06/03/2016 - 00:34
Passaram 220 anos desde que foi criada, por alvará régio, a
maior biblioteca do país. Viagem por 75 quilómetros de prateleiras, 66 mil m2
de edifício, 4,7 milhões de documentos.
Estamos numa sala com 600 m2. Tem duas portas corta-fogo de
três toneladas, é anti-sísmica e anti-incêndio — aqui, o simples acto de
acender um isqueiro é impossível, uma vez que o ar não é combustível. Há várias
estantes: algumas estão vazias, ainda à espera de serem preenchidas. Outras,
guardam relíquias que poucos têm oportunidade de ver. Como uma colecção de
documentos impressos até 1500 e os espólios de Sophia de Mello Breyner
Andresen, Fernando Pessoa, Eça de Queirós e Almeida Garrett. E de muitas outras
figuras da cultura portuguesa. Preciosidades que estão guardadas em pequenas
caixas de cartão, devidamente identificadas com o número do espólio a que
pertencem. Qualquer um as poderia abrir, na verdade. Mas antes teria de
conseguir entrar na cave da torre de depósitos, onde funciona a casa-forte da
Biblioteca Nacional de Portugal (BNP), a maior biblioteca do país. Nesta casa-forte,
que é a zona mais segura dentro da BNP, não estão necessariamente os documentos
mais antigos, mas aqueles que têm mais valor, os mais raros, os mais
importantes. “É como o cofre de um banco”, diz-nos a directora, Maria Inês
Cordeiro. E visitá-la é um privilégio — “entre os técnicos da biblioteca
ninguém entra sozinho e não entra ninguém que seja de fora”. Há excepções,
claro: os representantes de Estado. E os técnicos da manutenção. Nunca, nunca
sozinhos.
O privilégio justifica-se — afinal, estamos aqui porque a
BNP faz 220 anos. E há, aliás, mais para ver: como se visitar a casa-forte não
fosse já suficiente, ao centro da sala, numa comprida mesa rectangular,
espera-nos uma pequena amostra do tesouro. Dispostos por ordem cronológica,
estão dezasseis documentos cujo peso na História e na Cultura portuguesas é
inegável. “A selecção foi feita por Margarida Pinto, responsável dos Impressos,
Ana Cristina Santana, responsável dos Manuscritos, e Fátima Lopes, responsável
dos Espólios do Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea”, informa-nos a
directora da BNP. E é então que vemos, entre os documentos — uns, mais do que
outros, com um admirável estado de conservação — o mais antigo livro da BNP,
que remonta ao século XII; um dos 50 exemplares existentes no mundo da Bíblia
de Gutenberg; uma carta de Vasco da Gama; a primeira edição d’ Os Lusíadas; a
carta de Fernando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro a explicar a origem dos
heterónimos, escrita em Janeiro de 1935.
Nos bastidores da biblioteca
O acervo da BNP integra actualmente cerca de 4,7 milhões de
documentos. Com algumas doações e aquisições, o número cresce principalmente
graças ao depósito legal, uma lei que remonta a 1805 e que obriga a que sejam
entregues à BNP onze exemplares de todas as obras impressas ou editadas em
Portugal. Nove exemplares são depois enviados para bibliotecas um pouco por
todo o país, incluíndo Açores e Madeira, e para a Biblioteca do Real Gabinete
Português de Leitura do Rio de Janeiro, no Brasil. Os dois restantes integram o
acervo da BNP. É esse o percurso que Maria Inês Cordeiro desvenda ao PÚBLICO: a
viagem que estas obras fazem, nos bastidores da biblioteca, até serem entregues
aos leitores.
Ao chegarem — em paletes coloridas, com diferentes tamanhos,
vindas directamente das tipografias —, as obras com destino às outras
bibliotecas são empacotadas em caixotes que, uns em cima dos outros, ocupam os
dois lados de um corredor largo. Nuns lê-se “Madeira”, noutros “Rio de
Janeiro”, mas o critério é igual para todos: “antigamente, era a BNP que
enviava todos estes livros para as várias bibliotecas, mas agora isso é
insustentável e cada instituição paga o transporte dos seus livros, incluindo o
Rio de Janeiro”, assegura Maria Inês Cordeiro, que dirige a BNP desde 2011. A
biblioteca recebe mensalmente cerca de 40 mil livros através do depósito legal,
“e passa cerca de um mês entre a chegada, a sua distribuição e a catalogação”,
conclui a directora.
Para serem restaurados, a maior parte dos ocumentos são primeiro desmanchados, lavados com uma água controlada, e depois secam naturalmente
Maria Inês Cordeiro, directora da BNP desde 2011
Impõe-se um pequeno desvio ao trajecto principal,
informa-nos Maria Inês Cordeiro, com passos apressados: “Vamos ao sector de
conservação e restauro”. Conhecemos então o sr. Gonçalves, que já não vai para
novo e é o único encadernador a trabalhar na biblioteca — um sintoma da
escassez de funcionários de que os utilizadores da BNP actualmente se queixam.
Numa parede estão pendurados vários rolos de tecido colorido: “São usados para
as lombadas”, explica a directora. Aqui restauram-se “tanto manuscritos como obras
impressas, e não só livros, mas todo o tipo de documentos — mapas, desenhos,
pergaminhos…”. A cada documento é atribuída uma ficha, na qual se apontam
“todas as suas características, doenças e intervenções que vai sofrer” e se
incluem algumas fotografias.
Mais à frente, já noutra sala, ficamos a saber que os
documentos também são lavados, em banheiras próprias, com chuveiro. Maria Inês
Cordeiro justifica: “para serem restaurados, a maior parte dos documentos são
primeiro desmanchados, lavados aqui com uma água controlada, e depois secam
naturalmente” em secadores próprios que fazem lembrar os vulgares estendais de
alumínio. Quanto ao restauro, há vários processos para o fazer, e a directora
da BNP mostra-nos um documento restaurado através de reintegração mecânica, um
procedimento que recupera documentos “rotos, bichados ou com falhas”.
Feito o desvio, estamos de volta ao trajecto principal e
passamos à zona de catalogação. Dispostas, aos pares, em carros de livros, as
obras aguardam a sua vez de serem “introduzidas nas bases de dados”. São,
depois, classificadas e voltam novamente para os carros de livros, “prontas
para seguirem para a torre de depósitos”. Essa é justamente a paragem seguinte;
mas antes voltamos à área aberta ao público e visitamos a sala de referência
geral, onde os leitores pesquisam e requisitam as obras que querem consultar, e
passamos pela mais emblemática sala de leitura da casa — a sala de leitura
geral, conhecida pela enorme tapeçaria feita propositadamente por Guilherme Camarinha
para decorar a parede do fundo e alusiva à Leitura Nova, uma colecção de cópias
de importantes documentos mandada fazer por D. Manuel I e iniciada em 1504.
Percebemos, desgostosos, que está por estes dias encerrada “para substituição
do sistema de iluminação”, justifica Maria Inês Cordeiro. Conhecemos a sala de
leitura temporária, onde filas e filas de secretárias acolhem leitores
concentrados, e entramos no elevador que nos leva à icónica torre de depósitos,
ampliada entre 2008 e 2012 e que guarda todo o acervo da biblioteca em 10
andares.
Luís Sá, responsável pela sala de leitura e pela torre de
depósitos, junta-se a nós a partir daqui. Subimos até ao sétimo andar — “vamos
ao depósito de ciências e artes”, informa-nos. “O depósito está organizado por
grandes temas”, acrescenta a directora. As portas abrem-se e ouvimos o som
incomodativo de uma campainha intermitente, uma medida de segurança accionada
automaticamente à entrada e à saída de pessoas em cada piso. Chegamos a um
corredor de que quase não se vê o final — tem 133 metros de comprimento por 15
metros de largura —, ladeado por filas e filas de prateleiras repletas de obras
e conhecidas como “comboios”, devidamente identificadas com placas que, entre
outros dados, indicam o tema e o número do comboio. Para aproveitar o máximo de
espaço possível, as obras estão organizadas por três formatos: “livros de
bolso, livros com formato até A4 e A4 ou superior”, explica Luís Sá, que
acrescenta que outro dos critérios de organização é a data de publicação.
19.º a 22.º graus de temperatura com humidade relativa entre os
50% e os 55%, são as condições de conservação
Enquanto andamos pelo interminável corredor, Maria Inês
Cordeiro fala sobre as condições de conservação: “a temperatura está
normalmente entre 19.º e 22.º e a humidade relativa deve estar entre os 50% e
os 55%”, diz, explicando que o tratamento do ar é feito por várias máquinas
implementadas no último piso da torre e na cave. A incidência de luz solar é
controlada pelas janelas — que são pequenos rectângulos, como convém. Mas a
conservação passa também por armadilhar o espaço para combater eventuais
habitantes indesejáveis: “colocamos armadilhas com um comprimido que atrai todo
o tipo de insectos”. A segurança é assegurada por um sistema anti-intrusão e
anti-incêndio e, quanto à limpeza do pó, “não é como lá em casa, não é possível
andar sempre a limpar as prateleiras”.
Estamos no fim do percurso: é a partir de uma sala com
pequenos elevadores, que existem em todos os pisos da torre, que os livros — e
todos os outros documentos — são enviados lá para baixo, para os leitores. “O
talão do pedido do leitor é impresso cá em cima e depois os técnicos
colocam-nos nestes elevadores próprios”, indica Maria Inês Cordeiro. Nós
voltamos ao elevador e deixamos os livros para trás.
Um pouco de História
Hoje, a BNP é um mundo, já se viu. Mas muito aconteceu antes
de ficar assim. Nasceu a 29 de Fevereiro de 1796, sob o nome de Real Biblioteca
Pública da Corte. Em alvará régio, D. Maria I determinava: “Eu a Rainha faço
saber aos que este Alvará virem: que sendo um dos objectos, que ocupam a Minha
Real consideração, o cuidado de promover eficazmente os progressos da
Literatura Portuguesa; e conhecendo quanto será útil, e vantajoso para se
conseguir este fim, o estabelecimento de uma Livraria Pública, […] onde se
achem […] os Livros mais precisos pela sua raridade, […] que constituam um
riquíssimo depósito, não só de todos os conhecimentos humanos, mas também dos
meios mais próprios para conduzir os homens a conseguirem a virtuosa sabedoria,
[…] ordeno que na Minha Corte, e cidade de Lisboa se erija, […] a Real
Biblioteca Pública da Corte.”
Mas a História da BNP começa anos antes. “A BNP é o
resultado do pensamento iluminista de algumas figuras muito importantes na segunda
metade do século XVIII”, resume a directora. Tudo começou por volta de 1771:
Imbuído do espírito iluminista da valorização da razão, Frei Manuel do
Cenáculo, que ficaria para a posteridade como uma das personalidades mais
relevantes da Cultura portuguesa setecentista, propôs ao rei D. José I a
criação de uma biblioteca pública. E assim, em 1775, D. José I decretava que a
ala ocidental do Terreiro do Paço acolheria o projecto. Mas só duas décadas
depois é que os planos se concretizariam — e o alvará de D. Maria I viria
finalmente a fundar a Real Biblioteca Pública da Corte.
Do acervo da Real Biblioteca, gerido pelo bibliotecário-mor
António Ribeiro dos Santos, faziam parte as obras da Biblioteca da Real Mesa
Censória que, até à sua extinção em 1794, fiscalizava as obras a publicar.
Entre doações particulares e aquisições, a Real Biblioteca Pública da Corte foi
crescendo e, em 1834, depois da guerra civil contra os absolutistas, os
liberais tomaram o poder e a Real Biblioteca passou a chamar-se Biblioteca
Nacional de Lisboa. Nesse mesmo ano, a extinção das ordens religiosas viria a
contribuir para o aumento do seu acervo: “vieram carroças e carroças cheias de
livros de mosteiros e conventos para Lisboa”, conta Maria Inês Cordeiro. O
Terreiro do Paço tornou-se pequeno para tão vasto acervo e a Biblioteca
acabaria por se mudar para o Convento de S. Francisco, no Chiado, donde saíria
apenas em 1969, para ocupar o imponente edifício do Campo Grande projectado por
Porfírio Pardal Monteiro propositadamente para a acolher.
A BNP hoje: utilizadores, problemas e o desafio do digital
Dos 66 mil m2 de área total do edíficio, 35 mil m2 estão
ocupados pelos 75 quilómetros de prateleiras. Mas a quem serve um património
tão extenso? “Os principais utilizadores e exploradores do acervo da BNP
pertencem à comunidade académica”, esclarece Maria Inês Cordeiro, que
acrescenta que entre os cerca de 45 mil leitores que visitam anualmente a
biblioteca — um número que se tem mantido estável nos últimos anos, diz —, quem
procura a BNP não são apenas pessoas da Literatura, da História ou das
Ciências, mas de muitas outras áreas.
Prova disso é o realizador e encenador Frederico Corado: “As
minhas idas à biblioteca são frequentes, por motivos profissionais, quando faço
pesquisa para novos trabalhos, em particular no que diz respeito ao teatro”,
conta ao PÚBLICO. Corado dá o exemplo de uma exposição que organizou no final
de 2015, sobre teatro no Cartaxo, e para a qual se socorreu da BNP:
“Infelizmente, o Cartaxo não tem um arquivo muito completo, e tive de ir à BNP
sobretudo para consultar jornais antigos. Em relação a alguns jornais, foi-me
dito que não podia consultá-los porque estavam muito danificados, mas
ofereceram-me alternativas: podia consultá-los digitalmente, se pagasse a sua
digitalização”.
Um dos problemas mais recorrentes que os utilizadores da BNP
identificam ao PÚBLICO é precisamente o estado de conservação das publicações
periódicas. “É uma pena, porque vamos acabar por perder a memória do que era a
actividade jornalística nos séculos XIX e XX. O papel é muito frágil, desfaz-se
e a consulta deixa de ser possível”, lamenta Paulo Silveira e Sousa,
investigador de História e utilizador frequente da biblioteca, numa conversa
conjunta na cafetaria com presenças igualmente assíduas nas salas de leitura —
o historiador Diogo Ramada Curto [colaborador do PÚBLICO] e João Pedro George,
autor de obras como Marquesa de Paiva (2015) e O Que é um Escritor Maldito?
(2013).
Uma biblioteca nacional não pode viver apenas do acervo que
herdou do passado, tem de comprar obras - Diogo Ramada Curto, historiador
Os três investigadores partilham diariamente a sala de
leitura geral e concordam que há actualmente dois problemas de base que
condicionam o seu trabalho. Em primeiro lugar, “faz falta a formação de uma
nova geração de profissionais dentro da biblioteca, que beneficie da passagem
de testemunho do saber acumulado das pessoas mais velhas, que se vão
reformando”, diz Diogo Ramada Curto. A análise dos relatórios de actividade da
biblioteca mostra que, de facto, o panorama não é animador: enquanto que em 31
de Dezembro de 2010 “estavam ao serviço 231 trabalhadores”, na mesma data, em
2014 — de acordo com o mais recente relatório disponível —, “estavam ao serviço
195 trabalhadores”.
Em segundo lugar, continua Diogo Ramada Curto, “uma
biblioteca nacional não pode viver apenas do acervo que herdou do passado, tem
de comprar obras”, considera, preocupado com a falta de recursos para a
aquisição de obras. João Pedro George vai mais longe e diz mesmo que esta é uma
realidade que “atrasa imenso o conhecimento do país, porque os investigadores
não têm acesso a determinados documentos, que acabam nas mãos de privados”.
Também aqui os dados dos relatórios de actividade são reveladores: em 2010
foram adquiridas “105 obras de bibliografia corrente”, lê-se no relatório, e
1873 “no âmbito de leilões, espólios e raridades”. Já em 2014, “não foram
adquiridas obras de bibliografia corrente” e foi “suspensa a assinatura de
publicações periódicas estrangeiras”, tendo sido adquiridas 53 obras “no âmbito
de leilões, espólios e raridades”.
Associada ao acervo da BNP está a memória colectiva do país,
lembra Diogo Ramada Curto: “essa memória colectiva relaciona-se com a
investigação que fazemos, é através da investigação que pensamos a memória
colectiva, e por isso a biblioteca tem de ter condições para que possamos investigar,
não basta ter o acervo”. Silveira e Sousa, Ramada Curto e George reconhecem, no
entanto, que a falta de dinheiro é um problema transversal às instituições
culturais em Portugal e elogiam a competência da equipa da biblioteca dadas as
actuais circunstâncias.
Luís Ribeiro, um historiador de arte que trabalha em
projectos relacionados com manuscritos medievais, não hesita: “a actual
direcção é extremamente receptiva a colaborar com investigadores”, diz. O
verdadeiro problema é o horário — é limitado e limitativo. “Sei que há
condicionantes orçamentais e de recursos humanos, mas o horário devia ser mais
alargado e mais noturno. Para quem está a fazer investigação em part-time, o
fim-de-semana é ideal, por isso a biblioteca devia estar aberta mais horas ao
fim-de-semana e não fechar ao domingo”. Mas Maria Inês Cordeiro diz que o
alargamento do horário não é, “com os recursos que a biblioteca tem” hoje, uma
hipótese “viável”: “a média de pessoas na sala de leitura geral a partir das
18h30 — apenas 10 ou 15 pessoas — não o justificaria”.
Maria Inês Cordeiro olha para o processo de digitalização
dos documentos e a expansão da Biblioteca Nacional Digital, criada em 2002,
como desafios: “A partir do momento em que a Internet e os meios tecnológicos
se vulgarizaram, a BNP mudou radicalmente a forma como fornece os vários
serviços e como dá acesso àqueles documentos [mais antigos e valiosos] a que só
muito poucas pessoas antes podiam aceder”, explica. É a esses documentos que é
dada prioridade na “difusão através da digitalização”, continua a directora da
BNP, que destaca as vantagens da Biblioteca Nacional Digital: “qualquer pessoa,
em qualquer parte do mundo, a qualquer hora e para qualquer efeito, não só tem
acesso aos documentos como pode fazer o download e reutilizar. Por sua vez, a
BNP, enquanto gestora desses bens culturais, consegue garantir o cumprimento da
missão de os preservar a longo prazo”.
Apesar da evolução natural para o digital, o grande
objectivo mantém-se: “Queremos preservar para o futuro, mas ao mesmo tempo ter
relevância para a sociedade viva e que quer hoje utilizar a biblioteca. Temos
de ter um equilíbrio entre as duas coisas”. A actuação da instituição, no
entanto, mudou: “Até há 20 ou 30 anos, a biblioteca era reactiva — estava aqui,
guardava o acervo para quem quisesse utilizá-lo —, e hoje é proactiva — temos
de o ser para chegarmos à sociedade”. Por isso tem vindo a promover, nos
últimos anos, exposições, mostras, colóquios, congressos, publicações e
edições. “Anualmente, fazemos entre 60 e 70 eventos e lançamos entre 10 e 15
edições”, refere.
Quinze anos depois do seu lançamento, a Biblioteca Nacional
Digital disponibiliza actualmente 27 mil documentos para consulta online, entre
os quais o único exemplar conhecido de História de mui nobre Vespasiano (1496),
sobre o imperador romano, e o Cancioneiro da Biblioteca Nacional, uma cópia do
século XVI do maior cancioneiro de poesia trovadoresca em português. Frederico
Corado compreende a morosidade e as dificuldades inerentes ao projecto, mas
lamenta que seja apenas possível aceder a um número tão reduzido de documentos,
tal como Dora Santos Silva, investigadora do Departamento de Ciências da
Comunicação da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de
Lisboa, que consulta frequentemente o portal. “Gosto de ir vendo as obras que
vão sendo disponibilizadas”, explica, apesar de considerar que “o site não é
user friendly”. “Não há, por exemplo, a organização em temas, que tornaria a
consulta e a descoberta mais fáceis. A biblioteca permite a descoberta, mas a
descoberta também deve ser um pouco facilitada”.
“A exigência do público é imensa e não perdoa nada”,
concorda a directora. “Se não tivermos a última facilidade para o telemóvel ou
para o tablet, já ficamos para trás; se não tivermos o acervo com uma boa
visibilidade e recuperabilidade no Google, já existimos menos”, admite.
Destaca, por outro lado, os recursos que a criação da Biblioteca Nacional
Digital exigiu — e continua a exigir — e que envolvem “a transformação das infraestruturas
técnicas, a necessidade de os profissionais adquirirem novas competências e a
constante actualização dos meios de fornecimento do serviço do ponto de vista
tecnológico”. “É uma realidade tão mais complexa quanto mais simples parece a
sua utilização e tão ou mais dispendiosa do que a biblioteca das prateleiras”,
advoga. Mas não tem dúvidas de que este é o caminho do futuro: “em 2013,
apercebemo-nos de que o volume de tráfego na Biblioteca Nacional Digital é tal
que pode corresponder, num ano, a vinte anos do volume de leitura nas salas de
leitura aqui na BNP”. E conclui: “isso é o que as pessoas querem, é isso que
nos convém”.
http://www.publico.pt/portugal/noticia/pelos-caminhos-da-biblioteca-nacional-1724966
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