quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

Luís Osório - Quando Jerónimo de Sousa nos abraça

* Luís Osório


1.
Jerónimo de Sousa é um homem especial.
Mas não digam que é boa pessoa.
(apesar de ser boa pessoa)
Não digam que sempre gostaram dele
(apesar de poder ser mesmo verdade o que dizem)
Não digam coisas que, sendo certas, nos desviam do que foi e é a sua vida.

2.
Jerónimo é um operário metalúrgico.
E um comunista.
E apesar de deputado há quase 50 anos, continua a combater pela dignidade dos trabalhadores numa qualquer fábrica em que os seus ideais lhe saltem à vista.
Alguns talvez não acreditem.
Mas se não acreditam é porque nunca vos apertou a mão.
Ou abraçou.
Ou porque nunca estiveram com ele numa fábrica.
Quando nos aperta a mão percebemos o peso do trabalho operário.
Quando nos abraça percebemos que o faz com o que carrega, com a poesia de todos os que combateram e já não estão.
Quando está numa fábrica percebemos que está como se fosse a sua casa, os operários (comunistas ou não) são uma parte de si, mais do que os passos perdidos de um parlamento que conhece como as suas mãos, mas onde não sente pertencer por inteiro.


3.
Não digam que é uma boa pessoa pois isso é menorizar o combate de uma vida.
Jerónimo é uma boa pessoa – e como se sente que o é –, mas é no combate que o reconhecemos. E nesse combate é inclemente e daria a sua vida sem uma hesitação que fosse.
Jerónimo é um homem que se comove.
Com a dureza de princípios de um comunista, mas com a leveza de um coração que não esconde as lágrimas (mesmo que as lágrimas não sejam visíveis para os que lhe estão próximos).
Um dia telefonou-me depois de um “Postal” que dediquei aos meus amigos comunistas.
“Olá, Luís. É o Jerónimo. Só para te dizer que foi muito bonito o que escreveste. E para te dizer que estamos na expetativa de que a Benedita seja comunista”.
 

4.
Naquele postal eu publicara a fotografia da minha filha Benedita com o braço direito no ar.
A Benedita, neta mais nova do meu pai, um comunista convicto.
É por isso, em nome do respeito que os comunistas nos merecem, que o combate do Jerónimo (e de tantos outros e outras) nos merece, que devemos nestas horas complicadas desejar que possa sair do hospital com vontade de continuar a abraçar o mundo e de continuar o combate.
Comunistas e não comunistas, como eu.
Que possamos dar o abraço, Jerónimo.

Meu amigo.
 
E hoje camarada.

LO
 
 No blog «As palavras são armas», de Cid Simões 
12 DE JANEIRO DE 2022
A adversidade conjuga esforços e sentimentos
“POSTAL DO DIA” de Luís Osório (tirado do facebook)   

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