domingo, 30 de março de 2008

Negócios do “terço”, do turismo e do imobiliário

“Ratzinger criou agora a fama, entre as elites capitalistas, de ser um grande gestor. Num só ano de papado, o “óbolo de S. Pedro” aumentou 75 milhões de euros. Não só devido ao regresso à liturgia obscurantista mas também por altas manobras da banca do Vaticano. Só o Governatorato (administração do Estado Pontifício) fechou 2006 com lucros de 228 milhões de euros”.
Jorge Messias* - 08.09.07

É urgente salientar que as políticas de Sócrates e da sua “clique” de banqueiros estão a resultar num estrondoso fracasso. As falhas deste governo não se traduzem somente nos números do desemprego, do ensino, da saúde ou da segurança social. São evidentes, também, na incapacidade de Sócrates atingir os limiares das metas que ele próprio, pessoalmente se comprometeu a cumprir. As grandes obras públicas profusamente anunciadas, derrapam constantemente e, em norma, acabam por se afundar em escândalos financeiros. Os novos milionários dos “rankings” das fortunas juntam-se aos velhos capitães argentários dos tempos de Salazar o qual, para eles, continua a ser uma figura emblemática. A maquilhagem oficial que é dada ao desemprego e ao trabalho precário não consegue já ocultar o facto de que os índices crescem assustadoramente, com mais desempregados, mais falências, mais crédito mal parado e mais funcionários públicos remetidos para as “prateleiras”; e que o desmantelamento de áreas sociais (como a Saúde, o Ensino ou a Segurança Social) prossegue a bom ritmo mas à custa de mais miséria e da entrega à iniciativa privada de atribuições que a Constituição reserva como competências do Estado. Portugal está na cauda de todas as estatísticas comunitárias.

Tudo isto aparte, também é notório que Sócrates nem sequer entre amigos consegue brilhar. A tão celebrada Presidência da Europa está a terminar e as chefias portuguesas nada mais conseguiram senão agravar os problemas já existentes. Kosovo, Turquia e Afeganistão, imigração, segurança, bolsas de pobreza, desemprego, inflação, tudo na comunidade europeia vai de mal a pior. Com os ricos cada vez mais ricos, os pobres cada vez mais pobres, os fortes cada vez mais fortes e uma vasta multidão de homens e mulheres que o avanço tecnológico marginaliza, é altura de se perguntar, como Mário Soares tardiamente parece ter descoberto, que resultados finais trará a globalização?

Não poderão as “democracias” virem a ser substituídas pela manta de retalhos das oligarquias? É evidente que esse risco existe. Nós diríamos de outra maneira: é possível que a tentativa de globalização económica venha a traduzir-se na substituição das democracias virtuais ainda existentes por Estados fascistas organizados como grupos económicos e dominados pelas elites dos mais ricos. Para aí se caminha. Para uma ditadura de mercado.

Da presidência portuguesa da União Europeia não reza a história. A inépcia dos funcionários de Sócrates revelou-se ao longo destes últimos seis meses de pretensa glória. Subsistiram e agravaram-se as contradições entre os membros da Comunidade e é altamente duvidoso que a ardilosa proposta de tratado europeu seja consensualmente aprovada até Outubro próximo. Mesmo com todas as artimanhas que as maquiavélicas mentes de Durão e de Sócrates possam ter urdido. Com ou sem consulta popular. A Europa imperial sonhada pelos ricos é um sonho mau – um pesadelo – mas será apenas um sonho dos que dividem para reinar mas cada vez mais se isolam no Poder. Sócrates recorre agora às últimas tábuas de salvação: vende o património nacional e promete o Paraíso... para mais tarde, sempre para depois. Vende os próprios créditos públicos e quer, agora, vender Lisboa. Assim vamos com este governo às costas – de esquerda, laico, socialista - ao qual em tão má hora o eleitorado concedeu a maioria absoluta.

A face laico-clerical

Que a igreja católica aspira desde sempre ao poder político e ao dinheiro, é dado antigo da História. Mas nunca, em eras anteriores, esta ambição foi tão evidente como agora. É o progresso tecnológico. Os meios de comunicação actuam fulminantemente. Nem tudo se conhece, longe disso, mas no essencial descobrem-se os elementos-chave que explicam os contextos.

Frequentemente, nas notícias sobre a igreja católica institucional, tudo se opõe a si mesmo. São os enredos da intriga e da contradição. Procuremos apresentar alguns exemplos recentes.

O Papa Bento XVI (o antigo cardeal Ratzinger) gosta de apelar à imagem de uma igreja católica moderna, dinâmica, onde a filosofia do dogma coabite com o constante progresso do conhecimento científico. Pois esta preocupação estratégica central, sempre proclamada, não o impediu de recentemente apelar aos católicos a que regressem à prática tridentina do Rosário do Terço (15 dezenas de avé-marias todas as semanas, com missas e mistérios agrupados por séries, como nas telenovelas – mistérios gozosos, mistérios dolorosos e mistérios gloriosos). A recitação do Rosário pode ser feita individualmente ou em grupos, em voz alta e desfiando um colar de contas. A prática é depois compensada com bênçãos, bulas e perdões que, em geral, suscitam no crente a necessidade de ser materialmente generoso para com a Hierarquia. Ratzinger criou agora a fama, entre as elites capitalistas, de ser um grande gestor. Num só ano de papado, o “óbolo de S. Pedro” aumentou 75 milhões de euros. Não só devido ao regresso à liturgia obscurantista mas também por altas manobras da banca do Vaticano. Só o Governatorato (administração do Estado Pontifício) fechou 2006 com lucros de 228 milhões de euros.

O povo português, quando observa situações contraditórias deste tipo, costuma dizer que "a letra não joga com a careta", isto é, não há racionalidade e obscurantismo, nem pobreza apostólica e lucros financeiros. Sobretudo, está naturalmente impedido à Igreja regressar às práticas ancestrais das " lavagens ao cérebro".

Porém, se assim acontece no plano religioso outra é a Igreja que conduz as oportunidades de negócios.

Ainda muito recentemente, na área financeira, o Vaticano fez revelações inesperadas e sensacionais. A Santa Sé vai investir em sectores até aqui exclusivamente explorados por empresas capitais laicas. Segundo as regras concorrenciais dos mercados capitalistas.

Por exemplo, no Turismo religioso vai oferecer aos católicos novos produtos, promovendo as ligações aéreas, a baixos custos, entre os Santuários Marianos, nomeadamente Roma, Lurdes, Fátima, Santiago de Compostela, etc. São vôos regulares que em breve cobrirão todos os lugares sagrados da Europa e do Médio Oriente. Naturalmente que, a administração de Fátima se apressou a saudar esta decisão da Cúria Romana, salientando esperar que o Santuário movimente, em breve, cerca de 150 mil passageiros/ano, mesmo antes de reequipar e alargar, com infra-estruturas modernas, o pequeno aeródromo da Cova da Iria. Depois se verá, quando for lançado o TGV, quando as Misericórdias fizerem a sua reconversão no sentido do turismo religioso e da área assistencial subsidiada, etc. Cada problema se resolverá na devida altura.

Mas as "grossas" novidades não ficam por aqui.

Há notícias sobre a União das Misericórdias, confirmadas pelo seu presidente, que apontam para o envolvimento dessas IPSS no turismo e nas energias renováveis.

Manuel de Lemos levantou uma ponta do véu sobre as intenções das misericórdias na área do Turismo: " Este é o século do lazer e temos um vasto património imobiliário que poderemos rentabilizar, vocacionando-o para o turismo: hotéis e palacetes que podem ser reconvertidos, reservas de caça no Alentejo, um enorme espólio de peças de arte que pode ser exposto numa rede de museus que iremos lançar, as possibilidades abertas pelo turismo "sénior", etc., enquanto nos instalamos noutras áreas como as da construção de centrais fotovoltaicas, as actividades no campo da Segurança Social e o aproveitamento da rede das 398 Misericórdias sem fins lucrativos existentes no terreno e especializadas em serviços prestados às populações.

Este esclarecimento sugere, a proximidade com uma outra situação vivida em Reguengos de Monsaraz, onde uma figura destacada do Opus Dei, o engenheiro José Roquete (também ligado à SOMAGUE), pretende instalar hotéis de luxo com 17 mil camas, campos de "golfe", centros cinegéticos, etc., à custa da exploração dos recursos reunidos na Barragem do Alqueva!

Todos estes negócios e outros que se preparam, têm a assessoria da Universidade Católica que, para maior eficiência, acaba de criar o seu "Centro de Ética Económica" (CEE), dirigido pelo conhecido fundamentalista padre João Seabra, secretariado por outro membro da "Obra", o professor João César das Neves. O CEE irá formar, nos quadros da “ética cristã“, alunos das ciências empresariais e gestores de empresas ou grupos de empresas capitalistas. Ou seja, vai explicar a esses “condutores de homens”, o que fazer e como fazer para que a prática da exploração pareça humana.

De surpresa em surpresa, o Vaticano de Bento XVI não pára de surpreender.

Foi oficialmente anunciado que a Santa Sé entrou no mercado de compra e venda das quotas de poluição por dióxido de carbono. Conhecem-se alguns contornos deste negócio conduzido pela Secretaria do Estado do Vaticano e pelo Morgan Stanley (também conhecido conhecido como o banco do Papa nos EUA). Completam este grupo investidor (três mil milhões de dólares disponíveis para os negócios do carbono) outras instituições bancárias internacionais, bem cotadas nas Bolsas devido às suas ligações com o capital eclesiástico: o Citigrup, o Crédit Suisse e a Merill Lynch. A transacção em curso é negociada entre o grupo investidor e a Hungria e pode descrever-se da seguinte maneira: o Vaticano é grande poluidor e vai aumentar, no ano corrente, os níveis da poluição que produz. Deste modo, recorre ao mercado e compra a um outro Estado parte da quota que lhe foi atribuída na emissão de dióxido de carbono. Posto isto, a acção poluidora do Vaticano fica legalizada. Continuará a poluir a atmosfera, como se nada fosse. Em contrapartida, lá longe, nos confins da Hungria, o Papa irá participar financeiramente em parte da reflorestação do Parque Nacional de Bukk.

Basta de histórias do “ toma lá, dá cá ...”. Que mundo é aquele em que vivemos e como será possível aceitar toda esta farsa das democracias que cultivam, conscientemente a próxima ditadura, das religiões que dormem nas camas dos banqueiros, das igrejas que se prostituem, dos socialistas que roubam o poder democrático, da ética vendida como produto a quem mais der, dos pobres, miseráveis e famintos, tratados a pontapé pelos opulentos milionários cristãos?
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Ecoam na nossa memória os sermões ocos das metanoias, das reconciliações, das alternativas à luta de classes, das subsidiariedades, da defesa dos direitos do Homem entregues a verdadeiras mafias, dos socialistas sem ideologia nem códigos de honra, da coragem atribuída àqueles que tapam a honra e destapam a desonra, da conversão dos banqueiros ou das cruzadas de recristianização.
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Para além de tudo o mais, lutar e permanecer na luta é um acto de higiene mental... Não pode ser de outra maneira.


* Jorge Messias é amigo e colaborador de odiario.info

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