O PCP não recuou na via revolucionária por ordem de
Ponomariov ou de Suslov, que não quereriam uma Cuba na Europa. Recuou quando
Cunhal percebeu que não tinha outro caminho e não podia fazer mais nada
25 nov. 2025
A história do 25 de Novembro de 1975 está feita e bem
documentada. Vários testemunhos e memórias de quem participou registaram esse
dia inesquecível para quem o viveu do lado dos vencedores ou
dos vencidos. No entanto, parece-me importante recordar alguns factos e
homenagear os intervenientes decisivos para os acontecimentos marcantes
desses dias que puseram fim ao PREC e à tentativa de tomada de poder pelo PCP,
unido às forças civis e militares da esquerda radical.. Não seria necessário escrever
este texto se não existisse tanto empenho por tantas pessoas em fazer
esquecer esta data ou deturpar a ocorrência.
Depois dos tempos de unidade de um Portugal em festa pela
queda da ditadura, sabia-se que o PCP tinha um programa a cumprir e uma missão
histórica a concretizar, sabia-se também quie não queria que se consolidasse
uma democracia burguesa, igual a tantas outras europeias, em que os
trabalhadores e a sua vanguarda, a classe operária, continuasse a ser
explorada, mas antes passar a um Portugal socialista a caminho do comunismo.
Obviamente, era necessário, antes do mais, acabar com a guerra colonial que estava
na origem do golpe de Estado levado a cabo pelos militares no 25 de Abril.
Se os comunistas não quisessem e não tivessem como objetivo
estratégico passar à fase seguinte da revolução, ou se simplesmente desejassem
construir um país livre e democrático, uma democracia liberal, um Estado de
Direito, fazer a descolonização, tal teria acontecido e sem mais sobressaltos
revolucionários. Mas esse não era o objetivo, nem essa perspectiva constava do
programa do PCP. Sonhava-se com uma sociedade socialista a caminho do
comunismo. Esclarecia-se mesmo que esta pretensão era científica e inevitável,
tal como tinha sido escrito por Marx e Engels e concretizado por Lenine. Assim,
passou-se de imediato, desde a chegada de Cunhal ao aeroporto, a concretizar
esse objetivo, razão de ser da existência e da luta dura que o PCP travara
durante a ditadura. Não se pretendia preparar um novo golpe de estado, mas
antes passar à insurreição popular armada, resultante de uma aliança
povo/militares ou, como se chamou em Portugal, Aliança Povo/MFA, para alcançar
a revolução socialista.
Vejam,os os antecedentes. Álvaro Cunhal dirigiu o PCP
desde que fugiu da Cadeia de Peniche, chegando rapidamente a Secretário-Geral
em 1960.
Nessa época, o movimento comunista internacional estava
profundamente dividido, a cisão sino-soviética, ocorrida nos anos 50/60,
provocou divergências profundas entre a URSS de Khrushchov e a China de
Mao Tse Tung, fragmentando o movimento comunista internacional.
Cunhal chega à direção do PCP e redireciona a sua linha
política, considerando que se vivia um “desvio de direita”. Publica “Rumo à
Vitória”, recolocando o PCP na linha de fidelidade ao PC da URSS, ao contrário
dos partidos comunistas europeus, os quais rejeitaram a dependência e o
controle de Moscovo e assumiram um compromisso com a democracia parlamentar e
com o resultado das eleições pluripartidárias. O PC italiano, o espanhol e o
francês defendiam oficialmente um “caminho democrático para o Socialismo”, numa
célebre declaração conjunta, para se afirmarem como partidos democráticos,
demarcando-se do caminho revolucionário do PCP.
Conheci pessoalmente os dirigentes desses partidos,
ainda tenho uma caneta oferecida por Berlinguer, já Santiago
Carrilho ficou em minha casa quando veio olhar de perto a Revolução dos
Cravos. Quanto a Marchais, conheci-o mais tarde numa iniciativa sobre o
Vietname, em Paris. No PREC as duas vias para o comunismo e o consequente
debate ideológico estavam presentes, Cunhal era praticamente o único dirigente
que restava na Europa que mantinha fidelidade à União Soviética, com Podgorny a
acabar e Suslov a ascender a principal ideólogo.
Fernando Farinha
Cunhal tinha definido uma revolução em duas fases: uma
“Democrática-Nacional” e outra Socialista, que se seguiria à primeira, seguindo
o modelo das revoluções russas de Fevereiro e Outubro de 1917
É nesta conjuntura que Cunhal define o Programa do PCP para
combater o fim da ditadura através de um golpe de Estado e defender a
Insurreição Popular Armada como fase seguinte. Por isto mesmo, Cunhal
desconfiou do golpe militar do 25 de Abril, ainda em preparação, como do
interior lhe eram enviadas informações do que se preparava. Mas nem essas
notícias, nem a sua preparação, conseguiram convencê-lo, ao contrário dos
dirigentes do PCP que estavam em Portugal na luta clandestina – Carlos
Brito, Octávio Pato, entre muitos outros, e eu própria (camarada Teresa). Tanto
não acreditava que, já depois da saída da coluna militar das Caldas,
Cunhal convocou uma reunião do Comité Central ainda para a União Soviética, mas
que se veio depois a realizar efetivamente em Alhandra.
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No Programa que escreveu, a primeira fase da revolução é
chamada de Revolução Democrática e Nacional, a segunda fase é a da Revolução
Socialista ou, para facilitar a compreensão e comparando com a Rússia, a
primeira seria a revolução de Fevereiro e a segunda a revolução
de Outubro. Sobre isso escreveu Cunhal em 1971, esclarecendo os “objetivos
programáticos do PCP para as duas etapas da revolução: a fase democrática
e nacional poderá ser (parafraseando Marx e Engels) o prelúdio da revolução socialista”,
esclarecendo que “a realização da revolução Democrática e Nacional criará
condições favoráveis para a conquista do poder pelo proletariado”. Das
condições concretas “dependerá a possibilidade do caminho pacífico, ou da
necessidade de uma luta violenta”. Ainda nesse mesmo texto demonstra “a
inevitabilidade científica da passagem de uma fase para a outra” (in Radicalismo
Pequeno Burguês de Fachada Socialista, 1971).
É neste enquadramento teórico que o PCP chega ao PREC,
Processo Revolucionário em Curso, e acelera a luta pela tomada do poder, a
partir de Janeiro, a pretexto da unicidade sindical, e até ao 25 de Novembro.
OPCP tinha um rumo claro e preciso da tática e da
estratégia a seguir na luta pelo socialismo até ao comunismo. Para
isso aproveita bem o 11 de Março e, a partir do gabinete de Vasco
Gonçalves, concretiza-o quase literalmente.
Partindo dos Governos de Vasco Gonçalves e do seu gabinete,
juntamente com os sectores radicais de esquerda política e das forças armadas,
avançou-se para as nacionalizações, a reforma agrária, Caxias encheu-se
com mais presos políticos do que havia antes do 25 de Abril.
Alguém imagina que se o PCP não estivesse na vanguarda da
revolução se tal tivesse acontecido? O PCP fez tudo para impedir as eleições
para a Constituinte porque o povo, dizia, não estava preparado para tal.
Conseguiu adiá-las, mas a 25 de Abril realizaram-se e perdeu-as mesmo com o
apelo do MFA para que aqueles que não soubessem muito de política votassem em
branco. Perdeu as eleições e logo a seguir, numa clara demonstração de que não
reconhecia os resultados, o PCP impediu a entrada do Dr. Mário Soares no
estádio 1 de Maio, ele o vencedor das eleições.
Em choque de manifestações, barricadas e medição de forças
viveu-se depois o verão quente. O poder estava na rua e os sovietes “à
portuguesa” proliferavam: comissões de trabalhadores, comissões de moradores,
quartéis sublevados para rumar à Revolução socialista o Povo e o MFA. O
governo, que não correspondia ao resultado eleitoral, não tinha qualquer poder,
como reconheceu Pinheiro de Azevedo. Havia armas e barricadas por todo o lado
para quê? Com que objetivo estratégico? Expliquem bem a tese dos que asseguram
que o PCP não queria o poder revolucionário.
Só parou no 25 de Novembro confrontado com a realidade
militar e civil que se lhe opunha. Não recuou no seu Programa revolucionário
por ordem de Ponomariov, nem de Suslov, que não quereriam uma Cuba na Europa,
como escreveu o historiador José Pacheco Pereira esta semana no Jornal Público.
Essa tese é uma diminuição ridícula de Álvaro Cunhal, que recuou porque a
correlação de forças se tornou evidente pela ação das chefias da Força Aérea,
dos Comandos e dos militares moderados do Grupo dos Nove, do general Eanes e
dos partidos democráticos de Mário Soares, Sá Carneiro, Adelino Amaro da Costa,
Freitas do Amaral e da Igreja católica. O PCP recuou quando Cunhal percebeu que
não tinha outro caminho e não podia fazer mais nada.
Suslov, o grande ideólogo do regime comunista e amigo de
Cunhal, esse sim quando percebeu o recuo quis realmente perceber as causas e se
era definitivo. Ou se era um passo atrás para poder dar dois em frente mais
tarde, como ensinou Lenine. Por esse motivo, eu e o dirigente da União da
Juventude Trabalhadora (UJT) da altura, José Pedro Correia Soares, fomos
convidados a ir a Moscovo reunir – sei que não fomos os
únicos. Recordo bem a emoção de estar pela primeira vez em Moscovo,
circular pelos salões do Kremlin até ao gabinete de Suslov e reunir com
ele para que pudesse certificar-se da razão do recuo.
Decisivo neste percurso do PREC foi, desde
logo, o dirigente Jaime Serra, membro da Comissão Política e do
Secretariado do PCP. Era um verdadeiro revolucionário, herói mítico do
PCP, e um dos fundamentais homens de confiança do Álvaro Cunhal. Diria, sem
exagero, que Jaime Serra foi sempre visto como um Trotsky (militar e estratega
da ação) pela vida revolucionária que levou. Várias vezes preso, torturado e
condenado, conseguiu sempre fugir das cadeias onde o meteram. São famosas as
suas palavras quando assegurou no Tribunal Plenário que o julgou pela última
vez, dizendo que podiam condená-lo a quantos anos quisessem que fugiria sempre
da cadeia. Três vezes escapou, sempre de forma espetacular, da Cadeia de Caxias
e de Peniche, revelando uma coragem sem limite, tanto na tortura da PIDE como
na própria concepção das fugas, dignas de um filme ou série policial. Antes do
25 de Abril foi o mentor e fundador do braço armado do PCP contra o aparelho
colonial, a ARA, dissolvida no 25 de Abril, sem vítimas mortais nos seus
atentados.
Jorge Amaral/Global Imagens
Jaime Serra, que chegou a ser visto como o Trotsky do PCP
(pois controlava o sector militar, à semelhança do revolucionário russo), já no
fim da vida, numa cerimónia com Jerónimo de Sousa
Gostava de estar sempre no meio da ação revolucionária para
ajuizar pessoalmente das decisões, foi deputado à Constituinte e foi um dos
cercados no mês de Novembro. Na verdade Jaime Serra foi um dos que preparou as
ações revolucionárias do PCP, participando pessoalmente em reuniões do MFA,
como se sabe, incluindo as que decidiram a ocupação das bases aéreas na
madrugada de 25 de Novembro. Cunhal dirigia politicamente o PCP, enquanto ele
comandava e preparava a insurreição popular armada – essa sua participação está
documentada no despacho do Juiz Francisco Gouveia Pinto que averiguou as FP25,
arquivado na amnistia às FP e publicado mais tarde pelo jornal Expresso. Jaime
Serra foi o controleiro dos militares comunistas de patente e o responsável
pelo sector militar até ao 25 de Novembro e fundamental na decisão de avançar
no Verão Quente e na orientação dos militares comunistas, mas também para
recuar no dia 25 de Novembro.
Melo Antunes que teve um papel decisivo nestes dias e
marcante sobre o futuro dos comunistas portugueses. Amigo do
PCP desde antes do 25 de Abril, foi ele que fez chegar ao PCP clandestino
o documento-programa do MFA. Não era, nem nunca foi, membro do PCP, mas sim –
na minha opinião pessoal – um eurocomunista simpatizante das teses tão em moda
de Gramsci, Berlinguer, Carrillo ou Togliati, era um homem culto e muito
conhecedor dos livros dos intelectuais de esquerda da época.
No 25 de Novembro foi decisivo para a não ilegalização do
PCP. Era evidente que o seu poder estava na rua, nos sindicatos, ou nas
universidades, e nalguns quartéis. A ilegalização faria dele mártir e a
situação em Portugal caminharia para uma guerra civil.
Melo Antunes era também respeitado pelo PCP porque tinha
tido um papel decisivo na descolonização, muito maior do que o de Mário
Soares, e conhecia muito bem os movimentos de libertação das ex-colónias.
Foi Ministro sem Pasta para a definição da política de descolonização (Maio
de 1974 a Março de 1975) e definiu-a. Foi Ministro dos Negócios
Estrangeiros de Março a Setembro de 1975 e teve
responsabilidades políticas na forma como decorreu a independência das
ex-colónias, esteve pessoalmente no Acordo de Lusaka (Moçambique), no de Alvor
(Angola) e no de Argel (Guiné e Cabo Verde).
Melo Antunes foi uma figura central em todo o processo,
temia mesmo a possibilidade de uma guerra civil, mas na famosa intervenção que fez logo a seguir mantém a
ideia de em Portugal não devíamos ter uma sociedade capitalista
A tese bizarra de que Cunhal recuou durante o Verão
Quente, ou depois da Assembleia de Tancos, e de que nada tem a ver com o 25 de
Novembro, não faz qualquer sentido se olharmos para Melo Antunes e as suas
atitudes públicas. Como explicar a declaração de Melo Antunes nesse mesmo dia?
Tenho dele a memória de um homem culto, racional, sabendo sempre o que queria
fazer, pelo que não se percebe porque iria falar da não ilegalização do
PCP se nada se passava com o Partido Comunista e o golpe se resumia a umas
aventuras irresponsáveis entre militares baralhados e radicalizados?
Analisando seriamente os factos desse dia percebe-se
bem o momento do recuo. As chefias militares da Força Aérea tiveram um papel
decisivo nesse facto e sobre isso não resta nenhuma dúvida. Quando os aviões
vieram da base de Cortegaça e passaram num voo rasante por Lisboa e Setúbal
percebeu-se claramente de que lado estava a força militar e que a ocupação das
bases pelos paraquedistas servia de pouco. Fui chamada à sede do PCP na António
Serpa e recebi ordem para desmobilizarmos. Na verdade, os aviões, que deviam
estar estacionados nas bases aéreas quando os paraquedistas avançaram e as
tomaram, tinham sido desviados para Cortegaça e os que ficaram nas bases
estavam incapazes de voar. Sem aviões não se ganha uma insurreição popular
armada.
Um relatório da época relata em pormenor e oficialmente o
que se passou. É fácil perceber como essa operação de dissuasão, de
resistência, surpreendeu todos e foi determinante para o recuo de qualquer
espécie de golpe. Pensada e executada ao longo de meses, sob a
liderança do General Fernando Vasquez, teve como comandante da esquadra
dos sete aviões que levantaram de Cortegaça o General Vaz Afonso.
Esta operação secreta teve o nome de “Míscaros” com direito a uma placa
evocativa num restaurante de Cascais, onde durante todo o Verão se reuniam
secretamente os oficiais da Força Aérea.
Muitos outros militares foram importantes para que
Portugal seguisse no caminho da democracia pluralista e do estado de direito
ou, por outras palavras, para que o golpe do 25 de Novembro fosse
derrotado. Os comandos eram um foco determinante de resistência aos militares
revolucionários do PCP e da extrema-esquerda. Foram dos primeiros a perceber
para onde caminhava a revolução e a organizar os comandos para a resistência. O
culminar deu-se no dia 25 de Novembro. Foram pôr ordem em diversos locais e
sofreram baixas frente à Polícia Militar. Mas particularmente significativo e
eficaz foi o facto de os comandos cumprirem com a libertação da RTP.
A liberdade de imprensa tinha sido gravemente atingida no
Verão Quente. Saramago, então no Diário de Notícias, saneara todos os
jornalistas de esquerda e de direita não pró-comunistas, o jornal República foi
atacado, a Renascença cercada e a RTP ocupada, no dia 25 de Novembro. Para quem
defende a tese de que nada estava a ser preparado e de que Cunhal tinha feito
recuar o PCP por ordens de Moscovo, provavelmente com um telefonema de Brejnev
para não perturbar a descolonização, é importante que se verifique o que
aconteceu na comunicação social nesse dia, e o que levaram a cabo os comunistas
naqueles locais.
Por outro lado, há ainda os que imaginam que Álvaro Cunhal
não dirigia o seu Partido e ignorava o que os militantes civis e
militares andavam a ocupar. Os Comandos de Jaime Neves foram
interromper a RTP ocupada por Duran Clemente que não estava
a ver o filme com Danny Kaye “O Homem do Diner´s Club”, pois isso só aconteceu
depois de o Major José Coutinho retirar a emissão do ar. Não foi certamente
para passar o tempo que o Presidente da RTP, o Major Pedroso Marques, foi
fechado numa sala do Lumiar por Duran Clemente e libertado por ordem de Eanes.
Nos quartéis do Sul, excetuando os Comandos que sempre se
mantiveram unidos e prontos a defender o regime democrático, havia a maior das
confusões revolucionárias. No Norte, Eurico Corvacho, que comandava a
região militar e era muito próximo do PCP e amigo pessoal de Ângelo Veloso,
sendo que por lá eram poucos os militares da esquerda radical, foi demitido e
substituído por Pires Veloso. Essa substituição foi fundamental para que
os partidos democráticos ameaçassem mudar a Constituinte para o Norte e que o país
fosse divido entre Norte e Sul, a partir de Rio Maior.
Mário Soares, o fundador do PS, tinha grande
experiência política e sabia o que era o comunismo, conhecia Cunhal e a sua
família. Creio que, durante os primeiros meses após o 25 de Abril, ele
acreditava que os ímpetos revolucionários do PCP e da extrema esquerda civil e
militar se resolveriam com o resultado de eleições livres. Porém, logo no
início do PREC, percebeu que tal não ia acontecer e que teria
que enfrentar o radicalismo revolucionário da esquerda comunista. Percebeu
também que precisaria de demonstrar o apoio popular, na rua, à liberdade e
à democracia, enfrentando o PCP e a esquerda radical civil e militar. Por estar
consciente disto, Mário Soares saiu do cerco da Constituinte pela
residência oficial do primeiro-ministro, indo para o Norte com Sá Carneiro e o
CDS.
Alguém imagina que Mário Soares iria para o Norte se não
existisse uma ameaça real revolucionária no Portugal libertado da
ditadura? A que propósito? Ou que o cerco à Constituinte tivesse sido apenas
uma manifestação dos trabalhadores da construção civil que se
equivocaram e foram solicitar aumentos salariais frente à Constituinte?
Mas isto faz algum sentido?
Mesmo assim alguns ainda avançam, quando argumentam que não
houve nenhuma intenção de fazer um golpe revolucionário, que Cunhal, um homem
superiormente inteligente dizem, não se ia meter em tais riscos e já tinha
recuado, tanto mais que Angola já estava independente. Então por que motivo
Mário Soares e os restantes dirigentes estão no Norte do país? Vale a pena
lembrar os apelos dos sindicatos e da CGTP à greve geral nacional e à unidade
Povo/MFA.
Apartir do 25 de Novembro de 1975 o país voltou à
calma e o PREC acabou. Ao longo de vários anos, fez-se caminho para afirmar a
liberdade, a democracia e o Estado de direito. Foi por pouco que Portugal
não foi uma Cuba europeia com consequências humanas, económicas, cívicas e
sociais.
Por isso é importante comemorar o 25 de Abril mas é
igualmente importante lembrar o 25 de Novembro que, ao contrário do que ainda
hoje acontece em Cuba, libertou presos de Caxias, repôs a liberdade de
imprensa e consolidou a democracia ocidental em que vivemos.
O PCP recuou nesse dia, não por qualquer telefonema de Brejnev a Cunhal, mas porque mediu forças militares e percebeu que não tinha a maioria das forças militares do seu lado, nem as mais decisivas. O país entrou assim na normalidade e seguiu o seu rumo. A exceção foram as forças da esquerda radical, inspiradas por Otelo que não reconheceram a derrota e acederam ao terrorismo e a diversos atentados das FP25 de Abril, sucessoras das Brigadas Revolucionárias de Isabel do Carmo e Carlos Antunes. Essas fizeram diversas vítimas mortais entre as quais uma criança e o Gaspar Castelo Branco, pai de um amigo meu a quem dedico este artigo. Nessa escalada o PCP nunca esteve, obviamente.
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