domingo, 4 de abril de 2010

Poema do alegre desespero - António Gedeão

Assunto: SOLIDÃO
Data: 3/Abr 21:24
QUE ESTA SOLIDÃO NÃO TENHA O PODER DE TATUAR EM MIM A TRISTEZA. QUE AS ANDORINHAS VENHAM POUSAR NO BEIRAL DA JANELA, LEMBRANDO-ME QUE TROUXERAM A PRIMAVERA. E QUE ESSA NOTÍCIA ME FAÇA SORRIR. E QUE ME LEVE AO ARMÁRIO PARA PROCURAR AQUELE VESTIDO FLORIDO COM QUE EU IA DANÇAR. E QUE A RECORDAÇÃO DESSAS DANÇAS NÃO ME FAÇAM DOER O CORAÇÃO. E QUE DAÍ PARA CÁ TENHA ENCONTRADO ALGO QUE SUBSTITUA A MÚSICA, QUE ENTRE IGUALMENTE NAS VEIAS E ME FAÇA VIBRAR COMO CORDA DE VIOLINO. E QUE SE PERDI ALGUÉM NO CAMINHO, EM MIM CRESÇA A ESPERANÇA DE VOLTAREI A ESTAR JUNTO, E RIR, E BEIJAR, E ACREDITAR QUE A VIDA PULSA, VIBRANTE, NA PALMA DA MINHA MÃO. E QUE ACREDITE QUE PARA SEMPRE SERÁ ASSIM. E QUE O MEU OLHAR DE CRIANÇA SE ASSOMBRE PERANTE O BRILHO DO AZUL DO CÉU, A FRESCURA DO VERDE DAS ÁGUAS E A FORÇA QUE EMANA DO VERMELHO DA FLÔR. E QUE GUARDE EM MIM TUDO ISTO E MAIS AINDA - A BELEZA, A ESPERANÇA, A VOZ DO MAR, O BRILHO DAQUELA ESTRELA QUE É SÓ MINHA E NINGUÉM O SABE, O SABOR DE UM PASTEL DE NATA, O SOM DA MINHA GARGALHADA, A SUAVE SENSAÇÃO DA CERTEZA DE UM MUNDO MELHOR. QUE FAÇA CADA COISA COM PAIXÃO, COM ENTREGA TOTAL E DE TAL FORMA, QUE EU PASSE A SER A SOMA DE TUDO, E A PALAVRA SOLIDÃO NÃO SEJA MAIS DO QUE ISSO, UMA SIMPLES PALAVRA QUE SE SENTA A MEU LADO MAS NÃO CONSEGUE ENSOMBRAR MEU CORAÇÃO... EM ANEXO UM BEIJO!
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Distribuído por Moranguinho Pereira (hi5)
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POEMA DO ALEGRE DESESPERO
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Compreende-se que lá para o ano três mil e tal
ninguém se lembre de certo Fernão barbudo
que plantava couves em Oliveira do Hospital,

ou da minha virtuosa tia-avó Maria das Dores

que tirou um retrato toda vestida de veludo
sentada num canapé junto de um vaso com flores.

Compreende-se.


E até mesmo que já ninguém se lembre que houve três impérios no Egipto

(o Alto Império, o Médio Império e o Baixo Império)
com muitos faraós, todos a caminharem de lado e a fazerem tudo de perfil,
e o Estrabão, o Artaxerpes, e o Xenofonte, e o Heraclito,
e o desfiladeiro das Termópilas, e a mulher do Péricles, e a retirada dos dez mil,
e os reis de barbas encaracoladas que eram senhores de muitas terras,
que conquistavam o Lácio e perdiam o Épiro, e conquistavam o Épiro e perdiam o Lácio,

e passavam a vida inteira a fazer guerras,

e quando batiam com o pé no chão faziam tremer todo o palácio,
e o resto tudo por aí fora,
e a Guerra dos Cem Anos,
e a Invencível Armada,
e as campanhas de Napoleão,
e a bomba de hidrogénio,
e os poemas de António Gedeão.

Compreende-se.


Mais império menos império,

mais faraó menos faraó,
será tudo um vastíssimo cemitério,
cacos, cinzas e pó.

Compreende-se.

Lá para o ano três mil e tal.

E o nosso sofrimento para que serviu afinal?

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ANTÓNIO GEDEÃO

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