quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

Pedro Tadeu - Os nossos políticos são cobardes?

OPINIÃO
21 fevereiro 2024

* Pedro Tadeu
Jornalista

O ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, João Gomes Cravinho, imitando o que outros ministros europeus fizeram na sequência da morte, tremendamente suspeita, de Alexei Navalny, opositor do presidente russo Vladimir Putin, chamou o embaixador da Rússia ao seu ministério para que fossem prestados esclarecimentos... Muito bem!

O ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, João Gomes Cravinho, que se saiba, ainda não chamou ao seu ministério o embaixador de Israel no nosso país para pedir esclarecimentos sobre a morte de 10 mil a 30 mil civis (conforme as fontes) e o valor de quase dois milhões de deslocados, imensas vítimas inocentes provocadas pela retaliação de Israel ao ataque do Hamas de 7 de outubro que, por seu lado e perante indignação geral, matou 1200 pessoas... Muito mal!

Note-se que, no caso da Palestina, aos mortos e deslocados acrescenta-se uma situação humanitária catastrófica em Gaza: faltam ali medicamentos, comida, água, combustível e os hospitais estão em colapso, como vemos, todos os dias, nas TV.

A União Europeia (e Portugal por arrasto) está a tornar banal a utilização contraditória do argumento da Defesa dos Direitos Humanos para tornar efetivas as decisões políticas mais desumanas da sua história, contrariando claramente a sua retórica oficial.

Para além das sanções e das denuncias de violações de Direitos Humanos só se fazerem se forem cometidas pelos “inimigos do Ocidente” e se ignorarem ou escamotearem as que são cometidas por “Aliados” - e o caso da brandura inconsequente com que os Governos europeus analisam o que Israel tem feito é o exemplo mais pungente de como a hipocrisia política mata -, a própria União Europeia começa a tornar legal, dentro do seu próprio território, a violação de Direitos Humanos.

Temos agora o exemplo noticiado há dias de um texto que está pronto para ser aprovado em abril pelo Parlamento Europeu e que preconiza uma série de medidas severas para conter a imigração.

Uma dessas medidas chega ao ponto de prever que crianças, de qualquer idade, acompanhadas ou não pelas famílias, e que sejam requerentes de asilo, podem ser presas durante três meses desde que os estados que as recebam as declarem “perigos para a segurança nacional”, numa violação que a muita gente parece clara da Convenção das Nações Unidas para os Direitos das Crianças.

Numa notícia sobre isso que li no jornal Público diz-se que esse Pacto sobre Migração e Asilo prevê ainda a recolha de dados biométricos, como impressões digitais, a partir dos 6 anos de idade, e permite o recurso à “coação” contra crianças que se recusem a deixar recolher os seus dados.

Mais: as crianças podem ser devolvidas livremente ao país de origem desde que ele seja considerado um “país seguro” e nessa lista incluem-se países com problemas de perseguição a minorias ou com situações de violência social frequente, como a Tunísia, Turquia, Albânia ou Índia.

Outro dado inaceitável: os irmãos já não contarão para figurar em processos de reunificação de famílias, só os pais - se estes não estiverem presentes, os irmãos podem ser separados.

Estamos, portanto, a autorizar que um dia possa haver na União Europeia campos de concentração de crianças refugiadas ou requerentes de asilo... o antigo presidente norte-americano Donald Trump deve estar a rir-se do que os europeus disseram dele quando tentou fazer algo similar na fronteira com o México.

É tristemente significativo que nos debates eleitorais das últimas semanas as grandes questões internacionais, apesar de o mundo estar a arriscar-se a um conflito global, tenham ficado quase completamente ausentes das discussões entre líderes partidários - o medo de analisar seriamente o desvario atual é a prova da reduzida estatura política da maioria dos intervenientes.

Por outro lado, o fechar de olhos e a recusa em vetar os cada vez mais frequentes abusos da União Europeia em matéria de Direitos Humanos - com que a mesma UE enche a boca para condenar o resto do mundo - é a demonstração da cobardia prevalecente nos palácios do poder, nossos e da restante Europa “democrática”.

https://www.dn.pt/5001258510/os-nossos-politicos-sao-cobardes/

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