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1994 Cong
S.A. Suisse
Em Paris e
Oslo, olha-se para a liberdade desenhada por Corto Maltese. Em Nova Iorque,
Spike Lee abre o baú das suas inspirações
08 FEVEREIRO
2024 22:57
PARIS — OSLO
— AVELLINO — VENEZA
Um dia, uma
amiga da mãe pegou na mão esquerda do rapaz. Olhou e ficou horrorizada. Não
havia ali a linha do destino. O rapaz não pensou muito e foi buscar uma lâmina
de barbear do pai. Inventou na palma daquela mão uma linha profunda e longa.
Pela vida fora, nunca chegaria a acumular tesouros bem fechados. Mas sempre foi
livre.
O rapaz
chamava-se Corto Maltese e tinha nascido na ilha de Malta, no verão de 1887,
filho de uma cigana de Sevilha e de um marinheiro inglês de Tintagel, na
Cornualha. Aliás, o viajante Corto Maltese nasceu para o mundo 80 anos depois,
no livro “A Balada do Mar Salgado”, de 1967. Corto é a grande personagem criada
pelo autor de banda desenhada Hugo Pratt (1927-1995). E viajou por vários
continentes, partindo de La Valletta no veleiro “Vanità Dorata” (ou seja,
Vaidade Dourada). Nos livros de Pratt, Corto viveu apaixonado pela liberdade,
sempre pronto para partir. Era também capaz de declarar amor, perguntando:
“Queres partir comigo?”
Um próximo
destino cortomaltesiano pode ser Paris, onde o Pompidou terá de 29 de maio a 4
de novembro três exposições de banda desenhada em simultâneo. A iniciativa
chama-se “La BD à tous les étages” (A BD em todos os andares), com destaque
para “Corto Maltese, une vie romanesque” (uma vida de romance). Já na capital
da Noruega, Corto Maltese está presente até 22 de março no Istituto Italiano di
Cultura di Oslo, na exposição “Hugo Pratt. Opphavet, verket, livshistorien” (a
herança, a obra, a biografia).
Da biografia de
Pratt faz parte a amizade com o cartoonista Milo Manara, conhecido sobretudo
pelo erotismo e pela beleza de livros de banda desenhada como “O Clic”. E, em
entrevista ao Expresso em 2022, Milo Manara contou que Pratt era Corto Maltese,
mudando o contexto histórico. “Corto Maltese vivia numa época em que não era
preciso pedir autorização para chegar de barco e ancorar num sítio qualquer.
Agora é completamente diferente.” No atual contexto histórico, a cidade de
Avellino está na linha do destino de quem quiser ver a exposição “Milo Manara —
Così fan tutte. Le Metamorfosi d’amore”, que está até 9 de março no Museo
Irpino e parte da ópera “Così fan tutte”, de Wolfgang Amadeus Mozart. De
Avellino, será boa ideia prolongar a linha da sorte até a uma ponta aquática do
mapa de Itália, para caminhar sem destino por Veneza, um dos territórios
importantes para Corto Maltese. Haja liberdade.
NOVA IORQUE
A inspiração de Spike Lee
Sim, poderíamos
ocupar-nos apenas de massa fresca. Mas é essencial lembrar outros aspetos da
História, no contexto atual de propagação da extrema-direita, na Europa e no
mundo. Este póster foi feito em Itália em 1944, durante a II Guerra Mundial.
Contém racismo e pertence à coleção do casal Spike Lee e Tonya Lewis Lee. O
autor do cartaz desenhou-o nos últimos tempos do regime fascista do ditador
Benito Mussolini (1883-1945). E sim, a ideia era que vinham aí os soldados
americanos, preparados para pilhar e violar as riquezas e os corpos de Itália.
Para estimular o medo e a coesão entre a população, era preciso mostrar que,
com uma possível invasão norte-americana, chegaria o caos personificado por
soldados afro-americanos. Agora, este bocado de guerra psicológica faz parte da
exposição “Spike Lee: Creative Sources” (Fontes Criativas), que está até
segunda-feira no Brooklyn Museum, em Nova Iorque. Para ir às fontes de
inspiração do realizador afro-americano Spike Lee, há aqui mais de 400 objetos
fornecidos pelo autor. Haja inspiração.
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