GERAÇÃO E -
`* Manuel Cardoso - Humorista
Quando uma
pessoa não se agasalha, sujeita-se a um resfriado. Quando uma pessoa não se
agasalha à frente de Marcelo, sujeita-se ao inapropriado
Histórico. O
Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa - conhecido por comentar tudo
e que dias antes se tinha dirigido à zona de entrevistas rápidas do Estádio do
Algarve para tecer considerações sobre um jogo de futebol - respondeu a uma
pergunta de um jornalista com as palavras “nem sei o que hei-de comentar”.
Reparem: não foi “não comento”; “não quero comentar” ou “não me parece a melhor
altura para comentar”. O Presidente não sabia mesmo o que dizer, o que é
inédito. A pergunta era sobre o comentário que dirigiu a uma jovem no Canadá
sobre o decote. Pela primeira vez, quem ficou petrificado com um piropo não foi
o alvo, mas o autor.
As inovações
não se ficam por aí. Após sugerir que não sabia o que comentar, Marcelo
confirma que não o devia ter feito. Podia ter encerrado o caso, decidiu abrir o
chapéu-de-chuva. Eu não sou gestor de crise, mas diria que uma pessoa que quer
mitigar os efeitos de um comentário inadequado não começa as suas declarações
de penitência com “no fim do passeio pela parte portuguesa de Montreal, começou
a chover”. Também não trabalho no IPMA, mas ignorava este conceito de
“condições meteorológicas perfeitas para a prática do piropo”.
“Começou a
chover, estava frio”. Altamente pressionado, o Presidente optou por falar de
baixas pressões. Outros teriam atribuído o comportamento inconveniente a uma
depressão clínica, Marcelo acusou uma depressão barométrica. Até agora, a
estação favorita de quem escolhe ser vocal quanto a decotes era o Verão, pelo
minimalismo indumentário. Doravante, será o Inverno, já que o mau tempo fornece
uma boa desculpa para o comportamento.
O momento mais
fascinante das declarações de Marcelo aconteceu quando o Presidente, revelando
que se tinha constipado, forja uma ocorrência de tosse. “Eu constipei-me - cof
cof - como se vê”. É curioso, porque “cof cof” também é utilizado para
sinalizar ironia - como em “eu acho normal um Presidente da República comentar
o decote de uma jovem - cof cof”.
É possível que
o Presidente da República se tenha aconselhado mal. A comitiva portuguesa disse
"Marcelo, fala de gripe!". Os anfitriões canadianos disseram
"Marcelo, get a grip!". Infelizmente, Marcelo seguiu o conselho dos
compatriotas. O que é certo é que todo este episódio configura um avanço
significativo no ramo da Pneumologia. Quando uma pessoa não se agasalha,
sujeita-se a um resfriado. Quando uma pessoa não se agasalha à frente de
Marcelo, sujeita-se ao inapropriado.
Marcelo
recorrer à medicina para justificar o piropo é como o leitor recorrer a
amoxicilina para curar uma gripe. É que o comentário sobre o decote foi viral.
Como toda a gente sabe, não se curam vírus com antibióticos.
2023 09 19
https://expresso.pt/geracao-e/2023-09-19-Marcelo-o-lele-Camarinha-65df55c4
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