Digestivo nº 403 >>> Antologia poética, de Carlos Drummond de Andrade No saldo de anos caindo nos vestibulares e nos “vestibulinhos” da vida, a Antologia poética de Drummond afugentou futuros leitores adultos, depois de tanta dissecação interpretativa, dada a mania, professoral, de querer entender o poema além da poesia. Mas os versos continuaram lá, imbatíveis: “Perdi o bonde e a esperança” (“Soneto da Esperança Perdida”); “José, para onde?” (“José”); “O tempo ainda é de fezes, maus poemas, alucinações e espera” (“A Flor e a Náusea”); “(...)a vida não se perdeu/ (...)o coração continua” (“Consolo na Praia”). A Antologia, organizada pelo próprio Drummond, não tem a pretensão de esgotar a própria obra, mas de apresentar, no tempo, uma trajetória poética que varreu, como poucas, o século XX. “Dentro de mim, bem no fundo,/ há reservas colossais de tempo” (“Idade Madura”); “Sinto que o tempo sobre mim abate/ sua mão pesada. Rugas, dentes, calva.../ Uma aceitação maior de tudo,/ e o medo de novas descobertas” (“Versos à Boca da Noite”). Drummond foi, à sua maneira, também filósofo. E psicólogo: “Só não quer que seu amor/ seja uma prisão de dois,/ um contrato, entre bocejos/ e quatro pés de chinelo” (“A Mesa”). Foi, ainda, cronista que escreveu em jornal, mas o que valia mesmo era um poema, entre capas, como “Canto ao Homem do Povo Charlie Chaplin”: “Eis o tenebroso, o viúvo, o inconsolado,/ o corvo, o nunca-mais, o chegado muito tarde/ a um mundo muito velho”. E foi poeta, mais do que tudo: “A literatura estragou tuas melhores horas de amor” (“Elegia 1938”). Amou, naturalmente: “Minha vida, nossas vidas/ formam um só diamante” (“Canção Amiga”). E zombou da existência: “O mundo não vale o mundo,/ meu bem” (“Cantiga de Enganar”). Foi, ainda, profético: “E como ficou chato ser moderno” (“Eterno”). Até sair de cena: “Ah, não me tragam originais” (“Apelo a meus dessemelhantes em favor da paz”). A Antologia poética é seu testamento. Antologia poética | |
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Antologia Poetica
Autor: ANDRADE, CARLOS DRUMMOND DEEditora: RECORD
Assunto: LITERATURA BRASILEIRA - POESIA
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Ao organizar 'Antologia poética', Carlos Drummond não teve em mira, propriamente, selecionar poemas pela qualidade, nem pelas fases que acaso se observem em sua carreira poética. Cuidou antes de localizar, na obra publicada, certas características, preocupações e tendências que a condicionam ou definem, em conjunto. A antologia lhe pareceu assim mais vertebrada e, por outro lado, espelho mais fiel. Escolhidos e agrupados os poemas sob esse critério, resultou uma Antologia que não segue a divisão por livros nem obedece a cronologia rigorosa. O texto foi distribuído em nove seções, cada uma contendo material extraído de diferentes obras, e, disposto segundo uma ordem interna. |
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