segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Artur Queiroz - Angola | Criaturas de um Deus Menor


< Artur Queiroz*, Luanda >

A liberdade só existe se estiverem reunidas todas as condições que lhe dão expressão concreta: Paz, pão, saúde, educação, trabalho, habitação. Isto quer dizer que no planeta há poucos povos livres. Em Angola a paz social é um mito. O pão falta na mesa de uma grande parte da população. Trabalho com salários dignos é raridade em vias de extinção. Habitação está ao nível do casebre de lata e da cubata. Educação é um sonho para milhões de crianças fora do sistema de ensino. Escolas sem professores são um pesadelo para as comunidades. Uma desilusão para estudantes do ensino superior. Estamos malé, malé, malé. 

Angola nasceu socialista. Mas o socialismo só serviu enquanto foi necessário mobilizar todo um povo contra os invasores estrangeiros. O regime socialista e os valores do socialismo permitiram triunfar na guerra pela Soberania Nacional e a Integridade Territorial. 

O socialismo foi arma estratégica para derrotar o regime racista de Pretória e a sua unidade especial UNITA. O socialismo foi a ideia libertadora que voou de Angola para a Namíbia Zimbabwe e África do Sul. Quando o regime de apartheid capitulou e a maioria negra triunfou, Angola abandonou a via do socialismo. Mas o MPLA continuou guardião dos valores socialistas no seu Manifesto. Por isso faz parte da Internacional Socialista. 

Angola aderiu à economia de mercado e à democracia representativa, quando o Presidente José Eduardo dos Santos assinou com Jonas Savimbi o Acordo de Bicesse. Os socialistas deram a mão aos fascistas que sobrevieram ao 25 de Abril e à queda do regime de apartheid. Uma coisa contra natura. Para não se notar muito, a democracia popular e o socialismo ficaram para a História. Ou uma nostalgia para muitos que se bateram contra os invasores estrangeiros na Guerra pela Soberania Nacional e a Integridade Territorial.

A direcção do MPLA tomou esta decisão e as primeiras eleições multipartidárias, em 1992, provaram que tinha razão. O partido ganhou com maioria absoluta e nenhum concorrente se apresentou ao eleitorado defendendo o socialismo. Mau sinal. 

O oportunismo é a doença cancerígena do capitalismo. Está provado com resultados à vista. Descontando a armadilha que nos foi colocada no caminho entre 1992 e 2002 (rebelião armada de Savimbi) os “anos de paz” ainda não foram suficientes para garantir ao Povo Angolano paz, pão, saúde, educação, trabalho, habitação. Tudo se esvai por obra e graça dos oportunistas que pululam no MPLA, da base ao topo. Mas também em toda a sociedade, até nas igrejas. Em 2017 entrámos em retrocesso. E vamos andando de marcha atrás. Os recuos vão continuar até 2026. 

O congresso do MPLA vai responder se as nossas vidas vão continuar a andar para trás ou finalmente o Povo Angolano vai ter a vida que merece. Convém que ninguém esqueça o essencial. A mudança só é possível se formos capazes de explorar e colocar ao nosso serviço, os recursos naturais. Se apostarmos rudo na educação. Se formos capazes de dar máximo protagonismo á investigação científica. 

A ladainha da pobreza e da miséria não leva a lado nenhum. Os senhores bispos da Igreja bem podem pôr um padre desmiolado a perorar sobre miséria e fome. Podem prometer o céu aos famintos. Podem garantir aos mortos o paraíso no Além. Nada disso adianta. O paraíso tem de ser criado cá, nos nossos becos, nas nossas ruas, nos nossos bairros, nas nossas sanzalas, nas nossas casas. A liberdade religiosa é garantida a todos. Mas não enganem os crentes. 

O papel de enganar está reservado â UNITA. Desde sempre. Nasceu no seio do colonialismo. Savimbi, nas suas cartas de traição, reverenciava e elogiava os chefes fascistas de Lisboa. Os cabos de guerra colonialistas (genocidas). Não hesitou em lutar de armas na mão contra a Independência Nacional. 

O Galo Negro é filho do regime fascista e teve sempre uma prática fascista. Centenas de homens armados da UNITA reforçaram os Flechas da PIDE. Quando os Capitães de Abril derrubaram o regime fascista, a UNITA continuou incólume, ainda que fosse uma organização portuguesa ao nível da PIDE, da Legião ou da OPVDCA, as milícias nazis criadas em Angola depois da Grande Insurreição em 15 de Março 1961. O Povo Angolano foi enganado pelos libertadores de Lisboa. Valores mais altos se alevantaram.

Após o 25 de Abril 1974, a UNITA não hesitou em apoiar os independentistas brancos. Uma vez derrotados, Savimbi foi trabalhar directamente com o regime racista de Pretória. Nazis puros e duros. O chefe do Galo Negro mostrou uma coerência de betão. A UNITA nasceu no seio do fascismo. Cresceu ao serviço dos colonialistas. Serviu de armas na mão o regime racista de Pretória. Pratica a xenofobia. Sempre na senda da traição.

Em Portugal ganhou expressão, um partido que congrega os herdeiros dos fascistas derrubados em 25 de Abril 1974. Chama-se Chega. É um antro de fascistas, racistas e xenófobos. A UNITA tem uma ligação umbilical à Carta de Madrid. Faz parte da internacional Fascista. Tal como o Chega. São partidos irmãos. O MPLA em Portugal é irmão do Partido Comunista e do Partido Socialista. Primo direito do PSD. A UNITA é irmã do Chega. Coerência.

A igreja regressou ao passado mais problemático da sua existência, quando pôs a cruz ao serviço dos colonialistas. Benzeu as espadas que mataram civis inocentes. Participou nas Cruzadas. Ateou as fogueiras da Inquisição. Se Deus existe, vai preciar de milénios para vo perdoar. Agora os senhores bispos mandaram este recado pelo padre Pio: “O MPLA está ultrapassado!” Ai sim? Então digam quem está em condições de governar Angola com políticas actualizadas e políticos mais competentes. Mas digam já. É feio baterem e depois esconderem a mão. Foge-lhes sempre a conversa para o reaccionarismo mais primário.

Pobres criaturas de um deus menor!

* Jornalista

at setembro 22, 2025 

https://paginaglobal.blogspot.com/2025/09/angola-criaturas-de-um-deus-menor.html#more

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