Para o Manuel de Freitas . . E o pior é que chamamos liberdade a um tapete que, rolante, já não ouve a opinião dos nossos pés; que nos leva para onde e anuímos, alheados, aos mecânicos desígnios do terror. Respiramos cadeados, consumimos injustiça, damos duas várias voltas ao risonho torniquete que nos serve de chapéu; trocamos a cabeça por um prato de aspirinas. Os clássicos da vida sem tristeza nem remorso (Cinderela, Varadero, off-shore) iluminam o cenário em que dormimos, inocentes como balas e nem sei como não somos mais felizes. As rémoras, os ogres, os deuses mais bonitos, velam nossa carne como grifos educados. O tratado das sementes, o saber do lenhador, queremos lá saber de quem é pobre como nós. Confiados ao acaso, disputamos amuletos, reforçamos sob os pés a solidez do desacerto, colocamos outra pedra no sapato. Para o centro do inferno dirigimos este filho, o filho deste carro, cativados pelo direito conquistado de entregar os nossos dias, como rezes, ao cutelo de despachos infiéis. Neste cerco, viver é uma questão de prorrogar o desalento, de iludir o infortúnio: cerramos uma porta suicida, desatamos a gravata, ficamos satisfeitos quando o gelo, na bebida, é de boa qualidade. Se olhamos para o chão desaparece o horizonte; se olhamos para o céu ficamos sós. Não percebo como rimos quando pedem que posemos para a foto de família. Alguém nos enganamos. Confundidos pelo surto de mentira, leiloados pela última hipnose, enxertados no pedúnculo da morte, semi-envergonhados, de sorriso padecido, dizei-me se este rosto de cartão amarrotado, se esta alma como um campo pedregoso, se estes pés adaptados ao espinho, se isto que nós vemos é um homem. José Manuel Silva Ulisses já não mora aqui &etc |
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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011
Trevas - José Miguel Silva
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