quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Os capitalistas têm radar detector de socialistas

Sustenido

#, aqui o tom é meio elevado.


Thursday, September 27, 2007



Quero contar pra todo mundo o que aconteceu. Eu estava dando tudo de mim, esforçando-me ao máximo nesse emprego, que eu já achava que era meu. Até porque era só uma semana de teste, e uma semana já havia se passado (sexta passada completou-se). Já estávamos na terça e uma funcionária de um cargo um pouco maior, mas que não é gerente me chama para dizer algo importante: Não vai dar para você ficar.
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Eu, que já era anti-capitalismo, agora senti na pele e estou mais raivosa ainda, quero dar um chute nesse sistema ridículo, no qual as pessoas só pensam em si mesmas e no qual as empresas não tem a mínima ética ou bom senso nas relações pessoais.
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Desde que cheguei na locadora eu notei várias coisas erradas ali dentro. Os funcionários que deveriam ser apenas atendentes e vendedores têm que se virar em mil,têm que limpar o chão, passar pano, vassoura e até lavar o banheiro! Não, isso não é normal. Eu limparia o chão numa boa, desde que isso estivesse incluso no combinado. Eles não dizem nada sobre isso na entrevista. O salário dos funcionários é uma vergonha, um pouco mais de um salário mínimo e eles (donos) recebem cerca de 1.000 reais nas terças e quintas e 1,050 nos outros dias da semana, e acredito que varia de 1,200 a 1,500 nas quartas, sextas e sábados. Esses números multiplique por 3, que é o número de locadoras do mesmo dono. Isso dá mais de 200.000 mil reais!
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Mesmo assim, dia de terça e quinta não pagam o segurança para economizar. Um absurdo nos dias de hoje, uma loja sem segurança. Pagam faxineira dois dias na semana apenas, para que nos outros dias os funcionários tenham o trabalho que deveria ser dela.
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Ninguém gosta do supervisor e a fofoca rola solta. Ele que me chamou, ele que deveria me demitir. Mas não, nem teve essa dignidade. Mas ainda preciso perguntar para ele o "motivo" da demissão. Sendo que ele já tinha me dado o papel com os documentos necessários para o contrato. Não entendi nada mesmo. Ou entendi.
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Passei pelas 3 lojas existentes na cidade, e na segunda loja a gerente um dia me chamou para uma reunião, juntamente com o "M", outro garoto em teste. Ela ficou falando por mais de 1h e eu perguntava coisas o tempo todo, enquanto o "M" ficou calado o tempo inteiro. Isso claramente a assustou. Nesse mesmo dia ela viu que eu falo inglês, idioma que ela (gerente) não fala. Eu notei que a maioria dos funcionários tem pouco "conhecimento", por assim dizer.
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Não sou preconceituosa nem me acho melhor que ninguém, mas eu tenho sim mais conhecimento (inclusive sobre cinema) do que a grande maioria dos funcionários dali. Inclusive eu sei mais que a gerente e eu percebi desde esse dia que ela se sentiu ameaçada, sendo que qualquer funcionário pode crescer na empresa. Então ela escolheu o "M" (mas não soube disso logo, me transferiram para o Renascença e me enrolaram mais um pouco).
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Eu fiz de tudo ali com o maior gosto, atendia os clientes com simpatia e presteza, aprendi muita coisa em apenas uma semana, arrumava o paredão, indicava filmes, conversava com os clientes, até com as crianças, não tive nenhuma falta nos dias em que abri o caixa, chegava no horário (o único dia em que cheguei 5 minutos atrasada eu liguei antes para avisá-los, como eles ordenaram), quando tinha qualquer dúvida perguntava para os mais "experientes", e o mais importante: tratava o cliente como gente, e não como um meio de ganhar dinheiro. MUITOS clientes me elogiaram e disseram gostar do meu atendimento e de minhas indicações. Até porque, eu quis levar para a locadora algo que eles não tinham: atendentes que viam o cinema como arte. Quando algum cliente chegava e queria um filme de arte, eu sabia o quê indicar, coisa que ninguém mais sabia ali.
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Já "M" foi criticado por outros funcionários, pois o mesmo só pensava em vender videocheques para ser elogiado no fim do mês, só gosta de ficar no caixa; não atende bem os clientes, não gosta de ir ao salão indicar filmes, não entende muito de cinema, não entende nada de diretores, só sabe dizer que o filme é "massa" ou "não tem fundo(?)", não sabe falar português direito, usa muitas gírias, não gosta de arrumar filmes... enfim.
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Então, qual seria o motivo além de que sou uma ameaça? Parece que estou me auto-afirmando, mas eu realmente não fui a única a pensar assim. Todos concordaram comigo. É a velha lógica capitalista: os porcos burgueses contratam os burros para trabalharem como loucos e sem reclamar, como acontece no clássico "A revolução dos bichos" de George Orwell.
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Não querem pessoas eficientes, inteligentes e que entendem de arte, apesar de ser uma empresa que vende arte, mas os próprios nem sabem disso. Fizeram a escolha errada, vão se ferrar. Apesar de demorarem para se tocar, alguns funcionários já estão se cansando de tanta exploração e um dia as coisas vão reverter... "finally the tables are starting to turn", como diz Tracy Chapman.
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Ao mesmo tempo que sinto raiva, sinto alívio. Vou poder estudar melhor, estou livre de algo com o qual não concordava, não vou ajudar os porcos capitalistas a ganharem dinheiro; vou poder tirar minha soneca pela tarde e ter mais tempo para a família e os amigos, que é o que realmente importa para mim.
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Nunca mais piso naquele mundinho que fede a dinheiro, aquele mundo que para os clientes parece ser uma maravilha, mas que para os funcionários nada mais é que uma necessidade sofrida.
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É. Eu realmente não nasci para a burguesia. Nem na peneira deles eu passei.
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posted by V.S @ 3:59 PM
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