quinta-feira, 15 de abril de 2010

Espresso Book Machine - Livros à medida das nossas necessidades

Print on demand


Público - 12.04.2010 - 12:18 Por Isabel Coutinho
Em tempos de crise, as editoras têm de controlar os custos. Depois do sucesso internacional da Espresso Book Machine, que quer ser uma espécie de caixa multibanco de produzir livros, Zita Seabra cria em Portugal uma empresa de print on demand.
A Espresso Book Machine elimina o inventário, o armazenamento, o 
custo de transporte, as sobras  
A Espresso Book Machine elimina o inventário, o armazenamento, o custo de transporte, as sobras (Corbis/VMI)

Quando se passa por uma máquina de impressão a pedido e ela não está a funcionar, até se pode confundir o aparelho com uma corriqueira e gigantesca máquina de fotocópias.

Durante anos, vi máquinas de print on demand (impressão a pedido) expostas em feiras dedicadas ao sector livreiro, como a Feira do Livro de Frankfurt ou a Feira do Livro de Londres, e nunca lhes prestei grande atenção. Pareciam trambolhos e quando olhávamos para elas, sem estarem a funcionar, a ideia de que através delas e do print on demand se podia tornar mais racional e menos arriscada a edição de livros parecia ainda uma solução distante.

Foi numa tarde do final de Maio de 2009 que tudo isto mudou. Na Book Expo America (BEA), em Nova Iorque, vi pela primeira vez a Espresso Book Machine a funcionar. Era impressionante.

Esta máquina que imprime e encaderna livros continuava a ter aquele aspecto de fotocopiadora (apesar de ser mais pequena do que as outras) mas quando, num instante, produziu um livro com um acabamento perfeito, conquistou-me. Passou de patinho feio a cisne.

Na verdade, a presença daquela máquina de impressão a pedido na BEA fazia parte de uma estratégia do grupo editorial Perseus. Queriam provar que actualmente é possível produzir um livro em pouquíssimo tempo e distribuí-lo, em inúmeros formatos, em tempo recorde.

Um mês antes, a 28 de Abril de 2009, este grupo editorial norte-americano tinha criado um site onde pedia aos cibernautas que escrevessem a continuação dos seus livros preferidos. O projecto chamava-se Book: The Sequel.

Pediam: “Peguem num livro. Imaginem uma sequela. Escrevam a primeira frase. Dêem-lhe um título fantástico.”

O site (www.bookthesequel. com) ficou aberto durante um mês. No dia 28 de Maio de 2009, deixaram de aceitar contribuições e começaram a produzir “o livro” de várias formas.

O visionário

A obra Book: The Sequel first lines from the classics of the future by inventive imposters foi então produzida, em 48 horas, no recinto desta feira em Nova Iorque. Foi editada, desenhada, paginada e produzida em audiolivro (mp3), em formato digital, eBook, para várias plataformas e fizeram também uma versão impressa na Espresso Book Machine. Esse foi o momento mais emocionante. Em poucos minutos, a máquina de print on demand, ligada a um computador onde existia o ficheiro informático com o livro, imprimiu, organizou as páginas, cortou-as, fez a capa (a cores e brilhante), encaixou-a no maço de folhas e colou tudo. O barulho não era ensurdecedor e podíamos ver passo a passo a impressão e encadernação da obra. Num minuto, a máquina imprimiu cem páginas e de dentro dela saiu um livro, que, se eu não tivesse visto ser impresso à minha frente, pensaria ser um livro de bolso tradicional.

Um assombro. Já passou quase um ano e o meu exemplar de Book: The Sequel first lines from the classics of the future by inventive imposters está na estante para dar e durar. Continua com a capa colorida superbrilhante; as páginas não se descolaram; enfim, o tempo passou e o livro não se desfez.

Por trás desta máquina está a empresa On Demand Books (http://www.ondemandbooks.com) e o famoso editor Jason Epstein. Conhecido por ser o responsável pela colecção Vintage paperbacks (onde publicou Norman Mailer, Nabokov, Gore Vidal ou Philip Roth) e por ter criado, em 1952, quando era editor da Doubleday, a chancela Anchor Books, que foi a primeira a dedicar-se exclusivamente ao formato de livro de bolso. Jason Epstein ajudou também a sua ex-mulher, Barbara Epstein, a fundar a “The New York Review of Books”. Tem uma longa experiência no sector e fama de visionário.

Em 1999, Jason Epstein fez uma série de palestras na Biblioteca Pública de Nova Iorque. Imaginou que no futuro iria aparecer uma máquina que imprimia livros e os vendia de uma forma quase automática. Teria um preço acessível e poderia ser colocada em livrarias de bairro, nos cafés, em hotéis, nos aeroportos ou em cruzeiros de longo curso. Com ela, qualquer pessoa teria facilmente acesso a livros (esgotados ou não). Nessa altura, Jason Epstein não sabia que o protótipo desta máquina já existia: tinha sido inventada por Jeff Marsh. Esta história está contada no site da On Demands Books, empresa que Jason Epstein fundou em 2003 com o seu sócio, Dane Neller (antigo CEO do Dean & DeLuca), para desenvolverem e comercializarem a máquina inventada por Jeff Marsh.

O fim da era Gutenberg

Jason Epstein deu no ano passado uma palestra na conferência da O’Reilly Tools Of Change for Publishing e começou o seu discurso com esta frase: “Não preciso de vos dizer que estamos no fim da era Gutenberg...”. Falava não só de uma nova maneira de publicar livros mas também de uma revolução cultural. Explicava que existem muitos textos cujo valor é efémero e que não precisam de ser impressos. Nesse grupo incluía não só aqueles livros de ficção e de não-ficção que lemos uma vez (ou que nem chegamos a ler até ao fim) mas também dicionários, enciclopédias ou manuais, que ficam obsoletos logo no dia da sua publicação.

Para este editor, os conteúdos “efémeros” vão definitivamente passar a ser consultados e acedidos pelos consumidores através de dispositivos multitarefas (como telemóveis de nova geração ou tablets idênticos ao iPad que acaba de ser lançado pela Apple). Os consumidores terão acesso às obras guardadas em bases de dados através de assinaturas e os documentos digitalizados serão corrigidos ou eliminados à medida das nossas necessidades. “Quando falo em efémero, não o faço de forma depreciativa mas para enfatizar a extrema volatilidade destas obras de referência ou técnicas”, explicava Epstein.

Para ele, os editores vão comercializar online assinaturas que dão acesso a bases de dados sobre assuntos específicos e certos documentos com informações mais técnicas e académicas, estarão disponíveis quer para investigadores quer para utilizadores comuns. Na sua opinião, os leitores de livros electrónicos (que ainda considera aparelhos muito caros) serão substituídos por aparelhos mais baratos e multitarefas, isto é, podem ser utilizados para ler, mas também para jogar, ver filmes ou até navegar na Internet e terão baterias mais duradouras e ecrãs mais legíveis do que os actuais.

Jason Epstein defende também que o trabalho dos escritores precisa de ser protegido legalmente. “De que é que os escritores irão viver? Eles precisam de comer. Não são músicos. Não podem dar concertos ou fazer anúncios”, lembrou.

Nesse seu discurso (que está disponível para consulta online), o antigo editor recordava a palestra que tinha feito há dez anos na Biblioteca Pública de Nova Iorque onde lançara a ideia da tal máquina, que, como uma caixa multibanco, estaria disponível para se imprimirem livros num instante, em qualquer lugar. Na sua opinião, a máquina que mais se aproxima da que ele imaginou na época é a Espresso Book Machine (desenvolvida pela sua própria empresa) que imprime livros até 800 páginas e produz um livro de 320 páginas com a qualidade de um livro de bolso idêntico ao impresso numa tipografia, em sete minutos, por um penny por página.

“A Espresso Book Machine elimina completamente a cadeia de distribuição entregando um livro feito a partir de um ficheiro digital ao consumidor final sem passar por intermediários: sem inventário, sem armazenamento, sem custos de transporte, sem sobras e sem devoluções”, afirmou Epstein indicando que o investimento numa máquina destas equivale ao que se faz numa fotocopiadora. É quase uma revolução e permite acabar com o drama dos livros guilhotinados que tanta polémica tem gerado nos últimos meses.

Por cá, Zita Seabra, da editora Alêtheia, também decidiu seguir os passos de Jason Epstein. Quer contribuir para combater os livros em stock e o desperdício, acabar com armazéns de monos e recuperar bons livros esgotados e por isso criou uma empresa dedicada à impressão a pedido. É a Várzea da Rainha Impressores SA (VRI), teve um investimento de um milhão de euros, está sediada em Óbidos e brevemente vai aceitar encomendas através de um portal na Internet que está a ser construído. Para já, disponibilizam toda a informação sobre os seus serviços no site (http://www. varzeadarainha.pt).

A empresa possui duas máquinas de impressão a pedido: a Nuvera 200 (que imprime a preto e branco) e a Xerox DC 7002 (para imprimir a cores). Os clientes podem escolher imprimir desde um até 1500 exemplares a preços mais acessíveis do que nas impressoras tradicionais. Imprimir 25 exemplares de um livro com 250 páginas a preto e branco e capa a cores pode custar cerca de 185 euros. Por exemplo, a edição de A Nova Tirania, de Juan Manuel de Prada (Alêtheia), já foi lá produzida.

A VRI tem também um pacote apropriado para quem quer publicar livros sem ter de encontrar um editor que aceite editá-lo e sem ter de fazer a tiragem mínima imposta pela impressão nas gráficas. É o serviço de Self Publishing, que custa cerca de 350 euros e inclui a paginação do livro, a inscrição da obra no sistema ISBN, com código de barras, a atribuição da chancela Sinapis Editores e um exemplar impresso do livro é entregue ao autor. A obra é catalogada no portal da empresa e a partir daí poderá ser encomendada e adquirida online pelos leitores que a queiram ler. Sem dramas e sem chatices.

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