quarta-feira, 17 de junho de 2009

Poesia de Manuel Bandeira

Meus poemas preferidos, de Manuel Bandeira

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Análise da obra
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Coletânea de poemas selecionados pelo próprio Manuel Bandeira, um dos mais importantes poetas brasileiros do século XX. Mostram a busca pelo significado das coisas com um lirismo maduro e simples. Cheios de angústia e busca pelo significado das coisas, os poemas tratam basicamente sobre morte, humildade, infância e sensualidade. São quatro fortes pontos que marcaram a vida do autor.
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Estilo
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A leitura não-linear, rompendo a ordem cronológica da publicação dos livros, mostra a evolução e a reformação estética de temas recorrentes na poesia de Manuel Bandeira: a presença do cotidiano, a preocupação com a morte, e defesa da linguagem modernista, a sensualidade, o lirismo tradicional, o antilirismo, a impossibilidade existencial, reminiscências da infância, o humor, a experimentação com o significante, o apego a formas finisseculares parnasiano simbolista.
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A poesia de Manuel Bandeira caracterizou-se pela variedade criadora, desde o soneto parnasiano, pela prática do verso livre, até por experiências com a poesia concretista. Por outro lado, conservou e adaptou ao espírito moderno os ritmos e formas mais regulares, como os versos em redondilhas maiores. Em sua poesia, observa-se uma constante nota de ternura e paixão pela vida. Seu lirismo intimista registra o cotidiano com simplicidade, atribuindo-lhe um sentido de evento e espetáculo. Nela, também, estão presentes a infância, a terra natal, a cultura popular, a doença, a preocupação com a morte, a defesa da linguagem modernista, a sensualidade, o lirismo tradicional, o antilirismo, a reflexão existencial, a infância e o humor.
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Verificamos, em Manuel Bandeira, traços indicadores de uma sensibilidade romântica, sobretudo de uma profunda tristeza, aliada ao desencanto e à melancolia. A confissão de seu estado de espírito, da presença do “eu” em poemas e da morte como motivo poético mais freqüente conferiu-lhe uma aura romântica.
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Temáticas e estilos
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A morte estava muito presente na vida de Bandeira, pois muito jovem descobriu a tuberculose. Como não pôde seguir a vida como arquiteto, Bandeira começou a se dedicar à poesia para preencher o espaço. Esta temática está presente desde o primeiro livro. A morte também determinou um estilo, mas sem o entusiasmo dos modernistas da época. Os paulistas eram extremamente exaltados, como Oswald e Mário de Andrade. Bandeira era um poeta da humildade, do tom mais baixo.
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Outra temática dos poemas de Bandeira é a sensualidade, tratada de maneira diferente, não tradicional. O objeto do desejo era principalmente as prostitutas. Em função da própria experiência de vida sexual dele, não convencional por causa da doença.
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Também a infância, como retorno ao passado, opõe-se a este presente de angústia e dor vivenciado pelo poeta. O folclore, suas quadras e canções populares, a família sempre apareceram ligados à infância. Foi o tempo feliz antes da doença. Depois o pai, a mãe e o irmão morreram, então foi o tempo de comunhão com os parentes.
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Profundamente
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Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci
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Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
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Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.

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Em muitos poemas, Bandeira aproxima-se da estética parnasiana através da rigidez formal, da seleção de temas, da busca do universal e da apreensão objetiva da realidade. Em outros textos aparecem o irracionalismo, as paisagens indefiníveis, nebulosas e as atmosferas crepusculares. O Simbolismo, que além dessas características privilegiou a musicalidade, despertou no poeta o gosto pelo subjetivismo, pela introspecção.
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Paisagem Noturna
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(...)
O plenilúnio vai romper... Já da penumbra
Lentamente reslumbra
A paisagem de grandes árvores dormentes.
E cambiantes sutis, tonalidades fugidias,
Tintas delinqüescentes
Mancham para o levante as nuvens langorosas.

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Assimilando as conquistas dos poetas do Modernismo, Manuel Bandeira, em muitos textos nos quais discute a prática poética, define esta nova postura estética. Primeiramente, houve uma ruptura com o Parnasianismo, ou com a tradição lírica da época; depois, estes textos negariam as confecções e manifestariam o desejo de libertação:
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Poética
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Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem-comportado
(...)
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbados
O lirismo dos clowns de Shakespeare
- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

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O poema Poética é um manifesto modernista - metapoema = poesia que fala de poesia.
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Versos livres, tom de manifesto que se recusa ao lirismo comedido, bem comportado - o lirismo metrificado, protocolar e acadêmico, erudito e conservador.
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Ironiza o lirismo namorador que lembra a tradição romântica (Político, Raquítico, Sifilítico), tanto quanto o lirismo normativo, acadêmico, que lembra o parnasiano (contabilidade tabela de co-senos secretário...).
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Muitas propostas da “fase heróica” do Modernismo (1922-1930) estariam incorporadas à sua poesia, entre elas: a fusão prosa/poesia, versos brancos (sem rimas), versos livres (sem métrica), nova utilização de sinais gráficos (linha pontilhada para indicar a respiração, por exemplo), o diálogo, o humor negro e a linguagem coloquial.
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Pneumatórax
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Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
- Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.
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- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e
o pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

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Experiências concretistas
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O Concretismo, poesia de vanguarda que se firmou na década de 60, também mereceu a atenção de Bandeira. Palavras soltas, sonoridade, visualização.
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A onda
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a onda anda
aonde anda
a onda?
a onda ainda
ainda onda
ainda anda
aonde?
aonde?
a onda a onda

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A opressão da realidade, a solidão e a doença conduziram-no à busca da evasão, à procura do lugar ideal, onde praticamente tudo seria possível:
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Vou-me embora pra Pasárgada
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Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada
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E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do rei –
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

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A Estrela
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Vi uma estrela tão alta,
Vi uma estrela tão fria!
Vi uma estrela luzindo
Na minha vida vazia.
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Era uma estrela tão alta!
Era uma estrela tão fria !
Era uma estrela sozinha
Luzindo no fim do dia.
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Põe que da sua distância
Para a minha companhia
Não baixava aquela estrela?
Por que tão alta luzia?
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E ouvi-a na sombra funda
Responder que assim fazia
Para dar uma esperança
Mais triste ao fim do meu dia.
(Lira dos cinquent'anos)

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A estrela é uma imagem obsessiva na poesia de Bandeira, metaforizando o absoluto, o inatingível, a luz que orienta, na mesma linha da poesia romântica e simbolista.
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Algumas vezes, significa a mulher, sensual e distante, ansiosamente aguardada ("estrela da manhã").
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Em A estrela, notam-se as posições entre a vida vazia do poeta e o brilho do astro inacessível, utópico. Os contrastes aparecem no plano espacial e cromático ("Era uma estrela sozinha Luzindo no fim do dia", "E ouvi-a na sombra funda").
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Nos últimos versos há ironia, pois a estrela reitera a sua distancia insuperável, dando ao "eu" lírico uma esperança triste, uma vez que ele a contempla sem a menor possibilidade de aproximação.
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A poesia de MB apresenta uma amplitude de âmbito, testemunhado uma variedade criadora que vem do Parnasianismo crepuscular até as experiências concretistas, do soneto às formas mais audazes de expressão.
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Os Sinos
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Sino de Belém,
Sino da paixão...
Sino de Belém,
Sino da paixão...
Sino do Bonfim!...
Sino do Bonfim!...
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Sino de Belém, pelos que ainda vêm!
Sino de Belém, bate bem-bem-bem.
Sino da paixão, pelos que ainda vão!
Sino da paixão, bate bão-bão-bão.
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Sino do Bonfim, por que chora assim?...
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Sino de Belém, que graça ele tem!
Sino de Belém bate bem-bem-bem.
Sino da paixão. - pela minha irmã!
Sino da paixão. - pela minha mãe!
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Sino do Bonfim, que vai ser de mim?...
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Sino de Belém, como soa bem!
Sino de Belém bate bem-bem-bem.
Sino da paixão... Por meu pai?...-Não! Não!
Sino da paixão bate bão-bão-bão.
Sino do Bonfim, baterás por mim?...
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Sino de Belém,
Sino da paixão...
Sino da paixão, pelo meu irmão...
Sino da paixão,
Sino do Bonfim...
Sino do Bonfim, ai de mim, por mim!
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Sino de Belém, que graça ele tem!

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A poesia tem também um tom pessoal, intimista, coloquial, sempre resvalando ou abordando diretamente o cotidiano.
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Cita-se o poema Testamento:
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..."Criou-me desde menino
Para arquiteto meu pai,
Foi-se-me um dia a saúde...
Fiz-se arquiteto? Não pude!
Sou poeta menor, perdoai!"
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in na_ponta_lingua/livros/
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1 comentário:

Elvira Carvalho disse...

Que belo post para quem como eu gosta de Manuel Bandeira. É quase um livro.
Obrigada pela partilha.
Um abraço