terça-feira, 11 de agosto de 2009

O Ser Imaculado.

O Ser Imaculado.

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Posted: 06 Aug 2009 02:34 PM PDT

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Câmaras onde se fabrica o dia, alturas onde se fabrica a noite. A capa estelar que nos recobre, a lâmpada astral que nos guia: a órbita ao redor da qual em rodopio viajamos: senhores de nada e de vazio e entretanto pomposos, laureados, altivos como deuses, e como deuses charmosos, espertos, confiantes. E criamos. Sobre a superfície nua da pedra, rabiscamos o calor da caça e o êxito do primeiro caçador. E louvamos. Um deus que mal nos diz respeito. E no entanto o adoramos. Ele e o manto azul de seu filho. Ele e a face cândida de sua mãe e a asa lépida da pomba tripartida e do espírito. O que nos move? Será a alegria arcaica extraída do coração exposto desse deus ou será o próprio sangue desse deus derramado e a carne desse deus sacrificada em holocausto? Será o vinho vertido do corpo branco desse deus, será a aorta desse deus que expele vinho santo ou a coroa de espinhos que lhe lacerava a face ou será a carne macerada desse deus e convertida em pão, ou ainda um mero sopro seu o que nos anima? Resta que. Aqui pairamos. Aferrados ao corpo, ao corpo jungidos. Ao corpo aguilhoados. Aqui permanecemos, por dentro acesos, tesos por dentro, por dentro fibrosos, sanguinolentos por dentro. É que o júbilo de aqui permanecermos, atados, mas todavia por inteiro libertos, por demais libertos, inscreve no portal da alma um signo ilegível: rodamos em falso, e no entanto rodamos, mas sem direção. Somos flecha às cegas disparada e não se conhece o arqueiro. Mal sabemos se arqueiro há ou se a flecha meramente pelo vento iniciou sua trajetória. Mas e o impulso do vento, a trajetória do vento e a origem de todos os ventos? É certo: no nada rodamos, como se roda num rio que num mar indecifrado desemboca. Alturas onde se fabrica a vertigem que num giro tudo desvanece ou estradas onde se perfaz a viagem da qual não se adivinha o rumo ou motores onde se acumula a fuligem que nos enegrece as ventas ou desertos onde se fabrica a miragem ou túneis onde se fabrica a ida e a vinda e a vida que os tendões nos inflama e os calcanhares unidos em prece e os corações lacerados e as mãos e os braços erguidos ao céu tumultuado, e as faces perplexas, desfiguradas e voltadas ao nada, como se do nada pudesse sobrevir o ser alado e branco que do inferno da carne nos salvasse e nos conduzisse, puros, imateriais, a um éden qualquer de doces Formas, a um campo qualquer, mas aprazível onde a água jorrasse da montanha e o leite e o mel da pedra recolhêssemos. Porém, do nada, nada provém. Do vazio, nada se apresenta ao toque e nada nos sustenta – a não ser a coragem e a alegria de aqui lenta e lentamente definharmos. Mas alegres e sérios como sátiros, mas ferindo o couro do tambor pagão e manejando a flauta que nos trouxe a Hélade e cantando em coro no cortejo do deus, vamos todos animados pelo vinho e imaculados pelo trágico. Pois o trágico, Já dizia um amigo meu, imacula o ser.

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in Blog A Maçã no Escuro

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