«O milagre não é dar vida ao corpo extinto, / Ou luz ao cego, ou eloquência ao mudo... / Nem mudar água pura em vinho tinto... / Milagre é acreditarem nisso tudo!» – eis um belo testemunho da poesia de Mario (sem acento, que assim foi registado) Quintana, poeta, tradutor e jornalista brasileiro, o «poeta das coisas simples». Nascido em Alegrete, no Rio Grande do Sul, publica os primeiros versos na revista literária dos alunos do Colégio Militar de Porto Alegre, que frequenta até aos 18 anos. Começa a trabalhar como tradutor em 1929, no jornal O Estado do Rio Grande. Traduz autores como Voltaire, Virginia Woolf e Marcel Proust, incluindo a monumental obra deste último «Em Busca do Tempo Perdido». Em 1940, Mario Quintana publica o primeiro livro de sonetos: «A Rua dos Cataventos». Seguem-se outras obras, mas o reconhecimento de Quintana, hoje considerado como um dos maiores poetas do séc. XX, vem mais tarde. Três vezes rejeitado pela Academia Brasileira de Letras, virá a declinar o convite que finalmente lhe fazem. Mestre da síntese poética, recebe em 1980 o Prémio Machado de Assis da ABL e em 1981 o Prémio Jabuti. Morre em 1994, mas o seu humor resiste ao tempo: «Todos esses que aí estão /Atravancando o meu caminho,/ Eles passarão... / Eu passarinho!».
https://www.avante.pt/pt/2549/memoria/169133/1906-%E2%80%93-Nasce-Mario-Quintana.htm?
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Mario Quintana
Apresentação
Curiosamente, Quintana, que se celebrizaria como poeta, estreou com o conto “A sétima personagem”, publicado no Diário de Notícias, de Porto Alegre, em 1926. Só no ano seguinte ele teria um poema publicado. Antes do primeiro livro de versos editado pela Globo, foi com a tradução de Palavras e sangue, de Giovanni Papini, de 1934, que ele estreou na editora gaúcha. Deve-se, em parte, ao seu trabalho de tradutor em tempo integral o êxito da casa em introduzir autores estrangeiros no panorama literário brasileiro. Ainda no fecundo ano de 1934, ele iniciou colaboração, que se revelaria longa, no Correio do Povo, de Porto Alegre. Quintana não teve filhos e sempre preferiu os quartos de hotel ao aconchego de uma casa ou um apartamento. Doce no trato e no temperamento, não deixava de surpreender: na revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder, apresentou-se como voluntário e marchou para o Rio de Janeiro, onde ficou seis meses como integrante do 7º Batalhão de Caçadores de Porto Alegre. Na verdade, era encarregado do diário da tropa. Em 1940, por insistência de um de seus irmãos e de Erico Verissimo, publicou, pela Globo, seu primeiro livro: a coleção de 35 sonetos intitulada A roda dos cata-ventos, recheada da presença provinciana de Porto Alegre, ainda que com transposições, como em “Quando eu morrer e no frescor da lua/ Da casa nova me quedar a sós,/ Deixai-me em paz na minha quieta rua.../ Nada mais quero com nenhum de vós!”.
Com os textos curtos e poéticos publicados na coluna “Do Caderno H”, ele iniciou, em 1945, colaboração na revista Província de São Pedro. Muitos textos nesse estilo seriam publicados ao longo de sua fiel colaboração no Correio do Povo, o que não o impediu de lançar o segundo livro de versos, Canções, em 1946, em que, diferentemente do primeiro, se revela moderno, gozando de plena liberdade da forma. A este livro se seguiria Sapato florido, de 1948, com prosa poética e alguns aforismos: “Amar é mudar a alma de casa”, escreveu o poeta nesse livro que precedeu O aprendiz de feiticeiro, de 1950, e Espelho mágico, do ano seguinte. Estes são apenas alguns títulos de uma extensa obra que, não só por extensão, mas por mérito, levou-o a se candidatar a uma vaga na Academia Brasileira de Letras em 1981. Derrotado pelo professor Eduardo Portella, concorreria ainda duas vezes, sem sucesso. “Ainda vou ter a minha imortalidadezinha”, garantia ele à sobrinha, Helena, a quem confiou os papéis de que hoje se compõe seu arquivo.
Quintana colecionou dezenas de cadernos em que fermentavam aforismos, muitos deles posteriormente reunidos em livros. “Quinta-essência de cantares…/ Insólitos, ingulares…/ Cantares? Não! Quintanares!”. Assim preferiu se referir Manuel Bandeira aos versos do poeta gaúcho, considerando-os “insólitos, singulares”. Quintana, porém, achava que mais se aproximavam da música angustiada de Mahler. De um modo ou de outro, o autor de Canções pararia de cantar. Antes disso, a prefeitura de Alegrete, sua cidade natal, homenageou-o com uma placa de bronze, para a qual o poeta enviou a seguinte mensagem de inscrição: “Um engano em bronze é um engano eterno”. Certamente não passou de mais de uma de suas divertidas ironias.
Mario Quintana morreu em 5 de maio de 1994, em Porto Alegre.
https://ims.com.br/2017/06/01/sobre-mario-quintana/
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