domingo, 8 de abril de 2012

Um poema de José Fanha

* José Fanha

Dr
Doi-me o peito
do cigarro
do bagaço
do catarro
do cansaço
doi-me o peito
do caminho de ida e volta
do meu quarto à oficina
sem parar
sempra a andar
sempre a dar
doi-me o peito
destes anos, tantos anos
de trabalho e combustao
doi-me o luxo
doi-me os fatos
doi-me os filhos
doi-me o carro de quem pode
e eu a pé
sempre a pé
doi-me a esperança
doi-me a espera pelo aumento
pela reforma
pelo transporte
pela vida e pela morte
Dr.
Ja estou farto de nao ser mais que um braço para alugar
foi-se a força
e o meu corpo é como mosto pisado
como um passaro insultado
por nao poder mais voar
Dr.
eu nao sei ler os caminhos dos hospitais
mas alguem ha-de aprender
entre rugas do meu rosto
o que nao vem nos jornais
e nao ha nada no mundo
nem discurso
nem cartaz
capaz de gritar mais alto
que as palmas de minhas maos
que o meu sorriso sem jeito
Dr.
Doi-me o peito..

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