sábado, 31 de dezembro de 2011

Dois poemas para 2012



Carlos Drummond de Andrade


Receita de ano novo 




Para você ganhar belíssimo Ano Novo 

cor do arco-íris, ou da cor da sua paz, 

Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido 

(mal vivido talvez ou sem sentido) 

para você ganhar um ano 
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras, 
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser; 
novo 
até no coração das coisas menos percebidas 
(a começar pelo seu interior) 
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota, 
mas com ele se come, se passeia, 
se ama, se compreende, se trabalha, 
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita, 
não precisa expedir nem receber mensagens 
(planta recebe mensagens? 
passa telegramas?) 



Não precisa 

fazer lista de boas intenções 

para arquivá-las na gaveta. 

Não precisa chorar arrependido 

pelas besteiras consumidas 
nem parvamente acreditar 
que por decreto de esperança 
a partir de janeiro as coisas mudem 
e seja tudo claridade, recompensa, 
justiça entre os homens e as nações, 
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal, 
direitos respeitados, começando 
pelo direito augusto de viver. 



Para ganhar um Ano Novo 

que mereça este nome, 

você, meu caro, tem de merecê-lo, 

tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil, 

mas tente, experimente, consciente. 
É dentro de você que o Ano Novo 
cochila e espera desde sempre.





Carta ao Filho - Nazim Hikmet



Carta ao filho

  

Não vivas sobre a terra como um estranho
Um turista no meio da natureza.
Habita o mundo como a casa do teu pai.
Crê na semente, na terra, no mar.
mas acima de tudo crê nas pessoas.
Ama as nuvens,
as máquinas,
os livros,
mas acima de tudo ama o homem.
Sente a tristeza do ramo que murcha,
do astro que se extingue,
do animal ferido que agoniza,
mas acima de tudo
Sente a tristeza e a dor das pessoas.
Alegra-te com todos os bens da terra,
Com a sombra e a luz,
com as quatro estações,
mas acima de tudo e a mãos cheias
alegra-te com as pessoas.



Nazim Hikmet, (1902 - 1963) c. 1960.


Traduzido do inglês por Carlos Eugênio Marcondes de Moura.


Escritor e poeta turco nascido em Salonica, Grécia, então parte do império otomano, que, perseguido por suas idéias políticas, marcou profundamente a literatura turca ao romper com a tradição islâmica e sob a influência dos futuristas russos, propôs a despoetização da poesia. Pensando seguir uma carreira militar, entrou para a academia naval de Istambul e serviu na Marinha, da qual foi expulso (1919) por atividades revolucionárias. Partiu para Moscou, onde estudou ciências políticas e sociais por cinco anos, na Universidade Comunista de Moscou. Regressou à Turquia (1924), após a proclamação da república e tornou-se conhecido com seus primeiros poemas, de cunho patriótico. Condenado (1938) pela suposta participação num complô, após ser posto em liberdade (1950) por força de uma intensa campanha internacional, radicou-se então em Moscou, onde morreu. Publicou as coletâneas 835 satir (1929) e 1 + 1 = 2 (1930), os poemas históricos Sesini kaybeden sehir (1931) e Benerci kendini niçin öldürdü? (1932), as peças para teatro Kofatos (1932) e Unutulan adam (1935) e lançou uma autobiografia em Berlim (1961).

Sem comentários: