmeno chamado Zelensky, na condução do seu povo à miséria e do seu país à destruição, é o de haver um invadido e um invasor, digo eu que esperava muito mais deles. A falta de informação desculpa-se a quem a ela não tem acesso, mas não se pode aceitar da parte de quem tem formação e meios para aprofundar certos temas que são determinantes para o nosso futuro individual e coletivo.

Nunca relativizei qualquer massacre ou violência gratuita por parte deste invasor, como também não o fiz em relação aos inúmeros crimes praticados pelo invadido. A violência da guerra não pode ser relativizada. É sempre uma catástrofe e uma barbárie. Estranho é que, alguns moralistas do anti-imperialismo, da anti-guerra, ditos de esquerda e que se afirmam pela autodeterminação dos povos, desculpabilizem e relativizem tudo o que se passou na Ucrânia entre 2014 e fevereiro de 2022. Também há os que disso tomaram conhecimento depois de alertados e andem agora numa correria de leituras e de busca de opiniões convenientes, para poderem dizer algo de útil justificativo da sua posição e ignorância inicial.

Os “putinistas”, Zelensky e o amor à  guerra.

Em relação aos indevidamente chamados de putinistas e à denúncia que também fazem da liderança corrupta e criminosa  na Ucrânia, há que ter em atenção que:

  1. Os que apoiam incondicionalmente o poder corrupto na Ucrânia, sabem bem que quem o manipula e quem suporta toda esta guerra e o seu prolongamento, é o único interveniente que está a sair beneficiado e a fazer uma guerra por procuração, sem baixas, nem problemas políticos internos, os EUA.
  2. Criticar um estado e o seu presidente por ser um estado xenófobo, pró nazi e governado por um conjunto de agentes de oligarcas corruptos, não significa ser-se apoiante do invasor e do seu mentor, Putin. Mas é isso que os manipuladores e superficiais querem fazer crer, atirando pedras e invectivando a quem apresenta factos comprometedores para o pensamento oficial.
  3. Os que agora idolatram Zelensky, são os mesmos que aceitaram passivamente e ainda justificam todas as ações terroristas e belicistas patrocinadas por países protegidos pela bandeira da NATO e subservientes aos EUA. Essas ações já provocaram mais de um milhão de civis mortos só neste século, mas, aos seus olhos, parece serem considerados seres humanos de um nível inferior. Não são loiros de olhos azuis…
  4. Os que agora pretendem santificar o comediante corrupto (ver os Pandora Papers), nunca se questionaram sobre a ausência de iniciativas para a negociação da paz, a partir da segunda semana da guerra, quando ainda era possível. Nem questionam o efeito das medidas sancionatórias que, pretensamente seriam dirigidas ao invasor, mas que começam a chegar, lenta mas dolorosamente, às nossas portas e a casa de todos os infelizes povos que atualmente são dirigidos por uma seita manhosa e incompetente, nos gabinetes de Bruxelas.
  5. Os que justificam a necessidade desta guerra para conter os ímpetos imperialistas de Putin, não indicam aonde ou quando isso foi por ele escrito ou dito. Embarcam apenas na narrativa conveniente de quem quer manter o status unipolar da hegemonia no mundo.
  6. Tentar entender as causas desta invasão não é o mesmo que apoiá-la. Não procurar o acesso à informação dos dois lados é deixar-se manipular pela parte a que se está afiliado. A preguiça intelectual e a ignorância são, frequentemente, a origem de muitas certezas.
  7. Os que endeusam Zelensky, desconhecem que foi ele que publicou a Lei dos Povos Autóctones em 2021, lei essa que restringiu direitos de cidadania e de apoio aos russos do Donbass e da Ucrânia e que fez agravar a guerrilha independentista que provocou mais de catorze mil mortos e centenas de milhares de feridos e deslocados, desde 2014.
  8. Não procurar analisar os factos, tal como nos são apresentados dos dois lados, é presumir que só um é detentor da verdade. Endeusar uns e diabolizar outros é a maneira mais confortável de opinar. A clubite doentia dos adeptos de futebol, também reage dessa maneira.
  9. Também há quem chame de putinistas aos que denunciam como medida pró fascista, atentatória dos mais elementares direitos humanos e de cidadania, o encerramento de fronteiras para os cidadãos russos. Esquecem o artigo 13 da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
  10. Quem, indiscriminadamente chama de putinistas a quem vê a guerra pelos dois lados, é quem diz que o relatório da Amnistia Internacional sobre a utilização de civis como escudos humanos, é manipulação ao serviço dos russos, mas que o relatório da mesma entidade sobre Bucha, esse sim, é factual e credível. Como crentes que são, só as “verdades” vindas do ocidente, são credíveis e sem contraditório atendível.
  11. Acusam de putinistas os que, apesar de nunca terem alinhado com as posições russas, perseguem objetivos tendentes ao fim do conflito e denunciam a despudorada mistificação informativa controlada pelos ucranianos e pelos seus aliados mais influentes. Esses ditos putinistas, não se resignam em apenas ficar com a informação oficial publicada e acrescentam aos seus conhecimentos os que têm origem em fontes alternativas de ambos os lados. Divulgar informação proveniente de fontes pro russas ou independentes, é ser putinista?
  12. Os que apelidam de putinistas todos os que se manifestam contra a continuação da guerra e querem o seu fim, são os mesmos que apoiam incondicionalmente a continuação dos massacres de parte a parte e a completa destruição de um país. Estão ao serviço do único benificiário desta guerra, os EUA.
  13. Também há quem chame de putinista a quem considera risíveis as missas diárias do charlatão comediante e onde ele costuma imbecilizar a audiência e ameaçar com o inferno quem não der peso ao cesto das esmolas. Nas últimas eucaristias tem querido convencer os crentes de que a central de Saporija está na iminência de rebentar porque é bombardeada pelos russos que lá estão instalados desde Março. E quem não acredita é putinista…

Há solução política para esta guerra ou só terminará com uma derrota militar de um dos contendores?

Não sou um especialista em qualquer assunto de guerra, mas tenho, como todos nós, uma perceção e um entendimento sobre a evolução possível de um caminho para a paz, coisa que parece ser apenas o desejo dos acusados de putinistas. Qualquer pessoa medianamente informada, sabe que o único caminho para terminar esta guerra é o político e será o das negociações e das cedências repartidas.

O território da Ucrânia atualmente ocupado pelos russos excede significativamente a área que totalizavam, antes da invasão, as províncias do Donbass em luta pela independência/autodeterminação. As cedências terão que ser mútuas e será a altura de a Ucrânia (com ou sem Zelensky) aceitar a desanexação dessas províncias e concordar na sua autodeterminação, com a correspondente autonomia administrativa. Em contrapartida a Rússia cederia todos os restantes territórios ocupados, e que não lutavam pela independência à altura do início da invasão, inclusivamente a central nuclear de Zaporijia. Seriam criadas mais duas (?) nações autónomas e independentes, depois de sujeitas a referendos supervisionados pela ONU. Isto sou eu a sonhar.

Os belicistas alinhados do ocidente apontam a derrota incondicional da Rússia como o objetivo final e único, sabendo perfeitamente que isso nunca será possível sem que a guerra local se transforme numa guerra global, com fortes possibilidades de atingir a fase nuclear.

Pelos vistos é para isso que estão a trabalhar… os condutores do rebanho, os seus ajudantes de campo e a carneirada que os segue.

Não lhes auguro um bom futuro. A eles e a todos nós.

Santarém, Agosto de 2022


Nota: Alguns temas aqui referidos são mais desenvolvidos em dois artigos anteriores, um e Março e outro em Junho, de que seguem os respetivos links:

“A Guerra na Ucrânia e os Novos Inquisidores”: https://maisribatejo.pt/2022/03/14/a-guerra-na-ucrania-e-os-novos-inquisidores/

“A Guerra na Ucrânia e os Superficiais”: https://maisribatejo.pt/2022/06/03/a-guerra-na-ucrania-e-os-superficiais/

 in https://estatuadesal.com/2022/08/28/a-guerra-na-ucrania-e-os-putinistas-uma-justificacao-afinal-necessaria/

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