terça-feira, 22 de setembro de 2015

o outono na poesia

•     Olavo Bilac - Em Uma Tarde de Outono
•     Eugénio de Andrade - Outono
  • David Mourão-Ferreira Seria Outono aquele dia…
  • Mário Quintana - Canção de Outono
  • Cecília Meireles - Canção de Outono
  • Fernando Pessoa - Uma névoa de Outono o ar raro vela,
  • Alice Gomes -  Chegou o outono –
  • Miguel Torga – Outono
  • Ricardo Reis - Quando, Lídia, vier o nosso Outono
  • Paul Verlaine  -  chanson d'automne
  • Florbela Espanca - Outonal

·         Olavo Bilac
Em Uma Tarde de Outono

Outono. Em frente ao mar. Escancaro as janelas 
Sobre o jardim calado, e as águas miro, absorto. 
Outono... Rodopiando, as folhas amarelas 
Rolam, caem. Viuvez, velhice, desconforto... 

Por que, belo navio, ao clarão das estrelas, 
Visitaste este mar inabitado e morto, 
Se logo, ao vir do vento, abriste ao vento as velas, 
Se logo, ao vir da luz, abandonaste o porto? 

A água cantou. Rodeava, aos beijos, os teus flancos 
A espuma, desmanchada em riso e flocos brancos... 
Mas chegaste com a noite, e fugiste com o sol! 

E eu olho o céu deserto, e vejo o oceano triste, 
E contemplo o lugar por onde te sumiste, 
Banhado no clarão nascente do arrebol... 

Olavo Bilac, in "Poesias" 

·         Eugénio de Andrade
Outono

O outono vem vindo, chegam melancolias,
cavam fundo no corpo,
instalam-se nas fendas; às vezes
por aí ficam com a chuva
apodrecendo;
ou então deixam marcas; as putas,
difíceis de apagar, de tão negras,
duras.

Eugénio de Andrade, in 'O Outro Nome da Terra' 

·         David Mourão-Ferreira
Seria Outono aquele dia…

"Mas quem diria ser Outono
se tu e eu estávamos lá?
(Tínhamos sono... Tanto sono!
É bom dormir ao deus-dará...)
E sobre o banco do jardim,
ante a cidade, o cais e o tejo,
seria bom dormir assim,
ao deus-dará, como eu desejo...
Mas o teu seio é que não quis:
tremeu demais sob o meu rosto...
Seria Outono aquele dia,
nesse jardim doce e tranquilo...?
Seria Outono...
Mas havia
todo o teu corpo a desmenti-lo."

David Mourão Ferreira 

·         Mário Quintana
Canção de Outono

O outono toca realejo
No pátio da minha vida.
Velha canção, sempre a mesma,
Sob a vidraça descida…
Tristeza? Encanto? Desejo?
Como é possível sabê-lo?
Um gozo incerto e dorido
De carícia a contrapelo…
Partir, ó alma, que dizes?
Colher as horas, em suma…
Mas os caminhos do Outono
Vão dar em parte nenhuma!


* Cecília Meireles
Canção de Outono

Perdoa-me, folha seca, 
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo, 
e até do amor me perdi.
De que serviu tecer flores
pelas areias do chão 
se havia gente dormindo 
sobre o próprio coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando aqueles 
que não se levantarão...

Tu és folha de outono 
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
E vou por este caminho,
certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão.
.
  
Cecília Meireles MEIRELES, C. Poesia completa: Volume 2. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.


·         Fernando Pessoa 
Uma névoa de Outono o ar raro vela,

Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.
Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande sono.
De sentir é só a janela a que eu assomo.
Amanhã, se estiver um dia igual,
Mas se for outro, porque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta               [...]



·         ALICE GOMES
CHEGOU O OUTONO –

Chega o outono!
As andorinhas
despedem-se das outras avesinhas
e vão pelos ares fora
vão-se embora
embora?
Não!
Que voltam, voltarão...
Quando a bela estação
da Primavera
que antecede ao Verão
oferecer melhor vida.
Não têm agasalhos nem comida,
vão para terras quentes
à procura do sol que as consola
Mas nós, crianças,
nós,
todos contentes
partimos para a escola.

ALICE GOMES


* Miguel Torga
Outono

Tarde pintada
Por não sei que pintor.
Nunca vi tanta cor...
... Tão colorida!
Se é de morte ou de vida,
Não é comigo.
Eu, simplesmente, digo
Que há fantasia
Neste dia,
Que o mundo me parece
Vestido por ciganas adivinhas,
E que gosto de o ver, e me apetece
Ter folhas, como as vinhas.


  
* Ricardo Reis 
Quando, Lídia, vier o nosso Outono


Quando, Lídia, vier o nosso Outono
Com o Inverno que há nele, reservemos
Um pensamento, não para a futura
Primavera, que é de outrem,
Nem para o Estio, de quem somos mortos,
Senão para o que fica do que passa
O amarelo actual que as folhas vivem
E as torna diferentes.

Odes

Paul Verlaine
CHANSON D'AUTOMNE

Les sanglots longs
Des violons
     De l'automne
Blessent mon coeur
D'une langueur
     Monotone.
Tout suffocant
Et blême, quand
     Sonne l'heure,
Je me souviens
Des jours anciens
     Et je pleure.
Et je m'en vais
Au vent mauvais
     Qui m'emporte
Deçà, delà,
Pareil à la

     Feuille morte.



Florbela Espanca
Outonal

Caem as folhas mortas sobre o lago;
Na penumbra outonal, não sei quem tece
As rendas do silêncio… Olha, anoitece!
- Brumas longínquas do País do Vago…

Veludos a ondear… Mistério mago…
Encantamento… A hora que não esquece,
A luz que a pouco e pouco desfalece,
Que lança em mim a bênção dum afago…

Outono dos crepúsculos doirados,
De púrpuras, damascos e brocados!
- Vestes a terra inteira de esplendor!

Outono das tardinhas silenciosas,
Das magníficas noites voluptuosas
Em que eu soluço a delirar de amor…


(Florbela Espanca, «Charneca em Flor», in «Poesia Completa»)

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