sábado, 24 de maio de 2008

25 de Abril - «olhares» - «entrevistas» - «verdades» (22)

30 anos do 25 de Abril
Criado segunda-feira, 12 de Abril de 2004
Última actualização terça-feira, 27 de Abril de 2004

Miguel Silva/PÚBLICO
Vasco Lourenço

Presidente da Associação 25 de Abril
Vasco Lourenço: "Havia que encontrar uma solução política para a guerra, dizíamos"
Por António Melo
16.04.2004
Público
Os militares que se começam por reunir com base num problema de carreiras e vencimentos acabam por derrubar o regime com o objectivo de instaurar o regime democrático.

Qual é a motivação do vosso descontentamento?
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A base fundamental é o problema da guerra. A guerra colonial é a grande razão de ser do descontentamento e, sobretudo, o facto de o Governo não vislumbrar qualquer solução de natureza política.

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Não houve a questão dos oficiais milicianos que entraram para o quadro permanente?
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Isso aconteceu em Julho de 73, mas isso é uma coisa que está mais do que ultrapassada, aliás eu ia dizer que na constituição do Movimento acabara de ser ultrapassada essa divisão entre militares oriundos de cadetes da Academia Militar, que constituem o Movimento em si, e a dos oficiais milicianos.
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Em Abril/Maio de 73 dá-se a reacção ao Congresso dos Combatentes, organizado pelo poder e que terminou com uma campanha de assinaturas em que se esvazia o Congresso dos Combatentes, declarando antecipadamente os oficiais do abaixo-assinado que nada tinham a ver com as conclusões que lá viessem a ser tiradas.
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O grupo que dinamizou esta contestação ao Congresso, estava essencialmente ligado ao general Spínola, formara-se na Guiné, e nele me integrei. Começámos a discutir como aproveitar aquela dinâmica, que provara ser o poder muito mais fraco do que pensávamos, porque não reagiu a uma movimentação indisciplinada como a que fizemos. Andávamos a pensar no que fazer? Havia que encontrar uma solução política para a guerra, dizíamos, mas os gajos só vêem a solução militar...

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Pairava o fantasma da retirada da Índia?
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Nomeadamente em relação à Guiné. O Marcello já tinha dito ao Spínola que não haveria retirada nem negociação, nem pensar nisso, porque encontrar uma solução para a Guiné ia ter por consequência arrastar os outros territórios. É quando nos aparece um problema de ordem sócio-profissional, de índole corporativa. O poder, que precisava de dar resposta às necessidade da guerra colonial, criava situações contraditórias.
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Ao necessitar mobilizar mais militares para fazer a guerra alicia os milicianos. Foi tão descarada a abertura, que nós considerámo-la ofensiva para os militares, prejudicados nas suas carreiras militares. Estávamos num quadro de progressão segundo determinadas regras, fixadas à partida, e de repente vemos passar-nos por cima uma quantidade de pessoas, que eram mais modernos do que nós em termos de carreira.
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Mas também era ofensiva para as Forças Armadas em si, e isto teve muita importância junto dos militares. Havia uma grande rivalidade nos meios estudantis entre os cadetes da Academia Militar e os universitários dos cursos superiores, fomentada por diversos sectores, inclusive pelos da oposição.
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Nós exploramos esse descontentamento. Ao fazê-lo constituíram-se imediatamente dois grupos. O dos capitães, que vai contestar essa medida e ao lado deste o dos oficiais ex-milicianos que tinham concorrido ao quadro permanente e beneficiariam desses decretos. Eles consideram, de imediato, que nós estávamos contra eles. Explicámos que estávamos, isso sim, contra as medidas que implicam o desprestígio da instituição militar. Havia já oficiais, e falo por mim, a dizer que o importante não eram os decretos, mas aproveitar o descontentamento e dar-lhe uma orientação.

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