Poster soviético com os dizeres "O que a Revolução de Outubro deu às trabalhadoras e camponesas", trazendo ao fundo bibliotecas, centros de cultura, de lazer, escolas e institutos de ensino, antes privilégio
6 de novembro de 2015 - 11h38
Em novembro os comunistas e os povos do mundo comemoram 98 anos do triunfo da revolução que levou ao poder o Partido Bolchevique na então União Soviética. O Prosa, Poesia e Arte desta semana fez uma seleção de cinco poemas, todos escritos em 1917 (o ano da revolução), por poetas russos engajados no processo revolucionário.
Por Mariana Serafini
Poetas selecionados: Andréi Biéli, Boris Pasternak, Vladimir Maiakovski e Sierguéi IessiêninPoetas selecionados: Andréi Biéli, Boris Pasternak, Vladimir Maiakovski e Sierguéi Iessiênin Extremamente avançados para a época, tanto na forma, quanto no conteúdo, os poemas valorizam o poder da palavra. Minimalistas e certeiros, muitos dos poetas russos estavam longe de ser panfletários ou óbvios ao atuarem na trincheira da luta de ideais com as mais diversas armas: além da poesia, o teatro, o cinema, o romance.
De estética simples, e muito avançada para a época, os poemas apresentam formatos e conteúdo que foram aplicados mais de 40 anos depois na dramaturgia e na literatura em países como Inglaterra e Irlanda que são consagrados por terem inaugurado uma nova vertente da dramaturgia, tida como contemporânea e minimalista. No entanto, a inovação de fato aconteceu no início do século, já em 1903, 1910, na Rússia.
Os poemas foram extraídos do livro Poesia Russa Moderna, traduzidos no Brasil por Augusto e Haroldo de Campos e Boris Schnaiderman.
Leia na íntegra:
A Palavra
(Andréi Biéli)
Na febre de som
do sopro
a treva é flama-fala.
Lá fugindo da laringe,
a terra exala.
Expiram
As almas
Das palavras não compostas.
Deposita-se a crosta
Dos mundos que nos portam.
Sobre o mundo formado
Paira a profundidade
Das palavras proferíveis.
Profundamente ora
A palavra das palavras, Sarça viva.
E do futuro
Paraíso
Alça-se a terra adunca
Por onde em chamas, consumindo,
Não passarei: nunca.
Tradução de Augusto de Campos e Boris Schnaiderman
O Dom da Poesia
(Boris Pasternak)
Deixa a palavra escorregar,
Como um jardim o âmbar e a cidra,
Magnânimo e distraído,
Devagar, devagar, devagar.
Tradução de Augusto de Campos
Definição de Poesia
(Boris Pasternak)
Um risco maduro de assobio.
O trincar do gelo comprimido.
A noite, a folha sob o granizo.
Rouxinóis num dueto-desafio.
Um doce ervilhal abandonado
A dor do universo numa fava.
Fígaro: das estantes e flautas
Geada no canteiro, tombado.
Tudo o que para a noite revela
Nas funduras da casa de banho,
Trazer para o jardim uma estrela
Nas palmas úmidas, tiritando.
Mormaço: como pranchas na água,
Mais raso. Céu de bétulas, turvo.
Se dirá que as estrelas gargalham,
E no entanto o universo está surdo.
Tradução de Aroldo de Campos
Nacos de Nuvem
(Vladimir Maiakóvski)
No céu flutuavam trapos
de nuvem – quatro farrapos:
do primeiro ao terceiro – gente;
o quarto – um camelo errante.
A ele, levado pelo instinto,
no caminho junta-se um quinto.
Do seio azul do céu, pé-ante-
pé, se desgarra um elefante.
Um sexto salta – parece.
Susto: o grupo desaparece.
E em seu rasto agora se afasta
o sol – amarela girafa.
Tradução de Augusto de Campos
De Transfiguração
(Sierguéi Iessiênin)
Ei, russos!
Pescadores do universo,
Na rede da aurora colhendo o céu -
Troai as trompas!
Sob a charrua do raio
Ruge a terra.
Rompe os penhasco a auridente
Relha.
Novo semeador
Erra pelos campos
Novas sementes
Arroja aos sulcos.
Um hóspede-luz
Vem num coche.
Corre entre as nuvens
Uma égua
Sela da égua -
Azul.
Sinos da sela -
Estrelas.
Tradução de Augusto de Campos
http://www.vermelho.org.br/noticia/272427-11
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