Gábor e seus amigos
January 25, 2009
Os azulejos da Praça Deák
Caro leitor, eu sei que artigos em blogs devem ser curtos mas este será uma exceção, pois envolveu vários meses de pesquisa (que ainda não chegou ao fim).
"A idéia de João Vieira em reunir na estação da Praça Deák do Metropolitano de Budapeste, flashes de versos de seis poetas (três húngaros e três portugueses) é uma obra que se impõe por ela mesma.
A visualização mental deste conjunto é extremamente sedutora, excitante e a sua realização oferece, além do mais, atrativos que, de relance, não poderíamos imaginar.
Ao associar personalidades tão diversas nos seus painéis, o pintor partiu à procura do elo que, a meu ver, une, desde o início, as várias fases do seu percurso. Esta obra em azulejos tem todas as hipóteses de impressionar pelo rigor e pelo cromatismo da sua apresentação."
Assim se inicia o artigo "Um longo caminho interpretativo" de Margarida Botelho, publicado num caderno bilíngue (português e húngaro) intitulado "Painéis para a estação Deák Tér do Metropolitano de Budapeste" e publicado pelo Metropolitano de Lisboa em 1996.
Para quem quiser adquirir um exemplar por 10 euros, aqui vai o site:
.
http://www.metrolisboa.pt/Default.aspx?tabid=238&ItemId=61
Há quase dois anos trabalho algumas horas por dia numa empresa que fica próxima à estação Deák Tér e como vou quase todos os dias de metrô, os azulejos que eu lá via sempre me intrigaram. Sempre correndo, às vezes eu reconhecia algumas palavras em húngaro de um dos lados, outras vezes decifrava uma ou duas em português do outro... mas como estes fragmentos de texto não faziam sentido, achei que era mera coincidência. Até que um dia, movido pela curiosidade, pesquisei o assunto na internet e descobri que um jovem local chamado Géza Papp também tinha as mesmas dúvidas que eu. Trocamos emails, encontramo-nos algumas vezes e apresentamos agora o resultado das nossas pesquisas. Para quem quiser ler uma versão deste artigo em húngaro, visite o blog dele aqui:
.
.
.
Depois de fotografarmos ambos os lados da estação, ao lado do painel descobrimos uma plaqueta de bronze com o seguinte texto:.
Obra do pintor português JOÃO VIEIRA nascido em 1934 executada em Lisboa na Fábrica Cerâmica Viúva Lamego oferta do Metropolitano de Lisboa ao Budapesti Közlekedési Részvénytársaságnak (assim mesmo, com "nak" no final)
.Inaugurado em 19 de Agosto de 1996 por ocasião das comemorações dos 1100 anos da fundação do Estado Húngaro.
.Do lado oposto há uma outra plaqueta com este mesmo texto, porém em húngaro e sem o erro de concordância mencionado acima. O correto seria sem o sufixo -nak.
Semanas de pesquisa árdua se passaram, montamos finalmente o quebra-cabeças e descobrimos que o artista escolheu 3 poetas húngaros, 3 portugueses e 10 poemas no total, cinco em cada idioma. Aqui vão eles, caro leitor, começando com os portugueses traduzidos para o húngaro.
O primeiro poema, logo no painel da esquerda e bem menor em tamanho que os outros, é "Opiário" de Fernando Pessoa (ou Álvaro de Campos, que foi um de seus inúmeros heterônimos), nascido em 1888 e morto em 1935.
O primeiro poema, logo no painel da esquerda e bem menor em tamanho que os outros, é "Opiário" de Fernando Pessoa (ou Álvaro de Campos, que foi um de seus inúmeros heterônimos), nascido em 1888 e morto em 1935.
No painel encontramos somente os versos em negrito, os em azul já não couberam... o texto simplesmente termina, mas é compreensível, pois não seria possível ao artista compor uma obra desta envergadura levando em conta todas as letras de todos os poemas.
Podemos perceber, entretanto, que quando montaram o painel (ainda em Lisboa) cometeram alguns pequenos erros. Por exemplo, alguns azulejos trocaram de posição. Estas discrepâncias eu realço em letras vermelhas, caso um dia você, caro leitor, queira verificá-los pessoalmente. Em verde marquei os dois azulejos onde João Vieira substituiu uma letra pelo logotipo do seu atelier, que é uma concha (vide foto). Para conhecer o currículo extenso do artista, clique aqui:
http://www.citi.pt/cultura/artes_plasticas/pintura/joao_vieira/curricul.html
OPIÁRIUM
A LELKEMET NEM ÓPIUM SEBEZTE,
AZ ÉLETTŐL SÁPADOZTAM, DARVADOZTAM,
DE VÍGASZOM RÉMLETT AZ ÓPIUMBAN,
KELET KELETJE CSÁBÍTOTT KELETRE.
MEGÖL, TUDOM, E FEDÉLZETI ÉLET
FEJEMBEN LÁZAS NAPOK KERGETŐZNEK.
EZERSZER JOBB, HA BETEGSÉG GYÖTÖR MEG.
AZ ALKALMAZKODÁSHOZ ÉN NEM ÉRTEK.
AZ ELLENTMONDÁSOS, ROSSZ CSILLAG-ÁLLÁS
ARANY SEBEKKEL UTAMAT KISZABJA.
ÖNÉRZETEM LECSÚSZIK A HABOKBA,
IDEGCSOMÓIM HULLÁMOK CIBÁLJÁK.
A KÉPZELET TORZ LENDÍTŐKERÉKKEL
A KATASZTRÓFÁT MŰKÖDÉSBE HOZZA,
EGY KERTBEN RÁLELEK A VÉRPADOKRA,
SZÁRUKAT VESZTETT VIRÁGOK KÍSÉRNEK.
(Tradução de Zsuzsa Takács, de acordo com o livreto editado em Lisboa. É possível, entretanto, que seja tradução de Endre Kukorelly, verificarei em breve!)
Aqui vai a versão original do poema:
FERNANDO PESSOA / ÁLVARO DE CAMPOS: OPIÁRIO
(Ao Senhor Mário de Sá-Carneiro) - escrito em março de 1914
É ANTES DO ÓPIO QUE A MINH'ALMA É DOENTE.
SENTIR A VIDA CONVALESCE E ESTIOLA
E EU VOU BUSCAR AO ÓPIO QUE CONSOLA
UM ORIENTE AO ORIENTE DO ORIENTE.
ESTA VIDA DE BORDO HÁ-DE MATAR-ME.
SÃO DIAS SÓ DE FEBRE NA CABEÇA
E, POR MAIS QUE PROCURE ATÉ QUE ADOEÇA,
JÁ NÃO ENCONTRO A MOLA PRA ADAPTAR-ME.
EM PARADOXO E INCOMPETÊNCIA ASTRAL
EU VIVO A VINCOS DE OURO A MINHA VIDA,
ONDA ONDE O PUNDONOR É UMA DESCIDA
E OS PRÓPRIOS GOZOS GÂNGLIOS DO MEU MAL.
É POR UM MECANISMO DE DESASTRES,
UMA ENGRENAGEM COM VOLANTES FALSOS,
QUE PASSO ENTRE VISÕES DE CADAFALSOS
NUM JARDIM ONDE HÁ FLORES NO AR, SEM HASTES.
Na parte central do painel (que é bem maior que as duas laterais) encontramos 3 poemas, o primeiro deles de Luís Vaz de Camões (1524?-1580):
MIT AKARTOK, ÖRÖK VÁGYAKOZÁSOK?
MIT AKARTOK, ÖRÖK VÁGYAKOZÁSOK?
MILY REMÉNYEKKEL ÁLLTOK MÉG ELŐ?
NEM TÉR VISSZA A TOVASZÁLLT IDŐ,
S HA VISSZATÉR IS, VONÁSAI MÁSOK.
JÓL TESZITEK, ÉVEK, HOGY TOVASZÁLLTOK,
MERT BÁR MINDŐTÖK KÖNNYEN RÖPPENŐ,
HAJLAMOTOK NEM MINDIG EGYEZŐ,
S AZ ÓHAJ NEM ISMER EGYFORMASÁGOT.
MI KEDVES VOLT, MÁS BENNE MÁR A LÉNYEG;
MERT A NAPOK MÚLÁSA LETÖRÖLTE
A RÁTAPADT ELSŐ GYÖNYÖRŰSÉGET.
REMÉNYT NEKEM TOVÁBBI ÖRÖMÖKRE
NEM HAGY A MEGLÓDULT IDŐ S A VÉGZET,
A BOLDOGSÁG E KÉT KERÉKKÖTŐJE.
(Tradução de Ernő Hárs, embora o livreto editado pelo Metropolitano de Lisboa mencione Árpád Mohácsi – informação a verificar)
Aqui vai o soneto original:
LUÍS DE CAMÕES: QUE ME QUEREIS, PERPÉTUAS SAUDADES?
QUE ME QUEREIS, PERPÉTUAS SAUDADES?
COM QUE ESPERANÇA AINDA ME ENGANAIS?
QUE O TEMPO QUE SE VAI NÃO TORNA MAIS
E, SE TORNA, NÃO TORNAM AS IDADES.
RAZÃO É JÁ, Ó ANOS, QUE VOS VADES,
PORQUE ESTES TÃO LIGEIROS QUE PASSAIS,
NEM TODOS PARA UM GOSTO SÃO IGUAIS,
NEM SEMPRE SÃO CONFORMES AS VONTADES.
AQUILO A QUE JÁ QUIS É TÃO MUDADO
QUE QUASE É OUTRA COUSA; PORQUE OS DIAS
TÊM O PRIMEIRO GOSTO JÁ DANADO.
ESPERANÇAS DE NOVAS ALEGRIAS
NÃO MAS DEIXA A FORTUNA E O TEMPO ERRADO,
QUE DO CONTENTAMENTO SÃO ESPIAS.
O segundo poema do painel central já é de Cesário Verde, outro grande poeta português, que nasceu em Lisboa em 1855 e faleceu em Lumiar em 1886, aos 31 anos de idade.
Ainda não consegui descobrir por que os azulejos com as letras maiores (que destacam os nomes dos seis poetas) mencionam o nome como Cesáro (sem o i). Minha hipótese é que quando escolheram os seis protagonistas contaram as letras dos seus sobrenomes: Camões, Pessoa, József e Petőfi tem seis letras e Ady tem três (que dobrando dá seis, isto é, repetindo as letras daria para fazer combinações de azulejos similares aos dos outros). Cesário entretanto tem sete letras… hmmm… o que fazer? Suponho que o artista primeiro procurou outros poetas portugueses com seis letras e como não encontrou nenhum famoso… pensou que nós húngaros não perceberíamos este deslize e ’comeu’ o i, ficando Cesáro.
BEZÁRT ÉJ
EMLÉKSZEL-E, MONDD, AZ ELMÚLT SZOMBATRA:
LÉPÉSEINK LASSÚ KOPPANÁSAI,
FÖLÖTTÜNK A MERENGŐ GÁZ SÁRGA LÁNGJA,
S A HOLDFÉNY TEJFINOM SIMOGATÁSAI?
A SZŰK UTCÁCSKÁKRA JÓL EMLÉKSZEM ÉN,
HOL KÉZ A KÉZBEN KÓBOROLTUNK KETTEN:
A HÁZAK HOMLOKÁN OTT SÁPADT A FÉNY;
S ABLAKUKBAN SZOMSZÉDASSZONYOK FECSEGNEK.
NEM FELEJTEM MINDAZT MIRŐL MESÉLTÉL
EGY DÚSAN FARAGOTT KOMOR TEMPLOMNÁL;
SEM A CÉDRUST, MELY HÁJBÓL S HALÁLBÓL ÉL,
S BÁJOS TEMETŐKERTEK REJTEKÉN ÁLL.
ELINDULTUNK, TUDVA AZ ALKONY KÖZEL,
MÉGIS MEG-MEGÁLLVA HALADTUNK TOVÁBB; –
DE KEDVETLENSÉGEM SEM FELEJTEM EL,
S A SZAGGATOTT JELET: MINT MÚLTAK AZ ÓRÁK.
(Tradução: Éva Bernát)
CESÁRIO VERDE: NOITE FECHADA
LEMBRAS-TE TU DO SÁBADO PASSADO,
DO PASSEIO QUE DEMOS, DEVAGAR,
ENTRE UM SAUDOSO GÁS AMARELADO
E AS CARÍCIAS LEITOSAS DO LUAR?
BEM ME LEMBRO DAS ALTAS RUAZINHAS,
QUE AMBOS NÓS PERCORREMOS DE MÃOS DADAS:
ÀS JANELAS PALRAVAM AS VIZINHAS;
TINHAM LÍVIDAS LUZES AS FACHADAS.
NÃO ME ESQUEÇO DAS COUSAS QUE DISSESTE,
ANTE UM PESADO TEMPLO COM RECORTES;
E OS CEMITÉRIOS RICOS, E O CIPRESTE
QUE VIVE DE GORDURAS E DE MORTES!
NÓS SAÍRAMOS PRÓXIMO AO SOL-POSTO,
MAS SEGUÍAMOS CHEIOS DE DEMORAS;
NÃO ME ESQUECEU AINDA O MEU DESGOSTO
NEM O SINO RACHADO QUE DEU HORAS.
O terceiro poema da parte central é novamente de Fernando Pessoa:
Ő, AZ AZ ARATÓMUNKÁSNŐ ÉNEKEL
Ő, AZ AZ ARATÓMUNKÁSNŐ ÉNEKEL
SZEGÉNY, TALÁN BOLDOG IS, AZT HISZI;
ARAT, S AZ ÉNEK SZÁLL AZ ÉGBE FEL,
DERŰS ÉS NÉVTELEN ÖZVEGYSÉGGEL TELI.
ÉS HULLÁMZIK, MINT EGY MADÁR DALA
AZ ÉGEN, AMELY TISZTA, MINT A KEZDET,
S HAJLIK, AHOGY HAJLIK AZ ÉG FALA,
ÉS LÁGY FOLYAM, ÉS MEG SOHASE RESZKET.
ÖRÖM HALLGATNI ŐT, S ELSZOMORÍT,
E HANGBAN ÉLNEK A MEZŐK S A RÉTEK
S A MUNKA IS, E DAL ÚGY ELBORÍT,
ÉS MINTHA MÁS OKA IS LENNE, MINT AZ ÉLET.
Ó ÉNEKELJ, DALOLJ, HA NINCS IS OK!
AZ, AMIT ÉRZEK IS, CSAK GONDOLAT.
A SZÍVEMBEN, AHOL MOST NEM VAGYOK,
ÖNTSD SZÉT GYENGE, HULLÁMZÓ HANGODAT.
Ó HOGYHA ÚGY LEHETNÉK ÉN, HOGY TE LEGYEK!
BOLDOG TUDATLANSÁGBAN LENNI MÁS,
ÉS TUDNI ERRŐL, TUDNI. Ó EGEK!
Ó, MEZŐK! Ó, DAL! Ó, EZ A TUDÁS!
NEHÉZ, S AZ ÉLET CSAK EGY PILLANAT!
VÁLTOZTASSATOK, ÁRADVÁN BELÉM
LELKEMMÉ KÖNNYŰ ÁRNYÉKOTOKAT!
ÉS VIGYETEK, TOVÁBB, EL, MINDENT, AMI ÉN.
(Tradução de Endre Kukorelly)
Aqui vai o poema original para quem quiser conferir:
FERNANDO PESSOA: ELA CANTA, POBRE CEIFEIRA
ELA CANTA, POBRE CEIFEIRA,
JULGANDO-SE FELIZ TALVEZ;
CANTA, E CEIFA, E A SUA VOZ, CHEIA
DE ALEGRE E ANÔNIMA VIUVEZ,
ONDULA COMO UM CANTO DE AVENO
AR LIMPO COMO UM LIMIAR,
E HÁ CURVAS NO ENREDO SUAVE
DO SOM QUE ELA TEM A CANTAR.
OUVI-LA ALEGRA E ENTRISTECE,
NA SUA VOZ HÁ O CAMPO E A LIDA,
E CANTA COMO SE TIVESSE
MAIS RAZÕES P'RA CANTAR QUE A VIDA.
AH, CANTA, CANTA SEM RAZÃO!
O QUE EM MIM SENTE 'STÁ PENSANDO.
DERRAMA NO MEU CORAÇÃO
A TUA INCERTA VOZ ONDEANDO!
AH, PODER SER TU, SENDO EU!
TER A TUA ALEGRE INCONSCIÊNCIA,
E A CONSCIÊNCIA DISSO! Ó CÉU!
Ó CAMPO! Ó CANÇÃO! A CIÊNCIA
PESA TANTO E A VIDA É TÃO BREVE!
ENTRAI POR MIM DENTRO! TORNAI
MINHA ALMA A VOSSA SOMBRA LEVE!
DEPOIS, LEVANDO-ME, PASSAI!
No último painel deste lado "português", bem menor em tamanho, encontramo-nos novamente com Luís de Camões. Este é o quinto e último poema:
HIBÁIM, BALSORS, LOBOGÓ SZERELMEM
HIBÁIM, BALSORS, LOGOBÓ SZERELMEM
ESKÜDTEK AZ ELVESZTÉSEMRE ÖSSZE;
FELESLEGESEN TETT SORS, HIBA TÖNKRE,
MERT ELÉG VOLT ÁMORT MAGÁT VISELNEM.
RÉG MESSZE MÁR; DE ITT A KÍNJA BENNEM
MINDENNEK MÉG, MI MÚLTAMAT GYÖTÖRTE,
S VAD KESERVEK MEGGYŐZTEK FELŐLE,
HOGY NEM ÉLHETEK SOHA ÖNFELEDTEN.
ÉVEIM SORÁN MINDIG CSAK HIBÁZTAM;
S HOGY ROSSZ REMÉNYEIMET PORBA SÚJTSA,
BŐSÉGES OKOT ADTAM RÁ A SORSNAK.
RÖVID MARADT MINDEN SZERELMI LÁZAM...
Ó, ELÉGTÉTELT SZEREZNI KI TUDNA
BOSSZÚRA VÁGYÓ ZORD GÉNIUSZOMNAK!
(Tradução de Ernő Hárs, embora o livreto editado pelo Metropolitano de Lisboa diga que foi Árpád Mohácsi – informação a verificar)
E o original, para que o leitor possa desfrutá-lo:
LUÍS DE CAMÕES: ERROS MEUS, MÁ FORTUNA, AMOR ARDENTE
ERROS MEUS, MÁ FORTUNA, AMOR ARDENTE
EM MINHA PERDIÇÃO SE CONJURARAM;
OS ERROS E A FORTUNA SOBEJARAM,
QUE PARA MIM BASTAVA O AMOR SOMENTE.
TUDO PASSEI; MAS TENHO TÃO PRESENTE
A GRANDE DOR DAS COUSAS QUE PASSARAM,
QUE AS MAGOADAS IRAS ME ENSINARAM
A NÃO QUERER JÁ NUNCA SER CONTENTE.
ERREI TODO O DISCURSO DE MEUS ANOS;
DEI CAUSA A QUE A FORTUNA CASTIGASSE
AS MINHAS MAL FUNDADAS ESPERANÇAS.
DE AMOR NÃO VI SENÃO BREVES ENGANOS.
OH! QUEM TANTO PUDESSE, QUE FARTASSE
ESTE MEU DURO GÉNIO DE VINGANÇAS!
Aqui vai um filminho mostrando a tabela Excel que o meu amigo Géza Papp preparou para ajudar-nos a desvendar o mistério:
Do lado oposto da estação encontraremos 3 poetas e 5 poemas húngaros traduzidos para o português. Por sorte deste lado só cometeram um único erro quando colocaram os azulejos, uma simples troca de letras (veja em vermelho).
Curiosamente um dos poemas de é de SÁNDOR PETŐFI (Liberdade, Amor) é o único que foi usado na íntegra.
Primeiramente, o original:
SZABADSÁG, SZERELEM
SZABADSÁG, SZERELEM!
E KETTŐ KELL NEKEM.
SZERELMEMÉRT FÖLÁLDOZOM
AZ ÉLETET,
SZABADSÁGÉRT FÖLÁLDOZOM
SZERELMEMET.
AMOR E LIBERDADE!
AMBOS ME SÃO PRECISOS.
PELO MEU AMOR SACRIFICO
A VIDA.
PELA LIBERDADE SACRIFICO
O MEU AMOR.
Tradução: Yvette K. Centeno
Logo em seguida, dentro deste mesmo painel (o menor dos três) vem um segundo poema de Petőfi, mas só dois versos dele...
Logo em seguida, dentro deste mesmo painel (o menor dos três) vem um segundo poema de Petőfi, mas só dois versos dele...
A NÉP NEVÉBEN
MÉG KÉR A NÉP, MOST ADJATOK NEKI!
VAGY NEM TUDJÁTOK, MILY SZÖRNYŰ A NÉP,
HA FÖLKEL ÉS NEM KÉR, DE VESZ, RAGAD?
NEM HALLOTTÁTOK DÓZSA GYÖRGY HIRÉT?
IZZÓ VASTRÓNON ŐT ELÉGETTÉTEK,
DE SZELLEMÉT A TŰZ NEM ÉGETÉ MEG,
MERT AZ MAGA TŰZ; ÚGY VIGYÁZZATOK:
ISMÉT PUSZTÍTHAT E LÁNG RAJTATOK!
E em português:
SÁNDOR PETŐFI: EM NOME DO POVO
O POVO AINDA PEDE, DAI LHE AGORA!
NÃO SABEIS COMO É TERRIVEL QUANDO SE REVOLTA.
QUANDO EM VEZ DE PEDIR AGARRA E ARREBATA?
NAO OUVISTEIS FALAR O GYÖRGY DÓZSA?
FOI SENTADO POR VÓS NUM TRONO DE FERRO EM BRASA,
MAS NÃO QUEIMOU O SEU ESPÍRITO ESSE FOGO
POIS ERA O PRÓPRIO FOGO. CUIDADO,
AQUELAS LÍNGUAS PODEM DEVORAR-VOS!
(Tradução: Yvette K. Centeno)
Na parte central do painel (a que está sobre os bancos) novamente encontraremo-nos com três poemas.
O primeiro é „No Danúbio” do poeta Attila József porém o início da obra só encontraremos no último painel deste lado da estação, e só a continuação é que aparece nesta parte central. Vamos deixá-la para daqui a pouco e pular para o segundo poema, de Endre Ady. Aqui veremos o nome dele em letras bem maiores, mas em dobro (ADY / YDA):
ELILLANT ÉVEK SZŐLŐHEGYÉN
TORT ÜLÖK AZ ELILLANT ÉVEK
SZŐLŐHEGYÉN S VIDÁMAN BUGGYAN
TORKOMON A SZÜRETI ÉNEK.
ÓNOS, CSAPÓ ESŐBEN ÁZOM
S VÖRÖS-KÉK SZŐLŐLEVELEKKEL
HAJLÓ FEJEM MEGKORONÁZOM.
NÉZEM A TÉPETT VENYIGÉKET,
HAJTOGATOM RÉSZEG KORSÓMAT
S LASSAN, GŐGGEL MAGASRA LÉPEK.
A CSÚCSON MAJD TALÁN MEGÁLLOK.
FÖLDHÖZ VÁGOM A BOROS-KORSÓT
S VIDÁM JÓÉJSZAKÁT KIVÁNOK.
E em português:
ENDRE ADY: NA VINHA DOS ANOS FANADOS
FESTEJO NA VINHA DOS ANOS
FANADOS E, EM MINHA GARGANTA,
BROTA O CANTO VINDIMO, UFANO.
A CHUVA DE ESTANHO ME ADENSA;
COM PÂMPANOS VERMELHOS-AZUIS
CINJO MINHA CABEÇA PENSA.
CONTEMPLO TRAPOS, DE SARMENTO,
ENVERGO MINHA JARRA TONTA
E SIGO ACIMA, ALTIVO E LENTO.
TALVEZ PARE NO CIMO, LANÇO
AO CHÃO MINHA JARRA DE VINHO,
DESEJO A TODOS BOM DESCANSO.
(Tradução de Nelson Ascher (informação confirmada pelo próprio tradutor, que por coincidência é meu amigo pessoal) e não de Egito Gonçalves, como mencionado no livreto publicado em Lisboa)
O terceiro poema neste painel mais longo é novamente um de Sándor Petőfi, intitulado „O Sonho”.
AZ ÁLOM...
AZ ÁLOM
A TERMÉSZETNEK LEGSZEBB ADOMÁNYA.
MEGNYÍLIK EKKOR VÁGYINK TARTOMÁNYA,
MIT NEM LELÜNK MEG ÉBREN A VILÁGON.
ÁLMÁBAN A SZEGÉNY
NEM FÁZIK ÉS NEM ÉHEZIK,
BÍBOR RUHÁBA ÖLTÖZIK,
S JÁR SZÉP SZOBÁK LÁGY SZŐNYEGÉN.
ÁLMÁBAN A KIRÁLY
NEM BÜNTET, NEM KEGYELMEZ, NEM BIRÁL...
NYUGALMAT ÉLVEZ.
ÁLMÁBAN AZ IFJÚ ELMEGY KEDVESÉHEZ,
KIÉRT EPESZTI TILTOTT SZERELEM,
S OTT OLVAD ÉGŐ KEBELÉN. –
ÁLMAMBAN ÉN
RABNEMZETEK BILINCSÉT TÖRDELEM!
E em português:
SÁNDOR PETŐFI: O SONHO
O SONHO
É O DOM MAIS BELO DA NATUREZA.
ABRE O PAÍS DOS DESEJOS
PARA ENCONTRARMOS NELE
TUDO O QUE FALTA À NOSSA VIDA.
EM SONHOS
O POBRE NÃO PASSA FOME NEM FRIO.
ANDA VESTIDO DE PÚRPURA
SOBRE A MOLE ALCATIFA DE BELAS SALAS.
EM SONHOS
O REI NÃO JULGA, NÃO CASTIGA, NÃO CONCEDE PERDÃO...
SABOREIA A CALMA.
EM SONHOS O ADOLESCENTE ENCONTRA A SUA AMADA
POR QUEM SOFRE DE UM AMOR PROIBIDO
QUE LHE ARDE NO PEITO E O CONSOME.
EU, NOS MEUS SONHOS,
ROMPO AS CADEIAS DOS POVOS ESCRAVIZADOS!
(Tradução: Yvette K. Centeno)
Muito bem, e agora veremos „No Danúbio”, que se inicia no último painel e termina no começo da parte central.
JÓZSEF ATTILA: A DUNÁNÁL
A RAKODÓPART ALSÓ KÖVÉN ÜLTEM,
NÉZTEM, HOGY ÚSZIK EL A DINNYEHÉJ.
ALIG HALLOTTAM, SORSOMBA MERÜLTEN,
HOGY FECSEG A FELSZÍN, HALLGAT A MÉLY.
MINTHA SZÍVEMBŐL FOLYT VOLNA TOVA,
ZAVAROS, BÖLCS, ÉS NAGY VOLT A DUNA.
MINT AZ IZMOK, HA DOLGOZIK AZ EMBER,
RESZEL, KALAPÁL, VÁLYOGOT VET, ÁS,
ÚGY PATTANT, ÚGY FESZÜLT, ÚGY ERNYEDETT EL
MINDEN HULLÁM ÉS MINDEN MOZDULÁS.
S MINT ÉDESANYÁM, RINGATOTT, MESÉLT
S MOSTA A VÁROS MINDEN SZENNYESÉT.
ÉS ELKEZDETT AZ ESŐ CSEPERÉSZNI,
DE MINTHA MINDEGY VOLNA, EL IS ÁLLT.
ÉS MÉGIS, MINT AKI BARLANGBÓL NÉZI
A HOSSZÚ ESŐT – NÉZTEM A HATÁRT:
EGYKEDVŰ, ÖRÖK ESŐ MÓDRA HULLT,
SZÍNTELENÜL, MI TARKA VOLT, A MÚLT.
A DUNA CSAK FOLYT. ÉS MINT A TERMÉKENY,
MÁSRA GONDOLÓ ANYÁNAK ÖLÉN
A KISGYERMEK, ÚGY JÁTSZADOZTAK SZÉPEN
ÉS NEVETGÉLTEK A HABOK FELÉM.
AZ IDŐ ÁRJÁN ÚGY REMEGTEK ŐK,
MINT SÍRKÖVES, DÜLÖNGŐ TEMETŐK.
SENTADO NA MAIS ALTA PEDRA DO MOLHE
VIA FLUTUAR AS CASCAS DE MELANCIA.
PENSANDO NO DESTINO, MAL NOTAVA
COMO AS ONDAS SUSSURRAM E O FUNDO SILENCIA.
COMO SE DE MIM SAÍSSE
SÁBIO ERA O DANÚBIO, CONFUSO E GRANDE.
A ONDA, COMO OS MÚSCULOS HUMANOS
QUE LIMA, CAVA, CIMENTA OU MARTELA,
MOVIA-SE, SALTAVA, AMORTECIA,
RODOPIAVA LIVREMENTE. EMBALAVA-ME
COMO MINHA MÃE, CONTANDO HISTÓRIAS
E LAVANDO TODA A ROUPA DA CIDADE.
A CHUVA COMEÇOU A CAIR, DEPOIS CESSOU
DE UM MOMENTO PARA OUTRO, INDIFERENTE.
E EU, COMO QUEM OLHA DE UMA GRUTA,
A CHUVA INFINDÁVEL, OLHAVA O HORIZONTE
CAINDO SEM TRÉGUAS, INSENSÍVEL,
ESCURECIA O PASSADO, ANTES MULTICOR.
O DANÚBIO CORRIA. COMO UMA CRIANÇA
NO SEIO FECUNDO DE MÃE DISTRAÍDA
AS ONDAS BRINCAVAM ALEGRES,
E PARECIAM ÀS VEZES RIR PARA MIM,
NO DECURSO DO TEMPO, TRÊMULAS
COMO O RUIR DE PEDRAS TUMULARES.
(Tradução: Ernesto José Rodrigues)
Preciso concordar com A. Santos Machado, Presidente do Metropolitano de Lisboa (em 1996) quando escreveu o seguinte: "Numa troca de culturas, de poetas, de línguas e de alfabetos, a arte de Joao Vieira estabelece novas pontes, no tempo e no espaço, entre duas cidades e entre dois países. De Lisboa para Budapeste – na estaçao Deák Tér – uma pauta musical de arte e de poesia, ficará sempre, patente."
Sem comentários:
Enviar um comentário