segunda-feira, 9 de junho de 2025

José Gabriel - Proposta cultural – Pimbemos!


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* José Gabriel, in Facebook, 

08/06/2025, Revisão da Estátua)


Exma. Senhora Ministra da Cultura e Assuntos Correlativos
Excelência

Olhando a composição de governo a que V. Exa. pertence, bem como a alvissareira nomeação de V. Exa. para o alto cargo que merecidamente lhe coube, concluo que chegou, após tantos anos de espera, a oportunidade de valorizar e patrimonializar elementos da cultura-pátria até agora diminuídos pela arrogância e elitismo serôdio dos governos e gerações que agora se vão finando.

A ascensão de V. Exa. à condição de Ministra da Cultura é um grito de libertação daqueles que, fugindo ao pedantismo até agora reinante, se sentem encorajados a levantar a voz em defesa de valores que o povo ama e tem no coração. Quais? – perguntará V. Exa. em estado de compreensível expectativa. Inúmeras que são as subidas prendas da cultura que, desde o povo mais ignaro à ilustrada juventude universitária, merecem o mais extremoso amor luso.

Veja-se, por exemplo, a música. Não, não, não me refiro àquelas obras que soam nas salas de concertos e nos teatros – com nomes de santos – e deles não saem, onde, a par de estrangeiros de outros tempos – Mozart, Beethoven, Bach, Debussy, Stravinsky, Verdi, Wagner e muitos outros…- e portugueses dados a vanguardices e/ou classicismos que o povo não ama, se vai esvaindo o erário público.

Entretanto, só nos programas culturais das tardes dos canais de televisão generalistas e em algumas festas estudantis se vai vendo e ouvindo o incompreendido tesouro musical e poético que dá pelo nome torpe de “música pimba”, nome criado por elitistas que nem sonham as subtilezas que se ocultam nos entrefolhos – por assim dizer – dessas obras imorredouras. Na verdade, não nos deixemos enganar pela aparente simplicidade das melodias. Tal simplicidade está ao serviço da evidência da riqueza poética que, digamos assim, a recheia. A elegante e complexa polissemia abunda. Basta ouvirmos uma peça como aquela em que Rosinha canta:

“Eu levo no pacote

Ai eu levo sim senhor

Eu levo no pacote

P’ra  gosto do meu amor”

Não podemos deixar de admirar o uso ambíguo do “pacote”, aproveitando a riqueza polissémica da palavra. Joga-se assim na complexidade da proposta poética, deixando ao ouvinte a interpretação sobre se se está a fazer uma subtil insinuação libidinosa envolvendo a intimidade posterior – como lhe chamou Fellini – ou a falar num simples contentor onde a jovem leva a refeição do seu amor.

Também outro génio incompreendido, Quim Barreiros, não para de nos fascinar com as suas volutas – chamemos-lhe assim – semânticas. Quando canta a sua vontade de cheirar o bacalhau da Maria, está a falar do saboroso gadídeo ou a referir-se à região vulvar da cozinheira?

Quando diz ser o mestre da culinária que quer comprar uma panela de pressão a ver se “cuzinha mais depressa”, quem não vê a subtileza daquela vogal que só os distraídos entenderão como erro ortográfico? E a garagem da vizinha em que o trovador diz meter e tirar o carro à hora que quiser? E onde, até, muda o óleo? Quem não se fascina com a elegância destas ambiguidades poéticas, estes complexos jogos de sentido?

E até Emanuel, de cuja erudita obra musical deriva a designação deste tipo de trova, a palavra “pimba”, quando nos canta

“E se elas querem um

Abraço ou um beijinho

Nós pimba, nós pimba

E se elas querem muito

Amor, muito carinho

Nós pimba, nós pimba”

deixa à imaginação do ouvinte o significado deste imperativo ato. Pimba significa um firme e empenhada ação de cariz sexual que responda às ânsias das ”elas” de que fala o poema, ou um gesto, comportamento, atitude que decorra do livre-arbítrio do sujeito a que se dirige o apelo? “Nós pimba” pode significar nós fugimos, nós tomamos um café, nós desmaiamos, enfim, as possibilidades são tão infinitas como o talento do autor.

Outros exemplos poderiam ser chamados à liça. Mas, penso, Exma. Sra. Ministra, que estes são mais que suficientes. De resto, V. Exa. não ignorará o modo como estes artistas são aplaudidos e idolatrados em festas universitárias, por públicos da geração de V. Exa. que, como é consabidamente repetido, é a geração mais preparada de sempre. Logo, não pode estar enganada.

Do exposto, rogo a V. Exa., Senhora Ministra, que diligencie a proposta de classificação desta tão nossa forma de arte a Património Imaterial da Humanidade. O povo vos agradecerá e não deixará de exaltar o nome de V. Exa. e alcandorá-lo a par dos grandes da cóltura, perdão, cultura, de Portugal.

A bem da Nação

Nós, Pimba!

https://estatuadesal.com/2025/06/09/proposta-cultural-pimbemos/

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