segunda-feira, 1 de dezembro de 2025

Presidenciais 2026 - Entrevista a André Ventura

Ventura assume que falhar segunda volta das eleições presidenciais "é mau e é uma derrota"

Líder do Chega assume que, para 18 de janeiro, objetivo é "ganhar" ou garantir passagem à segunda volta. "Não há como mascarar a realidade se isso [não passar à segunda volta] acontecer", assume.

* Agência Lusa, Texto

O candidato presidencial André Ventura admite que não passar a uma segunda volta das eleições de janeiro será uma derrota e que, se lá chegar, será uma batalha difícil, porque estarão “todos contra” si.

“Eu estou a levar esta eleição em duas etapas. Há uma meta que é o dia 18 [de janeiro], nessa meta nós queremos vencer ou passar à segunda volta das eleições. Portanto, isto significa ou primeiro ou segundo lugar, e acho que estamos bem encaminhados para isso”, afirmou.

Em entrevista à agência Lusa no âmbito das eleições presidenciais de 18 de janeiro, o candidato a Belém admitiu que, se não conseguir cumprir o objetivo de passar a uma eventual segunda volta, “é mau e é uma derrota”.

“Se não estiver [na segunda volta], é sinal de que o Chega e eu próprio não atingimos nesta eleição o objetivo. Não há como mascarar a realidade se isso acontecer, porque é praticamente impossível ter um valor próximo das legislativas e não ir à segunda volta”, disse, referindo que “não atingir um valor próximo significaria que houve um voto de não acompanhamento por parte do eleitorado”.

“É uma derrota, só em partidos estalinistas ou leninistas é que as derrotas se tornam vitórias. Há momentos que são de derrota e há momentos que são menos bons na vida política. Saber assumi-lo é também um ato de grandeza democrática”, sustentou André Ventura.

O candidato a Presidente da República e líder do Chega indicou que o partido “continuará o seu caminho” e ele próprio fará “a avaliação que tiver que fazer disso”.

“Saberei ler os sinais que o eleitorado transmitir, mas evidentemente que se não for à segunda volta não foi um resultado positivo. Mas estou mesmo convencido que isso não vai acontecer, estou mesmo convencido que vamos ter uma segunda volta e que eu estarei nessa segunda volta”, salientou.

Ventura considerou que essa será a “batalha mais difícil, talvez da [sua] vida toda”, porque acredita que “se vão juntar todos” contra si, que “o sistema todo vai se juntar contra a candidatura”.

“Eu acredito que seja possível ganhá-la, mas vai ser uma luta muito difícil para mim e para o país”, admitiu.

“Seja quem for o adversário, mesmo que o adversário fosse, ou venha a ser, António José Seguro, tenho praticamente a certeza de que o PSD vai recomendar o voto em António José Seguro, porque sabe que eu sou uma ameaça ao ‘statu quo’ e uma ameaça ao domínio das instituições por estes dois partidos”, disse, antecipando que pode acontecer o mesmo com Gouveia e Melo ou até António Filipe.

O candidato mostrou-se também curioso sobre o que fará o PS caso venha a disputar uma segunda volta com Luís Marques Mendes: “Não que eu queira o apoio do PS, o mais distante disso possível, mas é curioso verificar se o PS vai entrar na segunda volta dizendo para se votar em Marques Mendes”.

André Ventura disse também não ter um adversário preferencial para a segunda volta, mas está convencido de que será Henrique Gouveia e Melo, e assumiu-se como “o adversário mais difícil na primeira volta”, mas “o mais fácil” de derrotar numa segunda.

Ventura dissolve Parlamento se houver “suspeita de corrupção grave” envolvendo primeiro-ministro

O candidato presidencial André Ventura dissolvia o parlamento e convocava eleições antecipadas perante um caso de “suspeita de corrupção grave” sem explicação convincente, envolvendo um primeiro-ministro, mesmo que o Governo fosse suportado por uma maioria absoluta.

“Para ser o mais claro e não estar aqui com reservas mentais, se um primeiro-ministro, por muita estabilidade que tivesse, inclusive se tivesse uma maioria absoluta, for suspeito de corrupção, não conseguir explicar essas suspeitas, e a informação que for dada ao Presidente da República é de que estas suspeitas são sérias, fundamentadas, fundadas e com indícios fortes, então eu acho que, nesse caso, com uma suspeita de corrupção grave, nós devemos dissolver a Assembleia da República e chamar o país a votos”, afirma o candidato a Belém em entrevista à agência Lusa.

Ventura admite que, perante novas eleições, o país poderia renovar a confiança no mesmo primeiro-ministro, criando “um drama institucional para um Presidente da República”.

“Eu tenho um perfil ativo, enérgico, e é assim que eu espero ser até ao final da minha vida. E, portanto, se tivesse que agir num caso de corrupção, agiria. Mas serei o mais ponderado possível para garantir que não lanço o país na instabilidade”, assegura.

O também líder do Chega refere-se a um cenário abstrato, apesar de o seu ponto de partida ser o caso da antiga empresa do primeiro-ministro, Luís Montenegro, que este passou aos filhos depois de uma polémica mediática que levou o Ministério Público a abrir um inquérito preliminar ainda sem resultado conhecido.

André Ventura considera que, no caso Spinumviva, acima de tudo “tem faltado a este primeiro-ministro” explicações.

“O caso Spinumviva tem características graves devido às suspeitas, não estou a dizer que elas são reais ou não, mas às suspeitas, enfim, de recebimento do indivíduo de dinheiro, etc. Isso é grave. Se eu fosse Presidente da República e o processo vier a desenvolver-se nos termos em que venha a desenvolver-se e o Ministério Público entender que deve avançar para um inquérito, o que significa que o primeiro-ministro será constituído arguido, acho que era importante, e é o que eu direi ao primeiro-ministro, que dê explicações não só em sede de justiça, mas também ao país”, precisou, acrescentando: “Eu avaliarei a sustentabilidade dessas declarações do ponto de vista da sua razoabilidade e da credibilidade que elas mereçam”.

“Não sou eu o juiz, evidentemente, mas é o Presidente da República, em funções naquele momento, que tem que dar uma palavra ou de confiança ou de entender que as instituições estão em causa e que não deve continuar”, sustenta.

“Eu tenho muitas críticas ao primeiro-ministro atual, mas consigo ter uma conversa com o primeiro-ministro. Acho que conseguiria dizer ao primeiro-ministro ‘isto são suspeitas graves, o que o primeiro-ministro tem que fazer é explicá-las e dar uma explicação sobre elas’ e exigir-lhe que fizesse isso”, acrescenta.

Ventura considera que “seria possível” levar o primeiro-ministro e evitar “um cenário de deterioração permanente”.

Caso se chegasse “a um ponto, enfim, que o primeiro-ministro fosse, tal como outros atores políticos, acusado, aí até há trâmites legais que são próprios, mas se as suspeitas fossem condensadas, evidentes e notórias, então eu acho que nem era preciso dizer ao primeiro-ministro para sair, eu acho que sairia pelo seu próprio pé”.

“Se eu for Presidente da República, espero que nunca aconteça e também não vejo nenhum motivo para isso, e houvesse uma acusação contra mim de corrupção, de desvio de dinheiro público, de enriquecimento ilícito, eu próprio, chegando ao momento de ver que havia coisas fundadas e reais, não tinha outra forma senão ir-me embora e sair”, conclui André Ventura.

Durante a entrevista, o candidato questionou a forma de nomeações para as instituições do Estado e empresas públicas, que considerou deverem ser repensadas, inclusivamente o caso do procurador-geral da República, apesar da consideração que disse ter para com o atual titular, Amadeu Guerra.

“Mas quando temos um sistema que nomeia o procurador-geral da República e é este procurador-geral da República, depois, que vai investigar quem o nomeou, é sempre um sistema frágil e é sempre um sistema que gera dúvidas de independência e de imparcialidade”, sustenta, alegando que o mesmo se passa com os titulares dos tribunais superiores e do Tribunal Constitucional.

“Faz sentido que o tribunal que controla os partidos políticos, e eu agora estou à vontade porque até somos o segundo maior partido, podíamos ter interesse em manter isto como está, derive destes próprios partidos políticos. Não seria de pensar isto como um todo, do ponto de vista de garantir a independência e a imparcialidade destas pessoas? Poderia ser o Presidente?”, questiona, concluindo: “Acho que temos que repensar um sistema que dê garantias de menor interferência política.

Ventura quer revisão constitucional para tornar Presidente um “ator político decisivo”

André Ventura defende uma revisão constitucional que reforce os poderes do Presidente da República, transformando-o num “ator político decisivo”, e promete “conduzir o país politicamente” a partir do Palácio Belém, designadamente com propostas concretas para a Justiça.

“A Constituição tem que consagrar um presidente que tem que ser mais do que um moderador. O presidente tem que ser um ator político decisivo, porque tem uma legitimidade política decisiva” que lhe advém de ser eleito diretamente com mais de 50% dos votos, justifica André Ventura, em entrevista à agência Lusa no âmbito da campanha para as eleições de 18 de janeiro.

O também líder do Chega considera que, no sistema atual, o “poder real” do Presidente da República “é o poder de veto, o poder de promulgar ou não promulgar, e esse poder, se não for utilizado, ou se não tiver capacidade e extensão de ser utilizado, nos casos mais dramáticos da vida nacional, acaba por ter pouca expressão”, tornando o chefe de Estado numa “espécie só de reduto de influência”.

“Se queremos levar a sério o cargo de presidente e justificar o salário que lhe pagamos, e o que gastamos com a presidência da República, então o presidente também tem que ter poderes concretos e reais”, sustenta.

Ventura entende que o presidente “não deve estar a ser um bloqueio, nem uma marioneta, nem uma muleta do Governo”, mas “deve ter os poderes mais especificados do ponto de vista do controlo, do escrutínio, da fiscalização” para que se saiba claramente “em que águas se move”, alegando que “isso hoje não é absolutamente claro”.

A partir de Belém, o também líder do Chega admite que não pode fazer propostas de revisão da lei fundamental, mas pode influenciá-lo.

“Se for Presidente da República, não terei o poder de fazer leis no parlamento, isso é uma evidência. Mas estou convencido de que não há nenhuma outra figura com tanta legitimidade e capacidade de influenciar o parlamento, até num processo de revisão constitucional, como o Presidente da República”, advogou.

Entre críticas a Marques Mendes e a “conversas de chacha” de Marcelo Rebelo de Sousa, André Ventura defende que seria importante eleger, pela primeira vez, um chefe de Estado “fora deste sistema partidário PS-PSD”, que nos 50 anos de vida democrática tem feito pactos na Saúde, Finanças, banca, “em tudo o que é setor público ou com influência pública”. Seria “uma garantia de independência e de luta contra o sistema”.

Mais do que romper com o sistema, o deputado e líder do Chega considera que “talvez a independência aqui até seja mais relevante”, aproveitando para atacar o seu adversário e ex-líder do PSD, Luís Marques Mendes, por “estar sempre a falar de independência”, mas ser “a linha direta, o apoio de Luís Montenegro, que é primeiro-ministro”.

“Ora, os portugueses gostam e querem um presidente que fiscalize a ação do governo, não um presidente que seja ou um pau-mandado, ou alguém condicionado pelo governo”, argumenta, acrescentando: “se é um presidente que tem conluio com o governo, isso não é bom para a democracia, é mau. E por isso eu percebo esta ansiedade [de Marques Mendes], automaticamente, em tentar desligar-se do Governo agora”.

Do mesmo modo, pretende combater a ideia de que o presidente é “uma espécie de senador reformado”.

“Eu não vou ser o Presidente da união fácil, de palavra certa e barata, confortável em todos os momentos. Nós não podemos tapar as clivagens, a polarização, os problemas com conversa de atleta”, disse.

Ventura promete travar uma batalha para convencer a opinião pública de que não é “nem uma jarra de enfeitar”, nem que irá estar “a dizer aquelas coisas banais, politicamente corretas”.

“Se votarem em mim no dia 18 de janeiro, vai haver uma mudança no estilo de Presidente da República”, assegura.

A partir de Belém, terá como prioridades a Justiça, as comunidades e os jovens, não se limitando a alertar que são precisas reformas, mas indicando ele próprio um caminho.

“Quero dar um sinal à reforma da justiça que ela tem que ser feita. E tem que ser feita em que sentido? Temos que garantir o fim destas penas suspensas que existem para muitos crimes, garantindo que as pessoas ficam presas em casos de abusos sexuais de menores, violência doméstica, que é um flagelo que temos em Portugal, o chamado crime contra o património, considerado às vezes pequeno crime, mas que é esse pequeno crime que vai gerando a insegurança nas pessoas”, aponta.

Segundo o candidato, todos os presidentes defendem reformas da Justiça, mas nunca dizem qual. “Eu ao menos digo qual é. É limitar recursos, porque nós temos recursos que nunca mais acabam, e temos que garantir que a pessoa tem direitos e que têm direito a uma justiça que funcione, imparcial, mas não pode ter direito a fazer mil recursos garantindo que as decisões nunca são efetivadas”, concretiza, numa alusão implícita ao processo Marquês.

“Acho que é preciso uma reforma da justiça e o presidente tem que ser o principal protagonista dela do ponto de vista político”, sublinha.

Segundo André Ventura, isso “não é governar, é conduzir o país politicamente”. “Eu estaria a ser um mau presidente e defraudaria completamente as expectativas das pessoas se lhes desse uma entrevista um dia ou dois depois de ser eleito Presidente da República e a minha conversa passasse a ser que temos que agregar vontades, temos que nos juntar todos, pensar a justiça a médio prazo e a longo prazo”, argumenta.

No decorrer da entrevista, quando abordava questões relacionadas com o processo Marquês, que envolve o ex-primeiro-ministro José Sócrates, Ventura reitera críticas à imprensa portuguesa, sem apontar casos concretos, sobretudo ao que chamou o ativismo de muitos jornalistas.

“E acho que também os jornalistas, em grande parte, não são bons. E acho que temos um ativismo muito grande no jornalismo, é a minha opinião. Mas eu seria o último a condicionar a liberdade da imprensa. Mais, digo-lhe outra coisa. Podia ser o órgão de comunicação, não é o caso da Lusa, mas podia ser o órgão de comunicação que eu menos gostasse, eu tudo faria para garantir que ele não é nem censurado, nem silenciado, nem ameaçado com questões económicas ou de natureza societária”, disse.

https://observador.pt/2025/11/30/ventura-assume-que-falhar-segunda-volta-das-eleicoes-presidenciais-e-mau-e-e-uma-derrota/

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