quinta-feira, 20 de setembro de 2007

A garra de um escritor

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* António Valdemar,
Jornalista, investigador e membro da Classe de Artes da Academia das Ciências
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Entre o homem e a obra há, em Aquilino, poucas diferenças; um e outra completam-se e denunciam a mesma energia: a energia cósmica da terra.
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A austeridade crua dos planaltos de Castela-a-Velha e de Castela-a-Nova projectada na Beira Alta moldou o temperamento e o carácter de Aquilino. Do contacto íntimo com a paisagem geográfica e humana deriva a garra do escritor. Continua a estar connosco mesmo quando já não temos o privilégio do seu convívio.
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Conheci-o nos anos 50, era menino e moço e estava a concluir o liceu. Aquilino encontrava-se na plena pujança e já se aproximava dos 70 anos. Concluía a série que costumo intitular o ‘Quinteto da Beira’: ‘Os Avós dos Nossos Avós’, ‘Aldeia’, ‘Arcas Encoiradas’, ‘O Homem da Nave’ e ‘Abóboras no Telhado’.
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Encerrado o ‘Quinteto da Beira’, Aquilino pouco depois publicava ‘A Casa Grande de Romarigães’. Foi em 1957. Os lobos só começaram a uivar no ano seguinte. O aparecimento da crónica romanceada que decorre em Paredes de Coura e nas suas redondezas no Alto Minho e avança até ao Tâmega provocou um forte impacto nos círculos intelectuais. Os próprios amigos de Aquilino ficaram surpreendidos.
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Recordo-me de Ramada Curto, à porta da Bertrand, dizer a Vitorino Nemésio: “É o melhor livro de Aquilino. Não acha que é um fenómeno aos 72 anos?”
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Vitorino Nemésio sorriu e respondeu: “Meu caro amigo, só quem não tem acompanhado a trajectória de Aquilino é que poderá dizer isto. Desde os anos 20 Aquilino continua sem fracturas, sem desníveis, sem altos e baixos. Continua intacto feito da mesma peça.”
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Depois de ‘O Malhadinhas’, integrado muitos anos na ‘Estrada de Santiago’ até constituir, nos anos 50, um volume autónomo, há um livro extraordinário, aquele de que Aquilino mais gostava: ‘Andam Faunos Pelos Bosques’ (1926).Comunica-nos, página a página, as singularidades da fauna e da flora, a neve sobre a neve, o Sol escaldante de Verão, a sensualidade ardente, o intenso desejo, o entusiasmo ao rubro, todo aquele ímpeto dionisíaco que transformava Aquilino, o homem e o escritor, numa indomável força da Natureza. Sempre. Até ao fim.
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O IMPACTO DA ORALIDADE EM ROMARIGÃES
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António Valdemar, testemunha privilegiada da vida e obra de Aquilino Ribeiro, um dia, à conversa com a viúva do escritor, Jerónima Dantas Machado, familiarmente tratada por Gigi, ficou a conhecer por dentro a fluência narrativa de ‘A Casa Grande de Romarigães’...
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“Aquele livro foi quase todo ele ditado até porque eu tinha uma grande prática de escrever à máquina que me vinha do tempo em que o meu pai, Bernardino Machado, foi Presidente da República e eu sua secretária. O Aquilino andava à volta da sala e ditava-me o texto. Daí a força do impacto da oralidade. Nunca se dava por satisfeito e as emendas multiplicavam-se. Mas, na sequência da apreensão pela PIDE de ‘Quando Lobos Uivam’, já não teve tempo de emendar as outras edições de ‘A Casa Grande de Romarigães’.
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O livro saiu assim e assim ficou as com toda aquela frescura e movimento.”
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"HOMEM SIMPLES DE CONTACTO FÁCIL" (Aquilino Ribeiro Machado, Filho)
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“Era um homem simples, de contacto fácil e relações indiscriminadas para com os mais e menos intelectualmente privilegiadas. Lembro-me de o acompanhar, garoto, de calção curto, aos fins de tarde ao Chiado, à data, capital intelectual do País, e também às tertúlias da Brasileira, da Bertrand, do consultório do Pulido Valente. Conheci muita gente mas não o Fernando Pessoa; o meu pai sim mas não eram próximos...
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Este nome é um identificador genético: o meu pai, eu, um irmão mais velho, o meu filho, somos todos Aquilino de nome. Escrever, escrevemos mas para a gaveta, coisa que o meu pai não fazia. Mesmo os dois livros póstumos estavam já prontos. No nosso caso, acho que é compreensível o pudor da publicação mas, no meu caso concreto, nem que seja postumamente, é uma promessa feita ao meu pai que, como todos os pais, achava que [eu] o filho era um talento natural. A ver vamos.” (...)
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in Correio da Manhã 2007.09.19
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Foto - Aquilino Ribeiro, na Livraria Bertrand, Chiado, em 1953
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17-09-2007 - 00:00:00 Panteão Nacional recebe Aquilino
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Quarta-feira, 19 Setembro

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- fica la muito bem Caluniai, caluniai porque ficara sempre alguma coisa. Dizia o Goebells. Tenham vergonha, ou juizo, por favor!
- o corvo A história de um "albergue espanhol". Só falta o Buiça o Salazar, o Afonso Costa , o Barbieri Cardoso, o Miguel de Vasconcelos , o Cunhal , o Otelo o Ze do Telhado e sei lá quantos.... - ptp A vergonha instala-se sempre que o PS paga favores à MAÇONARIA IRREGULAR(LEIA-SE GOL)Antes de escritor e de "antifascista"foi bombista, anarquista , agitador caluniador e por fim cumplice material ou moral de um assassinato que se saiba! Na dita casa também está um proto-fascista que se revoltou contra Salazar porque ele não lhe deu o tacho que ele queria.
- Leandro Coutinho Foge cão que fazem Barão.. Para onde? - que me fazem Conde! Parece ser poreciso trazer esta frase á memória dos que estão tão "indignados" com as honras a Aquilino devido á sua militância anti-monárquica.. *ps- A frase em causa é atribuída a Eça..
- Américo Silva. Algés Aquilino queria que o Estado Novo subsidiasse a florestação das suas terras. Como não conseguiu, tornou-se um activista contra a florestação dos baldios.
- Pim Pam Pum Ao ser "profanado", o Panteão Nacional deixa de ter aquele fundo que atinge a alma da gesta heróica. Parece ter chegado a vez da Carbonária...e os traidores de ontem... São heróis hoje...A Maçonaria já todos a conhecemos...e quem.

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