Boletim número 7, 05/2009
PEDAGOGIA MARXISTA
Nesta sociedade, já não se falará de educação iluminista, edificada sobre as formas reificadas e alienadas que são as escolas e os manuais que permitem uma apropriação privada e uma promoção individual, porque as ciências e as artes, de que as massas são privadas, estão ai consignadas ao abrigo, para proveito das classes privilegiadas.
A socialização da apropriação e do usufruto, em harmonia com a socialização já atingida da produção, permitirá abolir as classes dominantes e o próprio proletariado. É isto que implica a eliminação de todos os entraves ao desenvolvimento físico e intelectual do homem, ou seja, antes de tudo a abolição da divisão do trabalho que suscita as classes e as mutilaçõaes que tanto a especialização como a não-especialização dão aos indivíduos. O homem novo, nascido do revoilucionamento das condições materiais da sociedade, e não do treino e da educação iluminista, poderá então desenvolver-se à escala da sociedade inteira e será um homem social. (Roger Dangeville. Karl Marx e Friedrich Engels. Crítica da educação e do ensino)
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SUMÁRIO
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Gramsci e a pedagogia marxista: elementos conceituais para uma compreensão ampliada do que fazer educativo
Thiago Chagas Oliveira
Sandra Cordeiro Felismino
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Pedagogia marxista no Brasil - a contribuição de Dermeval Saviani
Miriam Santos de Sousa
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II Encontro marxismo, história, tempo livre e educação
Elza Margarida de Mendonça Peixoto
Maria de Fátima Rodrigues Pereira
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Curtas...
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PELA DIFUSÃO DO PENSAMENTO MARXISTA NO CAMPO DA PEDAGOGIA
- Editorial -
Lucelma Braga
O debate acerca de uma concepção de educação alinhada aos princípios marxistas é uma necessidade histórica que se coloca de maneira premente na atualidade. No Brasil, os últimos anos da década de 1970 e durante toda a década de 1980 foram profícuos na difusão de um pensamento crítico, bem como na organização política dos professores. Segundo Saviani, este momento histórico pode ser caracterizado pela existência de dois vetores: aquele voltado para a [...] “preocupação com o significado social e político da educação, do qual decorre a busca de uma escola pública de qualidade, aberta a toda a população e voltada precipuamente para as necessidades da maioria, isto é, a classe trabalhadora”; e outro vetor “marcado pela preocupação com o aspecto econômico-corporativo, portanto, de caráter reivindicativo, cuja expressão mais saliente é dada pelo fenômeno das greves que eclodiram a partir do final dos anos de 1970 e se repetiram em ritmo, freqüência e duração crescentes ao longo da década de 1980” . O vetor cuja preocupação central era com o significado social e político da educação é representado pelas entidades de cunho acadêmico- científico. É notável a expansão quantitativa e qualitativa da produção intelectual dos educadores no período, que se destacou, especialmente, pelo esforço em compreender o fenômeno educativo a partir de seus condicionantes econômico, sócio-político e ideológico. Como parte desse movimento, um volume extraordinário de trabalhos acadêmicos dos mais diversos matizes e de diferentes focos de análise. A expansão dos programas de pós-graduação no país contribuiu decisivamente para o visível avanço em termos de produção de um pensamento crítico, especialmente alinhado à tradição marxista, levando os educadores insatisfeitos com a atmosfera [objetiva e subjetiva] gerada pelos governos militares a participarem ativamente na desarticulação do regime. Este clima efervescente, tanto do ponto de vista da produção intelectual como da atuação política foi se arrefecendo, dada a ofensiva neoliberal que tivemos em enfrentar no decorrer da década de 1990 e que permanece na pauta política das classes dominantes nestes primeiros anos do século XXI. Mas passadas quase três décadas, tanto as análises críticas empreendidas em profusão naquele contexto, como as reivindicações delas decorrentes, permanecem atualíssimas. Vários educadores compreendendo desse modo a questão deram “passos” no sentido de reafirmar a concepção marxista de homem e de sociedade. Um exemplo conspícuo desse esforço tem sido a realização do Encontro Brasileiro de Educação e Marxismo (EBEM), já em sua quarta edição, bem como a organização de vários grupos de estudos e pesquisas marxistas, como o próprio MHTLE, que tem socializado o pensamento marxista sistematicamente através do seu Boletim e da Revista Germinal, Marxismo e Educação em Debate, que será lançada brevemente.
Nesse sentido, urge participarmos deste esforço e aprofundarmos o debate. A idéia inicial desta edição do Boletim Germinal era resgatar o pensamento dos marxistas clássicos que se dedicaram ao tema da educação. O leitor perceberá que ainda temos muitos passos a dar nesta direção, de modo que entendemos que este debate deve continuar numa próxima edição de nosso Boletim. Para inaugurarmos o debate sobre a Pedagogia Marxista, contamos com a contribuição de vários autores. O relato realizado pelos autores Bergamo, Magagnato e Scarpim acerca do experimento pedagógico vivenciado da União Soviética, no período de 1959 a 1984, traz importantes elementos sobre a reorganização dos conteúdos e métodos próprios da atividade escolar naquele contexto, fornecendo-nos pistas importantes para nossas pesquisas. Também nesse sentido, temos o texto de autoria de Malila Roxo, sobre as contribuições de Pistrak. A autora retoma a clássica relação entre educação e trabalho, com vistas a contribuir com a questão de um método marxista para a educação escolar. O texto de Oliveira e Felismino, intitulado Gramsci e a Pedagogia Marxista: elementos conceituais para uma compreensão ampliada do que fazer educativo, historiciza as contribuições deste intelectual e marxista italiano das primeiras décadas do século XX, acerca de um processo educativo empenhado em promover a elevação cultural e política das massas, vista como condição indispensável ao projeto revolucionário de transformação da sociedade de classes. Os autores DÁgostini e Titton trazem para a nossa reflexão uma questão cara ao pensamento marxista, a articulação teoria e prática. Partindo da compreensão de homem em Marx, os autores apontam as repercussões desta compreensão do âmbito da educação escolar e dos desafios desta na superação da “alienação decorrente da subsunção real do trabalho ao capital”. E por fim, a autora Miriam Sousa aponta a influência da pedagogia marxista no Brasil, destacando a contribuição de Dermeval Saviani, através da elaboração da Pedagogia Histórico-crítica. Em seu texto, Miriam Sousa afirma que ao recuperar a categoria marxista da contradição e reafirmar “as relações dialéticas que se estabelecem entre educação e sociedade”, Saviani supera o pensamento crítico, porém não marxista, uma vez que reconhece a contribuição da instituição escolar na construção de uma sociedade democrática. Com este novo número do Boletim Germinal esperamos dar continuidade ao trabalho, realizado pelo MHTLE, de difusão do pensamento marxista, em suas mais variadas potencialidades de debate, neste caso com o campo da Pedagogia.
Boa leitura.
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A PEDAGOGIA MARXISTA: TEORIA E PRÁTICA
Adriana D’Agostini
Mauro Titton
A Pedagogia, enquanto ciência prática que tem por objeto de estudo a educação, reflete em suas diferentes concepções e correntes uma disputa que tem sua origem na própria maneira de interpretar e explicar o mundo, ou seja, está diretamente vinculada à luta travada no desenvolvimento do pensamento e do conhecimento humano e suas explicações, que por sua vez vinculam-se ao desenvolvimento do homem ao longo da história, que até então é a história das lutas de classes. Disso decorre a necessidade de explicitarmos, ao falarmos em Pedagogia Marxista, qual é a compreensão de mundo e como o explicamos, para permitir compreender por que a necessidade de uma Pedagogia Marxista, ou dito de outra forma, uma Pedagogia concreta.
Nos Manuscritos Econômicos e Filosóficos Marx (2004) irá delinear pela primeira vez de forma sistemática a compreensão do homem enquanto ser da natureza que cria e recria pela sua atividade vital – o trabalho – a sua própria existência, diferenciando-se dos demais animais, que para garantir sua vida adaptam-se a natureza, pois já nascem regulados para dar um mesmo padrão de respostas aos diferentes estímulos e necessidades que se apresentam ao longo da vida. Já o homem, ao transformar a natureza cria um mundo humanizado – que Lessa (2002) irá chamar de o “mundo dos homens”. Colocando, portanto, nas mãos do homem o processo pelo qual ele próprio, por sua práxis, se constrói como homem, Marx (1983) irá demonstrar em O Capital, de forma mais clara, que a história humana é produto da ação humana intencional, confrontando-se com uma larga tradição que via a história e o mundo como expressão de vontades alheias ao homem.
Com esta compreensão de mundo – aberto, em que a história é feita pelos homens, e não teleologicamente guiada, já que o trabalho é a ação que projeta teleologicamente o futuro humano – fica claro que o homem necessita de um longo processo de apropriação dos elementos culturais que foi construindo ao longo da história para garantir sua vida, ou dito de outra forma, necessita ser educado para desenvolver-se como ser humano. Nas sociedades primitivas, como demonstra Ponce (2003), esse processo de educação dava-se no próprio processo de trabalho. Porém, com a divisão da sociedade em classes, e com a divisão social e técnica do trabalho, haverá uma separação também do processo de educação do processo de trabalho, e pela primeira vez serão criadas instituições sociais específicas para isso. Saviani (2005) irá demonstrar que com o surgimento de uma classe que vive do trabalho alheio, apropriando-se, para viver, do que é produzido por outros, ou seja, vive no ócio, surge também a escola, palavra que irá denominar a instituição que se encarregará da educação dos que não trabalham, e que em grego significa exatamente o lugar do ócio. Portanto, se antes a educação do homem era definida pelo próprio processo de trabalho, com a divisão da sociedade em classes irá dividir-se entre aquela destinada aos proprietários e aquela destinada aos não proprietários dos meios de produção. Ora, como ciência prática que estuda a educação, é nesse momento que à Pedagogia caberá responder como instituir o processo educativo relacionando-o aos interesses de uma determinada classe.
Entretanto, ao longo da história, desde a Grécia antiga, passando por Roma, pela Idade Média e chegando ao período inicial de instituição da sociedade burguesa, não havia sido colocado claramente tal problema nesses termos: a necessidade de respostas às questões educacionais do ponto de vista de uma determinada classe, ainda que o fizesse sempre em referência a uma. Será com o desenvolvimento da teoria marxista que o problema será formulado nestes termos, e se buscará articular o processo educacional realizado em instituições formais às lutas sociais de uma determinada classe, no caso da tradição marxista, a classe trabalhadora.
O desenvolvimento da Pedagogia no último período teve influência marcante da teoria marxista, quando não sendo desenvolvida nesta perspectiva, pelo envolvimento das demais teorias na contraposição às idéias marxistas. Porém, será no campo da pedagogia marxista – com o avanço e o aporte das demais ciências da educação fundamentadas no marxismo – que teremos contribuições extremamente significativas, sobretudo pelas experiências realizadas durante os períodos revolucionários dos séculos XIX e XX.
Segundo Dangeville (1978), a característica marcante da pedagogia marxista é que seu desenvolvimento no ocidente se deve à busca de uma educação contra a educação instituída nas sociedades capitalistas, enquanto nos países socialistas do leste europeu pelo desenvolvimento, sistematização e reflexão das experiências de articulação da educação e trabalho.
É imprescindível reconhecer que atualmente as pedagogias do capital estão inscritas nas teorias pedagógicas neoprodutivista, neotecnicista e neoconstrutivistas, as pedagogias do “aprender a aprender”, que negam ou secundarizam tais relações. Estas pedagogias hegemônicas são formuladas, divulgadas e defendidas pelos Organismos Internacionais do capital com a finalidade de formar o trabalhador necessário a manutenção de seu sistema sócio-metabólico.
Para nós, o avanço da Pedagogia marxista tem alguns pressupostos essenciais. Partindo da compreensão de mundo e de homem já delineadas acima, e tendo sempre como referência que o desenvolvimento de uma pedagogia marxista nas sociedades capitalistas se dá por contradição, e, portanto, contra a educação burguesa e suas pedagogias, outro elemento imprescindível a ser destacado – e que está na base de intensa polêmica no campo marxista, mas que pela negação ou pela afirmação fundamentam as proposições – é a relação educação e trabalho. Realizar uma profunda crítica das relações sociais próprias da realidade atual é indispensável se a intenção for de apreender os elementos essenciais de uma proposição pedagógica articulada à luta pela superação do capital.
A compreensão do trabalho como a atividade fundante do ser social – em sua dimensão ontocriativa – é imprescindível, porém, insuficiente. Como nos alerta Kopnin (1978) toda categoria tem um conteúdo lógico e histórico, logo, ao refletir sobre as relações trabalho e educação na atualidade, a forma que o trabalho assume sob o domínio do capital não pode ser esquecida. Pelo trabalho, o homem vai respondendo aos desafios e necessidades, construindo novas necessidades e impulsionando o desenvolvimento de novas habilidades e conhecimentos, num processo incessante. É neste processo que se desenvolvem a técnica, a ciência e a tecnologia, que permitem aumentar a produtividade do trabalho e, virtualmente, liberar progressivamente o homem do tempo despendido no reino da necessidade para o reino da liberdade. Porém, sob as relações de produção atuais, há uma potencialização do aspecto desumanizador do trabalho quando se incorporam os produtos humanos, como a ciência, a técnica e a tecnologia aos processos produtivos, ampliando a alienação.
Com isso, a pedagogia não pode deixar de questionar como educar em tempos de aprofundamento da barbárie, de profunda alienação decorrente da subsunção real do trabalho ao capital. A teoria pedagógica, portanto, sofre os impactos do processo de alienação. Freitas (1987) irá demonstrar que se a realidade é dialética, não há esferas da vida humana que fiquem “isoladas” da totalidade de relações em que os homens produzem sua vida, e, portanto, à Pedagogia cabe identificar na totalidade dos processos educativos as regularidades que permitem avançar na elaboração da teoria pedagógica e contribuir para a atividade educacional desenvolvida numa instituição social inserida na sociedade cindida em classes, sem perder do horizonte um projeto histórico claramente explicitado.
Quando tomamos fatos concretos em sociedades que buscaram empreender a superação do capital, há maior clareza de como a articulação da totalidade social com a vida escolar, e com o desenvolvimento da Pedagogia, permitiram avanços que não podem ser alcançados em sociedades de sociabilidade subsumida de maneira formal e real ao capital. Exemplo mais contundente pode vir de regiões que ainda hoje estão na luta contra o capital, onde formalmente não há o domínio de seu sistema social, e que apesar de serem pobres, tem alcançado enormes avanços nas ciências, como é o caso de Cuba. Apesar do longo enfrentamento com o imperialismo, houve avanços impensáveis em uma sociedade pobre como a cubana em áreas das ciências que nos países capitalistas estão integradas e subordinadas à produção tipicamente capitalista.
As ciências da educação, e em especial a Pedagogia, sofrem diretamente o impacto do desenvolvimento das demais ciências, pois se é possível “separar” o conhecimento sistematizado por áreas, a realidade é uma totalidade complexa de mediações e relações que não pode ser separada. O desenvolvimento da Pedagogia marxista, ao buscar identificar a relação entre as particularidades, a singularidade e a totalidade dos fenômenos e referi-los a um projeto educacional, o faz sustentada pelo avanço geral do conhecimento, dando seu importante aporte ao permitir realizar o processo educacional com uma intencionalidade dirigida.
Portanto, uma pedagogia pode ser reconhecida como marxista quando a educação é pensada e praticada a partir de uma lógica materialista dialética, que leva em conta o desenvolvimento histórico do homem, da sociedade e da educação e se propõem a pensar teleologicamente a educação tendo como referência o projeto histórico socialista e a crítica e a explicitação das contradições da educação e da sociedade capitalista.
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LA COMUNA DE PARIS - EDITORIAL PROGRESO
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GRAMSCI E A PEDAGOGIA MARXISTA: ELEMENTOS CONCEITUAIS PARA UMA COMPREENSÃO AMPLIADA DO QUE FAZER EDUCATIVO
Thiago Chagas Oliveira1
Sandra Cordeiro Felismino2
Expressão eloquente da tradição marxista, Antonio Gramsci (1891 – 1937) ocupou-se ao longo de sua vida da análise das relações entre as condições objetivas do modo de produção capitalista e a organização cultural que movimenta o mundo ideológico, objetivando apreender as determinações histórico-sociais a serem consideradas na preparação da revolução proletária. Suas ideias são particularmente importantes para a Pedagogia porque em seu pensamento a Política assume validade pedagógica, isto é, uma vez que a formação de uma hegemonia de novo tipo pressupõe a elevação intelectual, política e cultural das massas trabalhadoras, a questão educativa emerge como problema fulcral em sua estratégia revolucionária.
Cronologicamente, a produção bibliográfica gramsciana divide-se em quatro etapas que refletem os momentos histórico-políticos vividos pelo autor. A primeira corresponde aos escritos produzidos durante a 1ª Guerra Mundial (1914-1918) e é marcada pela fusão entre sua produção teórico-política e sua intensa atividade jornalística de organizador e propagandista de cultura proletária. Os escritos dessa época tratam de vários temas, com particular destaque para as questões que envolvem as relações entre socialismo, educação e cultura. Revelam, ainda, os primeiros posicionamentos de Gramsci a propósito do papel desempenhado pelos organismos de luta do movimento operário na elaboração e desenvolvimento de trabalhos educativo-culturais capazes de propagar uma nova concepção do mundo – proletária e revolucionária. Num texto de 1917, por exemplo, ele diz: “Os burgueses podem até ser ignorantes. Mas não os proletá¬rios. Os proletários têm o dever de não ser ignorantes” (2004, p.117).
A produção jornalística desse período é marcada por uma variedade infinita de interesses. Para além de assuntos especificamente políticos, Gramsci revela uma abertura intelectual de amplo alcance. Só em 1916, são cerca de 600 artigos que tratam dos mais variados temas (economia, religião, pedagogia, artes, moral, etc.). Seus escritos traduzem a rica interlocução estabelecida por Gramsci com intelectuais de diversos campos de atuação (filósofos, militantes do movimento operário), por meio da qual problematiza, critica, cria polêmicas, chama para o debate. De fato, com os principais representantes das duas grandes tendências do Partido Socialista Italiano (PSI), a tendência reformista, representada por Felipo Turati e Cláudio Treves e a maximalista, chefiada por Serrati. Já nesses escritos, ele recusa a ideia defendida pela ala reformista do PSI, que defendia a luta pelos direitos dos trabalhadores dentro da ordem democrático-burguesa, bem como a ideia proclamada pelos socialistas positivistas, que, por julgarem ter a história ao seu lado, consideravam que a agudeza das contradições geradas pelo capital, realidade de per se revolucionária, levaria inexoravelmente ao socialismo. Gramsci, crítico do espontaneísmo e atento aos riscos de certo personalismo e burocratismo no núcleo do PSI, deixa claro que a participação ativa dos trabalhadores era de fundamental importância para o sucesso da revolução socialista. Para ele, o trabalho de formação política, além de contribuir para o engajamento consciente e crítico dos militantes, deveria auxiliar a classe operária a superar uma visão meramente econômico-corporativista.
A segunda etapa corresponde aos escritos do pós-guerra (1919-1920) ou bienio rosso. A análise desses textos explicita a importância da subjetividade na elaboração histórica ao demonstrar que o processo revolucionário não se reduz às dimensões econômicas e políticas, mas entrelaça-se à realização de trabalhos pedagógicos capazes de sedimentar a consciência de classe dos trabalhadores. Revela que os conselhos de fábrica, os partidos e as associações proletárias desempenham papel importante na formação política dos trabalhadores, na medida em que desenvolvem atividades pedagógicas que funcionam como elemento de denúncia e crítica à sociedade capitalista. Nesses escritos, gesta-se a noção de que a revolução socialista, para além de um ato insurrecional ou simplesmente de tomada do poder governamental burguês, é um processo que exige a transformação radical das relações sociais de produção e de distribuição capitalistas. A partir do potencial revolucionário hipotecado aos conselhos de fábrica de Turim, Gramsci demonstra que os trabalhadores se formam no e pelo trabalho, destacando, ainda, a necessidade de eles elaborarem uma consciência de classe fortalecida pela preparação cultural. Destacam-se, sobretudo, as iniciativas educativas e culturais do grupo L´Ordine Nuovo.
A terceira etapa (1921-1926) reúne os artigos produzidos durante a ascensão do fascismo, os quais foram elaborados sob o influxo da reflexão de Gramsci acerca da primeira fase de atuação do Partido Comunista Italiano (PCI), quando de sua permanência em Moscou (1922 a 1923) e em Viena; momento também em que ele traça algumas perspectivas acerca do futuro político da Itália (consolidação e ascensão do fascismo). Data dessa época o famoso escrito sobre A Questão Meridional.
Por fim, temos o período carcerário (1926-1937), quando Gramsci escreveu 33 cadernos que continham quase 3.000 páginas. Após o término da Segunda Guerra Mundial, esses escritos foram organizados, editados e publicados em italiano. Ressalte-se que o núcleo central da reflexão carcerária gravita ao redor do desenvolvimento de uma teoria revolucionária capaz de fazer frente aos obstáculos contrarrevolucionários produzidos pelo capitalismo avançado.
As possibilidades formativas em Gramsci são equacionadas em função dos interesses de classe do proletariado e resolvidas como um problema de classe. Esta tese tem como corolário a noção de que em seu pensamento a educação possui uma dupla determinação: negativa, uma vez que não existem condições objetivas para a efetivação de uma educação voltada ao desenvolvimento integral da personalidade humana (omnilaterlaidade) numa sociedade que se erige a partir da valorização das necessidades de expansão indefinida do capital e não das necessidades humanas; mas, ao mesmo tempo, positiva, na medida em que o movimento contraditório da luta de classes entre capital e trabalho abre a possibilidade de desenvolvimento de ações formativas que, geradas e desenvolvidas no âmbito da sociedade civil, contribuem para a formação de um trabalhador de novo tipo, isto é, preparado para dar prosseguimento ao trabalho de construção do Estado socialista. Outrossim, a formação de uma hegemonia de novo tipo em Gramsci assenta-se numa dupla determinação: de um lado o surgimento de uma massa revolucionária capaz de se preparar e se organizar para a gestão da nova sociedade; de outro, a necessidade de potencializar suas lutas contra o capital com iniciativas educativo-culturais que permitissem aos trabalhadores a compreensão da totalidade do processo produtivo. Nos Quaderni del carcere, este processo se traduz na terminologia “reforma intelectual e moral”, que aponta para a necessidade de unidade orgânica entre as forças operárias e camponesas e os intelectuais. Isto porque, na medida em que a reprodução do capital não exige apenas a renovação dos meios de trabalho, mas também a interiorização, mediante o desenvolvimento da educação burguesa (entendida em sentido amplo), dos valores e da moral necessária à reprodução social capitalista (MARX, 2003, p.851), Gramsci aposta, como resposta à dominação cultural capitalista e como parte integrante do processo de formação da consciência de classe, na necessidade de difusão do marxismo no seio da classe trabalhadora.
Ao vincular o projeto pedagógico de elevação intelectual das massas ao projeto revolucionário de transformação da sociedade de classes, Gramsci recupera a ideia marxiana segundo a qual o homem, ao transformar a sociedade em que está inserido, se transforma, se forma e se educa. À luz dos fundadores do marxismo, temos a noção de que, à medida que os trabalhadores vão se organizando em associações, sindicatos e em partidos políticos, sua luta contra os capitalistas vai se fortalecendo; eles vão adquirindo consciência de sua força e, deste modo, vão se formando como classe antagônica ao capital. Para Gramsci, na medida em que a necessidade de desvelamento da estrutura funcional capitalista se transforma em estímulo para o desenvolvimento intelectual dos trabalhadores, a luta organizada contra o capital deixa de ser apenas econômico-política e passa a ser também uma luta cultural. Destarte, “A estrutura da força exterior que esmaga o homem, que o assimila e o torna passivo, se transforma em meio de liberdade, em instrumento para criar uma nova iniciativa.” (1975, p. 1244).
O emprego correto dessas reflexões no conjunto da obra gramsciana nos permite fazer a crítica à tendência reducionista que define o conceito de escola simplesmente como organização escolar formal. Quando Gramsci assevera a importância da escola na desarticulação da ideologia dominante e de elaboração de uma forma superior de cultura (nova concepção do mundo), ele compreende o significado de escola em sentido ampliado, situando-se no próprio terreno da hegemonia como síntese teórico-prática do movimento revolucionário de transformação social que exige organicidade, seja do pensamento filosófico, seja da solidez organizativa e de centralização cultural. Em conformidade com o princípio de unidade entre teoria e prática exposta por Marx na II Tese sobre Feuerbach, portanto, crítico ao tratamento escolástico da questão, Gramsci concebe essa ‘unidade como devir histórico, como ponto de chegada do movimento universal da classe operária, mediante o qual as contradições específicas do modo de produção capitalista serão superadas. Esta concepção não guarda similitude com os “devaneios didaticistas” que brotam de cabeças idealistas que povoam o meio escolar. À luz do pensamento de Gramsci, portanto, podemos acentuar que a escola não se reduz ao aparelho escolar convencional, mas engloba um conjunto de organismos oriundos do mundo do trabalho potencialmente formativos: escolas de partido, instituições de elaboração da vida cultural, como revistas e jornais operários (a célebre experiência de L’Ordine Nuovo, por exemplo), meios para organizar e difundir determinados tipo de cultura, como clubes, associações culturais, institutos de cultura popular, etc.
Ressalte-se, contudo, que o reconhecimento da negatividade da organização escolar formal não significa desconsiderar, sem mais, suas possibilidades na criação e difusão de uma concepção de mundo que atenda aos interesses históricos dos trabalhadores, ainda que sob os marcos do capitalismo. Se, organicamente vinculada ao movimento operário de transformação do real (seja no sentido industrial, seja no senso político), a escola convencional pode vir a auxiliar na divulgação de uma nova concepção do mundo (GRAMSCI, 1975, p.1540). Quando esse for o caso, para que essa função não seja realizada de forma idealista e romântica, faz-se necessária sua vinculação com um projeto revolucionário e sua articulação com os diversos organismos culturais formativos oriundos do mundo do trabalho, em especial, com o partido revolucionário, na luta pela elevação intelectual, moral e cultural das massas.
1Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira (UFC)
2Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira (UFC).
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RELATO DE UM EXPERIMENTO PEDAGÓGICO NA UNIÃO SOVIÉTICA
Geraldo Antonio Bergamo
Pamela Cristina Magagnato
Simone Scarpim
FC – UNESP Bauru
Neste trabalho apresentamos um resumo do Experimento Formativo (EF) que ocorreu na então União Soviética, no período de 1959 a 1984, sob a supervisão de Elkonin e Davídov.
Daniil Borísovich Elkonin foi um dos mais eminentes psicólogos soviéticos e professor, combinando o trabalho científico com o trabalho pedagógico. Seu caminho na ciência se definiu nos anos em que trabalhou sob a direção de L. Vigotski. O círculo de interesses científicos de Elkonin foi amplo, pois estudou o desenvolvimento da personalidade da criança, a formação do pensamento, da linguagem, a assimilação da leitura e da escrita. Dedicou especial atenção à formação dos distintos tipos de atividade infantil, em especial a atividade dominante nos diferentes períodos evolutivos (o conceito de atividade dominante foi elaborado em conjunto por Elkonin e Leontiev).
Vasili Vasílievich Davídov, doutor em ciências psicológicas e professor, foi chefe do laboratório do Instituto de Investigação Cientifica de Educação Pré-escolar da Academia de Ciências Pedagógicas da URSS. Trabalhou na área da psicologia evolutiva e pedagógica, em particular, das crianças de idade pré-escolar e escolar inicial. Elaborou teorias originais sobre a atividade de estudo dos alunos e sobre o desenvolvimento do pensamento no processo do ensino.
A equipe de pesquisadores do EF contou com pedagogos, psicólogos, lógicos, filósofos, cientistas e artistas das áreas de conhecimento referentes às disciplinas de matemática, física, artes plásticas e língua russa. O pressuposto de partida do EF foi que crianças de 7 a 10 anos de idade possuem amplas reservas cognitivas, sendo-lhes possível formar bases para um pensamento teórico. Organizou-se como experimento de natureza teórico-prática orientado para a aprendizagem dos conteúdos das disciplinas pelo trânsito lógico do geral para o particular, desde as séries iniciais.
Fundamentou-se no que havia de mais desenvolvido na psicologia soviética, cujo objeto é entender o desenvolvimento do psiquismo na sua unidade com a atividade social de produção, o trabalho social.
No desenvolvimento do psiquismo na criança, a unidade dá-se primeiro, com a atividade lúdica e, em seguida, com a atividade escolar, ambas entendidas como atividades reprodutivas do conhecimento, dos princípios artísticos e das normas e padrões acumulados sócio-historicamente.
No desenvolvimento dessas atividades as crianças não estão passivas. Elas realizam ações correspondentes àquelas realizadas nas práticas sociais de produção de conhecimento e, paulatinamente, internalizam essas ações como operações do seu próprio pensamento desenvolvendo novas e superiores funções psíquicas que se integram numa estrutura mais complexa do psiquismo. Se por um lado as atividades lúdicas e escolares são representativas no tocante ao conhecimento já acumulado (as crianças não criam novos conceitos ou princípios artísticos), por outro lado elas são produtivas de novos sujeitos, são meio para o desenvolvimento de um psiquismo que ascenda ao estágio de um pensamento capaz de controlar a própria conduta, isto é, a um psiquismo do sujeito autônomo.
As atividades lúdicas e escolares são atividades dominantes em estágios distintos e sucessivos da vida da criança. Atividade dominante é aquela que gera novas atividades, reorganiza os processos psíquicos e é um elemento importante na formação de personalidade. Chamá-la-emos de atividade desenvolvente, pois contribui para o surgimento de neoformações psíquicas.
Quanto à atividade escolar é importante ressaltar a afirmação de Vigotski que o desenvolvimento cognitivo não precede a aprendizagem escolar, ao invés disso, são os processos adequados de aprendizagem que irão conduzir para o surgimento de neoformações psíquicas (Vigotski, 2001). Já quanto à passagem da atividade lúdica para a escolar desenvolvente é importante ressaltar que
Nos casos normais, a mudança do tipo de actividade da criança e sua passagem de um estádio a outro respondem a necessidade interior nova e estão ligadas a novas tarefas postas à criança pela educação e correspondem às suas possibilidades novas, à sua nova consciência, (LEONTIEV, 1978, p.296).
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No EF soviético, para que a atividade escolar seja desenvolvente e responda à atual complexidade social produtiva, foi feita uma reorganização de conteúdos e métodos desde as séries iniciais. Em primeiro lugar, para ser desenvolvente, o conteúdo do ensino escolar deve ser os conhecimentos teóricos. Em segundo, desse tipo de conteúdo devem se derivar os métodos para organizar o ensino. O norteador principal dos métodos didáticos foi a adequação, para as respectivas disciplinas, do método de exposição da ciência de referência. Note-se que o método de exposição científica baseia-se no processo de ascensão do abstrato ao concreto. Para tanto houve uma elaboração de atividade escolar específica, em muitos pontos, contraposta à atividade escolar vigente. Essa atividade específica do EF, aqui denotada como atividade de estudo, funda-se na teoria de atividade de Leontiev, mas introduz características próprias que significam um aprofundamento teórico-prático.
Em resumo, a estrutura da atividade de estudo compõe-se de:
• tarefas de estudo, estreitamente ligadas à generalização substancial (teórica). Já para se conseguir um estágio em que a colocação de tarefas de estudo é feita pelo próprio estudante, pressupõe o desenvolvimento de motivação para o estudo e transformação da criança em sujeito da atividade;
• ações de estudo, sistematizadas para destacar as relações gerais, os princípios diretivos e as ideias chave da área que se está estudando. Envolve ações referentes à concretização de relações gerais e o inverso, à passagem de modelos aos objetos e o inverso;
• ações de controle e avaliação da tarefa de estudo, que devem ser realizadas pelo próprio estudante.
As ações de estudo para realizar a tarefa de estudo são as seguintes:
1ª Encontrar a relação inicial (geral) que contém os elementos essenciais do todo a ser estudado (a “célula”).
2ª Modelar a “célula” em forma gráfica, objetual e simbólica.
3ª Transformar os modelos para o entendimento das propriedades.
4ª Particularizar a “célula” mediante um sistema de tarefas particulares.
O caminho do conhecimento acima assinalado tem dois traços característicos. Em primeiro lugar, o pensamento dos alunos se move orientadamente do geral ao particular (de inicio buscam e fixam a célula geral do material a estudar e em seguida, apoiando-se nela, deduzem as diversas particularidades do objeto dado). Em segundo lugar, tal assimilação está orientada para que os alunos explicitem as condições de origem dos conteúdos dos conceitos que assimilam. Os alunos primeiro descobrem a relação geral inicial em certa área, constroem sobre essa base a generalização substancial e, graças a isso, determinam o conteúdo da célula. (DAVÍDOV, 1988, p.175)
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As ações de avaliação e controle permitem ao aluno saber se ocorreram as condições, os meios e as operações do pensamento adequadas para a finalidade da tarefa proposta, ou seja, permite ao estudante ter conhecimento se de fato estava inserido na atividade e com que intensidade ela foi realizada.
A realização de todos esses momentos da atividade de estudo significa a formação, no aluno, do conceito teórico que, no final, lhe permite estabelecer uma relação imediata entre a abstração inicial expressa na “célula” e as singularidades realizadas na resolução do sistema de tarefas particulares.
Essa concepção de formação de conceito diverge daquela da lógica formal, segundo a qual um conceito é dado por sua definição formal que fixaria os traços comuns de uma classe de objetos ou fenômenos e daí, a proposição segundo a qual um conceito estaria formado no aluno se ele é capaz de relacionar uma classe com seus elementos singulares. A atividade escolar vigente, baseada nas concepções da lógica formal, forma nos alunos um pensamento empírico (comparador, discriminador e classificador de traços comuns, mas que não possui, em grau desenvolvido, recursos para distinguir se os traços destacados são essenciais ou casuais).
Já a atividade de estudo segue o trânsito lógico do geral ao particular e prima pela formação do pensamento teórico, que por sua vez opera por conceitos em que se busca encontrar e analisar a essência, o movimento, os nexos internos do objeto estudado e este na sua relação com o todo.
A reformulação de conteúdos e métodos, para cada uma das disciplinas do ensino experimental baseou-se nessa teorização para a atividade de estudo e, tendo em conta a ascensão do abstrato ao concreto, nas seguintes teses lógico-psicológicas:
1. A assimilação dos conhecimentos que têm um caráter geral e abstrato precede a familiarização dos alunos com conhecimentos mais particulares e concretos; estes últimos são deduzidos pelos próprios alunos do geral e abstrato enquanto seu sistema unitário.
2. Os conhecimentos que constituem determinada disciplina são tais que suas principais partes são assimiladas pelos alunos no processo de análise das condições de seu surgimento, graças a qual tais conhecimentos tornam-se indispensáveis.
3. Na revelação das fontes objetivas de tais ou quais conhecimentos os alunos devem, sobretudo, saber descobrir no material estudado a relação geneticamente inicial, essencial, universal, que determina o conteúdo e a estrutura do objeto do conhecimento.
4. Os alunos reproduzem essa relação em especiais modelos objetuais, gráficos e semióticos, os quais permitem estudar suas propriedades em forma “pura”.
5. Os alunos devem saber concretizar a relação geneticamente inicial, universal do objeto de estudo no sistema de conhecimentos particulares sobre ele, os quais simultaneamente, devem manter-se em uma unidade que assegura os trânsitos do geral ao particular e o inverso.
6. Os alunos devem saber passar do cumprimento de ações mentais para sua realização no plano externo e o inverso. (Ibidem, p. 193)
Por exemplo, em matemática para as séries iniciais, o conceito de número, pela teoria da atividade de estudo é enraizado por sua ideia chave: a de grandeza. Esta ideia de grandeza é a “célula” do conteúdo a ser estudado e pode ser modelada por uma relação indissolúvel de duas grandezas de mesma espécie e um número. Tal relação e seu modelo na forma simbólica G/u = n deve estar presente nas séries iniciais e ser a base para o desenvolvimento do conceito de número e não partir do número natural simplesmente em vínculo com a contagem conforme é feito no ensino vigente. Isso também significa que as ideias algébricas conduzem o aprendizado da aritmética e não o oposto como na escola vigente.
Para a realização do EF foram criadas escolas experimentais espalhadas pela Rússia e uma escola de formação de professores em Moscou. Durante sua realização, para as três séries iniciais, constatou-se que todo o conteúdo de matemática das três primeiras séries vigentes, mais alguns tópicos importantes, foram desenvolvidos. Isso levou à comparação da aprendizagem de alunos da 3ª série do EF com a de alunos da 5ª série vigente.
Constatou-se que a grande maioria das crianças assimilou os conceitos trabalhados, apresentando compreensão e domínio das operações, bem como capacidade de resolução. Em vários conteúdos os alunos de 3ª série do EF superaram os da 5ª série habitual. Além disso, grande parte dos estudantes demonstrou ter autonomia em relação aos conceitos sendo capazes de deduzirem novas regras de ação com eles. Foi verificado que a atitude autônoma de concretizar o conceito é possível até o término do ciclo de ensino primário, dependendo do tipo de atividade que os sujeitos são postos.
De maneira geral o EF aponta para uma reestruturação possível desde as séries iniciais, de conteúdos e métodos para o ensino que possibilite a formação de conceitos teóricos e a constituição de um sujeito autônomo.
O objetivo geral do EF foi o de transformar o ensino de massas na URSS. Porém, sua maturação experimental ocorreu em época muito próxima da dissolução da URSS, o que abortou sua aplicação ao sistema de ensino como um todo.
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NOTAS PRELIMINARES PARA O ESTUDO DO PENSAMENTO DO PEDAGOGO RUSSO PISTRAK
Malila da Graça Roxo Abreu
Mestranda em Educação
Universidade Federal do Maranhão (UFMA)
malilaabreu@yahoo.com.br
Moisés Mikhaylovich Pistrak (1888-1940) foi um dos mais importantes educadores do desenvolvimento da Pedagogia Socialista na União Soviética, contemporâneo e companheiro de Makarenko e Krupskaya, suas reflexões se constituem em importante contribuição para o desenvolvimento do modelo educacional almejado pela sociabilidade socialista.
O desafio de implementar a Pedagogia Socialista, logo após a Revolução Russa, foi incorporado por Pistrak a partir dos ensinamentos de Karl Marx e Friedrich Engels e das experiências vivenciadas com os seus companheiros pedagogos e militantes socialistas.
Pistrak participou ativamente de encontros com professores logo após 1917 e refletiu sobre as perguntas elaboradas pelos docentes à luz da teoria marxista. Sobre isto, relatou que em reuniões com docentes em congressos, conferências, cursos, debates etc., sempre observou que os professores primários procuravam avidamente respostas detalhadas às questões de práticas metodológicas, didáticas e outras (PISTRAK, 2005).
As perguntas, elaboradas pela massa de professores soviéticos, sempre explicitavam questões práticas do tipo: “Como agir nesse caso?”, “Como aplicar esta ou aquela parte do programa?”, ”Como organizar na escola este ou aquele trabalho?” (PISTRAK, 2005, p.21). Porém, nas reflexões sobre essas questões, Pistrak orientava os professores a partir da teoria pedagógica revolucionária de base marxista, demonstrando o caráter de classe da escola, implícito no desenvolvimento de sua metodologia e em seu conteúdo.
Quanto à relação teoria e prática na organização do trabalho pedagógico, durante o processo de formação de professores, Pistrak faz as seguintes afirmações: em primeiro lugar, “[...] sem teoria pedagógica revolucionária não pode haver prática pedagógica revolucionária” (PISTRAK, 2005, p. 24); em segundo lugar [...] o objetivo principal da “[...] reeducação do professor não é absolutamente fornecer-lhe um conjunto de indicações práticas, mas armá-lo de modo que ele seja capaz de criar um bom método, baseando-se em uma sólida teoria de pedagogia social” (PISTRAK, 2005, p. 25); em terceiro lugar “a teoria pedagógica só se tornará eficaz se boa parte do tempo for dedicado a preparação sociológica dos professores, para que ele se torne um militante ativo” (PISTRAK, 2005, p. 31).
Como se vê, quando Pistrak assume a tarefa de participar de encontros, congressos, conferências, cursos, reuniões e debates para discutir com os professores, pode-se perceber o seu compromisso com a Revolução Socialista, assim como o seu comprometimento e respeito com as inquietações dos professores.
Neste movimento, verdadeiramente democrático e enriquecedor, a reflexão é diferente da propagada atualmente divulgada pelas Diretrizes de Formação de Professores (2002), em vigor no Brasil e em muitos países capitalistas, elaborada sob a égide dos organismos internacionais que, com a chamada “prática reflexiva”, orienta os docentes a fazerem uma reflexão superficial e imediata dos problemas da realidade educacional.
Captando esse movimento, Moraes (2003) expõe, que a política de formação de professores implementada pelo governo que define a experiência cotidiana como o norte, parte de uma concepção de conhecimento reduzida a conversações de estilo confessional entre os sujeitos envolvidos. Tal política de formação, que tem como premissa as experiências dos professores, verbalizadas nos espaços formativos quando estes expõem suas inquietações, desconsidera que as questões apresentadas por estes têm respostas complexas. A complexidade das respostas às questões reside no fato de que vivemos num país situado na periferia da acumulação capitalista.
Num movimento contrário, as reflexões feitas por Pistrak com os professores procuram pautar-se num quadro que articule teoria e prática utilizando, por exemplo, as teorias das ciências sociais e humanas e a reconstrução crítica das experiências individuais e coletivas, que possibilite ao sujeito sair do imediatismo para que possa percorrer o caminho das abstrações sucessivas, mediada pela teoria como forma de superação do real idealizado e só assim efetivar um mergulho em sua situação concreta.
Seguindo esta linha de análise, Pistrak, no processo de formação dos professores, defende a importância do método do materialismo histórico-dialético, proposto por Marx, como conteúdo formativo substancial à construção desta nova pedagogia, devendo, portanto, ocupar um lugar de destaque na reeducação dos docentes. Assim, no currículo de formação dos professores a compreensão “[...] do método marxista deve significar mais da metade do conhecimento da teoria e das concepções comunista sobre educação” (PISTRAK, 2005, p. 26).
Desta forma, o professor deverá compreender a escola na sua totalidade, percebendo-a como uma instituição que não é asséptica, neutra, mas está ligada a um conteúdo a um modo de pensar que exprime a forma como a sociedade está organizada. Neste processo, os estabelecimentos escolares deverão ser abertos às contradições que se desenvolvem na sociedade como um todo. Logo, o professor deverá realizar um movimento em espiral do todo (como a sociedade se organiza) para as partes (a escola, sua organização curricular) e, das partes para o todo, num processo contraditório e complementar para que, só assim, possa compreender as múltiplas situações em que se depara.
Além da necessária articulação da teoria e prática, defendida ao longo de toda a obra de Pistrak, é possível identificar três idéias fundamentais que à luz do marxismo balizaram suas reflexões, são elas: reflexões sobre a relação entre escola e trabalho; a proposta de auto-organização dos estudantes; e a organização do ensino por complexo temático.
Na apresentação da obra de Pistrak (2005), a educadora Roseli S. Caldart destaca que o legado deste pedagogo soviético ajuda a recriar práticas das organizações sociais e dos que reivindicam uma nova escola socialista. Este legado pode ser resumidamente assinalado nos seguintes pontos: 1 - Pensar e fazer uma escola que seja educadora do povo; 2 - A educação é mais que ensino; 3 - A vida escolar deve estar centrada na atividade produtiva; 4 - A escola precisa vincular-se ao mundo do trabalho e ao movimento social; 5 - A auto-organização dos educandos como base do processo pedagógico da escola; 6 - Pensar um jeito de desenvolver o ensino que seja coerente com o método dialético de interpretação da realidade; 7 - Sem teoria revolucionária não há prática pedagógica revolucionária.
Quanto à escola do trabalho, Pistrak se preocupou em fornecer orientações metodológicas para a sua organização no Sistema Educacional Soviético. Neste processo, podem ser sinalizadas algumas perguntas que balizaram o pensamento do pedagogo para organização do Sistema Educacional, são elas: Que formas e que tipos de trabalho podemos indicar para esta ou aquela idade? Em que aspectos certo tipo de trabalho será necessário concentrar a atenção? Qual o valor relativo a diferentes aspectos do trabalho? Como realizar a síntese entre ensino e educação? Quais os métodos gerais de educação devem ser observados no trabalho? (PISTRAK, 2005)
Na busca de respostas a essas inquietações, Pistrak propôs que durante os primeiros anos da Revolução Russa em muitas escolas e, principalmente nas escolas de Educação Infantil, o trabalho doméstico seja usado como princípio educativo. Sobre essa questão, Nogueira (1990) assinala que a participação das crianças nesta forma de trabalho foi anteriormente recomendada por Marx e Engels. A autora afirma, portanto, que “A participação das crianças e dos adolescentes na produção material foi admitida e, até mesmo recomendada por Marx e Engels [...], contudo, a abertura do trabalho não deveria ser reduzida à prática pura e simples de um ofício (NOGUEIRA, 1990, p. 89).
Para Pistrak, a utilidade do trabalho doméstico, como um meio educativo, deverá ser viabilizada na medida em que as crianças percebam sua utilidade e necessidades sociais. Nesse sentido, o objetivo é a utilidade social deste tipo de trabalho, visto que a vida coletiva necessita do trabalho doméstico desde o início da história da humanidade. Atividades, tais como: lavar, limpar, varrer, o trato do corpo, entre outras; fazem parte da vida em sociedade e permitem adquirir bons hábitos e normas necessárias a vida social.
Segundo Pistrak, seria um engano defender a abolição das tarefas domésticas porque seria uma forma de trabalho ultrapassada, destinada a ser rapidamente substituída por formas mais modernas como, por exemplo, restaurantes coletivos, lavanderias coletivas, creches etc. (PISTRAK, 2005, p. 55).
Pistrak não se esquece de afirmar que não há necessidade das crianças executarem todas as tarefas da escola, substituindo o corpo de funcionário da instituição, mas que essas tarefas sejam executadas e analisadas como meio educativo, ou seja, do ponto de vista do seu valor social. É imprescindível acrescentar, sobretudo, que o trabalho doméstico defendido por Pistrak, não deve ser nocivo à saúde física e mental e nem retirar o tempo precioso de estudo da criança.
Sobre o trabalho nas fábricas, este pedagogo defendeu que o estudo da matéria-prima é o ponto de partida onde o educando deve compreender todo o seu processo de produção: seu controle, sua circulação, ou seja, sua economia. Outro estudo necessário é o da máquina-ferramenta, que proporcionaria uma série de conteúdos educativos, tais como: relações sociais de produção, tecnologia, tempo de trabalho, transformação de matéria-prima, imperialismo etc.
Pistrak considera, como outro importante fator educativo, o contato íntimo das crianças com a população operária das fábricas, com sua vida, seu trabalho, seus interesses e preocupações; a participação em todas as manifestações da vida da fábrica (assembléias gerais, cooperativas, clube, juventude comunista, célula do partido...), ou seja, com uma fábrica que se organiza com um modelo de produção diferente.
Deste modo, o trabalho a ser integrado ao ensino defendido por Pistrak, e que foi justificado por Marx e Engels, não é o no sentido do apropriado pelo sistema capitalista que se transforma em valor de troca. Mas, é o trabalho que se liga desde cedo à aquisição pelos trabalhadores de uma formação científica elevada que lhe permita compreender o processo como um todo. Para cumprir essa função, a escola deverá prover formação teórica prática que dê conta de possibilitar aos trabalhadores compreensão e explicação sobre a sociedade em que vive para que o ser humano possa se desenvolver nas suas múltiplas dimensões.
No que se refere a auto-organização dos estudantes, Pistrak afirma que as idéias relativas a esse princípio herdado da pedagogia burguesa devem ser ressignificadas e reinterpretadas para que possa ser conduzido seu desenvolvimento sob a égide dos princípios da Pedagogia Socialista.
A análise feita por Pistrak sobre a auto-organização dos alunos das escolas burguesas expressa que ela se operacionaliza, na maioria dos casos, na distribuição de funções para ajudar o professor, destinada a salvaguardar uma determinada ordem social (PISTRAK, 2005, p.170)
A auto-organização dos estudantes proposta pelo pedagogo russo levará, juntamente com outras questões aqui apresentadas, a superação dos valores presentes na sociedade capitalista e, em última instância, a extinção do Estado. Sobre a extinção do Estado, Pistrak apresenta a obra de Lênin O Estado e a Revolução que considera a mais genial escrita pelo revolucionário russo (PISTRAK, 2005, p 174)
Para a concretização dos objetivos de auto-organização dos estudantes a ser desenvolvido no Sistema Educacional soviético, Pistrak propõe a organização de coletivos de educandos que perpassem desde a infância até a idade adulta.
Dessa forma, será necessária a organização das crianças em coletivos infantis que não nascerão de cima para baixo, mas começarão a aparecer na medida em que surgir a sua necessidade na prática de determinada ação. Nesses coletivos infantis, Pistrak assegura que a participação das crianças deve ser respeitada, porém o pedagogo russo afirma que sem a mediação do adulto as crianças não conseguirão formular e desenvolver seus interesses sociais.
Nesse sentido, Pistrak defende que é preciso encontrar a linha de comportamento justa, evitando sem dúvida, o esmagamento da iniciativa das crianças, a imposição de dificuldades à sua organização, mas permanecendo de outro lado, o companheiro mais velho que sabe ajudar [...] e, ao mesmo tempo, orientar as crianças (PISTRAK, 2005, pp.181-182).
Segundo Pistrak, as crianças devem participar dos Conselhos Escolares para tomar parte no trabalho orgânico da administração da escola e intervir em todos os problemas pedagógicos (e não somente econômicos) (PISTRAK, 2005, p. 200). De forma semelhante, Pistrak discutiu também orientações para outras idades a partir de análise da evolução de experiências no desenvolvimento da Pedagogia Socialista.
No que se refere à organização dos trabalhos das crianças no sistema de complexos temáticos, que se refere à articulação das ciências, será necessário, para que estes sujeitos, que percebam que os conhecimentos não se fecham em si mesmas. Essa percepção deverá ser viabilizada pelo trabalho intelectual e manual das crianças e com a sua auto-organização citada anteriormente.
Desta forma, Pistrak contribui com o objetivo da Pedagogia Socialista que é permitir que o trabalhador consiga, não somente ter acesso ao saber teórico, mas que possa controlar o processo de produção/reprodução (as condições de transmissão) do conhecimento científico e técnico. Busca-se, nesse sentido, acabar com a divisão e apropriação do trabalho pelo capital, contribuindo, assim, que o sujeito se desenvolva, desde seus primeiros anos, em todas as suas dimensões.
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PEDAGOGIA MARXISTA NO BRASIL – A CONTRIBUIÇÃO DE DERMEVAL SAVIANI
Profa. Ms. Miriam Santos de Sousa
Universidade Federal Do Maranhão
Maranhão. 1980. No município de Caxias, a 350 km da capital, São Luís, um grupo de professores da Faculdade de Educação de Caxias desenvolve um trabalho voltado para o resgate da importância da escola pública como lócus privilegiado da educação da classe trabalhadora. São Paulo. 1980. Em Campinas, um professor ingressa na conceituada Unicamp e passa a coordenar a pós-graduação em educação, tarefa já realizada por ele anteriormente em duas outras instituições: a UFSCar e a PUC/SP. Qual a relação entre as duas situações? Vejamos: o contexto vivenciado naquele momento apresentava as mais promissoras possibilidades para a reconstrução das relações sócio-políticas, após o longo período ditatorial. Iniciava-se a abertura “lenta, gradual e segura” que conduziria o país à normalidade democrática. Os movimentos sociais tomam corpo e no campo educacional destaca-se o fenômeno das greves de professores e a organização de entidades de cunho científico, direcionadas à discussão das questões de política educacional e à produção teórica destinada a compreender a realidade econômico-político-social do país na qual se enraíza a problemática educacional e a oferecer subsídios para o enfrentamento dos seus já tradicionais impasses. Nesse contexto destaca-se o desenvolvimento alcançado pela pós-graduação, responsável pela produção de explicações teóricas para os históricos problemas da educação brasileira, bem como pela busca de soluções práticas para a crise em que desembocara a educação pública no país, após mais de uma década de política educacional privatista conduzida pela ditadura militar.
O professor Dermeval Saviani teve papel destacado nesse momento, ao coordenar a pós-graduação em educação, inicialmente na UFSCar, depois na PUC-SP e na UNICAMP, como também ao participar ativamente na criação da Associação Nacional de Educação (ANDE), da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED) e do Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES), entidades responsáveis, entre outras ações, pela promoção das Conferências Brasileiras de Educação, que no decorrer de toda a década de 80 se dedicarão a aglutinar os esforços dos segmentos mais progressistas do setor educacional na produção e divulgação de um conjunto de análises que trazem como resultado a dinamização, redirecionamento e densidade do pensamento educacional brasileiro.
É a partir da atuação nesses dois campos – a docência na pós-graduação e a organização do campo acadêmico da educação – que o professor Saviani elabora a concepção que ficou conhecida como Pedagogia Histórico-Crítica e que veio a fundamentar a prática profissional de milhares de educadores pelo Brasil afora, inclusive aquele inicialmente pequeno grupo de professores do longínquo Maranhão, que passaram a utilizar-se do referencial teórico por ele sistematizado como instrumento de luta pela melhoria da qualidade da escola destinada às classes menos favorecidas da sociedade brasileira.
Uma característica da prática profissional do professor Saviani, destacada por um amigo que conviveu de perto com ele (LIBÂNEO, 1994), tem sido a de formador de quadros. Pode-se identificar sua influência sobre os principais pesquisadores da área educacional no Brasil: Jamil Cury, Miriam Warde, José Carlos Libâneo, Gaudêncio Frigotto, Neidson Rodrigues, Luís Antônio Cunha, Paolo Nosella, Betty Oliveira, Newton Duarte, Osmar Fávero, Maria Luisa Santos Ribeiro, Maria de Fátima Félix Rosar, José Claudinei Lombardi, José Luis Sanfelice, entre outros que a partir de suas idéias, fizeram avançar o debate sobre as relações entre educação e sociedade, bem como a realização de práticas pedagógicas identificadas com a construção de uma pedagogia marxista no Brasil. A característica de um trabalho coletivo tem sido uma constante na prática pedagógica do Prof. Saviani. Tanto que ele criou em 1986, junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UNICAMP, o Grupo de Estudos e Pesquisas “História, Sociedade e Educação no Brasil” – HISTEDBR, do qual é Coordenador Geral até hoje e que conta atualmente com Grupos de Trabalho em diferentes estados da federação e que tem como objetivo o desenvolvimento de pesquisas no campo da “História da Educação, entendida em termos concretos, isto é, como uma via para se compreender a inserção da educação no processo global de produção da existência humana, enquanto prática social determinada materialmente, buscando-se, por esse caminho, superar a visão tradicional da história da educação centrada nas idéias e instituições pedagógicas.” (SAVIANI, 2001). Evidencia-se, portanto, a opção pelo materialismo histórico como referencial teórico-metodológico das investigações.
A partir desse referencial teórico, Saviani analisa o fenômeno educacional na sociedade de classes na perspectiva de ultrapassar o mecanicismo das análises efetuadas na década de 1970 por autores que partiam do marxismo, porém minimizando a categoria da contradição. A essas análises Saviani classificou de crítico-reprodutivistas, pois, embora reconhecessem o condicionamento social da educação e explicitassem o compromisso da pedagogia oficial com os interesses hegemônicos, não apresentavam alternativa para atuação no interior do sistema escolar em outra direção. Ou seja, segundo essas teorias – representadas principalmente por Althusser, Bourdieu e Passeron e Baudelot-Establet, - a prática pedagógica situa-se sempre no âmbito da inculcação ideológica, da violência simbólica ou da reprodução das relações de produção, portanto, uma atuação crítica do professor no sentido da transformação das relações sociais é impossível, dadas as determinações materiais dominantes.
Recuperando a categoria da contradição, Saviani reafirma as relações dialéticas que se estabelecem entre educação e sociedade, admitindo-se o condicionamento social da educação, mas não de forma absoluta, existindo uma ação recíproca pela qual ambos interagem, sob o efeito da correlação de forças sociais presentes em dado momento histórico e que determinam posições mais ou menos avançadas na direção da transformação social. Consequentemente, há uma contribuição especificamente escolar na superação da sociedade capitalista, que importa fortalecer. À classe trabalhadora interessa uma escola que propicie o acesso ao saber socialmente produzido, acumulado e sistematizado. É então que se revela o aspecto contraditório e também mediador da escola na sociedade capitalista, responsável pelo caráter problemático da gestão da política educacional pelo Estado Capitalista. Nos termos de Snyders:
“A escola não é o feudo da classe dominante; ela é terreno de luta entre a classe dominante e a classe explorada; ela é o terreno em que se defrontam as forças do progresso e as forças conservadoras. O que lá se passa reflete a exploração e a luta contra a exploração. A escola é simultaneamente reprodução das estruturas existentes, correia de transmissão da ideologia oficial, domesticação - mas também ameaça à ordem estabelecida e possibilidade de libertação.”(SNYDERS,1977, p.105-6)
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O reconhecimento do espaço escolar como alvo de uma disputa aponta para a superação tanto das visões “ingênuas” e “não-críticas” em educação, como das visões “crítico-reprodutivistas”.Do ponto de vista de Saviani, a visão ingênua da educação como promotora da equalização social característica do liberalismo pedagógico, assim como a visão da educação como reprodução, são substituídas por uma concepção de educação como “atividade mediadora no seio da prática social global”, uma das mediações através da qual o aluno, pela intervenção do professor e por sua participação ativa, passa de uma experiência inicialmente confusa e fragmentada (visão sincrética da realidade) a uma visão sintética, mais organizada e unificada, da realidade social. Entende, ainda, que se a escola é parte integrante do todo social, agir no seu interior é também agir na direção da transformação social (SAVIANI, 1983). Existe, portanto, uma contribuição especificamente escolar, na construção de uma sociedade democrática. Essa contribuição recupera a função clássica da ação escolar, ou seja, a transmissão eficiente do saber acumulado historicamente pela humanidade, a qual foi sendo esvaziada ao longo do tempo, à medida em que as classes populares foram tendo acesso à educação. É a análise dialética que permite essa compreensão, através do conceito de superação dialética, entendida como elevação/incorporação. Ou seja, a antítese estabelecida entre a pedagogia tradicional e a pedagogia nova é superada na pedagogia histórico-crítica pela incorporação dos elementos válidos de cada uma delas. Dessa forma, cabe à escola a preparação do aluno para o mundo adulto e suas contradições, fornecendo-lhe um instrumental, por meio da aquisição de conteúdos e da socialização, para uma participação organizada e ativa na democratização da sociedade. Os conteúdos escolares serão, portanto, os conteúdos culturais universais que se constituíram em domínio de conhecimentos relativamente autônomos, incorporados pela humanidade, mas permanentemente reavaliados face às realidades exteriores. Quanto aos métodos, superam, por incorporação de suas contribuições, os métodos tradicionais e novos: estimulando a atividade e iniciativa dos alunos, sem abrir mão, porém da iniciativa do professor; favorecendo o diálogo dos alunos entre si e com o professor, sem deixar de valorizar o diálogo com a cultura acumulada historicamente; levando em conta os interesses dos alunos, os ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento psicológico, sem perder de vista a sistematização lógica dos conhecimentos, sua ordenação e gradação, para efeito de transmissão/assimilação dos conteúdos cognitivos. (Idem, ibidem)
Assim, a condição para que a escola sirva aos interesses da maioria da população é garantir a todos um bom ensino, ou seja, a apropriação dos conteúdos básicos que tenham ressonância na vida dos alunos.
A difusão das idéias dessa concepção, que posteriormente passou a se denominar Pedagogia Histórico-Crítica, propiciou efetiva contribuição para o avanço do debate sobre as relações entre educação e sociedade, bem como para a instrumentalização de práticas pedagógicas identificadas com a construção de uma educação portadora de uma qualidade que efetivamente sirva à superação das contradições presentes na sociedade capitalista.
Sob a inspiração dessa concepção pedagógica, inúmeras iniciativas foram realizadas no interior do sistema escolar, até pelo fato de que ela valoriza a instituição escolar como o “locus” privilegiado de efetivação de suas propostas. Ao contrário de outras correntes ideológicas que advogam que uma educação popular não pode se dar no ambiente da escola oficial, a pedagogia histórico-crítica defende o resgate da escola pública como o espaço onde se pode construir uma educação identificada com os interesses das massas, sob as expensas do Estado, mas sob o controle da sociedade.
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Antonio Gramsci
“Querido Délio,
Sinto-me um pouco cansado e não posso escrever muito. Mas escreva sempre e de tudo que lhe interessa na escola. Penso que você gosta de história, tal como eu gostava quando tinha sua idade, porque se refere aos homens vivos, e tudo que se refere aos homens, ao maior número possível, a todos os homens do mundo enquanto se unem entre si em sociedade, trabalham, lutam e melhoram a si mesmo – tudo isto só pode lhe prazer, mais do que qualquer outra coisa. Mas será que é assim mesmo? Abraços,
Antonio”
Escrito político:
Homens ou Máquinas?
A breve discussão ocorrida na última sessão da Câmara de Vereadores entre nossos companheiros e alguns de representantes da maioria, a respeito de programas para o ensino profissional, merece ser comentada, ainda que de modo breve e sumário. A observação do companheiro Zini (“a corrente humanista e profissional se chocam no campo do ensino popular: é preciso fundi-las, mas não se deve esquecer que, antes de ser operário, o homem é homem, ao qual não deve ser retirada, sob pretexto de sujeitá-lo imediatamente à maquina, a possibilidade de que se expanda nos mais amplos horizontes do espírito”) e os protestos do Vereador Sincero contra a filosofia (a filosofia encontra adversários sobretudo quando afirma verdades que atingem interesses particulares) não são simples episódios polêmicos ocasionais: são confrontos necessários entre os que representam princípios fundamentalmente diversos.
1. Nosso Partido ainda não se pronunciou sobre um problema escolar preciso, que se diferencie dos programas atuais. Contentamo-lo até agora em afirmar o princípio genérico da necessidade da cultura, seja elementar, profissional ou superior; e este princípio foi por nós desenvolvido e propagandeado com vigor e energia. Podemos afirmar que a diminuição do analfabetismo na Itália deve-se menos à lei sobre instrução obrigatória do que à vida espiritual, ao sentimento de determinadas necessidades da vida interior, que a propaganda socialista soube suscitar nos estratos proletários do povo italiano. Mas não fomos além disso. A escola, na Itália, continuou sendo um organismo estritamente burguês, no pior sentido da palavra. A escola média e superior, que são estatais – ou seja, pagas com os recursos do tesouro nacional e, portanto, também com os impostos diretos pagos pelo proletariado - , só podem ser freqüentadas pelos filhos da burguesia, que desfrutam da independência econômica necessária para a tranqüilidade dos estudos. Um proletário ainda que inteligente, ainda que com todas as condições necessárias para tornar-se homens de cultura, é obrigado ou a desperdiçar suas qualidades em outra atividade, ou a tornar-se um obstinado, um autodidata, ou seja, com as devidas exceções, um meio homem, um homem que não pode dar tudo o que poderia dar caso tivesse se completado e fortalecido na disciplina da escola. A cultura é privilégio. A escola é privilegio. E não queremos que seja assim. Todos os jovens deveriam ser iguais diante da cultura. O Estado não deve pagar a escola, com dinheiro de todos, também para os filhos medíocres e deficientes dos ricos, enquanto deixa de fora os jovens proletários inteligentes e capazes. A escola média e superior devem ser dirigidas apenas aos que sabem demonstrar que são dignos delas. Se é do interesse geral que elas existam, e que sejam mantidas e regulamentadas pelo Estado, é também do interesse geral que possam ter acesso a elas todos os que são inteligentes, qualquer que seja sua condição econômica. O sacrifício da coletividade só se justifica quando se dá em benefício dos que merecem. Por isso, o sacrifício da coletividade deve servir sobretudo para dar às pessoas de valor aquela independência econômica necessária para que possam consagrar tranquilamente seu tempo aos estudos e para possam fazê-lo com seriedade.
2. O proletariado, que está excluído das escolas de cultura média e superior por causa das atuais condições da sociedade, que determinam uma certa especialização entre os homens – especialização antinatural, já que não baseada na diferença de capacidades e, por isso, destruidora e prejudicial à produção -, tem de ingressar nas escola paralelas: técnicas e profissionalizantes. As escolas técnicas, instituídas com critérios democráticos pelo ministro Casati, sofreram, em função das necessidades antidemocráticas do orçamento estatal uma transformação que as desnaturou em grande medida. São agora, em grande parte, uma repetição inútil das escolas clássicas, além de um inocente desagadouro para o empreguismo pequeno-burguês. As taxas de matricula cada vez mais altas, bem como as possibilidades concretas que dão para a vida prática, fizeram delas um privilégio. De resto, o proletariado, em sua esmagadora maioria, é automaticamente excluído de tais escolas, em função da vida incerta e aleatória que o assalariado é obrigado a viver: uma vida que, certamente, não é a mais propícia para seguir com proveito um ciclo de estudos.
3. o proletariado precisa de uma escola desinteressada. Uma escola na qual seja dada à criança a possibilidade de ter uma formação, de tornar-se homem, de adquirir aqueles critérios gerais que servem para o desenvolvimento do caráter. Em suma, uma escola humanista, tal como a entendiam os antigos e, mais recentemente, os homens do Renascimento. Uma escola que não hipoteque o futuro da criança e não constranja a sua vontade, sua inteligência, sua consciência em formação a mover-se por um caminho cuja meta seja prefixada. Um escola de liberdade e de livre iniciativa, não uma escola de escravidão e de orientação mecânica. Também os filhos do proletariado devem ter diante de si todas as possibilidades, todos os terrenos livres para poder realizar sua própria individualidade do melhor modo possível e, por isso, do modo mais produtivo para eles mesmos e para a coletividade. A escola profissional não deve de tornar uma incubadora de monstros aridamente instruídos para um ofício, sem cultural geral, sem alma, mas só com o olho certeiro e a mão firme. Mesmo através da cultura profissional é possível fazer com que surja da criança o homem, contanto que se trate de cultura educativa e não somente informativa, ou não só prática manual. O vereador Sincero, que é industrial, é um burguês demasiadamente mesquinho quando protesta contra a filosofia.
Decerto, para os industriais mesquinhamente burgueses, pode ser mais útil ter operários-máquinas em vez de operários-homens. Mas os sacrifícios a que o conjunto da coletividade se sujeita voluntariamente, com o objetivo de melhorar a si mesma e fazer brotar do seu seio os melhores e mais perfeitos homens, que a elevem ainda mais, devem espalhar-se positivamente pelo conjunto da coletividade e não limitar-se apenas a uma categoria ou a uma classe.
É um problema de direito e de força. E o proletariado deve estar atento para não sofrer um novo abuso, além dos tantos que já sofre.
(Avanti, em 24 de dezembro de 1916, na coluna “La scuola e i socialisti)
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II ENCONTRO MARXISMO, HISTÓRIA, TEMPO LIVRE E EDUCAÇÃO
Elza Margarida de Mendonça Peixoto
Maria de Fátima Rodrigues Pereira
Desde sua fundação, entre fevereiro/março de 2007, o Grupo de estudos e pesquisas Marxismo, História, Tempo Livre e Educação (MHTLE) vem realizando diversos eventos que visam a formação dos estudantes do CEFE e, especificamente, dos estudantes vinculados ao Grupo MHTLE. Entre estes eventos, destacamos o I Encontro Marxismo, História, Tempo Livre e Educação, que ocorreu nos dias 02 e 03 de junho de 2007, contando com a presença virtual (via Skipe) dos professores Katia Oliver de Sá, Maria de Fátima Rodrigues Pereira e José Claudinei Lombardi. Contamos ainda com a participação do Prof. Fernando Pereira Cândido, da Prof. Catiana Leila Possamai, da Prof. Andréa Scomparin, dos graduandos Hugo Kitanishi e Fabiano de Jesus e da Prof. Elza Peixoto. Dedicamo-nos à discussão da noção de modo de produção da existência na obra A Ideologia Alemã (Marx e Engels (845-1846), resultando deste evento as produções que levamos ao III Encontro Brasileiro de Educação e Marxismo e do Encontro de Estudos e Pesquisas História, Trabalho e Educação (organizado pelo GT História, Trabalho e Educação do HISTEDBR). Em 14 de março de 2008, realizamos um de nossos Colóquios MHTLE, com a presença da professora Maria de Fátima Rodrigues Pereira. Desde a fundação do Grupo, realizamos diversos colóquios virtuais e presenciais, contando com as contribuições voluntárias e auto-financiadas dos professores Maria de Fátima Rodrigues Pereira, José Mário Angeli, Evaristo Colman e Elza Peixoto.
Na política de formação preconizada pelo grupo, com o objetivo de permitir estudos e debates entre os membros e ampliar a formação dos estudantes sob a orientação do MHTLE, realizou-se nestes dias 8 e 9 de maio de 2009 – aberto a toda a comunidade da UEL – o II Encontro Marxismo, História, Tempo Livre e Educação com a temática: Contribuições da Concepção Materialista e Dialética da História para a formação de professores e a produção do conhecimento em educação Física, Esportes e Lazer. Participaram desta edição do evento os professores doutores Maria de Fátima Rodrigues Pereira (líder), Máuri de Carvalho (líder), Iracema Soares de Sousa (pesq.), Kátia Sá (pesq.) e Elza Peixoto (líder). A presença dos pesquisadores de Vitória, Curitiba, Florianópolis e Salvador em Londrina foi viabilizada com o apoio da Secretaria Estadual do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCEPR), do Grupo de Estudos e Pesquisas LEPEL/UFBA e do Curso de Especialização Educação Física na Educação Básica – UEL que custearam as passagens de Kátia Sá e Máuri d Carvalho e as diárias no Hotel Londristar de todos os palestrantes convidados. Nesta edição, o Grupo MHTLE conta com estudantes em nível de graduação – os estudantes Andrei Manconi, Ednéia Silvino Brás e Carlos Eduardo Téo (colaborador) – e pós-gaduação – Professoras Vanessa da Silva Guilherme e Juliana Orthmeyer.
A estrutura do evento priorizou, na abertura, a homenagem àqueles que produzem as condições para a divulgação da produção do MHTLE na página do Grupo e no Boletim Germinal on line e impresso, destacando os trabalhos da Professora Priscilla Maia da Silva e do Diretor de Serviços Gráficos da UEL, Sr Jesuíno Vitorelli. Ainda durante a abertura realizamos o lançamento oficial do site do Projeto ARELB.
Após, realizou-se a mesa sobre a temática geral, com as contribuições dos Professores Doutores Maria de Fátima Rodrigues Pereira, Máuri de Carvalho, Iracema Soares de Sousa pontuando as contribuições do marxismo para a crítica do pensamento pós-moderno; a crítica à visão pragmática e mercadológica imposta à formação de professores; à necessidade de fortalecer a elaboração do conhecimento e a formação emancipatória; e a crítica da idéia da neutralidade presente entre os intelectuais na produção da ciência e na prática pedagógica com a defesa enfática da tomada de partido pela classe trabalhadora. Após as exposições, realizou-se uma rodada de debates que incluiu os limites do marxismo, a pedagogia marxista, a formação atual nos limites da formação na Universidade e o Ensino à Distância (EAD), com a crítica ao reducionismo e a eliminação da dialética e afirmação da lógica formal.
À tarde, os pesquisadores Elza Peixoto, Kátia Sá e Iracema Soares expuseram suas pesquisas debatendo modo de produção, trabalho, jornada de trabalho, tempo livre do trabalho e lazer, destacando-se a crítica à apropriação parcial e fragmentada da obra de Marx e Engels; à fragilidade conceitual dos estudos do lazer e da formação dos pesquisadores; e a crítica à ausência de ciência nas produções acadêmicas.
Na programação noturna, voltada aos estudantes trabalhadores, a palestra do Prof. Máuri de Carvalho sobre Ética e Educação partindo da recuperação histórica das origens do judô e dos princípios que o fundamentam o professor fez a defesa de um eixo ético para a formação e o convívio humano, defendendo princípios universais de honra e lealdade. Nos debates, o enfrentamento da tese da impossibilidade de uma revolução sem armas, com uma cessão pacífica, por parte da burguesia, dos privilégios históricos que obtém na apropriação dos meios de produção (a terra, as ferramentas) e dos bens socialmente produzidos.
Na programação da manhã do sábado, tratou-se da Concepção de Educação em Lênin, partindo-se da produção favorável ou desfavorável ao autor, destacando-se a dimensão da contribuição revolucionária e o seu profundo compromisso e amor pela humanidade, enfatizando-se a necessidade de se promover os estudos de conjuntura que explicitem o contexto histórico da Revolução Russa e a atuação de Lênin e dos líderes políticos que estiveram à frente do projeto de socialismo real (Trotski, Stalin, Krutcov). Nos debates, o destaque para a necessidade de estudar e avaliar as relações entre intensidade da crise e os processos revolucionários; as motivações para os grandes conflitos bélicos (interesses econômicos em última instância para entender as Guerras do Afeganistão e do Iraque) e a aliança estratégica revolucionária contra o imperialismo capitalista (cuja maior expressão são Estados Unidos e seus aliados).
Nos trabalhos da tarde, pautou-se a avaliação da trajetória do Grupo, incluindo a participação em eventos; os projetos; as parcerias; os esforços de conquista de recursos pela participação nos Editais do CNPq e do Ministério dos Esportes com recusa continuada; a necessidade de sobrevivência financeira do grupo com o debate sobre o engajamento em iniciativas de formação com cobrança de taxas e mensalidades aos estudantes no interior das instituições públicas; o debate sobre a adaptação aos processos avaliativos de produtividade promovidos pelos Ministérios de Educação e Ministérios Ciência e Tecnologia, através de seus aparelhos, o CNPq e a CAPES; o impacto de nossas decisões quanto a estes temas na formação de novos quadros marxistas para o ensino superior público. Debatemos e encaminhamos a pauta das próximas edições do Boletim Germinal; o fechamento do primeiro número da Revista Germinal; o Projeto ARELB; e a formação dos estudantes e professores ligados ao grupo MHTLE. Os encaminhamentos tiveram como norte a posição que o MHTLE deseja assumir no processo de construção de condições revolucionárias, definindo-se continuar debatendo e publicando, disputando espaços nos órgãos de comunicação, nos eventos e nas agências de fomento à pesquisa.
O Boletim Germinal terá como temáticas: Numero 7 (maio 2009) – Pedagogia marxista; Numero 8 (julho 2009) – Crises cíclicas do capitalismo; Numero 9 (setembro 2009) – Educação à distância; Numero 10 (novembro 2009) – Marxismo e religião; Numero 11 (março 2010) – O debate entre a pedagogia liberal e marxista; Numero 12 (maio 2010) – A taylorização da educação superior.
Historicizamos o projeto de produção de um periódico marxista voltado à educação, que conta com a colaboração do HISTEDBR/UNICAMP e da LEPEL/UFBA, além de importantes pesquisadores brasileiros que se colocam no campo do marxismo no âmbito da história, da filosofia, da sociologia e da pedagogia na forma de comissão editorial e produção de artigos. Debatemos detidamente quanto às nossas possibilidades de dar conta das tarefas relativas à Revista Germinal, avaliando a necessidade de produção de um instrumento de veiculação das teses marxistas, positivamente avaliado pelo Qualis. Decidimos dar andamento ao Projeto a Revista Germinal: marxismo e educação em debate, com a publicação, no sistema SEER/IBICT/UEL. Foram distribuídas as tarefas para a finalização do número.
Debatemos detidamente a validade do projeto “Levantamento, catalogação, compilação análise e síntese da produção do conhecimento referente aos estudos do lazer no Brasil”, destacando (1) a necessidade de organização das fontes que viabilize a (2) crítica radical desta produção e (3) sua localização e explicação histórica à luz (4) do referencial teórico marxista. Destacou-se a importância do banco para a produção de novas pesquisas e novos pesquisadores, e a necessidade – para além da fragilidade na explicação dos problemas do tempo livre e da relação modo do de produção, trabalho e tempo livre – do estudo desta produção para a identificação das determinações históricas que explicam o tema. Foram informados os projetos em andamentos e os estudantes a eles vinculados, bolsistas de Iniciação Científica e Inclusão Social, além de debatidas as orientações teóricas que apontassem uma análise para além do enfoque empirista e fenomenológico. Destacou-se a parceria com o Grupo LEPEL/UFBA e a designação da Professora Kátia Sá para a Coordenação do Projeto ARELB naquela Universidade Parceira.
A respeito da orientação dos professores e estudantes vinculados ao grupo, demos destaque à necessidade de cada pesquisador localizar interessados em desenvolver estudos marxistas em suas instituições aumentando a proporção pesquisador/orientandos; à necessidade de conceber os orientandos do grupo como orientandos de todos; às leituras e estudos que o grupo de Londrina vem realizando, e à necessidade de produção de uma lista de bibliografias essenciais à formação dos estudantes que passam pelo MHTLE.
Entre os pontos de ficaram em aberto, relacionamos: (1) a posição do grupo a respeito da participação em cursos pagos no interior da instituição pública; (2) a parceria com o HISTEDBR e o projeto de pesquisa a ser conduzido junto ao GT História, Trabalho e Educação.
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REFERÊNCIAS DESTE NÚMERO:
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VIGOTSKI, L.S. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
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... que a I Internacional (1864-1872) colocou os primeiros tijolos da organização internacional dos operários para a preparação de ofensiva revolucionária contra o capitalismo?
... que a II Internacional (1889-1914) enquanto organização do movimento operário, teve no oportunismo e na redução do ímpeto revolucionário, as causas principais de sua bancarrota?
... que a III Internacional (1918 - ) foi constituída após um longo processo de luta contra o oportunismo e o social-chauvinismo, sobretudo, durante a I Grande Guerra Imperialista (1914-1919), cujo objetivo mais característico era colocar em prática a teoria, os preceitos e os princípios do marxismo, além de pretender tornar realidade os ideais seculares do socialismo e do movimento operário?
... que a III Internacional ao surgir da bancarrota da II Internacional, recolheu seus frutos e amputou a sua parte oportunista, burguesa e pequeno-burguesa, tendo sido constituída no exato momento da implantação da ditadura do proletariado na Rússia soviética?
... que a III Internacional foi constituída no período histórico em que parte dos operários do leste europeu colocava em cheque a ultima forma de escravidão: a escravidão capitalista, ou seja, a escravidão assalariada, e que ao se libertar dessa escravidão a humanidade iria conhecer efetivamente, pela primeira vez, a verdadeira liberdade? Fonte: LENIN, V. I. A terceira internacional e seu lugar na história. In Obras Completas, t. 38, 1986. p. 321-330.
Il Quarto Stato (1901), olio su tela, cm 293x545, Milano, Galleria d'Arte Moderna
A imagem de capa deste Boletim Germinal 7 é Il Quarto Stato de Giuseppe Pellizza da Volpedo, pintor nascido em 1868, em Volpedo, Itália. A tela é expressão do “divisionismo italiano” uma tendência artística iniciada na França na última década do século XIX, que teve em Pelizza de Volpedo, o seu representante italiano mais aplicado. O movimento divisionista se caracteriza pela reprodução da adição de luz a partir de uma separação metodicamente minuciosa das cores complementares. O primeiro esboço de Il Quarto Stato é de 1891, a primeira versão é de 1896, mas a tela só será finalizada em 1901. Em óleo sobre tela, a obra surge de um estudo apaixonado e de uma contínua elaboração sobre um tema inspirado na problemática social, apontando a classe operária como a protagonista do século XX. Mais informações sobre o pintor e sua obra podem ser obtidas no site da Fundação Pellizza da Volpedo, Disponível em: http://www.pellizza.it/
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Encerram-se em 15 de junho as inscrições para o Colóquio Internacional Marx e Engels, promovido pelo Grupo CEMARX/IFCH/UNICAMP. O colóquio ocorrerá no período de 03 a 07 de novembro de 2009 na UNICAMP. Maiores informações no site http://www.ifch.unicamp.br/cemarx/
O Grupo HISTEDBR/UNICAMP estará realizando no período de 30 de junho a 03 de julho de 2009 o seu VIII Seminário Nacional de Estudos e Pesquisas com a temática “História, Educação e Transformações: tendências e perspectivas, na Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas. Maiores informações no link: http://www.eventohistedbr.com.br/viiiseminario
Entre 17 e 21 de agosto de 2009 ocorrerá o III Seminário Científico de Teoria Política do Socialismo. De caráter internacional, o seminário tem como tema “Gyorgy Lukács e a emancipação humana”. Promovido pelo Grupo de Pesquisa Cultura e Política do Mundo do Trabalho e pelo Núcleo de Estudos da Ontologia Marxiana, o evento ocorrerá no anfiteatro da UNESP de Maríli. As inscrições de trabalho podem ser feitas até 10 de agosto de 2009, nas emáticas: Tema I: György Lukács e sua obra; Tema II: Teoria Política do Socialismo (Filosofia e História); Tema III: Teoria Marxista no Brasil; Tema IV: Marxismo e Educação; Tema V: Movimentos Sociais e Marxismo; Tema VI: Organização do Trabalho. Mais informações podem ser obtidas no site http://www.marilia.unesp.br/index.php?CodigoMenu=4019&CodigoOpcao=4020
Ocorrerá entre os dias 13 a 16 de julho de 2009, na UNESP de São José do Rio Preto, o IV Encontro Brasileiro de Educação e Marxismo com a temática “Socialismo e Educação na América Latina”. O Encontro “tem como principais objetivos: discutir sobre as possibilidades e experiências da perspectiva marxista em educação na América Latina; socializar e submeter à crítica o conhecimento produzido nos estudos, pesquisas e outras práticas sociais marxistas; consolidar espaço para o encontro, reflexão e articulação de diferentes grupos de estudos, e pesquisas existentes no país que trabalham na perspectiva teórico-metodológica e política do materialismo histórico e dialético; garantir espaço de diálogo intencionalmente planejado entre os segmentos sociais e da academia presentes no EBEM, tendo em vista o norteamento da produção do conhecimento comprometido com os interesses da classe trabalhadora”. Maiores informações no link: http://www.eventos.ibilce.unesp.br/encontro/index.html
O Grupo MHTLE comunica que, após 365 dias de protocolo de pedido de espaço físico para o desenvolvimento das atividades do Grupo, obteve da Comissão de Espaço do CEFE, com apoio declarado dos estudantes do Centro Acadêmico unificado licenciatura e bacharelado, a concessão do espaço conhecido como “sala de estudos” para o desenvolvimento de suas atividades. Em tempo, assinalamos que mantemos o pedido de reorganização e readequação dos espaços do CEFE em favor de uma ocupação orientada pelos princípios da Universidade Pública e Gratuita, e por uma política de pesquisa que decorra em ensino e extensão referenciados nas finalidades históricas das Instituições Públicas de Ensino Superior (pesquisa integrada ao ensino e extensão) e nos interesses da classe trabalhadora que custeia a Universidade Pública, que não devem ser confundidos e reduzidos aos interesses do mercado de trabalho, terceiro setor e dos interessados em prestação de serviço paga.
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Colaboração:
Lucelma Silva Braga
Adriana D’Agostini
Mauro Titton
Thiago Chagas Oliveira
Sandra Cordeiro Felismino
Geraldo Antonio Bergamo
Pamela Cristina Magagnato
Simone Scarpim
Miriam Santos de Sousa
Francisco Mauri de Carvalho Freitas
Edmundo Fernandes Dias
Elza Margarida de Mendonça Peixoto
Maria de Fátima Rodrigues Pereira
Revisão:
Luciana Silvestre
Vivianne Bonetto Pinheiro
Imagem de Capa:
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